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PRESERVANDO A HISTÓRIA DOS LIVROS DIDÁTICOS PRODUZIDOS NO RIO
GRANDE DO SUL (1940-1980): O ACERVO DO GRUPO DE PESQUISA HISALES
Antonio Mauricio Medeiros Alves1
O presente estudo insere-se no campo da história dos livros escolares e está
vinculado ao grupo de pesquisa HISALES (História da Alfabetização, Leitura, Escrita e dos
Livros Escolares), que é ligado ao Programa de Pós-graduação em Educação da FaE/UFPel.
Neste grupo, três eixos são privilegiados nas investigações: i) estudos sobre história da
alfabetização; ii) pesquisas sobre práticas sociais de leitura e de escrita; iii) análise da
produção, circulação e utilização de livros escolares produzidos no Rio Grande do Sul,
especialmente entre os anos de 1940 e 1980 (período da influência do CPOE – Centro de
Pesquisas e Orientações Educacionais - SEC/RS na produção didática gaúcha).
O trabalho aqui apresentado está ligado ao eixo três e tem como objetivo central
realizar uma reflexão acerca da importância dos livros didáticos em pesquisas no campo da
História da Educação e, ainda, apresentar alguns aspectos do processo de constituição de um
acervo, no grupo de pesquisa HISALES, voltado à conservação de livros didáticos produzidos
no estado do Rio Grande do Sul, entre os anos de 1940 e 1980.
Diferentes trabalhos2 têm destacado a importância dada aos livros didáticos, nos
últimos anos, como fontes de pesquisa para a História da Educação, bem como as múltiplas
possibilidades de análise considerando-se esse impresso como objeto de estudo.
Por apresentarem características próprias que os diferenciam dos demais livros, os
livros didáticos, quando considerados como objeto e fonte em pesquisas históricas,
pressupõem a realização de algumas problematizações para sua análise.
Pensar o livro didático como um objeto com características próprias implica na
necessidade de conceituá-lo, ou seja, procurar responder a questão: o que é o livro didático?
Segundo Batista (2009, p.41), à primeira vista, não há muitos problemas na tarefa
de conceituar livro didático, sendo esse um:
tipo de livro que faz parte de nosso cotidiano: é adquirido, em geral, no início do
ano, em livrarias e papelarias quase sempre lotadas; que vai sendo utilizado à
medida que avança o ano escolar e que, com alguma sorte, poderá ser reutilizado por
outro usuário no ano seguinte. Seria, afinal aquele livro ou impresso empregado pela
escola, para o desenvolvimento de um processo de ensino ou formação.
1 Professor do Departamento de Matemática e Estatística do Instituto de Física e Matemática da UFPEL,
pesquisador do Grupo de Pesquisa HISALES (História da Alfabetização, Leitura, Escrita e dos Livros
Escolares), doutorando do PPGE/FAE/UFPEL. [email protected] 2 Batista (2008); Bittencourt (2008); Chopin (2002, 2004, 2009); Frade & Maciel (2006); Galvão e Batista
(2009); Gatti Júnior (2004); Peres (2006, 2008, 2010); Valente (2008), entre outros.
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O autor indica, porém, que ao suspendermos a familiaridade com os termos ou
expressões em itálico, essa conceituação passa a apresentar um conjunto de problemas, que
dizem respeito: ao suporte (livro, fichas, folhas soltas); a variação dos meios de produção
(diferentes formas de reprodução: mimeógrafo, Xerox, meio digital); a variação nos processos
de produção (obras que não foram produzidas para a escola, mas que acabam fazendo parte do
universo escolar, como a Bíblia, romances, etc.) e, por fim, a diversidade nos modos de
encenar sua leitura e utilização (que diz respeito a uma espécie de “contrato de leitura”
imposto pelos textos ou impressos didáticos aos seus leitores) (BATISTA, 2009, p.43-49).
Chopin (2004, p.549) indica que a dificuldade na definição dos livros e das
edições didáticas deriva da diversidade de vocabulário e da instabilidade dos usos lexicais.
Essa dificuldade faz, de acordo com o autor, com que muitos pesquisadores dos livros
escolares se omitam em definir seu objeto de estudo:
Na maioria das línguas, o “livro didático” é designado de inúmeras maneiras, e nem
sempre é possível explicitar as características específicas que podem estar
relacionadas a cada uma das denominações, tanto mais que as palavras quase sempre
sobrevivem àquilo que elas designaram por um determinado tempo. Inversamente, a
utilização de uma mesma palavra não se refere sempre a um mesmo objeto, e a
perspectiva diacrônica (que se desenvolve concomitantemente à evolução do léxico)
aumenta ainda mais essas ambigüidades. Alguns pesquisadores se esforçaram em
esclarecer essas questões e estabelecer tipologias, mas constata-se que a maior parte
deles se omite em definir, mesmo que sucintamente, seu objeto de estudo.
Dessa forma o autor encaminha para a existência de diferentes conceitos desse
objeto, com variações, por exemplo, de acordo com o tempo. Em outro texto, Chopin (2009)
afirma que o conceito de livro didático é historicamente recente e comenta sobre as variações
provenientes da língua, o que lhe atribui certa instabilidade:
Hoje, ainda, os termos aos quais recorrem as diversas línguas para designar o
conceito de livro escolar, são múltiplos, e sua acepção não é nem precisa nem
estável. Percorrendo a abundância bibliográfica científica consagrada no mundo do
livro e da edição escolar, constata-se que são utilizadas conjuntamente hoje várias
expressões que, na maioria das vezes, é difícil até impossível de determinar o que as
diferenciam. Tudo parece ser uma questão de contexto, de uso, até de estilo
(CHOPIN, 2009, p.19).
O autor segue discutindo as diferentes formas de nomear o livro didático de
acordo com a língua considerada: em francês, manuels scolaires, livres scolaires ou livres de
classe; em italiano são recorrentes as expressões libri scolastici, libri per la scuola ou libre di
texto; já os espanhóis alternam entre libros escolares, libros de texto ou textos escolares;
finalmente, os lusófonos preferem as expressões livros didáticos, manuais escolares ou textos
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didáticos, o que, segundo o autor, reflete “a complexidade do estatuto do livro escolar na
sociedade” (CHOPIN, 2009, p.20).
Chopin ainda apresenta outras questões que interferem na conceituação de livros
didáticos como, por exemplo, sua organização interna, suas funções, características materiais
ou mesmo ao contexto institucional no qual a obra é utilizada ou mesmo destinada.
Finalmente o autor apresenta uma conclusão derivada da “rápida incursão de horizonte
léxico”:
Em última instância, o manual, sob suas diversas denominações, é progressivamente
um objeto planetário: ele se impôs no mundo, pelo viés da evangelização e da
colonização, adotado pela maior parte dos países de sistemas educativos e de
métodos de ensino inspirados no modelo ocidental. O “manual” é, portanto,
frequentemente designado por termos que são a transcrição, a tradução ou a
transposição das designações as mais comumente utilizadas nos países
desenvolvidos (CHOPIN, 2009, p. 25).
Pontuados alguns aspectos da discussão sobre o conceito de livro didático, é
necessário pensar esse objeto dentro do campo da história da educação.
Chopin (2002) indica que nos últimos 20 anos as pesquisas históricas sobre o livro
didático tiveram avanços consideráveis em oposição ao descaso verificado ao longo da
História da Educação. Entre os fatores que levaram a esse descaso, o autor relaciona a
presença do livro didático no universo cotidiano de alunos, pais e professores, o que faz com
que seja visto como algo banal, familiar, que não apresenta nada de raro, exótico ou singular,
não sendo conservado e comumente descartado.
Outro fator importante considerado pelo autor é a característica perecível do livro
escolar, pois cada mudança nos métodos ou nos programas determina sua substituição, bem
como quando fatos da atualidade lhe impõem mudanças - que o autor exemplifica citando a
queda do muro de Berlim.
Nessa mesma perspectiva, Batista (1999, p.529) reafirma esses fatores de descaso
com o livro didático, caracterizando-o como “um livro efêmero, que se desatualiza com muita
velocidade”. Indica também outros elementos que favoreceram o desinteresse da pesquisa
educacional sobre o livro escolar, tais como: o fato de raramente este ser relido e, por esse
motivo, ser pouco conservado em prateleiras de bibliotecas; destinar-se geralmente a um
público infantil; ser produzido em grandes tiragens; apresentar encadernações – na maioria
das vezes – de baixa qualidade, o que favorece sua rápida deterioração e ter, ainda, boa parte
de sua circulação fora dos espaços das grandes livrarias e bibliotecas (BATISTA, 1999).
Segundo Darnton (1990) e Belo (2002), os anos de 1970 apresentam um
crescimento das pesquisas sobre o livro e, conforme Chopin (2002, p.11), é também “no
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decorrer dos anos 1970 que os historiadores começam a manifestar um real interesse pelo
livro e pela edição escolares”.
Encontramos também algumas considerações em Corrêa (2000), acerca da
importância da utilização do livro didático como objeto e fonte de pesquisa em História da
Educação. A autora destaca que devemos considerar dois aspectos: primeiro, o fato de ser o
livro escolar um material de grande contribuição tanto para a história do pensamento como
também das práticas educativas e, segundo, que ele traz em si os conteúdos que revelam as
representações e os valores predominantes na sociedade em determinada época.
Entre as diferentes possibilidades de análise histórica dos livros didáticos, Chopin
(2004, p. 554) apresenta duas grandes categorias de pesquisa:
[1] aquelas que, concebendo o livro didático apenas como um documento histórico
igual a qualquer outro, analisam os conteúdos em uma busca de informações
estranhas a ele mesmo (a representação de Frederico II da Prússia, ou a
representação da ideologia colonial, por exemplo), ou as que só se interessam pelo
conteúdo ensinado por meio do livro didático (história das categorias gramaticais,
por exemplo);
[2] aquelas que, negligenciando os conteúdos dos quais o livro didático é portador, o
consideram como um objeto físico, ou seja, como um produto fabricado,
comercializado, distribuído ou, ainda, como um utensílio concebido em função de
certos usos, consumido – e avaliado – em um determinado contexto.
O autor destaca que no primeiro caso, a história escrita pelo pesquisador não é, de
fato, a história do livro didático e sim “de um tema, de uma noção, de um personagem, de
uma disciplina” e, nesse caso, é comum os livros didáticos representarem apenas uma das
fontes às quais o pesquisador recorre. Já na segunda categoria, o pesquisador concentra sua
atenção diretamente nos livros didáticos, praticamente desconsiderando seu conteúdo,
detendo-se à sua concepção, produção, distribuição, utilização e recepção. Porém o autor
destaca a existência de pesquisas que se dedicam, mesmo que em proporção variável, às duas
categorias (Chopin, 2004, p.554).
Essa definição decorre dos interesses do pesquisador e também da natureza das
fontes disponíveis, pois, a ausência ou dificuldade de acesso aos acervos, bem como a falta de
catalogação e cuidado com os livros, terminam por:
gerar várias limitações à pesquisa, sobretudo no que diz respeito ao restabelecimento
do circuito da produção dos livros: mesmo nos exemplares localizados, faltam
referências quanto ao número e à data das edições, às tiragens, além daqueles que
estão parcialmente danificados, sem capa e sem folha de rosto (Galvão e Batista,
2009, p. 24)
Assim, partindo da constatação da ausência de acervos especializados e da
importância e representatividade dos livros didáticos produzidos no Rio Grande do Sul
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(PERES, 2006) o grupo de pesquisa HISALES (FaE/UFPel) tem se dedicado à busca, reunião
e conservação dessas fontes.
Esses livros, dirigidos ao ensino primário (ou às séries iniciais do 1º grau), foram
produzidos, em sua maioria, por autoras gaúchas vinculadas ao Centro de Pesquisas e
Orientação Educacionais (CPOE).
Segundo Peres (2004, p.301), o CPOE desempenhou desde a sua criação, em 1942
e até os anos 1970, importante papel no ensino primário gaúcho, tendo como principal função
a “realização de estudos de investigações psicológicas, pedagógicas e sociais, destinados a
manter em bases científicas o trabalho escolar”, além da elaboração de planos e programas
para esse nível de ensino.
A autora ressalta a importância do papel do CPOE para compreender as mudanças
nos livros didáticos do ensino primário:
O CPOE manteve-se até a década de 70, praticamente como um órgão
autônomo de direção, de orientação e de normatização didático-pedagógica.
O discurso das técnicas educacionais do CPOE ganhou legitimidade. Elas
estabeleceram uma forma de comunicação com as professoras primárias [...]
contendo orientações didáticas pedagógicas sobre a organização das classes,
o planejamento das aulas, os conteúdos e os métodos os materiais a serem
utilizados em sala de aula [...] o uso dos livros didáticos (PERES, 2000,
p.143).
Além das orientações sobre o uso dos livros didáticos, o CPOE também exerceu
um papel de “controle” na produção e indicação de livros didáticos. Segundo Peres (2006), o
CPOE tinha presente no cerne de sua política questões como a produção, análise, indicação,
divulgação e controle de materiais de leitura em geral e de livros didáticos em particular.
As obras produzidas pelas autoras gaúchas no período em questão foram
publicadas por editoras locais (Selbach, Globo e Tabajara) e também por editoras nacionais
como a Editora do Brasil e FTD. A circulação dessas obras possivelmente tenha contado com
a chancela do Estado, na figura do CPOE, pois de acordo com Chopin (2008, p.16):
quando a concepção e a elaboração de obras escolares são confiadas à iniciativa de
empresas privadas, o Poder político se reserva à prerrogativa de permitir sua
introdução nas escolas mediante uma autorização da administração escolar.
Porém, a dispersão dessa produção e falta de acervos especializados disponíveis
para pesquisa despertou a necessidade, no grupo de pesquisa HISALES, de constituir um
acervo focado na produção gaúcha de livros didáticos tendo sido, até o momento,
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identificadas 23 coleções3 produzidas por autoras gaúchas. Atualmente o acervo já possui ao
menos um exemplar de cada uma dessas coleções.
Cabe registrar a dificuldade encontrada no processo de constituição do acervo,
dada a dispersão e, até mesmo, inexistência dos livros, pelos diferentes motivos já
apresentados (CHOPIN, 2002). Esta é uma dificuldade recorrente em estudos com livros
didáticos, como se pode perceber nas palavras de Bittencourt (2008) ao indicar que “a
organização do acervo de livros didáticos correspondeu a um trabalho semelhante ao do
arqueólogo, buscando os objetos em diferentes ‘sítios’ [...]”, fazendo referência à constituição
do corpus documental de seu projeto de tese (p.18).
De fato, a tarefa de localizar o que “nos restou do passado” conforme expressão
de Galvão e Batista (2009), não é empreitada fácil, o que foi percebido no processo de busca
dos livros didáticos para o acervo. Segundo os autores:
no caso brasileiro, depara-se, de modo geral com a ausência de acervos específicos
de manuais escolares, o que gera, para os pesquisadores, um sobre-esforço na
localização dos livros em acervos não especializados, onde não estão, via de regra,
catalogados [...] (Galvão e Batista, 2009, p.24)
Assim, a partir dessas questões, o grupo de pesquisa HISALES tem trabalhado
incansavelmente para a ampliação do acervo de livros didáticos, realizando buscas dessas
fontes em diferentes espaços, a exemplo das bibliotecas de escolas municipais e estaduais de
Pelotas e região, incluindo também aquelas localizadas na zona rural, que podem ser
caracterizadas como “acervos não especializados”.
Em alguns desses espaços, normalmente separados dos modernos livros
escolares, em arquivos mortos, porões, depósitos, entre outros, foram encontrados exemplares
de livros produzidos no Rio Grande do Sul, na maior parte dos casos destinados ao descarte.
Outros exemplares foram adquiridos em sebos de diferentes cidades, bem como
em sebos virtuais, a exemplo do site Estante Virtual4. Esse site permite a realização de “busca
offline” permanente nos acervos dos vendedores cadastrados no site, incluindo livros que
ainda não tenham sido catalogados no portal. Assim, se porventura o livro for cadastrado
online, é enviado automaticamente ao interessado um alerta por e-mail. Para isso é necessário
preencher um formulário indicando o nome do autor, o título e outras descrições que julgar
necessárias sobre o livro.
Alguns exemplares foram localizados através de contato, via e-mail, com alunos e
3 As coleções e os exemplares disponíveis podem ser consultados no site do grupo de pesquisa em
http://www.ufpel.edu.br/fae/hisales/ 4 http://www.estantevirtual.com.br/
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professores de diversos cursos e níveis de ensino, pesquisadores, bibliotecas, entre outros, de
diferentes estados brasileiros que, mobilizados pela proposta, tem se empenhado na busca
desses livros em sebos e acervos particulares em suas cidades. Diferentes exemplares foram
cedidos por diferentes pesquisadores.
A procura também contou com a consulta sobre a disponibilidade dessas obras
junto às famílias das autoras, como no caso das obras das professoras Nelly Cunha e Cecy
Cordeiro Thofehrn, que produziram livros em conjunto e também em co-autoria com outras
professoras. No caso de Nelly Cunha, suas filhas já haviam disponibilizado seu acervo para
Facin (2008), ficando o mesmo sob sua posse e guarda.
Em relação à Cecy Cordeiro Thofehrn não se tinha, ainda, conseguido localizar
nenhum de seus descendentes. Porém através de diferentes buscas foi localizado um neto da
professora, Ricardo Coelho, residente em Porto Alegre, na casa onde Cecy Thofehrn havia
morado. Após realização de contato telefônico, Ricardo Coelho doou mais de 70 livros de
autoria de sua avó, Cecy Cordeiro Thofehrn e de sua mãe, Iara Thofehrn Coelho, que haviam
sido “poupados” de descartes ao longo do tempo, sobre o que ele se manifestou:
A gente estava entrando em obra [na casa], e resolvi guardar alguma coisa, porque
em algum momento isso ia dizer alguma coisa. Também sou pesquisador, então
acabei segurando alguns livros, descartando as réplicas, e possivelmente algum
acabou sendo descartado (Ricardo Coelho, entrevista, 03 de junho de 2010).
Esse descarte dos materiais é compreensível, pois, enquanto não são questionados,
esses livros não assumem o status de fontes para a História da Educação, sendo reconhecidos
apenas como vestígios do passado, passíveis de descarte. Prost (2008) alerta que, na verdade,
são as questões do pesquisador que dão aos impressos o caráter de documentos ou fontes,
passando então a serem valorizados e conservados.
Atualmente o acervo possui por volta de 200 exemplares de livros produzidos no
Rio Grande do Sul, dos quais 126 volumes tem autoria (ou co-autoria) de Nelly Cunha ou
Cecy Cordeiro Thofehrn, professoras primárias responsáveis por um grande volume da
produção didática gaúcha.
Esse volume torna-se bastante representativo se comparado a um importante
acervo como o da Biblioteca Nacional5, do Rio de Janeiro, no qual foram localizados somente
31 livros de autoria dessas professoras. Essa consulta foi realizada em Catálogos/Acervo
Geral/Livros (no Catálogo Corrente e também no Catálogo Antigo), usando como critério de
busca os nomes das autoras.
Com a finalidade de dar visibilidade às informações sobre o acervo, bem como
5 http://www.bn.br/portal/
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organizar e catalogar os exemplares disponíveis, foram construídos diferentes instrumentos de
registro:
Quadro 1 - Mapeamento das coleções produzidas por autoras gaúchas (segunda
metade do século xx) – nesse quadro foram listadas todas as coleções localizadas a
partir de outros estudos ou de referências constantes na contra capa dos exemplares
que já faziam parte do acervo.
Quadro 2 - Títulos que compõem as coleções (disponíveis no acervo HISALES) – esse
quadro apresenta a relação de todos os exemplares disponíveis de cada uma das
coleções localizadas, incluindo título por volume, série ou ano escolar a que se
destina, ano de publicação e edição.
Quadro 3 – Coleções (disponíveis no acervo HISALES) – no quadro três foram
listadas todas as coleções que possuem ao menos um volume no acervo. Inclui nome e
série da coleção (algumas editoras usam esse recurso), nome das autoras e editora.
A fim de sistematizar os dados de cada livro do acervo foram construídas fichas
individuais6 com alguns dados descritos como exemplificado a seguir:
AUTOR: THOFEHRN, Cecy Cordeiro; CUNHA, Nelly
TÍTULO: Bichano e Zumbi – Primeiro Ano
COLEÇÃO: “Estrada Iluminada” – Série Nelci
EDITORA: Editora do Brasil S/A
LOCAL: São Paulo
EDIÇÃO: 1ª
ANO PUBLICAÇÃO: 1960
PÁGINAS: 79 p.
EXEMPLARES: 1
A disponibilidade de coleções completas ou praticamente completas dos livros
produzidos por essas autoras no acervo do grupo de pesquisa HISALES tem gerado diferentes
trabalhos, orientados pela líder do grupo, professora Dra. Eliane Peres7. Espera-se que a
divulgação desse acervo possa gerar novas pesquisas que contemplem questões como, por
exemplo, as propostas por Darnton (2008, p.156), quando solicita “aos historiadores dos
livros que confrontem três questões: (1) como é que os livros passam a existir?; (2) como é
que eles chegam aos leitores?; (3) o que os leitores fazem deles?”, que envolvem aspectos
como a produção, circulação e uso desses livros. O presente texto tem ainda o intuito de
alertar para a necessidade de constituição de acervos como esse, que possibilitem a
6 A lista dos exemplares disponíveis no acervo pode ser consultada no site do grupo de pesquisa, em
http://www.ufpel.edu.br/fae/hisales. 7 A exemplo da tese de doutorado de Antonio Mauricio Medeiros Alves (Coleções Estrada Iluminada e Nossa
Terra Nossa Gente) e da dissertação de mestrado de Chris de Azevedo Ramil (Coleção Tapete Verde), em
desenvolvimento junto ao PPGE da FaE/UFPEL.
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conservação de fontes para a História da Educação.
O acervo do grupo de pesquisa HISALES configura-se como um acervo
específico, constituído a partir do interesse de dar visibilidade à produção gaúcha de livros
escolares, visto que:
Os manuais representam para os historiadores uma fonte privilegiada, seja qual for o
interesse por questões relativas à educação, à cultura ou às mentalidades, à
linguagem ou às ciências... ou ainda à economia do livro, às técnicas de impressão
ou à semiologia da imagem (CHOPIN, 2002, p.13).
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