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1. Introdução; 2. As imputações estatísticas: o obscurecimento da realidade social pela mensuração imediata; 3. A "pobreza absoluta" e a subsistência; 4. "Capital humano": uma contradição nos termos? 5. O fetichismo da produtividade; 6. Conclusão: o fetichismo da estatística. José Sérgio Leite Lopes ** * Desejo agradecer as valiosas su- gestões dos membros do Grupo de Pesquisas da FINEP, para o qual foi feito um relatório em que se baseou o presente artigo. Agradeço também a contribuição indispen- sável de membros do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional. As opi- niões aqui desenvolvidas são de ex- clusiva responsabilidade do autor, e não das instituições menciona- das. ** Economista da FlNEP - Fi- naciadora de Estudos e Proje- tos S. A. e aluno do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional, Univer- sidade Federal do Rio de Janeiro. R. Adm. Emp., Rio de Janeiro, 1. Introdução Aparentemente, desde a divulgação dos dados preliminares do censo de 1970, um espectro parece rondar o "modelo brasileiro": a "distri- buição de renda". Esse espectro passou repen- tinamente para as primeiras páginas dos jornais com as declarações de R. McNamara, presidente do Banco Mundial, na reunião da UNCTAD no Chile, que criticou a distribuição de renda de seu maior cliente, o Brasil. Nessas declarações, McNamara citou alguns dados de um trabalho do economista A. Fishlow. 1 No decorrer de 1972, um debate público generalizou-se, envolvendo ministros, parlamentares, economistas e soció- logos. O objetivo do presente artigo é, mais do que fazer uma resenha bibliográfica estrita do tra- balho Brasilian size distribution of income, do Prof. Fishlow, discutir criticamente, através daquele trabalho, alguns aspectos comuns à produção intelectual de autores especialistas em econometria e voltados para a política econô- mica imediata. 2 Por isso, antes de entrar pro- priamente na crítica ao artigo de Fishlow, de- sejamos situar brevemente o lugar dos estudos estatísticos sobre a distribuição de renda na evolução do "campo intelectual" brasileiro refe- rente ao tema da economia brasileira contem- porânea, e o seu lugar no debate público ante- riormente referido. a O debate da distribuição da renda parece apresentar algumas singularidades e paradoxos. Em primeiro lugar, um tema vedado a discus- sões que extravasem os especialistas, transfor- ma-se repentinamente, numa determinada con- juntura política, em "debate público";" Em segundo lugar, lança-se mão, de parte a parte, nesse debate, de áridos estudos estatísticos de 47 mensuração da distribuição da renda, e parado- xalmente, é no momento em que os trabalhos dos especialistas se tornam, por assim dizer, esotéricos, que eles são comunicados ao público. Além disso, um subdebate polariza-se em torno de alguns autores, com certas regras específicas de legitimação acadêmica - como é o caso do debate entre os Professores A. Fishlowe C. Lan- goni. 1\ Essas singularidades do debate podem ser relacionadas ao fato de que parece fazer parte da própria "camisa de força" em que o debate 13(3) : 47-61, jul./set. 1973 Sobre o debate da distribuição da renda leitura crítica de um artigo de fishlow

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1. Introdução;2. As imputações estatísticas:

o obscurecimento da realidadesocial pela mensuração imediata;

3. A "pobreza absoluta" e asubsistência;

4. "Capital humano": umacontradição nos termos?

5. O fetichismo da produtividade;6. Conclusão: o fetichismo da

estatística.

JoséSérgio Leite Lopes **

* Desejo agradecer as valiosas su-gestões dos membros do Grupo dePesquisas da FINEP, para o qualfoi feito um relatório em que sebaseou o presente artigo. Agradeçotambém a contribuição indispen-sável de membros do Programa dePós-Graduação em AntropologiaSocial do Museu Nacional. As opi-niões aqui desenvolvidas são de ex-clusiva responsabilidade do autor,e não das instituições menciona-

das.

** Economista da FlNEP - Fi-naciadora de Estudos e Proje-tos S. A. e aluno do Programa dePós-Graduação em AntropologiaSocial do Museu Nacional, Univer-sidade Federal do Rio de Janeiro.

R. Adm. Emp., Rio de Janeiro,

1. Introdução

Aparentemente, desde a divulgação dos dadospreliminares do censo de 1970, um espectroparece rondar o "modelo brasileiro": a "distri-buição de renda". Esse espectro passou repen-tinamente para as primeiras páginas dos jornaiscom as declarações de R. McNamara, presidentedo Banco Mundial, na reunião da UNCTAD noChile, que criticou a distribuição de renda deseu maior cliente, o Brasil. Nessas declarações,McNamara citou alguns dados de um trabalhodo economista A. Fishlow. 1No decorrer de 1972,um debate público generalizou-se, envolvendoministros, parlamentares, economistas e soció-logos.

O objetivo do presente artigo é, mais do quefazer uma resenha bibliográfica estrita do tra-balho Brasilian size distribution of income, doProf. Fishlow, discutir criticamente, atravésdaquele trabalho, alguns aspectos comuns àprodução intelectual de autores especialistas emeconometria e voltados para a política econô-mica imediata. 2 Por isso, antes de entrar pro-priamente na crítica ao artigo de Fishlow, de-sejamos situar brevemente o lugar dos estudosestatísticos sobre a distribuição de renda naevolução do "campo intelectual" brasileiro refe-rente ao tema da economia brasileira contem-porânea, e o seu lugar no debate público ante-riormente referido. a

O debate da distribuição da renda pareceapresentar algumas singularidades e paradoxos.Em primeiro lugar, um tema vedado a discus-sões que extravasem os especialistas, transfor-ma-se repentinamente, numa determinada con-juntura política, em "debate público";" Emsegundo lugar, lança-se mão, de parte a parte,nesse debate, de áridos estudos estatísticos de 47mensuração da distribuição da renda, e parado-xalmente, é no momento em que os trabalhosdos especialistas se tornam, por assim dizer,esotéricos, que eles são comunicados ao público.Além disso, um subdebate polariza-se em tornode alguns autores, com certas regras específicasde legitimação acadêmica - como é o caso dodebate entre os Professores A. Fishlowe C. Lan-goni. 1\

Essas singularidades do debate podem serrelacionadas ao fato de que parece fazer parteda própria "camisa de força" em que o debate13(3) : 47-61, jul./set. 1973

Sobre o debate da distribuição da renda leitura crítica de um artigo de fishlow

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público está colocado, o processo de limitação eespecialização temática que. sofreram os fenô-menos tradicionalmente designados sob a ru-brica da distribuição de renda. Com efeito, odebate público sobre a distribuição de rendajá se deu, em outras conjunturas políticas, emtorno não dessa categoria em si, mas descen-tralizado em volta das reivindicações econô-micas cotidianas de diferentes grupos sociais.Esse debate dizia respeito a toda a populaçãoporque incorporado à sua prática social e polí-tica; e a distribuição de renda, categoria daeconomia política, era debatida enquanto talentre especialistas - economistas, sociólogos epolíticos, preocupados com o processo de desen-volvimento e com as dimensões do mercado in-terno. Com as restrições impostas às reivindica-ções econômicas abertas dos grupos sociais, emparticular dos trabalhadores, o debate públicosobre os fenômenos a que diz respeito a distri-buição de renda transformou-se no debate pri-vado entre os economistas sobre o que a cate-goria significa em sua produção intelectual.Uma primeira limitação temática se operoupÕrtanto: de tema público referido à práticasocial dos diferentes grupos sociais, a distribui-ção de renda, ao mesmo tempo em que se afir-ma como categoria específica de debate, res-tringe-se à discussão entre especialistas. Mas aomesmo tempo, uma segunda limitação temáticase opera devido à correlação de forças internasao campo intelectual em que o tema é debatido:de tema integrado em análises de conjunto doprocesso econômico brasileiro, a distribuição derenda tende a ser reduzida ao tratamento devariáveis estatísticas e econométricas.

Assim, essas duas limitações temáticas per-mitiram que o tema, antes discutido por poucosse tornasse público de uma maneira limitada

48 e controlada. E a conjuntura política do anopassado permitiu que o tema extravasassecontroladamente o âmbito dos especialistas epudesse ser comunicado ao público: não maiso "público" estruturado em grupos sociais,produtor de suas ações reivindicatórias sobrea renda, mas um "público" difuso, agregadode indivíduos, reduzido a consumidor "sobe-rano" de informações escassas. Estava prontaassim, para o debate público, uma problemá-tica imposta: é de sua essência seu tratamentopor especialistas em econometria em detrimen-to da compreensão do público a ser comunicado.Revtsta de Admtntstração de Empresas

Por outro lado, a limitação da temática àsconsiderações em torno de mensurações esta-tísticas deve-se também ao fato de que ela éuma resposta a outra temática: a apologéticadas taxas de crescimento do produto nacional.Assim, os trabalhos de mensuração da distribui-ção de renda vieram combater aquela apologiano próprio terreno da estatística em que elase baseava, e tiveram o mérito de desmistificá-laao enfatizarem e aperfeiçoarem uma nova di-mensão estatística para a avaliação do desem-penho da economia brasileira (cf. Fishlow,Hoffman & Duarte e CEPAL). Os trabalhos demensuração da distribuição, críticos à grandeconcentração da renda, abriram assim umabrecha para o aprofundamento do debate entreos especialistas de política econômica e vieramtambém dar uma base estatística às análisescríticas ao processo de desenvolvimento bra-síleíro.v

No entanto, esses estudos, ao aceitarem o de-bate no próprio campo estatístico em que semovimenta a apologia das taxas de crescimento,são estimulados a procurar as causas e as ex-plicações do perfil da distribuição de renda combase nos próprios dados estatísticos. Como aestatística não revela outras relações senão asque são procuradas a priOri pelo pesquisador, énecessário discutir-se a própria validade expli-cativa dessas relações e dos "modelos" que opesquisador tem que lançar mão em sua análisecausal. Assim, a substantivação desse tipo deanálise causal pode fazer a análise estatísticaperder o seu caráter heurístico na sua interre-lação com a herança teórica da economia polí-tica e da sociologia. A análise estatística podeassim ofuscar, paradoxalmente, a teia de rela-ções sociais subjacentes à distribuição de rendaque aquela análise visa esclarecer.

A análise crítica do artigo de Fishlow que sesegue tem a preocupação de selecionar algunsde seus aspectos em que esse "ofuscamento"pode dar-se. Ela visa também tentar oporpreocupações teóricas à análise estatística, ealém disso, mostrar como os dados estatísticosnão podem ser tomados pela realidade. 7 Poroutro lado, a análise específica do artigo deFishlow tentará mostrar como mesmo tendo eleuma posição crítica com relação à concentraçãoda renda, ele subestima - devido ao seu ins-trumental estatístico e econométrico - a exten-são e a gravidade, para a maioria da população,dos resultados a que chega em sua análise.

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2. As imputações estatísticas:o obscurecimento da realidade socialpela mensuração imediata

o artigo Brazilian size distribution of incomede A. Fishlow - que, assinalando a maior con-centração de renda havida no intervalo de 10anos entre os censos, teve importante papel nadiscussão sobre a distribuição de renda - ex-plicita sua oposição, no campo estatístico, à te-mática das taxas de crescimento do produtonacional como único indicador do desempe-nho de uma economia. Um dos objetivos dodocumento é o de atuar no sentido de provocaro " ... reconhecimento de um sistema de con-tabilidade que reconhece e aplaude não somenteaumentos no produto agregado, mas tambémcontabilize os ganhos diferenciais de riqueza quese refletem na distribuição da renda" (p. 402).O autor aplica-se portanto em mostrar a possi-bilidade de uma mensuração estatística rigorosada distribuição de renda. Para isso, tem que tra-balhar sobre os resultados incompletos do censode 1960.

Após justificar a utilização de uma amostrado censo de 60 e não de suas estimativas preli-minares, Fishlow procede a dois tipos de ajusta-mentos sobre os dados da amostra: por um lado,incorporar a renda não monetária excluída doinquérito do censo, e por outro lado, realocarrenda para trabalhadores familiares designadospelo inquérito como economicamente ativos massem remuneração monetária. Para proceder aestas imputações, o autor recorreu a três tiposde informação: aluguel imputado, consumo do-méstico rural imputado e alimentação e dor-mida imputada para empregados domésticos. Éinteressante notar-se, com respeito à discussãopública acima referida, que a parte situacionistado debate acusava a parte crítica oposta deter-se baseado em dados (do censo) que nãoimputam a renda não monetária percebida pordeterminados grupos sociais (principalmentedo campo) , mas não esclarece que o trabalho deFishlow (cujo destaque na origem da polêmicajá foi referido) trabalha sobre os dados docenso, realizando explicitamente e de formacuidadosa, do ponto de vista estatístico, essasimputações.

O autor então faz quatro ajustamentos à sé-rie estatística da amostra do censo: um ajus-tamento relativo a aluguéis, 8 um ajustamentorelativo ao consumo doméstico rural, 9 um ajus-tamento relativo à renda não monetária perce-

bida pelos empregados domésticos, e finalmenteum ajustamento relativo à realocação de umafração da renda do chefe de família para traba-lhadores familiares não pagos.

Fazendo-se uma leitura um tanto exegéticado texto, não deixa de ser sintomático, no en-tanto, que Fishlow, quando fala dos emprega-dos domésticos, utiliza a categoria "força detrabalho" 10 e quando fala dos trabalhadoresfamiliares não pagos, utiliza a categoria "popu-lação economicamente ativa".l1 Ora, não sepode evitar de assinalar aqui a discussão do em-prego da categoria de "força de trabalho" paraFishlow. Ela parece ser uma categoria definidaao nível da operacionalização estatística, dis-tinguindo-se assim da categoria força de tra-balho, conceito da economia política, que secompõe dos mesmos termos. 12Pois a afirmaçãoda nota 10 provavelmente exclui o trabalho fe-minino não remunerado no quadro da produçãofamiliar camponesa ou artesanal, já que na-quela afirmação, a categoria é acompanhada deuma mensuração sem maiores explicaçõesquanto a possíveis estimações. Além disso, sónão há uma incoerência na utilização simul-tânea: a) da exclusão do trabalho familiarfeminino da categoria de "força de trabalho";b) da imputação da renda não monetáriapercebida pelas empregadas domésticas comocontrapartida da venda de sua força de tra-balho: se a categoria "força de trabalho" re-ferir-se a "mercado de trabalho". A diferençaentre as categorias estatísticas de "força detrabalho" e população economicamente ativabaseia-se na pressuposição da presença ou daausência de mercado de trabalho. A distinçãoentre essas duas categorias estatísticas suge-re-nos uma distinção entre a utilização daforça de trabalho no quadro da produção fa-miliar e a utilização da força de trabalho nocontexto de sua venda no mercado de trabalho. 49Essas duas utilizações da força de trabalho, deforma recorrente, pertencem, com efeito, a doistipos de "sistemas econômicos" distintos, con-forme procuro explicar adiante.

A conseqüência final daqueles quatro ajusta-mentos é um incremento da renda por traba-lhador de quase 20%, e uma redução signifi-cativa da concentração da renda; a renda fa-miliar sendo afetada na mesma direção mas emmenor grau. As críticas da parte situacionistada discussão sobre distribuição de renda já men-cionadas, caem por terra (no mínimo com res-peito a esse trabalho do Fishlow).

Distribuição da renda

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Cabe aqui, no entanto, levantar uma discus-são metodológica, de conseqüências substanti-vas, a respeito da validade mesma desses ajusta-mentos e imputações do ponto de vista doconhecimento da intrincada teia de relaçõessociais subjacente à distribuição da renda. Comefeito, essas imputações fazem agregar umarenda não monetária à renda monetária, trans-formando artificialmente a heterogeneidade daprimeira em benefício de uma homogeneidadesegundo a ótica da renda monetária. Essa trans-formação é justificada pelas necessidades demensuração. O que queremos ressaltar, em con-traposição, é a necessidade de uma discussãoconceitual como pré-requisito indispensável aessa transformação. É preciso discutir-se pri-meiramente o que está por detrás da renda nãomonetária. A consideração da própria distinçãoentre as categorias empregadas por Fishlow de"força de trabalho" e "população economica-mente ativa" (que fizemos antes, pode servirpara nos indicar uma heterogeneidade de fenô-menos no seio mesmo da renda não monetária:a categoria "força de trabalho", incluindo porexemplo as empregadas domésticas e excluindoos trabalhadores familiares não remunerados,ambos agentes econômicos perceptores de tiposde renda não monetária, indica a distinçãoentre um tipo de renda não monetária que écontrapartida à venda da força de trabalho(caso das empregadas domésticas) e um tipode renda não monetária que tem por base aredistribuição da renda ou do produto no seioda família (caso dos trabalhadores familiaresnão remunerados).

O primeiro tipo de renda não monetária seriaum fluxo de renda interrelacionando de umlado um empregador - por exemplo uma uni-dade familiar que empregue uma empregadadoméstica, ou por exemplo um senhor de enge-nho que "dê" moradia a seus trabalhadores -e de outro lado um trabalhador, que vende suaforça de trabalho e que recebe em contrapartidauma renda, em parte monetária - a qual ser-virá para a compra dos bens e serviços neces-sários à sua subsistência enquanto força detrabalho ativa - e em parte não monetária,isto é, diretamente bens e serviços. Essa partenão monetária pode constituir-se na alimenta-ção e dormida de uma empregada doméstica,na moradia de um trabalhador rural na proprie-dade de seu empregador, etc. e é explícita no"contrato" de trabalho - seja ele formalizadoRevista de Administração de Empresas

segundo a lei ou não - entre o trabalhador eseu empregador. Ela é constitutiva do próprioconteúdo do emprego em questão, fazendo partede suas condições de trabalho. Ora, isso nãoquer dizer que esses elementos constitutivos dascondições de trabalho destes trabalhadores -dos quais a percepção também de uma rendanão monetária é um indício - sejam uma van-tagem para eles como quer fazer crer a parte si-tuacionista do debate já mencionado. Aindamais, a própria imputação da renda não mone-tária à renda monetária desses trabalhadoresendossa inconscientemente a crença neste cará-ter "vantajoso", visto que essa imputação não éacompanhada da análise (ou pelo menos da re-ferência) das implicações que têm esses elemen-tos para o trabalhador na sua relação com oempregador: maior dependência econômica eextra-econômica daquele com relação a este,tendência ao monopólio da utilização da forçade trabalho do trabalhador pelo empregador(rigidez do mercado de trabalho). Essa' partenão monetária da renda do trabalhador é regi-da portanto pelo tipo específico de mercadode trabalho em que está inserido esse traba-Ihador.13

O segundo tipo de renda não monetária, aocontrário, é regida não pelo princípio do mer-cado - prestação de força de trabalho pelo tra-balhador, contra-prestação de renda monetáriae não monetária pelo empregador - mas peloprincípio da redistribuição: 14 do chefe de fa-mília a trabalhadores familiares não pagos, noquadro de uma organização do trabalho total-mente distinta, em que as condições de trabalhosão geralmente controladas pela família. Nocaso do pequeno produtor agrícola indepen-dente, a organização do trabalho familiar, ocálculo econômico do chefe de família, referem-se a um sistema econômico regido por leis defuncionamento distintas das leis do mercado detrabalho e das condições de trabalho nas em-presas. 15

Pode-se ter ainda um caso mais complexo deinterrelação entre renda monetária e renda nãomonetária: o do trabalhador rural que percebeum salário mais a moradia na propriedade doempregador. Nessa moradia muitas vezes estáincluído um pequeno sítio onde o trabalhadore sua família podem produzir um complementoà sua alimentação e ainda vender alguma coisano mercado. 16

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Não se pretende aqui listar e multiplicarcasos-limites ou casos extraordinãrios que seconstituiriam em um desafio à estatística e àcapacidade de imputação. Pretende-se apenasao contrárío:

a) assinalar a complexidade e a freqüência dediferentes formas de organização econômica esua interrelação, provocando a necessidade dese repensar as próprias categorias econômicasutilizadas, categorias essas aparentemente uni-versais pelo seu caráter abstrato, mas inteira-mente referidas a uma economia capitalista.Nesta parte do artigo (das imputações), Fishlownão comete nenhuma transplantação de con-ceito. No entanto, as próprias imputações re-duzem as categorias específicas a essas diferen-tes formas de organização econômica, a catego-rias monetárias próprias à economia capitalista;

b) adiantar que a compreensão dessa comple-xidade de formas econômicas pode ser efetivadapela substituição das representações dos pesqui-sadores econômicos ou estatísticos referidas àsua própria classe social, pelo controle da abor-dagem antropológica que analisa as representa-ções dos próprios agentes econômicos do gruposocial estudado sobre sua prátíca econômica.Isto é, os pesquisadores inconscientemente to-mam suas categorias de pensamento referidasao seu próprio meio social como verdade uni-versal. Um primeiro caminho de rompimentodeste impasse é portanto tentar o acesso aoconhecimento daquela realidade social especí-fica, pela observação direta e pela análíse doque pensam sobre ela os próprios agentes so-ciais que a vivem;

c) assinalar que, com essa análise substantivaprévia, a mensuração estatística, a contabiliza-ção e as imputações que se fizerem necessãriasmultiplicarão sua eficiência, por sua maior ade-quação à realidade social a ser medida. Isto é,a possibilidade de mensuração é muito depen-dente da existência de relações monetãrias. Aotransformar a renda não monetária em rendamonetária, toda uma série de relações sociais- que estão intimamente ligadas às relaçõeseconômicas - é abstraída, obscurecendo a rea-lidade social. Por outro lado, não hã receitasprontas para a realização dessa "mensuraçãoadequada", a não ser - além da competênciaestatística do pesquisador - o conhecimento darealidade social em suas diversas formas espe-cíficas.17

3. A "pobreza absoluta" e a subsistência

A preocupação imediata com a mensuração estátambém presente na parte 1 do artigo deFishlow quando ele procura construir um pa-drão de pobreza nacional uniforme. O autorprocura construir esse padrão nacional atravésde um nível minimo absoluto de renda, em con-traposição à variação regional de saláríos mí-nimos diferenciados. A preocupação com níveisde renda absolutos nos parece uma preocupaçãolegitima. Uma determinada estrutura de distri-buição de renda pode ser muito concentradamas com um nível mínimo absoluto tal, que aforça de trabalho correspondente a esse nívelmínimo possa satisfazer suas necessidades bá-sicas sem prejudicar sua reprodução enquantoforça de trabalho. Uma outra estrutura de dis-tribuição de renda pode ser menos concentrada,mas ter um nível mínimo absoluto tal, que areprodução da força de trabalho correspondentea esse nível se faça sem satisfazer às suas ne-cessidades básícas, inclusive ao nível biológico ..As diversas combinações possíveis entre concen-tração da renda e natureza do nível mínimoabsoluto de subsistência encontram-se realiza-das no Brasil na pior das hipóteses: "A tragédiada situação brasileira, como a da maioria dospaíses em desenvolvimento, é que tanto a distri-buição quanto o nível vão juntos" (p. 392). Secom relação à distribuição da renda um deter-minado trabalho sobre as estatísticas disponí-veis pode dar uma idéia da importância daconcentração de renda, um outro trabalho, so-bre as informações qualitativas e quantitativascom relação às doenças que se abatem sobrea força de trabalho, pode dar uma idéia sobre anatureza do nível de subsistência, insuficientedo ponto de vista biológico, de grandes parcelasda força de trabalho brasileira. 18

Portanto, ao lado da desigualdade da distri-buição de renda, é necessário e legítimo preo-cupar-se com a grandeza absoluta da renda, es-pecialmente a dos grupos populacionais de maisbaixa renda. Essa grandeza absoluta da renda éabsoluta com relação à distribuição da rendapela população total, pois independe do grau desua concentração. Mas ela não pode ser tomadacomo absoluta no sentido de definir um padrãode subsistência mínimo ao qual toda a popula-ção nacional estaria referida. Pois essa grandezaabsoluta da renda - absoluta em relação aograu de concentração da distribuição - é

Dütribuição da renda

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relativa ao nível de subsistência necessário àmanutenção dos diferentes grupos sociais de queessa população se compõe. Por isso, a constru-ção estatística de um padrão uniforme de po-breza nacional deve ser examinada com cuidado.A construção desse padrão se faz através de umasérie de arbitrários estatísticos, 19 mas não sãoesses arbitrários inevitáveis o aspecto mais dis-cutível desta construção e sim a redução dofenômeno da pobreza a um padrão único, apli-cável em escala nacional. O autor discute a ne-cessidade da construção desse padrão nacionalde pobreza em oposição aos salários mínimosregionais legais, assinalando como de fato essessalários mínimos não satisfazem às demandasmínimas da população.

Estando de acordo com a observação sobre ossalários mínimos, supomos entretanto que aquestão não está aí. Acreditamos que a questãoestá, ao contrário, na oposição entre: a) apretensão ao estabelecimento de um "nível abso-luto de bem-estar" (p. 394); b) a atenção àimportância do nível de subsistência da forçade trabalho. 20

Com efeito, o autor tem em mente a primeiraalternativa: "Um índice de pobreza baseado navariação de salários mínimos incluiria portantotodas as pessoasnas faixas mais baixas das di-ferentes distribuições regionais independente-mente de seu nível absoluto de bem-estar. Aoinvés disso, um mínimo absoluto foi adotado,ajustado para a aparentemente muito menorvariação nos preços relativos" (p. 394). A cons-trução desse mínimo absoluto implica em umahomogeneização artificial das diferentes neces-sidades de subsistência da força de trabalhopara sua manutenção enquanto tal conformesua inserção düerencial no processo produtivo ena estrutura ocupacional. As necessidades de

52 subsistência de um trabalhador industrial ur-bano têm uma composição diferente das neces-sidades de subsistência de um trabalhador ru-ral (exemplo: aluguel, transportes, dependênciatotal ao mercado de bens de consumo, etc.).Assim, a pobreza deve ser considerada como re-lativa às necessidades que dizem respeito a dife-rentes grupos de trabalhadores. Dessa forma, apobreza está em toda parte na sociedade brasi-leira, e não apenas concentrada no campo, comoenfatiza o autor. Fishlow deixa de incluir gru-pos de trabalhadores dos grandes centros urba-nos na categoria de pobreza porque o padrãode referência da pobreza se refere a trabalha-Revista de Administração de Empresas

dores do Nordeste. No entanto, a dificuldade dostrabalhadores dos grandes centros urbanos emsatisfazer suas necessidades elementares, e quetem suficientes indícios empíricos para sua com-provação, 21 retrata seu estado de privação, ne-cessário à caracterização de sua pobreza.

Assim, o critério limitativo do nível absolutode bem-estar, com base no qual "31 % das famí-lias brasileiras em 1960 não se aproximaram deum nível aceitável de renda" (p. 394), parecelimitativo demais, não tanto pela percentagemque apresenta como pelo fato de eludir impli-citamente ao caráter diferencial e relativo darenda conforme as necessidades de subsistênciade düerentes tipos de trabalhadores para suamanutenção enquanto trabalhadores ativosdesse mesmo tipo.

Deve-se assinalar que a mensuração de umpadrão de pobreza absoluto na literatura sobreo assunto é em grande parte conseqüência deum debate norte-americano a partir da décadados 60. A pobreza é definida de maneira oficiale dá direito a um auxílio público. Mas se, aocontrário, a pobreza é referida a nível de sub-sistência, a própria pobreza americana poderáser repensada e ampliada. 22 Mas a referênciaao nível de subsistência necessita da conside-ração do conceito de subsistência. Além disso,o conceito de subsistência é complementar aoconceito de excedente. (Os conceitos de traba-lho necessário e sobretrabalho podem ser con-siderados equivalentes teoricamente mais ri-gorosos do que subsistência e excedente respec-tivamente.) Evidentemente, esses conceitos sópodem manter-se enquanto tais quando inseri-dos em um quadro teórico ao qual são estru-turalmente indispensáveis. O apelo a esses con-ceitos no quadro de uma construção neoclássicaou keynesiana seria de pouca eficácia teóricadevido à heterogeneidade e por vezes incompa-tibilidade de conceitos. O sentido que podehaver na utilização de um nível de subsistênciaabsoluto é uma subdiscussão que se inclui nessadiscussão geral subsistência-excedente: a pos-sibilidade de determinação de um nível desubsistência biológica parece ser uma ar-gumentação frágil diante da necessidade daconsideração do nível de subsistência em seucontexto social e cultural e portanto relativo adiferentes tipos de sociedades ou a düerentesgrupos sociais. 23

Com relação tanto às imputações, quanto aopadrão nacional de pobreza, é interessante no-

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tar-se finalmente que as necessidades de men-suração imediata, sem uma análise mais detidada realidade social, levaram o autor:

a) a fazer abstração da contrapartida da ren-da não monetária do trabalhador que é suamaior dependência ao empregador. E isto ape-sar de ter imputado tal renda à sua renda mo-netária. Isto implica numa subestimação dacondição de privação desse tipo de trabalhador(ver parte 2 deste artigo) ;

b) a subestimar a condição de privação de tra-balhadores urbanos ao construir um padrão na-cional de pobreza absoluta.

4. "Capital humano": uma contradiçãonos termos?

A construção desse padrão nacional de pobrezaabsoluta traz também poucas conseqüências doponto de vista do conhecimento, como se podeobservar da listagem das "características dife-renciadoras da pobreza" feita pelo autor. 24 Essalistagem que se refere a dados educacionais,regionais, setorias e demográficos (tamanhoda família) sugere-nos a pergunta do critério deescolha dessa lista e não de outra com maisitens. Por que a não inclusão de itens relativosà alimentação (que deve desempenhar um papelfundamental na concepção de um nível abso-luto de renda, independente da distribuição derenda mas relativo ao nível de subsistência daforça do trabalho), saúde (idem), posse e/oupropriedade da matéria-prima e/ou. dos instru-mentos de trabalho, regime de trabalho, formade remuneração, por exemplo? Onde deve aca-bar essa lista se descobrirmos mais e mais carac-terísticas diferenciadoras? Evidentemente essascaracterísticas diferenciadoras estão referencia-das à amostra do censo, e portanto são limita-das a priori pelo tipo de dados coletados nocenso. Mas o autor não enfatiza essa limita-ção, o que pode levar à substantivação abusivadessas características pela redução do fenômenoda pobreza a uma dimensão exclusivamenteestatística.

Com efeito, a parte 2 de seu artigo (parte 3da primeira versão), visa explicar a desigual-dade da distribuição de renda em função dasvariáveis idade, educação, setor e região, atra-vés da aplicação de um índice de desigualdadedesenvolvido da "teoria da informação" (índice

de Theil). Aqui, também, deve-se distinguir en-tre a explicação econométrica da desigualdadeda distribuição de renda e da pobreza - que sereduz a uma explicação em função de fatoresdecompostos escolhidos com referência às pos-sibilidades estatísticas - e uma explicação da-queles mesmos fenômenos através de uma arti-culação rigorosa de conceitos. As próprias va-riá veís escolhidas para a explicação economé-trica - nas quais também se baseiam as carac-terísticas diferenciadoras da pobreza - têm umefeito explicativo limitado segundo os critériosdo próprio índice de Theil: "Passando final-mente para os resultados substantivos, váriosachados aparecem. Em primeiro lugar, as dife-renças de idade, setoriais, regionais e educacio-nais explicam pouco mais do que a metade dadesigualdade de renda observada" (p. 396, grifonosso).

Essas explicações econométricas apresentamum problema de eficácia explicativa relativa-mente à realidade social, quando reduzem asunidades sociais básicas em que a população seestrutura (para atuar com respeito à distribui-ção de renda) a indivíduos. O autor salienta,na nota 18 da primeira versão de seu trabalho,que selecionou as variáveis idade, setor, região,educação, por seu poder de explicação das va-riações de renda ao nível individual. No entantoa compreensão da inserção dos indivíduos emgrupos sociais determinados, referenciados aosistema econômico, parece ser fundamentalpara o conhecimento tanto do modo como arenda se distribui por subgrupos populacionaisquanto dos movimentos de redistribuição, re-sultante de forças "emitidas" por esses grupossociais e com a mediação da intervenção es-tatal. 25

Mas, além disso, essas explicações economé-tricas se baseiam em determinados modelos im-plícitos da realidade social, cujos fundamentosnão são discutidos. Fishlow tem o mérito deexplicitar sua utilização de modelos implícitos,e mesmo de discuti-los, embora não os seus fun-damentos. Com efeito, o interesse do autor nes-sas variáveis e a importância dada à educaçãona enumeração das características diferencia-doras da pobreza refere-se ao seu interesse pelodebate interno - travado pelos autores situa-dos na mesma posição de Fishlow com relaçãoao campo intelectual - a propósito da educa-ção e do chamado "capital humano". 26 Emborao autor desenvolva uma apreciação crítica das

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abordagens do tipo capital humano e relativizea importância mágica dada à educação nessesegmento do campo intelectual, o fato de terque se referir a esse debate longamente, enca-minhar sempre sua análise estatística no sen-tido da inclusão da variável educação em detri-mento de outras variáveis e de sua inclusãoprivilegiada nas características diferenciadorasda pobreza em detrimento de muitas outras ca-racterísticas pensáveis à primeira vista, demons-tra o peso destas abordagens nesse segmento docampo intelectual, e a dificuldade dos autorescríticos em se desvencilharem desse peso - queofusca muitas outras características e variáveisa serem desenvolvidas. 27 Com efeito, toda a par-te 2 do artigo de Fishlow, que visa "alargarmais geralmente nossa visão para os fatoresestruturais causadores da desigualdade entretrabalhadores (to broaden our scope to thestructurtü [actors making for inequality amonguiorkers more generally - p. 395), é em grandeparte dedicada à educação quando uma articu-lação (e não simples enumeração) de múltiplosfatores seria necessária para um melhor enten-dimento dessa desigualdade. Cabe refletir, noentanto, sobre o conceito mesmo de capital hu-mano e expressões como "acumulação de capitalhumano". 28

Os equívocos que o conceito de capital hu-mano encerra remetem à própria concepção quetêm as diversas variantes da escola neoclássicado conceito de capital. Os neoclássicos tratamesse conceito não como uma relação social espe-cífica própria a uma sociedade específica, deli-mitada historicamente - mas como um "fatorde produção" universal, existente em qualquersociedade humana. Além de dar um status teó-rico universal a um conceito historicamenteespecífico, a não-compreensão da relação socialespecífica que é subjacente ao conceito de ca-pital faz com que esse conceito para os neoclás-sicos ora designe os meios de produção (ou àsvezes somente a maquinaria), o chamado "ca-pital físico", ora designe o capital financeiro,sem uma conceituação precisa desse conjuntode fenômenos. E a remuneração do detentor docapital é explicada por alguns desses autores(Senior, Marshall, Fisher, Bõhm-Bawerck)como conseqüência de sua abstinência de con-sumo ("teoria da espera"). T. W. Schultz, her-deiro dessa corrente, estendeu esse conceito semespecificidade de período histórico nem de rela-ção social, para designar também "investimen-Revista de Administração de Empresas

tos na pessoa humana" que se reflitam na forçade trabalho. Com o conceito de capital humanoele espera explicar não somente os fatores quefaltam na teoria neoclássica para dar conta dosganhos de produtividade, mas também a alta desalários reais do "fator trabalho" nos países de-senvolvidos pelos ganhos resultantes da "taxade retorno", devido ao "tempo de espera" do in-divíduo na sua educação formal. 29

Apesar do conceito de capital humano estarhereditariamente impregnado dos mesmos peca-dos de falta de rigor metodológico que o con-ceito de capital dos neoclássicos - o qual seauto-outorga uma falsa validade universal -pode-se tomar aquele conceito como categoriade análise, e constatar-se que ele tem um maiorvalor explicativo involuntariamente enquantocategoria ideológica do que enquanto conceitocientífico rigoroso.

Com efeito, a própria conjugação dos termosformadores do conceito parece encerrar, maisque uma ambigüidade, uma contradição nos ter-mos. Ambigüidade pela imagem reificadora quesugere a conjugação desses termos: a reduçãodo humano à qualidade de capital. Mas um con-ceito tem pretensões teóricas maiores que umasimples imagem, e o seu caráter reificador nãoparece sequer incomodar os formuladores eusuários desse conceito. Contradição nos termosdevido não só à diferença entre o conceito ca-pital e o adjetivo qualificativo humano, dife-rença esta que é fundamental para a própriaconstituição do conceito de capital, mas à anti-nomia entre o que há de humano no processode produção (ou mais geralmente, em um sis-tema econômico) - a força de trabalho - e acapitalização do processo produtivo, que alémde tender a eliminar progressivamente, de ma-neira relativa (na indústria; de maneira abso-luta na agricultura) a força de trabalho ativarealocando-a constantemente para novos setores(com intervalos crescentes de desemprego e su-bemprego) , subtrai o controle do processo pro-dutivo das mãos da força de trabalho direta ea monopoliza nas mãos do funcionamento auto-matizado do capital. Nesse sentido, a reificaçãoque a conjugação dos termos encerra, tem todasua eficácia como imagem. Além disso o caráterde reificação, e não de antropomorfismo, daimagem que sugere a conjugação dos termos,pode ser visto na própria diferença de naturezaentre o termo capital tendo pretensão de con-ceito, e o termo humano, adjetivo qualificativo.

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Se a conjugação dos termos formadores da ca-tegoria capital humano parece mais sustentar-seenquanto imagem do que enquanto conceito -pela própria hibridez não explicitada de suaconjugação - essa imagem parece ser esclare-cedora, à revelia de seus formuladores e usuá-rios, ao apontar para a apropriação da mente eda habilidade pelo capital, que se expressa nãosomente pela subtração do controle do processoprodutivo por parte da força de trabalho direta,mas pela formação e socialização da força detrabalho no sentido do aperfeiçoamento de suafuncionalidade ao capital. Por outro lado, a assi-milação do humano ao capital, 30 implícita nessacategoria, é insustentável. Se é evidente que aforça de trabalho é de grande funcionalidadeao capital (uma funcionalidade essencial), talaspecto funcional não elimina o fato de sua di-ferença: o capital é propriedade permanente daempresa mas o trabalho humano vende a utili-zação de sua força de trabalho - que é intrín-seca à pessoa do trabalhador 31 - a cada ins-tante. Tratando-se do chamado "capital físico",ele é uma propriedade definitiva quando de suacompra pelo empresário. A utilização da forçade trabalho, ao contrário, é "negociada" periodi-camente no mercado de trabalho, segundo dife-rentes conjunturas, entre seu proprietário - opróprio trabalhador, que é a própria força detrabalho em carne, osso e alma - e o empresá-rio, representante do capital. Além disso, a re-posição da força de trabalho para a produçãonão é controlada diretamente pelo empresário,mas é em grande parte do domínio da vida pri-vada do trabalhador. Entre esses elementos dereposição da força de trabalho em grande partefora do domínio do empresário - além da sub-sistência material do trabalhador e de sua fa-mília (alimentação, vestuário, habitação etc.)- o elemento educação e qualificação da forçade trabalho toma uma importância crescente emrelação ao processo produtivo. A "ciência prá-tica" do artesão e do pequeno agricultor, trans-mitida de geração a geração, é destruída pelaconsolidação e expansão da revolução industrialque transforma a antiga dependência do instru-mento e objeto de trabalho em relação ao traba-lhador na dependência inversa do trabalhadorem relação ao instrumento e objeto de trabalho.A aplicação da ciência e tecnologia à produçãoproduz um novo apêndice da máquina - o tra-balhador. Essa ciência aplicada, agora, é dife-rente da antiga "ciência prática selvagem", poissó tem acesso a ela uma fração reduzida da

força de trabalho - à exclusão da força de tra-balho direta - necessária à supervisão e gerên-cia do capital. A força de trabalho direta, noentanto, é atribuído o acesso a uma formaçãovisando sua maior adequação e funcionalida-de ao instrumento e objeto de trabalho assimcomo ao "ambiente" de trabalho, tentando do-tá-la das habilidades técnicas necessárias e dasnormas de conduta e comportamento (explíci-tas ou não) também necessárias. A pequenaparcela da força de trabalho potencial destinadaa supervisionar e gerir o funcionamento daprodução, por outro lado, é atribuído o acessoao "ensino superior", para a aplicação da ciên-cia, da tecnologia e da administração "racional"à vida econômica, e dirigindo assim a grandeparcela complementar da força de trabalho.Essas necessidades crescentes, por parte do ca-pital, de adequação da força de trabalho, esti-mulam a intervenção junto ao sistema educa-cional para a adequação conveniente da menteda força de trabalho atual ou potencial. A ên-fase no capital humano junto ao segmento docampo intelectual em questão pode situar-senesse contexto, cujo corolário é a tendência àadequação do conhecimento humano para olado do conteúdo do termo capital contra o ladodo conteúdo do termo humano - na medidaem que evoque os interesses das pessoas consti-tutivas da força de trabalho - para utilizar ostermos polares decompostos da combinação sin-gular do termo capital humano.

Ainda mais, esse contexto tende a abafar aprofundidade do pensamento teórico, subordi-nando-o aos interesses de sua aplicação práticaao funcionamento atual da produção e de suascondições sociais subjacentes. Assim, esse con-ceito - capital humano - apesar da confusãoteórica que realiza, representada pela imagemreificadora, demonstra em sua aplicação práticaa distinção mesma entre força de trabalho - a 55qual depende da mente do trabalhador - ecapital. Pois se não há distinção, se a mentedo trabalhador é naturalmente adequada às re-lações sociais subjacentes ao conceito de capital.por que então "investir" no "aperfeiçoamento"da força de trabalho? 32

5. O fetichismo da produtividade

Na terceira parte de seu artigo Fishlow com-para os resultados de suas estimações para ocenso de 1960 com os resultados do censo de

Distribuição da renda

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1970, constatando um aumento na desigualda-de da distribuição de renda. Ele faz então umabreve análise substantiva das possíveis causasdesse aumento da desigualdade, incluindo nes-sa análise uma apreciação da política econô-mica governamental. Creio não ser inútil resu-mir aqui algumas de suas conclusões:

a) Fishlow enfatiza o período de 1964/1967,da"política de estabilização", como o período de-cisivo para o aumento da desigualdade, emboraesse resultado não fosse de todo intencional. 33

A desigualdade crescente resultou, no entanto,indiretamente das prioridades do governo: des-truir a ameaça política que representavam ostrabalhadores urbanos e reestabelecimento daordem econômica baseada na acumulação pri-vada de capital; 34

b) devido ao fato da persistência - assinalaFishlow - das prioridades políticas acima alu-didas, não é fácil ser otimista com relação àsimplicações da distribuição do rápido cresci-mento sol>um longo período (p. 400);

c) os instrumentos de política econômica - éainda Fishlow que assinala - tal como aplica-dos presentemente, dificilmente favorecem aigualdade (p. 400);

d) acrescenta o autor. que é importante nãodar ênfase exagerada nas possibilidades de in-fluência que possam vir a ter políticas conven-cionais na distribuição da renda (p. 401);

e) fatores estruturais tais como a distribuiçãodas oportunidades educacionais e a alocação se-torial da força de trabalho não tendem a favorda igualdade, ao contrário (p. 401);

f) na ausência de uma alteração efetiva e delongo alcance nas atitudes governamentais, ha-

56 verá pouco progresso e possivelmente regressãona distribuição de renda. É errado encarar talresultado como uma lamentável conseqüênciado rápido crescimento. Não há inconsistêncianecessária entre uma maior igualdade e um pro-duto em expansão (p. 402).

A análise feita por Fishlow, nessa última par-te de seu artigo, está, em linhas gerais, deacordo com as interpretações de Celso Furtado,Maria da Conceição Tavares e outros autores.

Parece-nos, em contraposição, de interessediscutir uma dessas conclusões a que chegaFishlow e que é mencionada duas vezes no de-Revista de Administração de Empresas

correr do artigo: a de que a pobreza brasileira édiretamente ligada a baixos níveis de produtivi-dade, particularmente rurais, que devem seratacados. 35 Na parte 1 do artigo, que já exami-namos anteriormente, Fishlow, tratando dascaracterísticas diferenciadoras da pobreza bra-sileira (ver nota 24 deste trabalho) e comparan-do-as com as características da pobreza ame-ricana, afirma que o problema brasileiro é o depossuir baixos níveis de produtividade na econo-mia rural. 36 A consideração pelo autor dos"baixos níveis de produtividade" da agriculturasem uma maior qualificação dessa produtivi-dade, e sem uma análise da estrutura internadessa agricultura, levam Fishlow a dar umpasso a frente e propor a disseminação de téc-nicas modernas na agricultura e a aceleraçãogeral do crescimento como método de combateà pobreza brasileira. 37

A associação que faz entre pobreza e baixaprodutividade parece-nos estar ligada a um cer-to fetichismo da produtividade. Pois, ao contrá-rio, pode haver pobreza onde há alta produti-vidade, como é o caso, por exemplo, dos traba-lhadores assalariados das mais modernas usinasde açúcar e é o caso também de muitos gruposde operários urbanos (exemplos não faltam).Ora, essa associação denota uma utilizaçãopouco rigorosa da categoria produtividade:

a) o autor parece pensar na produtividadeprópria à moderna empresa capitalista, utilizan-do-a como padrão para qualquer outro tipo deunidade de produção;

b) abstrai o fato de que a pobreza coexiste emesmo se amplia com a alta produtividade ine-rente ao capitalismo.

Com relação ao ponto (a): a categoria pro-dutividade não pode ser vista da mesma ma-neira em qualquer tipo de organização econô-mica. Se em alguns tipos de organização eco-nômica o trabalhador direto tem o controle di-reto do processo de trabalho em que está inse-rido e portanto de sua produtividade, em outrostipos de organização econômica esse controledireto não existe, e ao contrário, a cooperaçãoentre os trabalhadores e também sua produti-vidade é controlada por um agente econômicodistinto. Assim em organizações econômicas emque o trabalhador direto não controla o processode trabalho nem se apropria do produto, a ca-tegoria mesma de produtividade aponta para

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uma realidade contrária a seus interesses: amaior intensidade do trabalho que pode acarre-tar um aumento de produtividade beneficia nãoo trabalhador, mas o não-trabalhador. Não épor acaso que no sistema capitalista os empre-gadores têm por vezes vantagens em utilizarema forma do "salário por peças" ou "por pro-dução" - além dos "prêmios de produtividade"- já que essa forma liga o interesse dos tra-balhadores diretos pelo salário à produtividadedesejada pelo empregador, tentando assim ate-nuar a falta de ligação entre o interesse dotrabalhador e a produtividade, decorrente daprópria organização do processo de trabalho.Fishlow parece não ver que a categoria produti-vidade, uma categoria simples, pressupõe umacategoria mais concreta como por exemplo aempresa capitalista, a plantation, ou o lote deterra de uma família camponesa - isto é, uni-dades de produção específicas, com uma orga-nização econômica específica. Essa própria pres-suposição da categoria simples à categoria con-creta corta as asas da pretensão à universali-dade (devido ao seu caráter mais abstrato) dacategoria simples e a coloca em seus devidos lu-gares: a sua referência histórica. Mas essa nãoé uma deficiência própria a Fishlow: a próprianão existência de uma teoria do processo deprodução no aparato teórico neoclássico e key-nesiano - o "inconsciente cultural" da maio-ria dos economistas - faz com que a categoriaprodutividade, referenciada unicamente ao pro-duto final por unidade de tempo, seja tomadaem um sentido trans-hístóríco.w

Com relação ao ponto (b): a proposta deFishlow, de "disseminar técnicas modernas naagricultura" e "acelerar o crescimento de ma-neira mais generalizada" para acabar com apobreza rural parece contraditória com suacrítica à concentração da renda. Ao fazer abstra-ção das relações sociais na agricultura brasileiraao formular essa proposta, ele faz também abs-tração do fenômeno da "acumulação primitiva"que o capitalismo exerce sobre os produtores di-retos rurais. Em primeiro lugar, o autor não sepergunta pelo reverso da medalha da dissemi-nação de "técnicas modernas na agricultura":a tendência à concentração da propriedadeda terra, a qual tende a refletir-se no agra-vamento da concentração da renda. Essa pro-palada disseminação exerce portanto um pri-meiro tipo de efeito concentrador: a "fagoci-tose" dos proprietários mais fracos (que podeir desde o pequeno camponês, até grandes fa-

zendeiros mais fracos relativamente a concor-rentes "tecnificados"). 39 Em segundo lugar, oautor parece ignorar aqui, que, se a "tecnifica-ção" da grande indústria urbana é expulsadorade mão-de-obra de maneira relativa (parte damão-de-obra expulsa sendo absorvida por novosramos criados pela industrialização de novasinvenções técnicas depois de um período de de-semprego ou subemprego), a tecnificação daagricultura é, no entanto, expulsadora de mão-de-obra de maneira absoluta (com a tecnifica-ção, os "novos ramos" criados estão na indús-tria, e não na agricultura, daí a expulsão abso-luta de mão-de-obra). 40 Tal expulsão, separan-do o trabalhador rural de seu emprego na agri-cultura, e, principalmente, separando-o do pe-queno sítio, quando for o caso, do qual se servepara a produção de um complemento alimentar,força-o a vender nas piores condições possíveissua força de trabalho, seja na cidade, seja nopróprio campo, seja em áreas de fronteira agrí-cola. Esse processo de expulsão tem repercus-sões evidentes sobre o agravamento da concen-tração da renda tanto no campo quanto na ci-dade (pressão salarial pelos novos contingentesde trabalhadores) e principalmente sobre ascondições de trabalho (levando-se em conta, na.situação rural anterior do trabalhador expulso,o seu pequeno lote para a produção de um com-plemento alimentar). 41

6. Conclusão: o fetichismo da estatística

A análise anteriormente desenvolvida visa aalertar contra mais um fetichismo: o "fetichis-mo da estatística", a adesão ao qual é um ele-mento de prestígio intelectual em certas esferas"tecnocráticas". Esse fetichismo consiste não namensuração do que merece ser conhecido, masao contrário, consiste na crença de que só me- 57rece ser conhecido o que pode ser medido. 42

Tomando os dados estatísticos pela própria rea-lidade empírica, muitos estudos estatísticos eeconométricos não somente ocultam a possibili-dade de outros tipos de pesquisa empírica comoopõem o peso dessa pretensa realidade ao tra-balho teórico rigoroso.

Por uma imputação apressada da renda nãomonetária, Fishlow de certa forma subestimao estado de privação dos trabalhadores rurais edos trabalhadores domésticos, enquanto quepela construção de um padrão estatístico de po-breza absoluta ao nível nacional ele subestima

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a privação dos trabalhadores urbanos. Alémdisso, pela aceitação de modelos e proposiçõescorrentes, ele é levado a enfatizar a variável edu-cação em detrimento de outras explicações paraa desigualdade de rendas e a preconizar umaumento de produtividade rural e uma dissemi-nação de técnicas modernas na agricultura quesão contraditórios tanto com a desconcentraçãoda renda, quanto com a diminuição da pobreza.Com os mesmos dados estatísticos por ele traba-lhados, Fishlow poderia ter chegado a resulta-dos diferentes dos aqui criticados, se amparadopor um conhecimento da realidade social queorientasse seu trabalho de mensuração no sen-tido da adequação àquela realidade.

Somente então os próprios termos em que odebate está colocado para os especialistas emeconometria poderiam ser rompidos, e a análiseestatística se reencontraria tanto com as aná-lises etnográficas e sociológicas da realidade so-cial brasileira, como com a análise crítica daeconomia brasileira. O

1 Cf. Jornal do Brasil de 26-7-1972.O Prof. A.Fishlow,da Universidade da Califórnia, trabalhou no BrasUem 1967e 1968como chefe do grupo de pesquisas re-sultante de um convênio entre o IPEA e a Universi-dade da Califórnia. O artigo BrazUian size distribu-tion of income, feito no decorrer do ano de 1971,foiobjeto de uma comunicação pelo autor no quadro dareunião anual da American Economic Association emNew Orleans, em dezembro de 1971.Essa comunica-ção foi assistida por técnicos do Banco Mundial quefizeram chegar a McNamara o seu conteúdo. As de-clarações de McNamara na UNCTADdatam de abrilde 1972.Logo em seguida, um resumo do trabalhode Fishlow foi publicado no Jornal do Brasil de23-4-72.As respostas de membros do governo à crí-tica à concentração de renda serão referidas nesteartigo como "parte situacionista" do debate.

58 2 O artigo de Fishlow foi publicado na AmericanEconomic Review de maio de 1972,sob o título deBrazilian size distribution of income. Tem tambémuma versão mimeografada anterior, com o mesmotítulo, que contém explicitação maior de seus méto-dos de imputação. A seguir, quando citarmos apenasa página, sem menção à obra, a citação refere-se aoartigo da revista. As citações da primeira versãomimeografada serão explicitadas, como sendo da"primeira versão".

3 Para o conceito de "campo intelectual" ver Bour-dieu P., Campo intelectual e projeto criador. In: Pro-blemas do estruturalismo. Rio de Janeiro, Zahar Edi-tores, 1968.Cf. também a introdução de M. S. Pal-meira em Latifundium et capitalisme: lecture critiqued'un débat, thêse de 3éme cycle présentée à l'Uni-

Revista de Administração de Empresas

versité de Paris, 1971.Os outros trabalhos de mensu-ração da distribuição da renda são: oepar-üpes. Ladi8tribución deZ ingreso en Brasil, 1970;Hoffman, R.,Contribuição à análise da distribuição de renda e daposse da terra no Brasil, tese de livre-docência apre-sentada à Escola de Agricultura da USP; Duarte, J. C.Aspectos da distribuição de renda no Brasil em 1970,ESALQ-USP,1971;Langoni, C. Distribuição da rendae desenvolvimento econômico do Brasil. Estudos Eco-nômicos. IPE-USP, v. 2, n. 5, out. 1972.

4 Um trabalho que tratasse especificamente dessedebate poderia vê-lo como ilustração da maneira emque um debate público surge atualmente no País: queagentes sociais participam, que tipo de produção in-telectual é acionada, que formas de legitimação sãoacionadas.

5 Entre essas regras específicas de legitimação es-tão: o valor dado ao título de Ph.D. em universidadesamericanas cotadas, o conhecimento e a atualizaçãocom os últimos modelos econométricos, a formulaçãode sugestões para a política econômica imediata. C.Langoni realizou um estudo encomendado pelo Minis-tério da Fazenda ao IPE/USP sobre a distribuição derenda, cujos resultados foram anunciados pelo Minis-tro em junho de 1972.Para a polarização do debate emtorno desses dois autores, cf. Veja de 7-6-1972e o ar-tigo de Fishlow, Brazilian size dístríbutíon of íncome,another look, e a resposta de Langoni, a serem publi-cados na revista Dados.

6 Cf. os trabalhos recentes de C. Furtado, M. Con-ceição Tavares, José Serra, P. Singer, F. de Oliveira.

7 Limitamo-nos à análise do trabalho de Fishlow,embora uma análise da montagem que se pode fazerdo debate entre todos esses autores "estatísticos"seja importante e necessária. Na época de redação dorelatório em que esse artigo se baseia, não tivemosacesso aos outros trabalhos, e não foi possível ana-lisá-los depois.

8 O aluguel imputado foi calculado a partir dascaracterísticas da amostra do censo. O aluguel atualpago pelos inquilinos, imputado aos proprietários paracalcular o valor dos serviços que seus imóveis lhesprestam, foi obtido através de uma regressão linearem que o aluguel é tomado como função das carac-teristicas do domicilio do inquilino, da renda familiar,do tamanho da família e do aluguel propriamentedito (cf. p. 5 da primeira versão>.

9 As informações relativas a essa imputação nãoestão contidas na amostra do censo como no caso dosaluguéis: o autor utilizou-se de estudos de orçamen-tos famUiares referentes a 1962e 1963realizados emsete estados: Food consumption in Brazil, familllbudget surveys in tne earlll 1960's. Fundação GetulioVargas, nov. 1970.

10 "Algo como 21% da força de trabalho femininasão empregadas domésticas, mais da metade das quaisreside em seu local de trabalho" (p. 6 do documentomimeografado; primeira versão).

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11 "Tal realocação é necessária se a distribuição darenda da população economicamente ativa é para serestudada" (p. 7 do documento mimeografado, pri-meira versão).

12 Note-se que quando empregamos a seguir o ter-mo força de trabalho grifado, referimo-nos a um con-ceito da economia política, enquanto o termo "forçade trabalho" entre aspas refere-se a uma categoriadefinida ao nível da operacional1zação estatística edesigna um somatório de trabalhadores sujeitos ao"mercado de trabalho".

13 Note-se que não se falou do "mercado de traba-lho" em geral, sem qualificações, justamente porqueesse mercado de trabalho específico tem por carac-terísticas a menor mobilidade do trabalhador. Alémdisso, a contrapartida do trabalhador à renda nãomonetária que lhe é concedida pode ser contabU1zadapelo empregador como uma dívida "extra-econômica"(política), de lealdade, por exemplo. Deve-se levarem conta ainda, nesse tipo de emprego, a possibili-dade que a totalidade da renda do trabalhador sejanão monetária. Em tempo: por que nem se pensaem imputar a renda não monetária dos assalariadossuperiores e "gerentes", como por exemplo, carro daempresa à disposição e outros prêmios?

14 Para uma discussão da natureza distinta dos sis-temas econômicos baseados nos príncipíos alternati-vos da reciprocidade, da redistribuição e da troca demercado cf. Polanyí, K. et alil. Trade and markets inthe early empires. N. York, The Free Press, 1957.

16 Deve-se atentar também para a discussão acimareferida sobre o caráter "vantajoso" ou "não vanta-joso" da situação do trabalhador rural que percebeesse tipo de renda não monetária, lembrando-se dacontrapartida "extra-econômica" que pode ser exi-gida pelo empregador.

15 Cf. Chayanov. The theory ot peasant economll·Illinois, The American Economic Association, Irwin,1966. Cf. também, para análise da unidade de trabalhofamiliar camponesa em uma área do Nordeste, a par-tir das categorias dos próprio agentes dessas unidades:Heredia, B. & Garcia, A. Trabalho familiar e cam-pesinato. América Latina CLAPCS, n. 1, 1971.

17 Cf.Cuisenier, Jean. Sur la construction d'untableau economíque cantonal en pays sous-développés.Tiers Monde, t. 3 n. 11, p. 361 e 392, juU./sep. 1962.

18 Talvez se possa distinguir, entre as doenças dotrabalho, aquelas por excesso de trabalho ou insalu-bridade das condições de trabalho - caso freqüenteentre operários fabris e outros operários - daquelaspor carência alímentar, seja em relação à extensãoou intensidade do trabalho executado, seja ao nívelabsoluto (cujos maiores exemplos são os trabalhadoresrurais assalariados). Cf. os estudos do Instituto deNutrição da Universidade Federal de Pernambuco.

19 O salário mínimo real do NE é tomado como olimite inferior aceitável de renda para uma família'

de 4,3 pessoas. Para o Brasil rural tomou-se o salárioque prevalece nas áreas rurais do NE; para o NE ur-bano tomou-se o nível salarial do município de tama-nho médio; e para todos os outros residentes urba-nos, é aplicado o nível do NE + 15%. A linha depobreza para diferentes tamanhos de família é de-finida com ajuda da elasticidade da despesa em ali-mentação com respeito ao tamanho da família (eco-nomia de escala da família com respeito à alimen-tação. ror. p. 393'>

20 Isto é, a confrontação entre a renda mínima per-cebida por uma parte da força de trabalho e suasnecessidades de subsistência. Se essa renda mínimaindepende do grau de concentração da renda, no en-tanto essas necessidades de subsistência são relativaspois se referem a diferentes grupos sociais.

21 O autor, ele mesmo, dá grande importância àpolítica de contenção salarial em sua explicação damaior concentração da renda nos 10 anos, tanto noartigo aqui analisado quanto em Brazilian incomes1ze distribution - another look, a ser publicado pelarevista Dados (IUPERJ). Essa já é uma pista parase ver a pobreza dos operários urbanos. Cf. o trabalhoPesquisa de padrão de vida da classe trabalhadorada cidade de São Paulo, resultados preliminares.DIEESE, 1969, mímeogr. Por outro lado, o cresci-mento da taxa de mortalidade infantil na cidade deSão Paulo nos últimos anos nos dá outro indício dessapobreza.

22 l'!:interessante notar-se que o autor menciona que,a ser medida pelo padrão de pobreza dos EUA, quasetoda a população brasileira seria pobre (p. 9 dodocumento mimeografado, primeira versão). Se eleconstrói um padrão de pobreza específico para oBrasil, é porque implicitamente ele admite a dife-rença entre a pobreza americana e a brasielira, admi-tindo portanto que a pobreza é relativa a diferentespaíses. Por que então seria ela absoluta dentro deum país como o Brasil, e não referenciada a diferen-tes grupos de trabalhadores? Com relação à pobrezaamericana, cf. a introdução de Roach & Roach empoverty. London, Penguin Modem Sociology Readings,1972; e er. Baran & Sweezy. Capitalismo monopolista.Rio de Janeiro, Zahar, 1966 p. 285-8.

23 Cf. a discussão sobre o excedente na antropologiaeconômica envolvendo Harry Pearson, Marvin Harrise George Dalton (em Trade and market, op. cito e narevista American Anthropologist) e cf. C. Bettelheim,capítulo do excedente in Planificação e crescimentoacelerado. Que se baseia nas contribuições deP. Baran; Zahar.

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24 As "características diferenciadoras da pobreza"são: baixo nível educacional, concentração em ativi-dades agrícolas, residência em áreas rurais (locationin, and non migration trom, rural areas), númerolimitado de trabalhadores por família, residência noNE, tamanho familiar e número de crianças maiorque a média, menores oportunidades relativas para aeducação dessas crianças (p. 394).

Distribuição da renda

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25 Um estudo exaustivo segundo essa abordagem paraa França, Inglaterra, Estados Unidos e Alemanha é ode MarchaI, Jean & Lecaillon, Jacques. La repartitiondu revenu national. Paris, Ed. Genin, 4 v.

26 " .•• a permutabilidade (traâe-ott) entre redistri-buição e crescimento é geralmente exagerada. Há pos-Sibilidade de se conseguir ambos simultaneamenteatravés da melhoria da qualidade dos recursos huma-nos" (p, 395). "A importância dada à idade e à edu-cação na decomposição precedente dá suporte a ummodelo Implicíto de acumulação de capital humanocomo determinante fundamental dos níveis de rendadiferenciais e da desigualdade" (p. 398).

27 Um resumo (livre) da crítica à "abordagem ca-pital humano" por Fishlow, merece ser apresentado:os modelos de capital humano implicam em causali-dade que vai do investimento à renda. No entantoos dados utilizados para implementar a teoria sãocorrompidos exatamente pela relação oposta (da ren-da ao investimento). No caso do Brasil, essa relaçãoé importante, onde a renda da família é um dos de-terminantes significativos da escolaridade. Se a edu-cação superior é monopolizada pelos já ricos, e elespassam para suas crianças oportunidades de rendanão associadas com a atual produtividade, aumentaro número de pessoas educadas não levará ao padrãode resultados esperado. Persistência da desigualdade(não presente no modelo): o sistema educacionalbrasileiro ele próprio é um importante mecanismopara garantir a manutenção da estrutura existente,racionando graus (diplomas) não apenas para os járicos, mas também predominantemente para aquelescom pais educados. Se um maior acesso ao treina-mento é assegurado, isso não significa que outros me-canismos institucionais favorecendo a persistência dediferenciais de renda não emergirão. li: necessáriolembrar-se não somente o quanto da desigualdadepode ser explicado pela educação, mas também quãopouco ela explica (p. 398). As observações críticas deFishlow resumidas acima são apenas, segundo o au-tor, observações contra a "aceitação não crítica domodelo" (p. 398), mas a própria natureza do con-ceito "capital humano" não é questionada.

6028 Desenvolvemos aqui uma reflexão sobre esse con-ceito devido à importância que ele assuma no atualdebate sobre a distribuição de renda entre os espe-cialistas em econometria, como variável estratégicade mobilidade social. m. Langoni, C. Depois do boomvirá a distribuição. Jornal do Brasil, 26-11-72; e Dis-tribuição de renda e desenvolvimento econômico doBrasil. Estudos Econ6micos, v. 2, n. 5, 1972.

29 "Os trabalhadores transformaram-se em capita-listas, não pela difusão da propriedade das ações daempresa, como o folclore colocaria a questão, maspela aquisição de conhecimentos e de capacidade quepossuem valor econômico." Cf. Schultz. Investmentin human capital. American Economic Review, v. 51,p. 1-17, 1961; e cf. p. 35 da tradução brasileira: In:O capital humano. Zahar, 1973. O conceito de "capi-tal humano" complementaria assim o conceito de

Revista de Administração de Empresas

"salário" de L. Robbins como sendo o resultado daluta pela escassez e como tal aplicável não só aosassalariados como ao empresário. Cf. Introdução deSweezy. Teoria do desenvolvimento capitalista. Zahar,1962.

30 Essa assimilação, ou extensão abusiva, faz abstra-ção das características intrínsecas e diferenciadorasdo "capital" e da força de trabalho - assimilaçãoesta que se torna possível pela própria homogeneíza-ção de fatores que implica a consideração de "fatoresde produção" (terra, trabalho, capital: coisificaçãodo trabalho e universalização do capital) compondoUma "função de produção" na teoria neoclássica. Cf.também a extensão análoga do termo "recursos hu-manos" proveniente do tradicional termo "recursosnaturais".

31 Mesmo no caso da escravidão, quando a própriaforça de trabalho é propriedade do senhor de escra-vos através da propriedade da pessoa do escravo,deve-se distinguir a força de trabalho do "capital".

32 Para um aprofundamento da relação entre a edu-cação e a sociedade capitalista, cf. Bourdieu, P. Lareproduction. Paris, Ed. Minuit, 1970; Althusser L.Ideologie et appareils idéologiques d'Etat. In: Lapensée, [uín 1970; e Dossier. L'usine et l'école. In:Les Temps Modernes, n. 301/302, 1971.

33 "The concentration of income resultant from sta-bilization was not wholly intentional" (P. 400).

34 "In a larger sense, however, the result wasaccurately indicative of priorities: destruction of theurban proletariat as a political threat, and reesta-blishment of an economic order geared to privatecapital accumulation" (p. 400).

35 "Brazilian poverty ís directly linked to low leveIsof productivity, particularly rural, that are subjectto attack" (p. 402).

36 "The Brazilian problem ís more one of low leveIsof productivity wíthín the mainstream of the ruraleconomy" (p. 394).

31 "The políeíes appropriate to dealing with povertyare correspondingly differenciated. Negative incometaxes, subsidies, and weirare programa have less roleto play in Brazil than efforts directed at dissemina-tíng modern techníques in agriculture and accelera-ting growth more generally" (p. 394). Não se tratade contestar a veracidade da primeira parte da últimafrase citada de Fishlow, a saber, a inefi..:ácia dos im-postos, subsídios, etc., mas de combater a ingenuidadeda segunda parte dessa frase, da crença mágica nastécnicas modernas e no crescimento acelerado comoxarope para a pobreza brasileira.

38 Fazendo abstração da divisão do trabalho, dacooperação e das formas de apropriação do exce-dente dentro do processo produtivo, a herança teóricaneoclássica e keynesiana é, ao contrário, fascinadapela reificação do produto final e pelo mercado.

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39 Um exemplo histórico dessa "disseminação" econcentração decorrente da propriedade é a criaçãoe expansão das usinas de açúcar, principalmente noNE e em São Paulo e, em menor grau, no Estadodo Rio, em detrimento dos antigos "engenhos" queforam ou "fagocitados" ou reduzidos à condição de"fornecedores", cf. Engenhos e canaviais na vida po-lítica brasileira. Azevedo, Fernando de. Ed. Melhora-mentos. Cf. também o romance Usina de José Linsdo Rego.

40 Um exemplo: a introdução da "carregadeíra" me-cânica, que transporta a cana cortada do local docorte ao caminhão ou trem, eliminou os "cargos"de "cabo" (espécie de contramestre) e "cambiteiro"(transportador de cana no burro), além de eliminarvários corta dores de cana através da maior intensi-dade do trabalho dos corta dores remanescentes. Na

medida da expansão dessa introdução, os trabalhado-res expulsos terão cada vez menos meios de torna-rem-se aptos a concorrer com os trabalhadores dosengenhos mecanizados, e não havendo, na agricultura,criação de novos ramos com essa introdução inova-dora, a expulsão torna-se absoluta. Cf. também fe-nômeno de expulsão análogo com relação à pecuária.

H Cf. os fatores de expulsão da mão-de-obra ruralapresentados por P. Singer, em particular os "fatoresde mudança", em Migrações internas: consideraçõesteóricas sobre o seu estudo, s.d. mimeogr.

42 Pois, "se toda coisa é susceptível de medida esta-tística, não se segue daí que a estatística seja amedida de toda coisa". Cf. Bourdíeu, P. et alii.Travail et travailleurs en Algérie. Paris, La Haye,Mouton, 1963. p. 9-10.

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