metadesign no design de moda: projetando localidades em redes

204
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI MESTRADO EM DESIGN PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes Mestranda Cláudia Regina Martins Orientadora Dr.ª Luísa Paraguai São Paulo, 2013.

Upload: phamnhan

Post on 08-Jan-2017

217 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI MESTRADO EM DESIGN

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

Metadesign no Design de Moda:

Projetando localidades em redes

Mestranda Cláudia Regina Martins

Orientadora Dr.ª Luísa Paraguai

São Paulo, 2013.

Page 2: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

Metadesign no Design de Moda:

Projetando localidades em redes

MESTRANDA CLÁUDIA REGINA MARTINS

ORIENTADORA Dr.ª LUÍSA PARAGUAI

São Paulo, 2013

Page 3: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

ESCOLA DE ARTES, ARQUITETURA, DESIGN E MODA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESIGN

Metadesign no Design de Moda:

Projetando localidades em redes

São Paulo, 2013.

Texto Dissertativo para defesa de

pesquisa apresentado como exigência

parcial para conclusão do curso de Pós-

graduação Stricto Sensu em Design no

Programa de Mestrado da Universidade

Anhembi Morumbi.

Mestranda: Cláudia Regina Martins

Orientadora: Pr.ª Dra. Luísa Paraguai

Page 4: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 5: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

CLÁUDIA REGINA MARTINS

Banca Examinadora

Profª Drª Luísa Angélica Paraguai Donati

Orientadora

Universidade Anhembi Morumbi.

Assinatura: _____________________

Profª Drª Rachel Zuanon Dias

Examinadora Interna

Universidade Anhembi Morumbi.

Assinatura: _____________________

Profº Drº Caio Adorno Vassão

Examinador Externo

Fundação Armando Álvares Penteado.

Assinatura: _____________________

São Paulo, 28 de agosto/2013.

Defesa de dissertação apresentada ao

Programa de Pós-Graduação Stricto

Sensu em Design – Mestrado, da

Universidade Anhembi Morumbi, como

requisito parcial para obtenção do título

de Mestre em Design.

Page 6: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 7: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do

trabalho sem a autorização da Universidade, do autor e do orientador.

CLÁUDIA REGINA MARTINS – CACAU

Possui graduação como bacharel em Design de Moda pela Universidade

Anhembi Morumbi Escola de Artes, Arquitetura, Design e Moda – SP.

Ficha Catalográfica

M342m Martins, Cláudia Regina Metadesign no design de moda: projetando localidades em redes / Cláudia Regina Martins. – 2013. 204f. : il.; 30 cm. Orientador: Profª Drª Luísa Angélica Paraguai Donati. Dissertação (Mestrado em Design) – Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2013. Bibliografia: f. 181-194. 1. Metadesign. 2. Design de moda. 3. Cadeia de valor. 4. Cadeia produtiva. 5. Comunidades locais. 6. Organização em redes. I. Título. CDD 741.6

Page 8: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 9: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Dedico esta pesquisa a todos os que

contribuíram, direta e indiretamente, com

suas energias, ações e observações,

incentivando-me nos estudos e nas

reflexões sobre o papel do designer de

Moda no mundo.

Page 10: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 11: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

AGRADECIMENTOS

Uma pesquisa exige tempo e dedicação, o que normalmente nos afasta dos

familiares, amigos e clientes. Agradeço a todos pela paciência e compreensão

nos diversos momentos de minha ausência por conta do meu empenho neste

trabalho.

Um agradecimento especial à professora Drª Luísa Paraguai, pela

generosidade e enorme disponibilidade ao longo das orientações, que me

levaram a momentos de reflexão e a um grande crescimento pessoal –

fundamental para este e também para os próximos projetos. Muito obrigada

pelo carinho e por me conduzir nesse caminho.

Aos professores Drª Rachel Zuanon e Drº Caio Vassão, agradeço

imensamente por aceitarem fazer parte da minha banca de qualificação e de

Defesa. Seus apontamentos foram essenciais e também serão levados para

percursos adiante.

Aos professores do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design

Mestrado da Universidade Anhembi Morumbi e também do Programa de

Graduação do curso de Design de Moda da Anhembi Morumbi, que

contribuíram com meu processo de aprendizado e são base da minha

formação como designer de Moda. À Instituição Anhembi Morumbi, que ao

confiar no resultado do meu empenho na graduação, concedeu-me uma bolsa

parcial de mestrado.

Um agradecimento muito especial à querida professora Me. Eloize Navalon, a

quem serei eternamente grata por ter despertado e tornado esta pesquisa

possível. À minha mãe, Antônia Alves Martins, pelo amor e apoio incondicional,

e à minha irmã Renata Alves Martins, por estar comigo em todos os momentos.

E em memória de Maria Soares Mota, Luzia Maria Martins, José Reis Martins e

Encarnação Gimenez.

Page 12: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 13: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

“Se você quer praticar o mal, a ciência

pode lhe prover as mais poderosas

armas; mas igualmente, se você deseja

fazer o bem, a ciência também lhe põe

nas mãos as mais poderosas

ferramentas.” ―Richard Dawkins.

"Ela [Sabedoria] se mostrará a eles,

jubilosamente, nos caminhos e irá a seu

encontro, com toda a solicitude".

―Santo Agostinho.

[...] do aprofundamento e da sublimação

da particularidade do “sertão” para a

universalidade do “sertão interior”. “Uma

cidade da religião” significa ultrapassar a

etapa da interiorização, transcender o

cotidiano — como se fosse um símbolo

“sagrado” [...] tornando-se essência da

fusão orgânica desses elementos e que

age como fonte de energia para a

restauração da cosmologia. ―Daisaku

Ikeda.

Page 14: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 15: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Resumo

Investiga-se neste trabalho a abordagem de Metadesign em Design de Moda,

considerando como objeto de estudo as ações projetuais dos designers

Ronaldo Fraga, Walter Rodrigues, Jum Nakao e o percurso histórico da

cooperativa de artesãs Coopa-Roca. São apontados direcionamentos e

estratégias de design, evidenciando as inter-relações de fluxos de matéria e

informação com vista a proporcionar percepção de valor em redes distribuídas

organizacionais e de comunidades locais. Contextualiza-se, assim, o termo

Metadesign como ferramenta de formalização de projetos colaborativos na

criação de produto-serviço em Design de Moda.

Palavras-chave: Metadesign; Design de Moda; Cadeia Produtiva; Cadeia de

Valor; Comunidades Locais; Organizações em redes.

Abstract

The research is concerned with the context of Metadesign and Fashion Design,

considering design actions of Ronaldo Fraga, Walter Rodrigues, Jum Nakao

and the historical background of Coopa-Roca’s Artisans as objects of studies.

The investigation points out design strategies and directions, focusing on

interrelationships of material and information fluxes to understand value

perception on distributed networks of organisations and local communities. So,

Metadesign, assumed as a design tool, can formalise collaborative projects to

create product-services in Fashion Design.

Keywords: Metadesign; Fashion Design, Production Chain, Value Chain, Local

Communities, Organizations networks.

Page 16: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 17: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Sumário

Lista de Figuras...........................................................................................17

Lista de Quadros.........................................................................................19

Lista de Tabelas..........................................................................................19

Lista de Gráficos.........................................................................................19

Introdução.....................................................................................................21

1. Metadesign e Metaprojeto no cenário do Design de Moda................27

1.1. Metadesign: projetar processos e Metaprojeto: o projeto do

projeto...........................................................................................37

1.2. Projetar entre o global e local..............................................49

1.3.Contextos históricos para construção do cenário

emergente....................................................................................69

2. Ações metaprojetuais: interrelação das variáveis adaptáveis com

cadeia de produção.................................................................................89

2.1. Processo, produto e serviço em cadeia produtiva.................90

2.2. Estratégias de Design e valor.............................................106

2.3. Cadeia de valor: fluxos distintos de informação.................120

2.4.Tecnologia produtiva: novos materiais e certificação de

origem.........................................................................................125

3. Projetando localidades e relações sociais em redes........................139

3.1.Percepção da qualidade como interações em redes: pessoas,

artefatos e lugares......................................................................134

3.2. Territorialidades: exercícios projetuais no local...................146

3.3.Projetar processos em redes: Comunidades locais e

organizações colaborativas........................................................156

Considerações finais.....................................................................................175

Referências Bibliográficas............................................................................179

Anexos......................................................................................................................193

Page 18: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 19: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

17

Lista de Figuras

Figura 1: Walter Rodrigues no Fórum Inspiramais e participantes.............................................26

Figura 2: Jum Nakao no Reality Project e na comunidade de Manicoré (AM)............................26

Figura 3: Sede da cooperativa Coopa-Roca em1988 e em 2013...............................................26

Figura 4: Matriz hexagonal da função.........................................................................................33

Figura 5: Matriz Vernácula..........................................................................................................34

Figura 6: Logo da Coopa-Roca, vista panorâmica da cooperativa na Rocinha (RJ) e a socióloga

Maria Tereza Leal fundadora da cooperativa recebendo prêmios da Fondation d’entreprise

Kering pour la Dignité et les Droits des Femmes (2010) e da Clinton Global Initiative

(2009)..........................................................................................................................................47

Figura 7: Etapas do problema de projeto....................................................................................52

Figura 8: Esquema sistêmico do desenvolvimento do processo metaprojetual e projeto no

processo de design.....................................................................................................................54

Figura 9: Reality Project ação projetual Jum Nakao (2012), estudantes e

artesões.......................................................................................................................................56

Figura 10: Peças e componentes desenvolvidos por stakeholders participantes do Fórum

Inspiramais (2013) coordenado por Walter Rodrigues................................................................58

Figura 11: Artesãos de Manicoré (AM) comunidade das ações de Jum Nakao (2008)..............60

Figura 12: Desfile Coopa-Roca no Ateliers de Paris (2005).......................................................61

Figura 13: Peças confeccionadas pela Coopa-Roca com as marcas Osklen e M.Officer..........63

Figura 14: Artesãs da Coopa-Roca (1981) e Tereza Leal (2005)...............................................70

Figura 15: Detalhes de técnicas tradicionais de artesanato e proposições contemporâneas em

peças desenvolvidas para o cotidiano pelas cooperadas da Coopa-Roca.................................72

Figura 16: Foto Coopa-Roca para divulgação da exposição “Retalho: Feminino Plural”

(1981)..........................................................................................................................................73

Figura 17: Foto primeiro desfile de Moda Coopa-Roca em 1994 (à direira), e proposta de Carlos

Miele em colaboração com a Coopa-Roca.................................................................................73

Figura 18: Folders e peças desenvolvidas para exposição Retalhar (2000)..............................75

Figura 19: Peças desenvolvidas em colaboração entre artesãs, designers e artistas para a

exposição Retalhar (2002)..........................................................................................................77

Figura 20: Mostra Retalhar 2007, peças em cooperação entre artesãs, artistas e designers....78

Figura 21: Convite para o primeiro desfile internacional da COOPA-ROCA no Haus der

Kulturen der Welt (Casa das Culturas do Mundo), em Berlim, Alemanha (2005) e algumas das

peças desenvolvidas com a M.Officer (2001) para Carlo Miele e desfile no Fashion Rio

(2002)..........................................................................................................................................79

Figura 22: Organograma Coopa-Roca........................................................................................80

Figura 23: Diagrama fluxos operacionais cooperativa Coopa-Roca...........................................81

Figura 24: Sass Brown, artista plástica e designer de Moda voluntária na Coopa-Roca entre

2003-2008...................................................................................................................................82

Figura 25: Camisas desenvolvidas em colaboração entre artesãs Coopa-Roca e irmãos

Campana para Lacoste (2009)....................................................................................................83

Page 20: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

18

Figura 26: Elementos de linguagens em peça de Boontje (2004) e vestido Marcelo Sommer,

desenvolvidos em colaboração na Coopa-ROCA (2004)...........................................................84

Figura 27: Peças desenvolvidas pela cooperativa Coopa-Roca e pelo Designer de Produtos e

Artista Plástico Tord Boontje.......................................................................................................85

Figura 28: Produtos em colaboração entre Jum Nakao e as comunidades de Maricoré

(2008)..........................................................................................................................................86

Figura 29: Artesãs cooperadas, loja no Fashion Mall e nova sede da Coopa-roca em

2010............................................................................................................................................88

Figura 30: Algumas técnicas de tradições locais de artesãs do Programa Talentos do

Brasil...........................................................................................................................................91

Figura 31: Fórum Inspiramais (2013)........................................................................................102

Figura 32: Peças gráficas do Programa do Fórum de Inspirações (2013)................................104

Figura 33: Layout do website do Programa da Assintecal, Blog, aplicativos e tags.................105

Figura 34: Mapa simplificado fluxos de informação no Programa do Fórum de Inspirações

coordenado por Walter Rodrigues............................................................................................106

Figura 35: Mãos que [Re]fazem o mundo (2010), Programa Talentos do Brasil......................108

Figura 36: Desfile e Identidade Visual do Programa Talentos do Brasil...................................111

Figura 37: Layout do website e-commerce do Programa Talentos do Brasil............................112

Figura 38: Bolsas e acessórios de couro de peixe produzidos na comunidade de Coxim, croqui

e desenhos técnicos desenvolvidos por Ronaldo Fraga (2008)...............................................113

Figura 39: Peças produzidas por artesãs da comunidade de São Borja, Rio Grande do Sul e

croqui e desenhos técnicos do designer Ronaldo Fraga (2008)...............................................115

Figura 40: Catálogos da coleção Talentos do Brasil, desenvolvidos pela designer Tereza

Santos (2008, 2009, 2010) e postais referentes as comunidades pela designer Lorena Marinho

(2010)........................................................................................................................................117

Figura 41: Peças desenvolvidas pelas comunidades de bordadeiras e rendeiras do agreste da

Paraíba (2008) para o programa Talentos do Brasil, com colaboração do designer Ronaldo

Fraga.........................................................................................................................................119

Figura 42: Projeto Arte e Tramas (2013)...................................................................................121

Figura 43: Cadeia de valor: esferas de controle e influência....................................................122

Figura 44: Mosaico de alguns dos atores que participam da cadeia de valor têxtil..................123

Figura 45: Tecidos produzidos de forma manual pela “Artes e Tramas”..................................124

Figura 46: Foto comunidade de Manicoré e comunidade de artesãos.....................................135

Figura 47: Além das escolhas binárias.....................................................................................139

Figura 48: Registros do processo de desenvolvimento da coleção..........................................141

Figura 49: Peças desenvolvidas pelos artesãos em colaboração com Jun Nakao (2008) na

comunidade de Manicoré..........................................................................................................144

Figura 50: Moodboard conceitual Manicoré e algumas das peças desenvolvidas pelos

artesãos.....................................................................................................................................147

Figura 51: Ações essenciais para promover produtos e territórios...........................................149

Figura 52: Moodboad conceitual território da comunidade de Tucumã (PA)............................156

Page 21: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

19

Figura 53: Propostas para Coleção Turista Aprendiz na Terra do Grão Pará – Verão

2012/13.....................................................................................................................................153

Figura 54: Propostas para Coleção Turista Aprendiz na Terra do Grão Pará – Verão

2012/13.....................................................................................................................................154

Figura 55: Estrutura Reality Project ação de Jum Nakao (2010), estudantes e artesãos no

SENAC de Fortaleza (CE).........................................................................................................159

Figura 56: Ação projetual Walter Rodrigues (2001), na casa das rendeiras do Morro das

marianas, patrocinada pelo Museu A casa do objeto brasileiro................................................159

Figura 57: Artesanato local da comunidade de Tucumã, fotos do território, e da cooperativa de

artesãs de biojóias “Meninas de Tucumã”................................................................................160

Figura 58: Processo geral de instauração de um novo nicho de interação..............................169

Figura 59: Quadrívio como forma de compreender a sequência de concepção isolada e sua

circulação pela sociedade, no caso processo artesanal...........................................................165

Figura 60: Fotos workshops e processos produtivos na ação projetual Ronaldo Fraga (2010) na

cooperativa Meninas de Tucumã..............................................................................................167

Figura 61: Detalhe de processo de algumas técnicas de desenvolvimento da renda no Morro

das Marianas, ferramentas almofadas, agulhas e teares usados para fazer a renda e detalhes

de uma das propostas elaboradas em colaboração com o designer Walter Rodrigues em

2001..........................................................................................................................................170

Figura 62: Fotos propostas da coleção "A hora do Brasil: Breve Manifesto pela Redescoberta

do Paraíso Brasileiro"................................................................................................................172

Lista de Quadros

Quadro 1: Quadro sintético com princípais características de diferenças e relações possíveis

entre Metadesign (VASSÃO, 2010 e GIACCARDI, 2003) e Metaprojeto (MORAES,

2010).......................................................................................................................................... 42

Lista de Tabelas

Tabela 1: Tabela comparativa entre características do design tradicional e do

metadesign..................................................................................................................................58

Tabela 2: Alguns dos eventos da Cooperativa Coopa-Roca......................................................74

Tabela 3: Pilares de Sustentabilidade.......................................................................................128

Lista de Gráficos

Gráfico 1: Contextos relacionais Copa-Roca..............................................................................66

Gráfico 2: Participação da moda nas etapas da cadeia têxtil e possibilidade de

adaptação....................................................................................................................................93

Page 22: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

20

Gráfico 3: Ações projetuais de Walter Rodrigues na coordenação do Fórum Inspiramais

(2012)..........................................................................................................................................97

Gráfico 4: Redes e possíveis fluxos de informação nas ações de Walter

Rodrigues....................................................................................................................................98

Gráfico 5: Estrutura relacional do Programa Talentos do Brasil...............................................109

Gráfico 6: Estrela de valor define dimensões para produtos e serviços de Ronaldo Fraga no

Talentos do Brasil (2008)..........................................................................................................118

Page 23: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

21

Introdução

Esta pesquisa investiga o Metadesign como abordagem reflexiva frente às

ações projetuais em redes colaborativas de comunidades locais. Assume-se

um contexto de produção no campo do Design marcado por fluxos inter-

relacionais cada vez mais complexos, dinâmicos e fluidos, provocado por

mudanças constantes nos diversos níveis e setores: econômico, político,

ambiental, social e cultural. Neste cenário, o designer pode contribuir como

facilitador para a compreensão, construção e implementação de novos

modelos de sistemas e modos de vida. No atual momento, novas tecnologias e

novos modos de interação nos meios de comunicação e transporte frente às

relações entre o global e o local têm transformado significativamente o

cotidiano das pessoas. Isso tudo, no âmbito do Design de Moda, diz respeito a

processos de produção e consumo de produtos e serviços, em que materiais,

processos e pessoas interagem com fluxos relacionais dinâmicos e distribuídos

pelo globo.

Há questões diversas para serem repensadas, pois muito tem sido produzido,

consumido e descartado diante das opções distintas de escolhas,

potencializadas pelas aproximações físicas entre o global e o local nos

processos de produção e circulação de bens de consumo. Por fatores como

esses, nos últimos anos houve um grande número de inovações positivas,

como a possibilidade de melhor distribuição da informação entre stakeholders

com vistas a melhores estratégias de projetos. No entanto, muitas questões

como a desigualdade social e a reorientação ecológica continuam sem

solução. Nestas situações, os designers de Moda devem repensar metas e

processos de desenvolvimento reorientando sistemas, estratégias, escolhas

etc., de maneira que promovam novas redes na cadeia de produção têxtil, para

uma percepção de qualidade e valor mais adequados, visando uma

autossuficiência não exploratória de capital social. As novas relações nesses

sistemas são complexas redes entre coisas, pessoas e lugares que incluem

stakeholders distribuídos pelo globo em contextos diversos de organização:

institucionais sociais, empresas, fornecedores, distribuidores, artesões,

comunidades locais, consumidores, etc.

Page 24: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

22

Desta maneira, serão abordados temas como: processos entre o global e o

local na cadeia produtiva, ações projetuais em composições sócio-técnicas,

fluxo de processos e informação em cadeia de valor, a partir de ações

projetuais específicas em comunidades locais. Para tanto, foram relacionados

estudos de caso dos designers de Moda: Walter Rodrigues (2001 e 2013), na

coordenação do Fórum Inspiramais e ação projetual na comunidade do Morro

da Mariana pelo Museu A Casa do objeto Brasileiro; Jum Nakao (2008 e 2012),

em ação projetual na comunidade local de Manicoré, no Amazonas, pelo

Programa Talentos do Brasil e “Reality Project”, juntamente com estudantes de

Design de Moda do Senac e artesãos de Fortaleza; Ronaldo Fraga (2008 e

2012), em ação projetual pelo Programa Talentos do Brasil junto às

comunidades de bordadeiras do Agreste da Paraíba, de Coxim no Mato Grosso

do Sul, São Borja no Rio Grande do Sul e em Tucumã no Pará, pela Fundação

VALE, e o percurso histórico da cooperativa de artesãs Coopa-Roca (1981-

2013) da comunidade da Rocinha no Rio de Janeiro.

Propõe-se neste trabalho investigar nos contextos dessas ações projetuais a

instrumentalidade de Metadesign, a partir de Vassão (2010), na formalização e

construção de mapas conceituais para a identificação de entidades emergentes

nos ambientes complexos. Metadesign a partir de Giaccardi (2003) e Fisher

(2004) é apontado como possibilidade de ação projetual em contextos sócio-

técnicos criativos em comunidades locais para valorização de know-how. E

Metaprojeto por Moraes (2010), Celaschi e Deserti (2009) e Franzato (2012)

como análise preliminar para compor uma plataforma de conhecimentos que

oriente etapas iniciais de projeto em cenários de mercado.

A compreensão do cenário atual de globalização no Design de Moda frente às

questões de reorientação de produção e consumo na Cadeia Produtiva Têxtil

em ações projetuais em comunidades locais é pautada a partir de

apontamentos de Fletcher (2011), Black (2013), Berlim (2012), De Carli (2012),

Brown (2010) e Avelar (2009). Questões sobre o papel do Design no cenário

de processos, sociedade e complexidade na contemporaneidade foram

colocadas de acordo com Cardoso (2011), Bomfim (1997), Thackara (2008),

Bonsiepe (2011). Para processos em Cadeia de Valor e projetos em território

Page 25: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

23

local são consideradas afirmações de Krucken (2009), Meroni (2008), Monzoni

(2012), Magnavita (2011), Luchiari (1998) e Santos (1996). Reorientação

ecológica e social tem conceitos balizados por Manzini (2008), Manzini e

Vezzoli (2008) e Papanek (1995). Sistemas em redes e cenários complexos em

Bateson (2000) e redes sociais por Castells (1994), processos relativos à

cognição e percepção em sistemas sócio-técnicos são balizados a partir de

Virilio (1996), Maturana (1997) e Varela (1999), aprendizado coletivo, Lévy

(1994) e projeto aberto, Vassão (2010).

A dissertação esta estruturada em três partes, de acordo com as estratégias

das seguintes abordagens de Metadesign:

I. "Behind: Designing Design” – “Atrás: Projetanto o projeto” aborda o

Metadesign focando em processos e estruturas em geral, mais do que objetos

e conteúdos, e sugere métodos e técnicas para projetar no nível meta e para

levar em consideração a dimensão dinâmica dos processos. Que corresponde

ao primeiro capítulo onde são analisadas as abordagens de Metadesign a partir

de Vassão (2008, 2010), Giaccardi (2003) e Fisher (2004), e Metaprojeto a

partir de Moraes (2010), Celachi & Deserti (2009), Celaschi e Franzato (2012),

com vistas a compreender possibilidades e limitações na instrumentalidade

desses, apontando métodos, técnicas e ferramentas estratégicas para a

atuação do designer de Moda nos cenários descritos anteriormente. Os

projetos tomados como objetos de estudo são pontuados pela investigação da

possibilidade de atuação de Metadesign em ações de colaboração em redes

sociais distribuídas em cadeia produtiva e comunidades locais, com

observações desses nas ações projetuais de Walter Rodrigues (2012), Jum

Nakao (2008 e 2012) e na cooperativa de artesãs Coopa-Roca (1981-2013).

II. "With: Designing Together“ – “Com: Projetando Junto” aborda o ambiente

colaborativo (designers e usuários podem colaborar para a atividade de design,

em suas especificidades temporais de projetar e usar). São as práticas

comunitárias. Essa abordagem é apresentada no segundo capítulo, quando

investiga-se a instrumentalidade de Metadesign (VASSÃO, 2010) e

Metaprojeto (2010) na sistematização de fluxos de processos, informação e

Page 26: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

24

interação na cadeia de produção têxtil distribuídos em redes, com abordagens

de colaboração em relações tecnológicas e sociais. A cadeia de valor é

analisada visando a descrever conceitos, características, critérios e discussões

relevantes na escolha dos contextos, processos de produção e tecnologias. As

questões de valorização do território são colocadas a partir de Krucken (2009),

e plataformas de conhecimentos prévios para fases iniciais de projeto a partir

de Moraes (2010). São analisadas as ações projetuais dos designers Ronaldo

Fraga no Programa Talentos do Brasil (2008) junto às comunidades de Coxim

(MS), Agreste da Paraíba (PB) e São Borja (RS), e também a ação projetual de

Walter Rodrigues na coordenação do Programa do Fórum de Inspiração da

ASSINTECAL, junto à artesã Yasmine (2012).

III. "Between: Designing the In-Between“ – “Entre: Projetando o Entre” abordam

o ambiente das redes sociais (estruturas organizacionais e podem alterar

papéis e padrões de interação). É o Design de sistemas sócio-técnicos.

Cenários com contextos apresentados no terceiro capítulo, que aborda ações

de Metadesign (VASSÃO, 2008; VASSÃO 2010) para a compreensão de

estruturas organizacionais que podem alterar papéis e padrões de interação

em redes colaborativas nas ações projetuais de sistemas sócio-técnicos. São

apontados questionamentos sobre a importância do Design como processo de

percepção de valor e qualidade nas interações em distintas redes de intenções

e proximidades intersubjetivas, inerentes aos designers, ao mercado e às

comunidades de artesãos. É pontuada a importância do papel ético do

designer de Moda nas escolhas contextuais e projetuais referentes às

estratégias de Design para a composição social, de território, cultura e tradição

local. Neste cenário, são referenciados os projetos dos designers Walter

Rodrigues, junto à comunidade de artesãs do Morro das Marianas (PB) e

Museu A casa do objeto brasileiro em 2001; Ronaldo Fraga, junto à

cooperativa de artesãs de Tucumã (PA) e Fundação VALE em 2012; e Jum

Nakao, junto à comunidade de Manicoré (AM), no Programa Talento do Brasil,

em 2008, e o “Reality Project”, com estudantes de Design de Moda, artesãs e o

Senac de Fortaleza (CE), em 2012.

Page 27: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

25

1. Metadesign e Metaprojeto no cenário do Design de Moda

Este primeiro capítulo aborda Metadesign focando em processos e estruturas

em geral, mais do que objetos e conteúdos. Sugere métodos e técnicas para

projetar no nível meta levando em consideração a dimensão dinâmica dos

processos. Investigam-se as proposições conceituais e instrumentalidade de

“Metadesign ou Projeto do processo” (VASSÃO, 2010) e “Metaprojeto ou

Projeto do projeto” (MORAES, 2010) e estratégias possíveis para a gestão em

projetos de Design de Moda. As abordagens de Metadesign são analisadas a

partir de Vassão (2008, 2010), Giaccardi (2003), Fisher (2004), e Metaprojeto a

partir de Moraes (2010), Celachi & Deserti (2009), Celaschi e Franzato (2012).

Para compreender as possibilidades e limitações na instrumentalidade desses,

apontam-se métodos, técnicas e ferramentas estratégicas para a atuação do

designer de Moda nos cenários de projetos tomados como objetos de estudo

de caso, pontuados pela investigação da possibilidade de atuação de

Metadesign e Metaprojeto em ações de colaboração em redes sociais

distribuídas em cadeia produtiva e comunidades locais, com observações

desses nas ações projetuais de Walter Rodrigues (2012) e Jum Nakao (2008 e

2012); e no cenário emergente da cooperativa de artesãs Coopa-Roca (1981-

2013).

Constatou-se a potencialidade dessas ações que, ao incorporarem variáveis de

escolhas técnicas e de modos de produzir flexíveis e adaptáveis durante toda a

cadeia de produção e em diferentes cenários sociais – que incluem desde

sistemas formalizadores e operacionais em projetos de Design de Moda,

empresas ou até empreendimentos sociais colaborativos etc. –, promovem

mediação e integração entre os componentes do sistema da Moda em

produção e consumo, distribuídos em diferentes redes colaborativas.

Estes cenários são apresentados nos estudos de caso em projetos dos

designers Walter Rodrigues, que coordena o Programa do Fórum Inspiramais

(2013) (figura 1) e Jum Nakao, com a ação na comunidade de Manicoré, no

Amazonas, pelo Programa Talentos do Brasil, em 2008, e “Reality Project”,

Page 28: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

26

junto a estudantes de Design de Moda e artesãs no Senac Fortaleza de Ceará,

em 2012 (figura 2). Também será apresentado o percurso histórico entre 1981-

2013 da Cooperativa de Artesãs Coopa-Roca, do Rio de Janeiro, em

perspectiva emergente de organização social e estratégia de produção

colaborativa em grupo (figura 3).

Figura 1: Walter Rodrigues no Fórum Inspiramais (2012) e participantes. Fonte: (INSPIRAMAIS.COM.BR, 2013)

Figura 2: Jum Nakao no “Reality Project” (2012) e na comunidade de Manicoré (2008). Fonte: (JUMNAKAO.COM.BR, 2013)

Figura 3: Sede da cooperativa Coopa-Roca em1988 e em 2013. Fonte: (COOPA-ROCA.COM.ORG, 2013) e (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013)

Page 29: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

27

As ações projetuais de Design de Moda na cadeia produtiva têxtil frente às

novas questões de reorientação de processos quanto às atuais condições

sociais, ecológicas e ações em colaboração com comunidades que

contemplam a valorização de técnicas de artesanato e tradição local vêm

promovendo reflexões importantes sobre o direcionamento desses projetos nos

sistemas de produção e consumo dos produtos de Design de Moda.

Essas ações de Design na cadeia produtiva têxtil e em comunidades de

artesãos locais visam a processos mais adequados por meio de ações com

menor impacto negativo ambiental e promoção de desenvolvimento social, ao

se posicionarem perante as questões da conscientização desses fatores nas

etapas do projeto. Vale reconhecer a validação do sistema da Moda como

suporte da economia capitalista, da “obsolescência programada e da

obsolescência percebida” (DE CARLI, 2011), evocando comportamentos

recorrentes de consumo e a consequente demanda de produtos, que têm

tempo efêmero de vida tanto de mercado como de uso.

Nesse sentido, Sass Brown (2010) e De Carli (2011) criticam o curto ciclo dos

produtos, pensamento também explanado por Papanek (1995, p.202): “A base

econômica da moda reside no desejo de fazer as pessoas comprarem coisas

que não necessitam uma forma da técnica capitalista de obsolescência

planejada”, quando critica essas questões associadas ao Design de modos de

uso e consumo nos ciclos de vida dos produtos, evocando responsabilidade e

ética por parte dos designers para repensar seus projetos considerando esses

pontos.

Berlim (2012) levanta essa questão quando destaca que a adequação do

consumo às novas realidades parece ser dicotômica e complexa. Pois se a

lógica da Moda reside na sua autodesvalorização, como construir valor

percebido nos produtos de Moda? Assim, Parode, Remus e Visoná, (apud DE

CARLI, 2010) trazem a seguinte afirmação: “a própria essência da moda de

gerar novas tendências periodicamente, estimulando a efemeridade dos

produtos, já é uma contradição”. O impacto das escolhas de vestuário quase

nunca é considerado ou notado no mosaico de disciplinas que interagem com a

Page 30: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

28

Moda, ou seja, é como se a aquisição, uso ou descarte de uma peça de

vestuário estivesse mais ligado a alguma área de marketing de tendências de

mercado do que com a questão do próprio projeto do Design da roupa, peça

e/ou produto, que deve levar em consideração todo o ciclo de vida do mesmo.

O fato é que, dessa maneira, para constituir uma escala de valor nos processos

de Design de Moda, questiona-se em profundidade a própria lógica desse

sistema.

A moda absorve e descarta com a mesma intensidade valores de cada época, a voracidade e a antropofagia de conceitos que se transformam em tendências e a necessidade plena de mudança que se traduz em propor novas soluções para adequar o produto têxtil, de confecção, o qual será então oferecido ao mercado (CASTILHO, 2008, p.126).

Retoma-se Papanek (1995) para se repensar o Design de Moda pela ética e

função social, onde funcionar bem é atender o contexto das necessidades

humanas e ambientais, que podem ser materiais ou não, e destaca-se

A criação e fabrico de qualquer produto – tanto durante o seu período de uso ativo como na sua posterior existência – inserem-se pelo menos seis ciclos

1 distintos, cada um dos quais com potencial dano à ecologia

[...] A resposta do design deve ser positiva e unificadora; deve ser a ponte entre as necessidades humanas, a cultura e a ecologia. [...] A relação entre design e ecologia é muito estreita e cria algumas complexidades inesperadas, exigindo muito estudo, testagem e experimentação, que podem ser melhor compreendidos pela observação de cada um destes ciclos (PAPANEK, 1995, p.31-35).

Nesse processo devem ser consideradas características específicas de acordo

com cada contexto identificado durante a análise dos cenários para a criação,

produção e desenvolvimento do produto, serviço ou sistema. Papanek (1995)

aponta que no desenvolvimento desses projetos devem-se atender as

necessidades humanas e demandas de mercados sem que sejam causados

danos ao meio ambiente e ao meio social. Nesse sentido, Bomfim (1997, p.32)

aponta que “o design seria, antes de tudo, instrumento para a materialização e

perpetuação de ideologias, de valores predominantes em uma sociedade”; e

1 Papanek (1995, p.36) classifica seis diferentes ciclos como pontos importantes que devem

ser considerados no processo de criação e desenvolvimento de qualquer produto/serviço/sistema: i – Método (Instrumentos; Materiais e Processos); ii – Associação (Família e Ambiente Inicial; Educação e Cultura); iii – Estética (Forma; Percepção; Dados eidéticos e bio-sociais); iv – Necessidade (Sobrevivência; Identidade; Formação de objetivos); v – Consequências (Ecológico-ambientais; Sociais-societárias; Uso de material e de energia); vi – Uso (Como instrumento; Como comunicação; Como símbolo).

Page 31: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

29

embora poucos designers aceitem essa faceta mimética de suas atividades,

conscientemente ou não, “o design re-produziria realidades e moldaria

indivíduos, por intermédio dos objetos que configura”. O autor critica assim a

padronização que acontece a partir do processo cada vez mais acelerado do

meio em que se vive, operado pela globalização de mercados.

Bomfim (2001) e Papanek (1995) apontam essas ações de Design como de

grande importância, pois dizem respeito a grande parte dos artefatos que irão

circular no mundo, colocando em evidência que os autores das configurações

dos objetos para o meio devem se ver como os responsáveis por essa relação,

tanto na dimensão estética quanto ética, e pela função social do objeto,

entendendo-o como algo imaterial e mutável. Para Cardoso (2011, p.15) “o

Design nasceu com firme propósito de pôr ordem na bagunça do mundo

industrial”, provocando mudanças organizacionais e produtivas e alterando

também o funcionamento dos sistemas de bens de consumo e, em

consequência, fatores econômicos, sociais e ambientais.

Nesse contexto, Vassão (2008, p.202) destaca: “o Design nasce como

ferramenta da indústria – a qual descreve resumidamente como formalização

da produção do cotidiano”, e baseando-se no conceito de sociedades de

controle (DELEUZE, 1990) e Metadesign (VIRILIO, 1996), afirma-o como uma

sistemática sócio-técnica de dominação e controle dos indivíduos e da

sociedade (VASSÃO, 2008, p.101). Segundo o autor, a Sociedade de Controle

articula-se não como um projeto localizável em um grupo social específico, mas

como uma Meta-Máquina Social, onde é possível elaborar o Metadesign dos

costumes, uma negociação constante dos modos de vida. Bateson (1970)

chama de Ecologia de Mídias, concentrando-se nas relações e não tanto nos

objetos para elaborar configurações. Já McLuhan, nas décadas de 1960 e

1970, fala de uma ecologia que considera não o uso de uma ou outra mídia,

mas um conjunto concatenado e intercomunicado de mídias. O termo

Metadesign é proposto por Vassão (2008) como:

Page 32: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

30

um projeto complexo, em si, negociado no meio social, em um Meta-Espaço social, que não se localiza especificamente em algum lugar, mas a partir de modos mais ou menos formalizados de conduta – alguns impostos legalmente (a legislação), outros pelos costumes tradicionais, ainda mais alguns pelas tecnologias e sua operação, e também pela super-estrutura ideológica que também demonstra contornos de super-estrutura emergente (VASSÃO, 2008, p.102).

Bomfim (1997, p.35), sob uma ótica positiva à padronização de

comportamentos – como se fosse possível controlar esse processo –, recorre a

Wittgenstein (2003) e sua proposta de “semelhanças familiares” aplicada ao

conceito de jogo:

Algo deve ser comum a todos eles, senão não se chamariam jogos [...] E assim podemos percorrer muitos, e muitos outros grupos de jogos e ver semelhanças surgirem e desaparecerem. E é tal o resultado desta consideração: vemos uma rede complicada de semelhanças, que se envolvem e se cruzam mutualmente. Semelhanças de conjunto e de pormenor (WITTGENSTEIN apud BOMFIM, 1997, p.36).

Segundo Bomfim (1997, p.36), essa proposta de Wittgenstein poderia ser

aplicada às situações metodológicas que o Design enfrentaria em diferentes

tipos de projeto. “Algumas semelhanças permanecem, outras desaparecem e

outras ainda surgem”. E a tarefa, segundo o autor, é evidente: não pensar (com

instrumentos disciplinares das ciências clássicas), mas olhar (a realidade, o

problema em toda sua extensão)!

Sobre as mudanças na contemporaneidade, Bomfim (1997, p.29) aponta que o

volume do conhecimento acumulado pela humanidade tornou-se imenso, as

ciências se desenvolveram e se verticalizaram, tornando mais difícil o domínio

de suas descobertas e mais urgente a criação de novos elos transdisciplinares.

O contexto atual da sociedade aponta um cenário complexo com novas

relações entre tempo-espaço (BAUMAN apud MORAES, 2010) e com sistemas

de produção e consumo, exigindo profissionais mais flexíveis, com habilidades

para trabalhar em equipes multidisciplinares, em um ambiente de fluxos fluidos

e dinâmicos.

Para Manzini (2010, p.XI), esse cenário demanda uma “dupla mudança,

reconceituar o design para uma abordagem do serviço pela inovação social, e

reconceituar os serviços padronizados para serviços colaborativos”; essa

Page 33: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

31

condição requer esforços tanto da comunidade interna do Design (designers e

equipe do projeto), orientada pelo produto na busca por desenvolvimento e

através de novos conceitos e novas ferramentas, como também pela

comunidade externa do Design (usuários/consumidores/sociedade), onde um

novo conceito orientado pelo serviço precisa ser promovido.

Segundo Manzini (2010), essas oportunidades implicam em campos de

atividades que surgirão nas próximas décadas, como: a reorientação ecológica

dos sistemas de produção e consumo (o que aumenta drasticamente a

obrigação de eficiência ecológica); a produção social de serviços (para atender

a novas demandas de coesão social); os programas regionais e eco-

desenvolvimento (para promover o uso sustentável de recursos físicos e

sociais locais). Essa afirmação do autor corrobora com o seguinte

questionamento:

O mundo está conectado em várias dimensões e em nível profundo — um sistema global de sistemas. [...] A maior conectividade criou fortes — e desconhecidas — interdependências. [...] Simplificação e padronização são estratégias-chave para reduzir a complexidade existente e futura. [...] Abordagens modulares, componentes padronizados em áreas como desenvolvimento e manufatura de produtos, ajudam as organizações a serem globalmente eficientes e localmente sintonizadas (IBM, 2006a) [...] Enfrentam-se desafios de indivíduos que tentam manter o equilíbrio entre a tradição de vantagens nacionais em meio a mercados imersos em um clima de intensa globalização [...] Para realizar mudanças positivas como em inovação social muitas vezes são confrontados fatores culturais, políticos e padrões específicos de comportamento humano (IBM, 2006b). [...] a colaboração interna e externa entre indivíduos e organizações é vista como um pré-requisito essencial para a inovação bem-sucedida para criar valor institucional (IBM, 2010). [...] O design tem se tornado amplamente conhecido como uma ferramenta estratégica de suporte ao desenvolvimento de melhores serviços para as comunidades e indivíduos, incluindo melhores sistemas de saúde e melhores cidades. [...] O design pode ser um poderoso catalizador para a mudança em longo prazo. Mas como um maior número de ‘players’, tanto no setor público como no setor privado podem ser persuadidos a se engajarem com o design? (IBM, 2008).

Lidar com a complexidade nesses sistemas e encontrar novos modelos de

projetos são alguns dos desafios dos designers na atualidade, situação que,

conforme Capra (1981), acontece, pois vive-se um momento no qual para

superar os problemas ambientais e sociais são necessárias mudanças de uma

visão de mundo mecanicista da ciência cartesiana-newtoniana para um novo

Page 34: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

32

"paradigma'' – uma nova visão da realidade, uma mudança fundamental em

nossos pensamentos, percepções e valores. Para se alcançar tal estado de

equilíbrio dinâmico num mundo globalmente interligado, será necessária uma

estrutura social e econômica radicalmente diferente: uma revolução cultural

com uma concepção sistêmica da vida a qual o autor chama de “A teia da vida”

(CAPRA, Ponto de Mutação,1981), onde:

[...] a concepção de sistemas vivos como redes fornece uma nova perspectiva sobre as chamadas hierarquias da natureza. Desde que os sistemas vivos, em todos os níveis, são redes, devemos visualizar a teia da vida como sistemas vivos (redes) interagindo à maneira de rede com outros sistemas (redes) (CAPRA, 1996).

Conforme o autor, essa visão emergente exige novas abordagens de

estruturas sociais, ambientais, tecnológicas e econômicas que, no futuro, vão

fundamentar uma ecologia sistêmica (BATESON, 1972), na qual novos

modelos de sistemas institucionais e novos modos de vida cotidianos na

comunidade em geral vão organizar a sociedade.

Nesse sentido, Plattner (2011), afirma que projetar de forma a equilibrar as

necessidades e interesses de distintos e interdependentes componentes –

pessoas, mercado e tecnologia – exige que o designer obtenha, gerencie e

integre informações e conhecimento de especialistas de cada uma dessas

áreas. Tal necessidade leva-o a assumir um papel de coordenação desse

processo de resolução de problemas.

Projetar sob essa perspectiva múltipla implica abordar as ambiguidades desses

complexos sistemas simultaneamente, para encontrar soluções (produtos,

serviços ou sistemas). Essa perspectiva foi descrita e ilustrada por Papanek

(1995), figura 4, quando o autor propõe que no projeto de qualquer

produto/serviço/sistema sejam considerados simultaneamente contextos

específicos respectivos aos cenários do projeto.

Page 35: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

33

Figura 4: Matriz hexagonal da função Fonte: (PAPANEK, 1995, p.36)

Nessa matriz hexagonal da função, Papanek (1995, p.35) destaca “qualquer

produto criado passa por pelo menos seis fases potencialmente perigosas

ecologicamente e que os designers devem considerá-las na avaliação e

projeção dos ciclos de vida dos produtos”, um processo que, segundo o autor,

é algo complicado e por isso exige muito estudo, testagem e experimentação.

Papanek aponta que os dados coletados nessa matriz hexagonal da função

não podem ser explicados isoladamente sem que se comprometam todas as

partes, por isso a observação simultânea dos diferentes ciclos. O autor sugere

o uso conjunto da matriz vernácula (PAPANEK, 1995, p152), figura 5, para que

sejam identificadas as interações entre esses múltiplos modificadores da teia

dinâmica das funções dos produtos, através da qual é possível ver e avaliar

cada estrutura de um artefato que flutua entre essas diversas áreas de

enfoque, e que não podem ser válidas se estudadas isoladamente. Esse é um

processo que permite ao designer desenvolver esquemas para conhecer e lidar

com a complexidade, situação que corrobora com o pensamento de Vassão

(2010, p.25) “se a complexidade pode ser conhecida isso possibilita que ela

Page 36: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

34

seja compreendida e manipulada de maneira bastante simples em camadas ou

níveis de abstração pela abordagem de Metadesign”.

Figura 5: Matriz vernácula Fonte: (PAPANEK, 1995, p.152)

Dessa maneira, esses resultados serão o fio condutor do projeto, trazendo à

luz questões dessas seis funções e outras das mais diversas como: tradição,

perfeição, uso de materiais e métodos locais, cultura local etc. e em diferentes

contextos, que se tornam referenciais frente aos projetos e novos desafios

ecológicos e sociais. Conforme Papanek (1995, p.152), é preciso recolher o

máximo de informação e iniciar uma classificação para construir uma base de

dados e assim ser possível compreender as funções, interações e a

importância delas em cada relação. Para o autor, uma questão importante é

que, quando os projetos envolvem a comunidade, essa situação exige que

essa base de dados seja decodificada de forma clara e acessível a todos:

arquitetos, projetistas, designers, comunidade local2 e sociedade em geral.

2Segundo a Lei 9.985/2000, do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o conceito de

comunidade local é compreendido como aquelas populações tradicionais com modo de vida e inter-relações sociais e materiais indissociáveis à diversidade biológica e à reprodução dos conhecimentos tradicionais a ela associados.

Page 37: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

35

No que se refere à projetar nos sistemas complexos quando os processos são

guiados pela engenharia, Celaschi (2010, p.XV) afirma que “projetar é um ato

com sinônimo de dimensionar soluções quanto a questões técnicas que

normalmente vão conduzir a soluções que serão consideradas corretas”. A

natureza da subjetividade no Design é a escolha do caminho projetual,

colocando as qualidades individuais do designer como características

fundamentais desse processo. Nesse sentido, Moraes (2010) questiona:

Mas como perceber e decodificar as mensagens recebidas em um cenário complexo e dinâmico? Como discernir os conteúdos sólidos dos frágeis em um ambiente repleto de excesso de informações? Como dosar os valores intangíveis e materiais, como a estima e a emoção, sem comprometer a fruição e o valor de uso? Como considerar os fatores subjetivos e os atributos secundários sem perder a ênfase nos fatores objetivos e nos atributos primários? Essas são questões para as quais, seguramente, não encontraremos respostas na metodologia convencional, e muito menos na elaboração de briefings, como conhecemos (MORAES, 2010, p.XX).

Nesse contexto, para Vassão (2008, p.100), quando o prefixo Meta é vinculado

a um campo de pensamento – no caso desta dissertação, Design e projeto –,

esse processo possibilita “determinar as formas perenes que sustentam as

formas variáveis do mundo observável, experienciável, sensorial, da percepção

em questão”. Pois, nesse tipo de articulação por combinação das entidades,

estas funcionam como operadores projetáveis entre si. O autor destaca que

essas ações podem promover uma série de experimentações, consideradas

Metadesign, o “projeto do processo”, gerando formas e composições

surpreendentes, que serão apontadas no discorrer da dissertação. Nesse

sentido, Bürdek (2006) afirma

Um mundo cada vez mais complexo não pode ser mais dominado pelo designer individualmente. A teoria dos sistemas foi reconhecida como disciplina importante e que poderia ser útil para o design. Ela ganha hoje uma nova atualidade, quando se procura [...] pensar o design sistematicamente, quer dizer, de forma integral e em rede (BÜRDEK, 2006, p. 256).

Então Moraes (2010), Vassão (2008) e Bürdek (2006) afirmam que a

complexidade da sociedade atual demanda novas metodologias que apontem

Page 38: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

36

métodos e possam sistematizar ações e integrar as redes de saberes e

práticas de produção:

Um modo coerente de compreender esse “projeto do processo de projeto” é como o projeto de processos e não do produto acabado, em si. Não que se despreze a concretização em um produto unitário que possa ser identificado como tal, ou que o metadesign promova uma ainda maior alienação, em uma espécie de projeto de conceitos em detrimento da realização. É justamente o contrário: reconhecer que o projeto do processo é tão uma criação, uma realização, quanto a efetivação de um processo de projeto em um objeto finalizado (VASSÃO, 2008, p.100).

No mesmo sentido, Manzini (2010, p.XI) se aproxima ao pensamento de

Vassão (2008) em Metadesign, quando afirma que o Metaprojeto surge como

uma possível referência para os cenários complexos e como linha guia para

uma fase de transição nas pesquisas e práticas projetuais, na qual não mais o

produto é colocado em evidência, mas o contexto em que esse opera ou deve

operar. No entanto, essa linha de pensamento diverge de Moraes (2010), para

quem o Metaprojeto atua como plataforma reflexiva de conhecimentos que

considera as referências materiais e imateriais, tangíveis e intangíveis,

objetivas e subjetivas, que evolvem coleta de dados territoriais, tecnológicos,

de matéria-prima local, culturas tradicionais, capacidades técnicas, sociais etc.,

sem considerar questões de caráter intersubjetivo por parte dos participantes

stakeholders nas ações.

Para Vassão (2008, p.93), o Metadesign se apresenta como abordagem de

projeto além da constituição de conhecimentos prévios para informação. Em

Metadesign, a complexidade é trabalhada a partir da formalização de entidades

emergentes nos sistemas dinâmicos e fluidos (Ibid., p.95), e a partir da análise

e articulação de ecologia de interação dessas entidades em níveis de

abstração. O que levanta uma série de questões que exigem interpretação e

trabalho conceitual (Ibid., p.100), em função de muitas definições que procuram

torná-la sinônimo de auto-poiésis (MATURANA, 1998) e como crítica social

(VIRILIO, 1996) (Ibid, p.94), exigindo uma postura de Design frente à

instrumentalidade da filosofia analítica, mas procurando se afastar de seus

critérios ideológicos fundamentais.

Page 39: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

37

Essa é uma proposição interessante para o enredo desta pesquisa, pois

podem ser fatores de referência para promover redes e relações inéditas tanto

em relação a sistemas de redes tecno-produtivas quanto a novas redes sociais,

de produção e consumo em colaboração. Questões observadas no caso

emergente da cooperativa Coopa-Roca (1981-2013), na ação projetual do

designer Walter Rodrigues (2012) na coordenação do Programa do Fórum

Inspiramais e na ação projetual do designer Jum Nakao (2008 e 2012) na

comunidade de Manicoré (AM) e “Reality Project” (2012), em conjunto com

artesões, estudantes e Senac de Fortaleza (CE), estão inclusas no item 1.1. a

seguir, pois consideram os processos dos produtos-serviços relacionados à

cultura local e às redes sociais no cenário de globalização.

1.1. Metadesign: projetar processos e Metaprojeto: o projeto do

projeto

Em inglês, a palavra design funciona como substantivo e também como verbo. Como substantivo significa “propósito”, “plano”, “intenção”, “meta”, “esquema maligno”, “conspiração”, “forma”, “estrutura básica”, significados relacionados a “astúcia” e a “fraude”. Na situação de verbo – to design – significa “tramar algo”, “simular”, “projetar”, “esquematizar”, “configurar”, “proceder de modo estratégico” (FLUSSER, 2007, p. 181). Em uma época se falava em “projeto racional”, de “síntese formal”, de “ciência de projeto”, hoje se fala de “pesquisa projetual”, de “metaprojeto”, de “concept design”, de “engendering design”, de “análise do projeto”, etc. “Adjetivar”, definir, caracterizar, precisar, decompor e focalizar são ações indispensáveis para aprofundar, melhorar e também para construir novos instrumentos de trabalho em busca de formar os futuros designers (MANZINI, 2010, p.XIV).

Segundo Bomfim (1997, p.28), o design, dado pela configuração de artefatos

de uso e sistemas de comunicação tem sua fundamentação determinada pela

práxis, um questionamento crítico oriundo do trânsito entre áreas distintas do

conhecimento. Para o autor, essa natureza interdisciplinar do design, de

origem diferenciada, dependendo do corpo teórico em que se relacionam,

classifica-se em três grandes grupos: “os métodos indutivos e experimentais,

que se desenvolvem a partir da observação da natureza”, como a física e a

fisiologia; “os métodos dedutivos, demonstrativos”, como a lógica e a

matemática; e “os métodos especulativos”, que se fundamentam através do

Page 40: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

38

consenso, como é o caso da estética (Ibid., p.33). Esses métodos, no entanto,

não são próprios do design, mas das ciências que os sustentam. Nesse

contexto, são apontadas importantes distinções:

“Metodologia” – ciência que estuda os métodos – deriva do grego “métodos” e “logos” [...]: trata da geração, adaptação de conceitos de diversos campos das ciências (matemática, física, biologia, psicologia etc.) na proposição de procedimentos lógicos, classifica os métodos aplicados no desenvolvimento do projeto em três categorias: Ferramentas, Técnicas e Métodos. Ferramentas são [...] instrumentos físicos ou conceituais, símbolos matemáticos, tabelas de logaritmos, listras de verificação etc. [...] e provêm de diversas ciências. Técnicas, [...] meios intermediários na solução de problemas, como Matriz, ‘Braisntorming’, Análise de Funções etc. E Métodos, [...] procedimentos lógicos auxiliares no desenvolvimento racional de projetos (BONFIM, 1984, p.2-14).

Para Bomfim (1984) e Morales (1989), os métodos podem ser classificados em

“Métodos de Primeira Geração ou Caixa Transparente”, e “Métodos de Caixa

Preta”. Os Métodos tipo “Caixa Transparente” representam a atividade projetual

através de uma sucessão linear de tarefas, que pretendem racionalizar todas

as operações necessárias para obter o resultado final (BOMFIM, 1984, p.16).

Os Métodos tipo “Caixa Preta” derivam da Cibernética3 e representam um

processo onde há input, atividade transformativa não descritível, e output. Ou

seja, as “atividades desenvolvidas entre o recebimento de uma tarefa e a

solução final são realizadas sem que se possa descrever precisamente cada

passo” (BOMFIM, 1984, p.20). Essas duas classes de métodos não são

excludentes e podem se alternar ao longo de um mesmo projeto: “há etapas

que podem ser plenamente explicitadas e justificadas com auxílio de ciências,

enquanto outras permanecem ainda obscuras, sujeitas a procedimentos

considerados até o momento como indutivos” (BOMFIM, 1997, p.33). No

entanto, o autor e Vassão (2010) apontam que:

Métodos são relatos descritivos ou prescritivos sobre o real e, se em um primeiro momento o sujeito cria o método, uma ótica e uma maneira determinadas de pensar e agir, no momento seguinte a persistência desta ótica e desta maneira de agir modelam a realidade e, por extensão, o próprio sujeito (BOMFIM, 1997, p.34).

3Cibernética é a ciência e teoria do controle da comunicação entre os seres vivos e as

máquinas, correspondendo à capacidade de poder ajustar alguma conduta futura em função do desempenho pretérito (WIENER, 1984, p. 33).

Page 41: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

39

A etimologia da palavra “método” indica uma origem muito próxima ao Metadesign, seu prefixo “meta” se refere ao mesmo significado do movimento de transposição e “hodos” significa “caminho” ambos do grego, assim a palavra meta indica um objetivo a ser alcançado (VASSÃO, 2010, p61).

Conforme Vassão (2008, p. 218), tentativas mais recentes para elaborar o

Metadesign como um método de projeto, ou como uma abordagem projetual

consequente, determinam-se nas potencialidades dos intercâmbios entre arte,

tecnologia digital, e projeto; mas é preciso garantir a “cultura de projeto”, não

subalterna à engenharia de sistemas, às ciências exatas, à filosofia analítica, à

tecnologia e sua ideologia subjacente.

Celaschi e Deserti (2007, p.24) definem “a cultura de projeto” compreendida

como sinônimo de “design”, e descrevem tanto a “mercadologia

contemporânea” quanto o desenho, a representação e a gestão. Como

“mercadologia contemporânea” compreende-se o conjunto de saberes que

qualificam e parametrizam os bens – objetos de troca dentro das dinâmicas

que regulam os mercados; e a “cultura de projeto” situa-se na inter-relação

entre humanidades, tecnologia e engenharia, arte e criatividade, economia e

gestão (Ibid., p.24).

Pensamento que corrobora com Bonsiepe (2011, p.13) sobre inter-relações

entre Design e sociedade, que apontam interesses e conhecimentos de áreas

diversas entre ciências sociais e ciências aplicadas. O autor destaca que os

termos Design e projeto não são homônimos ou co-extensivos, referindo-se à

projeto como dimensão antropológica da criação de artefatos materiais e

simbólicos (ciência social), enquanto Design significa um modo de atividade

projetual do capitalismo tardio (ciência aplicada), podendo estar ligado a

fatores estilísticos e processos industriais.

Nesse sentido, Vassão (2008, p.218) também aponta divergências entre os

termos Metadesign e Metaprojeto e a necessidade de posicionamento frente ao

fato, apresentando diferenças entre o termo Metadesign, relacionado à

“formalização nas suas potências e limitações”, e o termo Metaprojeto,

determinado pela “pesquisa constante em design”. Vassão (2010) coloca “o

design em um estado de constante especulação quanto às possibilidades

Page 42: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

40

futuras de seu desenvolvimento e aplicação, especificamente em design

industrial” (VASSÃO, 2008, p.218), fato que, em Metaprojeto, essa

especulação fica restrita à coleta de dados nas fases iniciais, o que faz com

que o termo meta seja tratado de maneira a não se explicitar a

instrumentalidade presente.

[...] definiremos o Metadesign a partir de três referências fundamentais: (1) o texto pioneiro de Andries Van Onck (1963) – a definição mais antiga e, talvez, a que carrega o máximo de carga operacional, ou seja, aquela que ainda pode tratar coerentemente do campo de ação do Metadesign, (2) o prefixo Meta, sua origem e percurso etimológico – seu uso nas diversas palavras em que aparece – e (3) a acepção crítica e absolutamente crucial que Paul Virilio apresenta em Arte do Motor (1996) – o Metadesign como o projeto do cotidiano, de uma esfera alienada e alienante de produção dos costumes como padrão de comportamento cujos critérios e categorias, sua validação, encontram-se além da ação de quem os vive (VASSÃO, 2008, p.94).

Pensamento que corrobora com Van Onk (apud MORAES, 2010) quando

afirma que:

O debate do fenômeno “meta”, relacionado ao design, se inicia ainda mesmo na década de 1960, quando diversos autores como Van Onck, Eco, Maldonado e Archer, refletiam sobre o conceito de metadesign: aquilo que se encontra de maneira estática nos objetos do design, é interpretado como um estado de “movimento brecado” [...] No Metadesign as linhas são como pontos em movimento. Os planos são as linhas em movimento, os corpos são como planos em movimento [...] O baricentro do interesse do metadesign encontra-se deslocado, portanto, para o estudo do movimento, enquanto design está mais interessado pela forma estática (VAN ONK apud MORAES, 2010, p.25).

Moraes (2010) explica a sua escolha pelo termo Metaprojeto:

Ao considerarmos a realidade de um “cenário complexo e mutante”, o metaprojeto, por sua vez, como por nós é abordado neste, se apresenta como um suporte possível à metodologia convencional que operava em cenário previsível e estático. Em um âmbito mais abrangente, o metaprojeto desponta como suporte de reflexão na elaboração dos conteúdos da pesquisa projetual (MORAES, 2010, p.25).

Assim, Metadesign é “um meio de construir a simplicidade a partir da

complexidade no ato projetual” (VASSÃO, 2010, p.15), no qual “O prefixo

‘meta’ aplica-se a um movimento reflexivo de auto-conhecimento para

considerar esse próprio campo de auto-reflexão” (Ibid., p.19), em um processo

dinâmico durante todo o projeto incluindo as fases de processo, finalização e

avaliação de projeto. Metaprojeto pode ser “considerado o processo dedutivo

Page 43: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

41

das fases iniciais para compor uma plataforma de conhecimentos dos

problemas para direcionar as soluções do projeto” (MORAES, 2010, p.26).

De maneira geral, as duas abordagens tratam da questão de cultura de projeto

a partir de entidades complexas e relacionadas com reflexões contemporâneas

acerca de geração de valor, cadeia produtiva, reorientação ecológica e social,

mercados globalizados (Metaprojeto – MORAES, 2010), e também percepção

da qualidade abrangendo processos colaborativos (Metadesign – VASSÃO,

2010), situação que exige, além de reflexão disciplinar, também ponderações

filosóficas e epistemológicas. Observa-se que os dois autores desenvolvem

modelos conceituais para lidar com a complexidade. Enquanto Moraes (2010)

se baliza por processos de significação linguística em cultura de massa (ECO,

1964), próximos aos utilizados no mercado para compor e representar

plataformas de dados informacionais que dão suporte ao projeto nas fases

iniciais, Vassão (2010) constitui mapas conceituais em diagramas através de

taxonomia4 e ontologia5 em níveis de abstração, que permitem classificar as

entidades e organizar ou manipulá-las nos sistemas onde a arquitetura livre

oferece a possibilidade de uma abordagem ética. Quando aproximados esses

conceitos apresentados por Vassão aos de Giaccadi (2004), com detalhes

explicitados a seguir, promove-se colaborações e interação humana em

ambientes sócio-técnicos que envolvem criatividade. No Quadro 1 a seguir,

podem ser observadas algumas características dessas diferenças e possíveis

relações entre as duas abordagens e a aproximação de Giaccardi (2004):

4 Taxonomia é a ciência que, na biologia, organiza e classifica grupos de organismos vivos.

Quando apropriadas pelas ciências da computação, a taxonomia desempenha o papel de fornecer uma infraestrutura de classificação que permita agrupar os objetos do conhecimento (Vassão, 2008). 5 Ontologia é a parte da metafísica que trata da natureza, realidade e existência dos entes,

apropriada pelas ciências da computação em Arquitetura da informação (Vassão, 2008).

Page 44: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

42

Quadro 1: Quadro sintético com principais diferenças e relações possíveis entre Metadesign

(VASSÃO, 2010 e GIACCARDI, 2003) e Metaprojeto (MORAES, 2010).

Fonte: Dos autores.

Reconhece-se que a abordagem de Metadesign, pela sua maior abrangência

de questionamentos, demonstra instrumentalidade pertinente a

posicionamentos de Design que podem estar colocados antes, durante e

depois do projeto e, por isso, em muitos momentos Metadesign aparece como

abordagem principal. Observa-se que Metaprojeto tem um campo de atuação

mais específico e disciplinar; é uma aproximação que se mostra positiva a

partir de Moraes (2010), nas questões do campo de Design de Moda sobre

mercados globalizados e mapas conceituais (ECO, 1964). Mas, em questões

que envolvem colaboração e comunidades locais, o Metadesign a partir de

Vassão (2010) e Giaccardi (2204) mostra-se uma abordagem mais adequada

por considerar fatores da própria sociedade de maneira mais geral (BATESON,

MATURANA e VARELA, 1970).

As duas abordagens são interessantes ao campo de Design de Moda,

estabelecido em uma complexa rede de relações nos sistemas produtivos e de

consumo da cadeia têxtil da Moda na contemporaneidade. Dessa maneira, a

investigação e escolha de projetos apresentados nesta pesquisa foram

orientados por essa ação auto-reflexiva frente às complexidades em processos

- mapas conceituais em diagramas

Page 45: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

43

de Design no cenário atual. Serão reconhecidas algumas semelhanças, mas

também divergências nas ações de designers nos projetos em comunidades

locais, onde se encontram os elementos inerentes na prática informal tanto de

Metadesign como de Metaprojeto. São cenários estabelecidos pelas ações

projetuais em comunidades locais a partir de materialidades e imaterialidades

específicas inseridas em perspectiva local e global nas fases da cadeia

produtiva e envolvimento social colaborativo e de forma sustentável.

Na abordagem de projetos colaborativos em comunidades locais, Vassão

(2008) aponta que, para lidar com a complexidade estabelecida coletivamente,

é crescente ser possível fazer um projeto além do par ideologicamente

estabelecido problema/solução, pergunta/resposta.

Metadesign representa uma mudança cultural a partir do projeto como "planejamento" para projetar como "semeadura". Através de práticas colaborativas e de transformação do design pode suportar novos modos de interação humana e sustentar uma expansão do processo criativo, novas formas de compreensão e planejamento com o objetivo de produzir mais sistemas abertos de interação em evolução. Ao invés de um novo modelo de design, metadesign representa um modo construtivo de design: um aprimoramento do processo criativo na convergência de "arte" e "ciência" (GIACCARDI, 2005, 15).

Para Vassão (2008), Giaccardi (2003) em sua pesquisa sobre Metadesign

apresenta um campo sócio-técnico interligado à emergência das mídias digitais

e processos criativos. Nesse sentido, Giaccardi e Fischer (2004), colocam que

“o desafio do design não é uma questão de se desvencilhar da emergência,

mas de incluí-la e fazer dela uma oportunidade para soluções mais criativas e

adequadas”, em decorrência Giaccardi (2003) aponta o Metadesign como três

estratégias:

1. "Behind: Designing Design" (Atrás: Projetanto o projeto) aborda o

Metadesign – "foca em processos e estruturas em geral, mais do que

em objetos e conteúdos. Metodologicamente, sugere métodos e técnicas

para projetar no nível meta – dimensão dinâmica dos processos".

2. "With: Designing Together" (Com: Projetando Junto) aborda o ambiente

colaborativo – "designers e usuários podem colaborar para a atividade

Page 46: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

44

de design, em suas especificidades temporais de projetar e usar –

práticas comunitárias".

3. "Between: Designing the In-Between" (Entre: Projetando o Entre)

aborda o ambiente das redes sociais – "estruturas organizacionais que

podem alterar papéis e padrões de interação – design de sistemas

sócio-técnicos" (GIACCARDI, 2003, p.339)..

A autora propõe que, nesses processos, seja possível a criação de contextos

de projetos como uma meta-estrutura de automatização de alguns estratos do

projeto, em que o conceito é de espaços de Design com base em três níveis

interdependentes de projeto, apresentando princípios de Design específicos

para cada nível identificados nas três proposições anteriores. E é a partir desta

abordagem que essa dissertação foi estruturada; no primeiro capítulo

apresentam-se os processos e estruturas dinâmicas referentes à estratégia de

"Behind: Designing Design" (Ibidem), com cenários observados na cooperativa

Coopa-Roca e ações do designer Jum Nakao junto aos estudantes de Design

de Moda no Senac de Fortaleza (2010) e na comunidade de Manicoré (2008).

No segundo capítulo são analisadas perspectivas de estratégia "With:

Designing Together" (Ibidem), nos ambientes colaborativos e práticas

comunitárias do Programa do Fórum Inspiramais (2012) na sua cadeia

produtiva têxtil e na relação com a artesã Yasmine promovidas pela ação

projetual do designer Walter Rodrigues. Nessa mesma perspectiva também

são observadas ações do designer Ronaldo Fraga (2008) junto ao Programa

Talentos no Brasil nas comunidades de Coxim (MS), São Borja (RS) e

bordadeiras do agreste da Paraíba. No terceiro capítulo são investigadas

proposições estratégicas de acordo com a abordagem "Between: Designing the

In-Between" (Ibidem), com análise do ambiente das redes sociais, estruturas

organizacionais e sistemas socio-técnicos nas ações promovidas pelos

designers Ronaldo Fraga (2010) junto à comunidade de Tucumã no Pará, do

designer Walter Rodrigues (2006) junto à comunidade do Morro das Marianas

(PB) e do designer Jum Nakao (2008 e 2010) respectivamente, junto à

comunidade de Manicoré (MA) e estudantes de Design de Moda e artesãs no

Senac de Fortaleza.

Page 47: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

45

Nessas perspectivas apontadas por Giaccardi (2003), Metadesign funciona

como um "modo de Design" em uma ideia não teleológica do Design, que a

mesma denomina como "sócio tecnologia do know-how6". Para Vassão (2008,

p.205), nessa proposição é como se a forma que controla os fluxos fosse a

Interface, sendo necessário que o estatuto da forma seja mantido distinto do

estatuto do conteúdo e que os dois não possam se misturar. Mas o autor (Ibid,

p.205) aponta: “sob a perspectiva de McLuhan, forma é conteúdo (“o meio é a

mensagem“), e assim esse estatuto seria mantido de maneira forçosa”, e então

sob a ótica de Giaccardi (2003) “o Metadesign seria um modo (e não modelo)

de design, na convergência da arte e da ciência”, o que exige um

desenvolvimento conceitual mais amplo, em que:

[...] é possível coletar nesse campo contraditório uma qualidade interessante. Talvez esteja aí a possibilidade de uma promiscuidade conceitual benéfica à liberação do processo de projeto. Por outro lado, sob escrutínio conceitual mais atento, nos parece que essas abordagens se subscrevem ao que denominamos “ideologia da informação”, que seletivamente formaliza o mundo e o desformaliza, de acordo com aquilo que pode ser oportuno a uma lógica disciplinar pré-estabelecida em outro estrato (meta-estrato) (VASSÃO, 2008, p.21).

Nesse contexto, Munari (1981, p.18) descarta que “o método projetual para o

designer não é algo absoluto e definitivo; é modificável, quando encontra

valores objetivos que melhoram o projeto”. E são positivas as convergências de

proposições de Metadesign com abordagens reflexivas nas metodologias de

Design, ampliando-se para além de projeto de artefatos, moradias ou cidades,

entendendo que a concepção de que todas as dimensões da vida

(MATURANA, 1998 e VIRILIO, 1996) podem ser projetadas. Dessa maneira,

apontam-se as ações projetuais de Metadesign em redes da cadeia produtiva

têxtil com fluxos inter-relacionados e processos colaborativos criativos

(autopoiésis) em ações de Design de Moda nas comunidades locais, casos que

serão apresentados na extensão desta pesquisa.

6 Know-how é um termo em inglês que significa literalmente "saber como". Trata-se do conjunto

de conhecimentos práticos (fórmulas secretas, informações, tecnologias, técnicas, procedimentos, etc.) adquiridos por uma empresa, organização ou profissional, que traz para si vantagens competitivas. Por exemplo, possui know-how a organização que consegue dominar o mercado por apresentar conhecimento especializado sobre algum produto ou serviço que os concorrentes não possuem. In Fran Martins, Op. Cit. p.598, Know How é uma “arte de fabricação” de indivíduo com conhecimentos processuais que devidamente aplicados dão como resultado um benefício a favor de quem o emprega.

Page 48: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

46

1.2. Projetar entre o global e o local

A identidade cultural, como sistema de representação das relações entre indivíduos e grupos, envolve o compartilhamento de patrimônios comuns como a língua, a religião, as artes, o trabalho, os esportes, as festas, entre outros. Não é fixa e imutável, mas um processo dinâmico, de construção continuada, que se alimenta de várias fontes no tempo e no espaço. No contexto de globalização, as tramas estão mais complexas e as identidades culturais têm contornos mais fluidos e relacionais. Estão sendo deslocadas, fragmentadas, como expõe Stuart Hall (1997), tornando-se uma celebração móvel. (PESQUISA ECONOMIA E CULTURA DA MODA NO BRASIL, 2011, p.13).

A ação projetual de Design de Moda em rede na cadeia de produção e de

forma colaborativa nas comunidades locais reflete os aspectos sociais e

políticos do atual momento, promovendo relações diretas e indiretas no

cotidiano das pessoas, com atuações vinculadas tanto ao comportamento de

consumo quanto aos processos em produção de artefatos. Conforme Moraes

(2010, p.7), com a globalização houve um nivelamento da capacidade

produtiva entre os países, o que promoveu produção de consumo com bens

massificados com estéticas híbridas e conteúdos frágeis, colocando em cheque

os conceitos de ética e estética, nos sentidos de comportamento social,

produtivos, meio ambiente e consumo.

Nesse contexto, para Fletcher (2011), é preciso sensibilidade e ponderação por

parte dos designers sobre como compor os objetivos das comunidades locais e

os atrativos mercadológicos. O autor aponta que, para analisar as ações de

Design nessas comunidades com valorização da cultura local tendo em vista

mercados de Moda, essa atividade precisa ser contextualizada no atual

momento de globalização, com fluxos diversos de informação, materiais,

capacidades e processos produtivos relacionados entre o local e global, que

exigem conhecimentos de Design para entender como isso acontece tanto na

macrofigura como na microfigura dos contextos, para que então

potencialidades, processos e habilidades locais necessários possam ser

identificados e promovidos. Conforme pode ser analisado no percurso da

cooperativa de artesãs Coopa-Roca do Rio de Janeiro, na comunidade da

Rocinha, ilustrada na figura 6. O grupo de artesãs é um exemplo de estrutura

organizacional em comunidade local com influências de fluxos da globalização

nas ações propostas em colaboração com grupos de artistas, designers e

Page 49: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

47

estudantes do Brasil e de diversas partes do mundo. O caso da cooperativa é

um exemplo de gestão organizacional e de estratégia de Design, analisado e

premiado por escritórios de Design e Fundações sociais de diversos países:

Figura 6: Logotipo da Coopa-Roca, vista panorâmica da cooperativa na Rocinha (RJ) e a socióloga Maria Tereza Leal, fundadora da cooperativa, recebendo prêmios da Fondation d’entreprise Kering pour la Dignité et les Droits des Femmes (2010) e da Clinton Global

Initiative (2009). Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013)

Nesse sentido, Moraes (2010, p.XXI), afirma que: “o Metaprojeto nasce,

portanto, da necessidade de existência de uma ‘plataforma de conhecimentos’

que sustente e oriente a atividade projetual em um cenário fluido e dinâmico

que se prefigura em constante mutação”. Segundo Desis (apud MANZINI,

2010, p.XIII), os processos de Design são complexas redes de interações entre

indivíduos e organizações, em escalas locais e globais, que usam de

criatividade e empreendedorismo para obter valores compartilhados.

Page 50: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

48

A ideia de atendimento simultâneo de fatores ou de requisitos projetuais não é

nova. Ela está presente na obra de outros autores, como Papanek (1995),

apresentado no item anterior desta pesquisa com seu uso das matrizes da

função e vernácula. Esse pensamento também foi colocado por Maldonado

(1990, p.11), ao afirmar que “não é com menos, mas sim com mais (e

certamente distinto) conhecimento técnico-científico que podemos ultrapassar

os aspectos negativos que o mesmo, na sua utilização, originou”. Visões que

devem conduzir a uma abordagem sistêmica que consideram o modo como os

requisitos projetuais, ergonômicos ou tecnológicos se relacionam e se afetam.

Essa compreensão, escreve Branzi (2006, p.106), coloca em questionamento a

possibilidade de inter-relação de naturezas distintas: “[...] nas grandes

metrópoles atuais apresenta-se um cenário altamente diversificado, em que

lógicas produtivas e sistemas linguísticos opostos convivem sem maiores

contradições”. Segundo Moraes (2010, p.5), “são essas lógicas produtivas e

sistemas linguísticos opostos que ajudam a configurar esta realidade de

cenário de complexidade” 7.

Na sociedade global, os processos produtivos, a fim de obterem êxito

econômico, necessitam de atualizações constantes. A sobrevivência dos

segmentos de Design de Moda em comunidades locais demanda uma

adaptação, ao invés de imposição, às diferentes culturas; segundo Black

(2012), é uma situação que envolve questões ambientais, trabalhistas, de

acordo com cada localidade, e considerações dos produtos com elementos do

local que deverão responder as expectativas globais.

Com ampliação da ideia de projeto nesses cenários de complexidade (aumento

da circulação da informação, globalização nos mercados, rede de cadeias

produtivas locais, identidade cultural, tradição local etc.), há a demanda de

métodos para gestão de desenvolvimento de produtos, que exigem alto nível

7 “À primeira vista, a complexidade é um tecido (complexus: o que é tecido em conjunto) de

constituintes heterogêneos inseparavelmente associados: coloca o paradoxo do uno e do múltiplo. Na segunda abordagem, a complexidade é efetivamente o tecido de acontecimentos, ações, interações, retroações, determinações, acasos, que constituem o nosso mundo fenomenal” (MORIN, 1991, p.17).

Page 51: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

49

de integração entre as equipes, mesmo as externas (comunidades de artesãs,

prestadores de serviços, escritórios de Design e designers free-lancers,

fornecedores de serviços, cooperativas etc.), de modo a reduzir o tempo de

tomada de decisões, minimizar erros e antecipar o lançamento de produtos no

mercado. Nesse cenário, a abordagem de Metadesign visa a refletir sobre a

legibilidade desses processos de criação e tomadas de decisão para projetar

nesses contextos, frente às questões que envolvem ética e sustentabilidade.

Isso pode ser observado no depoimento de Jum Nakao (2011), quando afirma

que:

O mundo não precisa de mais roupas, o mundo precisa de pessoas melhores. Mas como transformar as pessoas? Acredito que o caminho seja a educação e a cultura. Em moda somos todos muito iletrados, alfabetizados apenas no sentido de sermos consumidores, mas totalmente sem capacidade de leitura e interpretação. Existe uma grande diferença entre alfabetizar e educar. Tenho me dedicado à esta educação, pois de que adianta poesia se a escrita não é compreendida? (NAKAO, 2011, p.49).

Contexto em que, segundo Bomfim e Rossi (1990), a questão da Metodologia

Projetual favorece estudos sobre métodos específicos enfatizando fases ou

atividades do projeto, além de integração com diversas disciplinas não

projetuais, como a estética, implicando em ampliação do repertório dos

designers em sua prática profissional.

Dessa maneira, a proposição do projeto seria: antes compartimentada, passa a

depender da integração entre as áreas profissionais envolvidas em todas as

suas etapas, admitindo-se áreas de Ciências Sociais e Conhecimentos

Aplicados em um mesmo projeto. Na produção dos artefatos, são necessários

conhecimentos diversos relativos à técnica produtiva e simbologia cultural, que

exigem qualidades específicas dos projetistas, de acordo com as áreas de

cada fase. Além disso, oportunidades e desafios da globalização, da tecnologia

da informação e, simultaneamente, a emergência da questão ambiental, levam

às novas abordagens projetuais com o intuito de minimizar os impactos

negativos nos sistemas ambiental, econômico e social para garantir a

sobrevivência e expansão das instituições sociais e organizações industriais.

Page 52: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

50

Essas transformações no escopo do projeto estabelecem-se em propostas de

Design voltadas para além do desenvolvimento de produtos, passando-se a

discutir criticamente os processos, serviços e produção nos níveis estratégicos

das organizações (MAGALHÃES, 1997), na sustentabilidade ambiental

(MANZINI e VEZZOLI, 2002), na visão estratégica nos negócios (SANTOS,

2000; MARTINS e MERINO, 2008) e na preocupação com a sistematização do

processo de desenvolvimento de produtos (ROOZEMBURG e EEKELS, 1995;

BAXTER, 1998; ULRICH e EPPINGER, 2008).

Dessa maneira, pelo aumento das etapas e do número de participantes, a

divisão dos problemas em subproblemas passou a não ser suficiente, de modo

que, para o projeto ser levado a bom termo, é necessário que sejam

explicitadas e abordadas as relações (vínculos, associações, dependências

entre os sistemas em redes relacionados à produção, consumo, colaboração,

etc.) entre os elementos desse cenário complexo. Cenário em que, conforme

Kazazian (2005), para um resultado positivo é necessário reconhecer que

todos os participantes estão em um sistema de interdependência e um

problema em uma das fases do projeto pode desencadear demandas para

outros colaboradores, participantes, e/ou usuários do sistema.

Segundo Valiati (et al., 2011), o sistema que regula a cadeia produtiva da Moda

atravessa um período de mudanças devido ao processo de globalização e à

abertura de novos mercados. Há ainda o deslocamento da produção em

decorrência dos altos custos operacionais; a exasperação da concorrência; a

redução do ciclo de vida dos produtos de Moda; o incremento veloz das

tecnologias e as modificações complexas na estrutura dos mercados, cenário

descrito por Black (2012):

A cadeia de suprimentos da moda é longa e complexa, abrangendo matérias-primas distribuídas em todo o globo, produtos acabados e venda. Mais de 40 milhões de pessoas em todo o mundo participam na confecção de vestuário e têxteis, em muitos países em desenvolvimento que dependem em grande parte das exportações de vestuário para a renda. A indústria da moda representa, apesar de alguma automação, uma das poucas indústrias em que restam artesãs onde as habilidades manuais individuais ainda desempenham um papel significativo (BLACK, 2012, p.139).

Page 53: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

51

A abordagem reflexiva sobre os processos conceitua o contexto dos cenários,

considerando fatores produtivos, criativos, sociais, materiais, imateriais,

mercadológicos, ambientais, de usabilidade, distribuídos em cadeias e redes

de valor etc. Esse tipo de gestão de Design não produz output de um modelo

projetual único com soluções técnicas pré-estabelecidas, mas se amplia em um

conjunto de atividades compreendidas em sua concepção, de maneira que a

forma e as funções contidas no produto tornam-se o ponto de partida e não o

fim do projeto. Para Moraes (2010, p.18) “no cenário atual a forma dos

produtos não é mais uma questão objetiva e funcional estando ligada aos

fatores semânticos, psicológicos e subjetivos, e a função está em satisfazer

necessidades primárias, secundárias, objetivas e subjetivas dos usuários”.

Nesse sentido, levando em consideração a forma e função do produto/serviço,

o designer conceitua cenários possíveis para localizar neles as linhas guias

dos problemas, buscando sintetizar de maneira reflexiva etapas do projeto de

acordo com cada cenário. Assim discorre Marconi e Lakatos (apud MORAES,

2006)

Portanto, as coisas não são analisadas na qualidade de objetos fixos, mas objetos em movimento: nenhuma coisa está ”acabada”, encontrando-se sempre em vias de se transformar, desenvolver. O fim de um processo é sempre o começo de outro, as coisas não existem isoladas, destacadas uma das outras, e independentes, mas como um todo unido, coerente (MARCONI; LAKATOS apud MORAES, 2006, p.2).

Segundo Moraes (2010), o metaprojeto antecede o ato projetual, caracteriza-se

por uma análise anterior à fase projetual com reflexão crítica sobre o próprio

projeto a partir do cenário contextual relacionado ao objeto central e seus

fatores produtivos, tecnológicos, mercadológicos, materiais, ambientais,

socioculturais e estético-formais. Moraes (2006) destaca:

Considerada a aplicação dos princípios do metaprojeto, e de posse dos resultados das análises efetuadas, deve ser elaborado um quadro conclusivo, onde vem apresentado as principais características para uma “nova proposta conceitual (concept) ou análise corretiva (diagnose)”, no desenvolvimento ou redesenho do produto proposto. Onde a aplicação do metaprojeto é, portanto, uma síntese do esforço empreendido na decomposição e decodificação dos cenários possíveis, procurando por fim, promover uma maior e melhor qualidade dos artefatos (MORAES, 2006, p.8).

Page 54: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

52

De acordo com esse pensamento, Scaletsky e Parode (2008) afirmam que a

etapa metaprojetual é uma fase de diagnóstico que busca estabelecer

coerência e ligações produtivas para que seja possível iniciar a fase de projeto

de modo mais seguro e eficiente. Quanto ao problema de projeto e

direcionamento das ações no processo de Design, essa etapa caracteriza-se

por possibilitar questionamentos e reflexões acerca do objetivo do projeto,

estabelecendo uma proposição de resultados objetivos e conceituais. Para

Franzato e Celaschi (2012), a etapa metaprojetual apresenta-se em quatro

fases distintas: entrada, pesquisa contextual, pesquisa aberta e sistematização,

caracterizadas por análises e questionamentos. Após a etapa metaprojetual,

inicia-se a etapa projetual através da geração de alternativas, finalização e

avaliação. O que diferencia esse método é a abordagem analítica e

investigativa, e a pesquisa contextual no universo da empresa, produto, usuário

e mercado.

Celaschi e Deserti (2007) colocam que Metaprojeto é a fase de observação da

realidade e modelação sintética da mesma que contém o esforço do designer

em analisar e conhecer o campo problemático no qual deve atuar. E por tal

razão, essa etapa é ligeiramente anterior à fase de transformação da realidade,

definindo-se o percurso do projeto diante da inserção em um contexto

específico de recursos, prazos, momento histórico, natureza etc. O Metaprojeto

apoia-se na reflexão constante sobre a definição dos problemas pela

investigação e análise a partir dos objetivos e demandas projetuais, conforme

ilustra a figura 7

Figura 7: Etapas do problema de projeto Fonte: Adaptado de Best (2006)

Page 55: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

53

Para o Design de Moda, essa proposição é interessante, pois pode promover

mudanças positivas nos métodos processuais ao incorporar os contextos

específicos como parte das soluções projetuais, que podem ser de cunho

ambiental e/ou pela rede de fornecedores distribuídos, como no caso das

cadeias produtivas descentralizadas em escala global. Nas ações com

artesãos em comunidades locais, como nos casos dos designers Walter

Rodrigues, Ronaldo Fraga e Jum Nakao, a proposição projetual precisa ser

simultânea ao acontecimento dos processos colaborativos, o que implica não

em atualização, mas em constância.

Os designers de moda fazem escolhas, baseados principalmente em critérios estéticos ou financeiros. Na tentativa de avaliar o impacto ambiental, eles têm de negociar acerca de diversos fatores, tais como os custos de transporte de peças de vestuário e suas matérias-primas em relação ao impacto que a eliminação das vestes (BLACK, 2012, p.95).

Conforme os autores, a possibilidade da escolha de materiais e de processos

compor conhecimentos reflexivos prévios pode auxiliar no desenvolvimento de

projetos. Nesse sentido, Scaletsky e Parode (2008) e Franzato e Celaschi

(2012), apontam que o Metaprojeto estabelece a lógica de fases preliminares

necessárias de pesquisa para análise do problema para uma posterior

investigação de solução. Assim, a partir do pressuposto de Best (2006), figura

8, lê-se que a etapa de Metaprojeto ocorre desde o inicio até a fase de

sistematização. Após, tem início a etapa de projeto, seguindo a lógica do

processo de Design, e por isso alguns autores como Moraes (2010, p.25)

também o denominam como “o projeto do projeto”. Dessa forma, inseriu-se ao

proposto por Celaschi e Deserti (2007), conforme a figura 8, as etapas

metaprojetuais.

Page 56: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

54

Figura 8: Esquema sistêmico do desenvolvimento do processo metaprojetual e projeto no processo de Design

Fonte: Adaptado de Celaschi e Deserti (2007)

Segundo Celaschi (2010, p.XV), no método metaprojetual o designer

posiciona-se “como ator primário do projeto e suas características pessoais

constituem parte fundamental do processo. Assim, substituir o designer

Page 57: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

55

significa seguramente obter um resultado diferente”. O autor considera que o

Metaprojeto caracteriza-se pelas observações do entorno – indivíduos,

contextos de uso e de trocas sociais – e pela construção de modelos

simplificados. Destacam-se nessas duas fases, as qualidades e o caráter do

designer como fundamentais, na medida em que seu repertório cultural é

fundamental na fase de observação do entorno, tornando-o capaz de

reconhecer fenômenos dos mais diversos relacionados aos processos

produtivos em sistemas de cadeias de produção e redes de colaboração em

comunidades; e exigindo capacidade de conhecer e praticar de modo integrado

diferentes linguagens de representação – visual, sonora, impressa, audiovisual

– que serão também fundamentais para construir os modelos de síntese.

No cenário de Design de Moda contemporâneo, atua-se em meio às

contradições de um mercado competitivo e globalizado, com questionamentos

quanto à sua cadeia produtiva no que se refere à sustentabilidade dos

sistemas econômico, ambiental e social. Segundo Black (2012, p.92), foi

apenas durante a última década que a consciência das questões ambientais e

éticas no Design de Moda traduziu-se em ações combinadas e visíveis por

parte dos designers; a cadeia produtiva, que antes baseava-se em confiança

com poucos participantes, hoje, devido à complexidade desse sistema,

demanda por desenvolvimento de métodos para uma melhor integração das

redes nos sistemas de processos produtivos e consumo como redes de

fornecedores de matéria prima, redes de processos sócio-técnicos, redes

colaborativas em comunidades locais, equipes de Design etc.

Nesses cenários, Giaccardi (2005, p.15) aponta que Metadesign pode ser visto

não apenas como uma abordagem de projeto informando a metodologia

durante o seu desenvolvimento, mas também pode promover práticas

colaborativas em sistemas e cadeias de processos, evocando novos modos de

interação humana. E por que não pensar, conforme Giaccardi e Fisher (2004),

que pode ser processo de criação? Como, por exemplo, pode ser observado

nas novas relações promovidas para artesãos e estudantes na ação projetual

de Jum Nakao (2012), em conjunto com o Senac de Fortaleza (CE). O designer

idealizou o “Reality Project”, no qual deveriam ser confeccionadas vinte

Page 58: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

56

propostas de vestuários a partir de técnicas, materiais, tradições e conceitos da

cultura nordestina para serem apresentadas durante o Dragão Fashion Week

Brasil8 (2012). O projeto consistiu em um evento no qual o público presente e

espectadores via web poderiam acompanhar em tempo real o processo de

criação que ocorria entre os participantes, dispostos em uma estrutura

transparente durante o prazo cinco dias do evento (figura 9). Essa ação exigiu

que Jum Nakao (2012) elaborasse uma estrutura de projeto que diz respeito a

espaço físico e sensorial, com disposições e normas de conduta para promover

a interação entre os participantes da ação criativa. Assim, artesãos e

estudantes de Design de Moda tinham como objetivo fazer emergir nessa

atividade processos de criação e produção que levassem a resultados com

traços que referenciassem materiais, cultura e tradição locais desses

participantes e também do próprio território local – a região nordeste.

Figura 9: “Reality Project”, ação projetual Jum Nakao (2012), estudantes e artesãos. Fonte: (JUMNAKAO.COM, 2013)

8 Semana de Moda da região nordeste do Brasil. Um evento da indústria de moda local, com

duração de aproximadamente uma semana, permite designers e produtores de moda em geral

mostrem suas últimas coleções. Fonte: (http://dfhouse.com.br/2013/dragao-fashion-brasil/)

Page 59: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

57

Reforçando esse pensamento, Giaccard e Fisher (2004) descrevem, na tabela

1 a seguir, as comparações entre método tradicional e o que a autora adjetiva

como Metadesign, favoráveis a esses sistemas abertos:

Tabela 1: Tabela comparativa entre características do Design tradicional e do Metadesign Fonte: Adaptado de Giaccardi e Fisher (2004).

Proposições desse contexto podem ser observadas também nos projetos de

Design de Moda em colaboração com comunidades locais que agenciam a

produção de artefatos (peças de vestuário) e as qualidades incorporadas em

etapas distribuídas pela cadeia produtiva, em cenários de sistemas ambientais

e sociais, que se apresentam interdependentes e em constante transformação.

Isso pode ser observado na ação de Walter Rodrigues (2013) no Programa do

Fórum Inspiramais, na figura 10 (iniciativa da Assintecal9, que terá detalhes

analisados no capítulo 2), em que o designer coordena fluxos de informação e

processos na cadeia produtiva têxtil com stakeholders participantes distribuídos

em diversos estados do Brasil, assim cada componente pode ser desenvolvido

com peças separadas e em regiões diferentes. O designer promove também

ações projetuais em comunidades locais de artesãs (questões que terão mais

detalhes analisados nos capítulos 2 e 3 desta dissertação):

9 Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos.

Page 60: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

58

Figura 10: Peças e componentes desenvolvidos por stakeholders participantes do Fórum Inspiramais (2013), coordenado por Walter Rodrigues.

Fonte: (INSPIRAMAIS.COM.BR, 2013)

Nesse contexto, segundo as características apontadas por Giaccardi (2005), o

Metadesign torna-se um espaço aberto de negociações que incorpora o

contexto (entidades emergentes) como parte da solução, e não como um

esforço de contê-lo. Os projetos de designers com comunidades colaborativas

sugerem-se como esse espaço compartilhado entre atores sociais – sem a

obrigação de etapas e resultados definidos previamente com a construção de

soluções diversas e adaptações constantes. Segundo Vassão (2008), para que

esse tipo de ação seja projetada conforme a abordagem de Metadesign

proposta pela autora, é necessário que o sistema esteja em constante

interação entre os participantes das ações, como apontado na coordenação

projetual do designer Walter Rodrigues (2012) na cadeia produtiva têxtil do

Fórum Inspiramais (2012), com fluxos de informações e processos distribuídos

entre os stakeholders.

Para Moraes (2010), a abordagem Metaprojetual se estabelece nas fases

iniciais para compor a plataforma de conhecimentos que irá guiar a ação do

designer, em movimento bresado10 frente aos objetos estáticos de Design em

geral (VASSÃO, 2008); enquanto o Metadesign para Giaccardi (2005) se

10

Aquilo que se apresenta de maneira estática nos objetos de Design é interpretado como um estado de “movimento bresado”; [sic, fresado]. No Metadesign é o estado de solidificação de um material que segue o estado de suspensão num meio coloidal (VASSÃO, 2008, p.96).

Page 61: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

59

apresenta essencialmente durante as ações de interação em processos

colaborativos, ou seja, essas atividades que envolvem sistemas sócio-técnicos

caracterizam-se necessariamente pela manipulação direta ou indireta das

ações dos participantes e agenciamentos de possíveis relações que

acontecem em uma meta-estrutura negociada no espaço social (VIRILIO,

2000) de todos os stakeholders envolvidos.

Ações projetuais nesse sentido podem ser observadas na ação de Jum Nakao

(2008) em Manicoré (AM), em um projeto que envolve famílias de artesãos de

comunidades locais (figura 11). Aqui, considerar os contextos e cenários

significa contemplar culturas, saberes e tradições com integrantes diversos,

ficando difícil mensurar valores que possam ser plausíveis em proposições

projetuais nesse tipo de avaliação. Giaccardi (2005, p.15) aponta que através

de práticas de Metadesign podem-se constituir projetos que suportem modos

de interação humana, sustentando a expansão do processo criativo.

Segundo Manzini (et al., 2007), é possível nomear essas ações locais como

comunidades criativas, pois, como grupos organizados, procuram a solução e

criação de novas possibilidades para problemas comuns com soluções mais

promissoras quando as interações são do tipo bottom-up (MANZINI, 2008,

p.75). Um exemplo é o projeto Creative Communities no item “Collaborative

Services: Family-like Services”, quando as donas de casa criam sistemas para

levar e/ou buscar as crianças na escola. No entanto, a longo prazo, essas

ações se disseminam mais facilmente quando as interações acontecem

segundo o tipo top-down e peer-to-peer (Ibid, p.83). Para o autor, a partir de

um processo de construção colaborativa é possível elaborar conhecimento,

garantindo a promoção da sustentabilidade social e ambiental em situações do

cotidiano, em movimentos de ações sociais e/ou cooperativas, mas isso

depende de mecanismos complexos de interação entre os participantes (Ibid,

p.75). Assim, o designer precisa identificar contextos locais nos quais

reorientações sociais e materiais possam ser aplicadas como ações

facilitadoras – inovações, como as ações de Jum Nakao (2008) em Manicoré

(AM). (Os detalhes do projeto serão apontados no capítulo 3 desta

dissertação).

Page 62: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

60

Figura 11: Artesãos de Manicoré (AM), comunidade das ações de Jum Nakao (2008). Fonte: (JUMNAKAO.COM.BR, 2013)

Para Brown (2010), algumas dessas atividades em comunidades locais que

articulam Moda e sustentabilidade caracterizam-se como ação social e política

e, portanto, assumem um papel questionador – como o da Arte –, ao criticar

condições da sociedade na atualidade. O Design, baseado em instrumentos,

conhecimentos e métodos, procura reordenar os processos produtivos e de

distribuição com as demandas de grupos interessados. Assim como acontece

nas ações na cooperativa de artesãs Coopa-Roca, que promovem a

articulação destas em contextos de circuitos de desfiles de Design de Moda e

Exposições de Arte em níveis nacional e internacional. Isso evidencia as

potencialidades das artesãs no valor de seus conhecimentos tradicionais no

cotidiano da comunidade, e também a situação precária das cooperadas frente

às condições de sobrevivência na comunidade da Rocinha (RJ).

Nas ações há o intuito de compor conhecimentos e expertises distintos – Arte,

Moda, Design e tradições das comunidades –, adequando o produto local ao

mercado global, mas procurando manter os aspectos específicos das técnicas

manuais da cultura local, como pode ser observado na figura 13, nas propostas

Page 63: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

61

desenvolvidas em colaboração pelas artesãs da Coopa-Roca, artistas e

designers de Moda para um desfile no Ateliers de Paris, em 2005.

Figura 12: Desfile Coopa-Roca no Ateliers de Paris (2005) Fonte: (FRANCEBRAZIL.COM/FASHION, 2013)

Essas ações, quando visam o mercado, não são facilmente geridas, pois, como

Fletcher (2011, p.110) escreve, “artesão, arte e economia ocupam mundos

diferentes e, portanto, têm objetivos diferentes – um espiritual e outro

mundano”. Assim, é preciso sensibilidade, ética11 e ponderação por parte dos

designers, para compor os objetivos das comunidades locais com as

demandas mercadológicas e resultados estéticos desejados.

A estética é tida como um reflexo do comportamento do homem enquanto ser social, aqui entendido como grupo coletivo, das apreciações referentes à conduta humana, isto é: a ética que acaba por influenciar a estética da nossa cultura material. Pode-se dizer então

11

Ética s.f. 1. Filosofia. Disciplina que procura determinar a finalidade da vida humana e os meios de alcançá-la, preconizando juízos de valor que permitem distinguir entre o bem e o mal; 2. Princípios morais por que um indivíduo rege a sua conduta pessoal ou profissional; código deontológico; 3.Moral; 4. Ciência da moral. Do grego éthiké (epistéme), “a ciência relativa aos costumes”, pelo latim ethica (Fonte: Grande Dicionário de Língua Portuguesa, Porto Editora, 2004).

Page 64: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

62

que exista uma estética militar, indígena ou eclesiástica, por exemplo, fruto da sua ética e do seu comportamento (MORAES, 2010, p.74).

Nesse sentido, Papanek (1971) levanta fortes debates sobre a ética no Design,

invocando a responsabilidade para os designers de projetar soluções para o

mundo real, apontando que tudo pode ser intervencionado pelo Homem

através da prática do Design para a criação de uma ordem significativa, seja

esta motivada por ação consciente, analítica, ponderada ou mesmo intuitiva.

Essas perspectivas descrevem que projetar, segundo Papanek (1995), exige

postura e conduta ética e destaca importantes questões como:

– 1. O código de ética serve apenas os seus próprios interesses?

– 2. O código de conduta protege realmente o público?

– 3. O Design do projeto responde às necessidades humanas além das

demandas de funcionalidade e aspectos estéticos?

– 4. O projeto responde às demandas dos mercados considerando a função

social do Design na sociedade?

– 5. O processo/produto/serviço, contexto de uso, consumo ou descarte desses

causa algum dano ao ecossistema ambiental, ou interfere na cultura local?

– 6. Os não membros/projetistas/usuários podem optar sobre as escolhas de

projeto?

– 7. As regras/etapas/escolhas/contextos/cenários e questionamentos dos

processos são colocados de forma clara a todos membros e não membros do

projeto?

Papanek (2000) aponta os designers como profissionais responsáveis pelo

futuro de uma coletividade (massa) e, portanto, capazes de causar importantes

e profundas alterações no mundo através do seu trabalho. Defende que as

suas responsabilidades morais e sociais devem estar presentes em todo o

percurso do projeto, e que a responsabilidade em relação às consequências da

criação, produção, processo social, descarte etc. de um

produto/serviço/sistema deve ser compartilhada com todos os stakeholders.

Assim, a ação que vai reger a conduta do projeto é fruto de um conjunto moral

com caráter social (ethos) de um coletivo com costumes, culturas, hábitos e

valores determinados na própria sociedade. Dessa maneira, para analisar as

ações de Design de Moda nessas comunidades tendo em vista a valorização

Page 65: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

63

da cultura local e os mercados de Moda, esta atividade precisa ser

contextualizada no atual momento de globalização e particularidades locais.

Há alguns anos atrás, dizia-se que a globalização iria destruir as diferenças locais, homogeneizando o espaço e a sociedade. Hoje, o debate não se coloca mais nestes termos. Tanto as peculiaridades locais, os localismos, os regionalismos emergiram deste global, quanto a própria globalização econômica passou a valorizar as diferenças dos lugares, fazendo desta diferenciação um atrativo para o capital (LUCHIARI, 1998, p.16).

Para Fletcher (2011, p.110), “trabalhar com artesãos faz que todos esses

elementos se relacionem com os processos de design de forma imediata e

vital”. Para a autora, os artesãos desconhecem as regras de mercado e as

preferências dos consumidores, enquanto o designer pode propor à

comunidade local composições – articulando entre a cultura tradicional e as

especificidades das culturas globalizadas. Parece possível desenvolver

produtos que expressem as tradições dos artesãos e, ao mesmo tempo, se

ajustem a novos estilos de vida do mercado. Como pode ser observado nas

propostas desenvolvidas pelas artesãs da cooperativa da Coopa-Roca em

parceria com designers de Moda de marcas conceituadas, como Osklen e

M.Officer (figura 13).

Figura 13: Peças confeccionadas pela Coopa-Roca com as marcas Osklen e M.Officer. Fonte: (COOPA-ROCA.ORG.BR, 2013)

Page 66: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

64

Segundo De Carli (2012, p.173), “conhecer a história de cada lugar e seus

particularismos culturais, tradições e técnicas cultivadas de geração em

geração, permite valorizar e vislumbrar o chamado genius loci, expressão latina

que significa o talento do lugar”. Morace (2009, p.15) defende essa expressão

como “o motor primeiro de uma globalização ‘sadia’: aquela que ao lado do

caráter dos indivíduos, considera o caráter dos lugares”. Nesse cenário,

Bonsiepe (2011), aponta que:

O uso de recursos locais (motivos gráficos, combinações cromáticas, materiais e processos de produção intensivos em mão de obra) em relação ao Design e à Identidade podem ser vistos, de maneira exemplar, em países periféricos. Em grande parte essas atividades pertencem ao setor informal da economia e geralmente aplicam processos simples e não intensivos de capital. (BONSIEPE, 2011, p.64).

Esse patrimônio cultural do lugar é formado pelas práticas do cotidiano –

técnicas e tradições. Krucken (2009, p.32) reconhece-as pelo conceito de

“terroir”, que significa “o produto, o território e a sociedade que o produz” e “o

espaço geográfico no qual os valores patrimoniais são fruto de relações

complexas das características culturais, sociais, ecológicas e econômicas,

tecidas ao longo do tempo”. Pensamento também de Bonsiepe (2011), quando

afirma que há muitas questões incluídas nos projetos que envolvem a

cooperação com artesãos:

Além dos problemas da subsistência, a relação com o ambiente e a natureza tem um papel importante para o artesanato. Os motivos da flora, fauna e astronomia servem como ponto de partida para lendas e tradições que depois se materializam nos produtos. A destruição do ambiente e a eliminação de animais e plantas são uma ameaça para a continuidade dessa cultura. Por isso a ecologia não é somente uma questão <bio-físico-química>, mas uma questão cultural de importância fundamental para a permanência e o desenvolvimento dos artesãos (BONSIEPE, 2011, p.78).

No cenário atual, o setor de Design de Moda tem passado por profundas

alterações pelo efeito da mundialização, confrontando-se com fluxos de trocas,

que vão da escala local para global e vice-versa. Nesse sentido, é importante

destacar que essa relação “é o resultado de um feixe de relações que soma as

particularidades (políticas, econômicas, sociais, culturais, ambientais) às

Page 67: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

65

demandas do global que o atravessa” (LUCHIARI, 1998, p.16). Conforme

aponta Ortiz (2009):

O processo de mundialização é um fenômeno social total que permeia o conjunto das manifestações culturais. Para existir, ele deve localizar-se, enraizar-se nas práticas cotidianas dos homens, sem o que seria uma expressão abstrata das relações sociais. Com a emergência de uma sociedade globalizada, a totalidade cultural remodelada, portanto, sem a necessidade de raciocinarmos em termos sistêmicos, a ‘situação’ na qual se encontravam as múltiplas particularidades (ORTIZ, 1994, p.31).

Para Avelar (2009, p.81), “a cultura global é carregada de um fluxo contínuo de

signos e significados”, assumindo formas distintas e pluralizadas em

decorrência da miscigenação cultural. Dessa maneira, “a ‘diferença’ é algo

complexo que pode ser compreendida de muitas maneiras” (Avelar, 2009, p.86)

e ser estabelecida em comportamentos de origem mais conservadora com

“rejeição enfática às diferenças”, sendo que aquilo que é diferente acaba por se

afirmar sobre a diferença. Ou em um discurso mais igualitário, onde há o

“respeito às diferenças” e não se pretende estabelecer o discurso do que seria

o óbvio – a igualdade e a homogeneização –, há uma “aceitação das

diferenças”. Para Castells (1999), essas interações são uma consequência do

processo de hibridação cultural dentro de uma coletividade, que ocorre dentro

de um padrão do reconhecimento ou não reconhecimento do outro, em

decorrência de uma comunicação efetiva ou não. Alguns desses contextos

relacionais podem ser observados no caso da cooperativa Coopa-Roca, onde

essas interações se estabelecem de forma complexa, e os participantes são

colocados em modo a interagir na zona de conflitos das diferenças. Como pode

ser observado na ilustração do gráfico 1, organizado a partir do modelo de

Franzato e Celaschi (2012), nos quais os contextos relacionais das diferenças

são colocadas em contraponto:

Page 68: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

66

Gráfico 1: Contextos relacionais Copa-Roca. Fonte: Adaptado de Franzato e Celaschi (2012).

A Moda antecipa esse movimento híbrido por sua capacidade de identificar

grupos sociais e incorporá-los ao exercitar a prática projetual na dinâmica da

própria coletividade. Nesse sentido, os pensamentos de Fletcher (2011) e

Luchiari (1998) corroboram essa ideia:

Os designers que trabalham diretamente com artesão do campo devem tornar-se “biculturais”, capazes de alcançar um equilíbrio entre as considerações acerca de ornamentos e as expectativas, realidades e potenciais de pessoas e organizações envolvidas (FLETCHER, 2011, p.110). As práticas de consumo atuais conjugam o café expresso, o fast-food, os equipamentos eletrônicos, as marcas dos carros e as grifes das roupas aos souvenires locais, ao artesanato, aos remanescentes florestais e culturais. Esta é a realidade em que vivemos. Ela é híbrida (LUCHIARI, 1998, p.18).

Não é rara a associação entre globalização e homogeneização ou

padronização, uma consequente transformação do lugar pelo enfraquecimento

de identidade e da perda de singularidades. A Moda tem sido apontada nesse

processo exercendo diferentes papéis, dependendo do enfoque que lhe é

dado. Ela pode ser fator homogeneizante, quando se fala de processos de

criação de símbolos e imagens globalizados, como nas cadeias de lojas com

Page 69: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

67

rede internacionais pela proliferação do mesmo padrão de atendimento e

serviço. Em contrapartida, pode disseminar um fazer artesanal de tradição local

em nível global, como nas ações dos designers e artistas plásticos em

colaboração com as artesãs da cooperativa Coopa-Roca e nas ações do

designer Jum Nakao (2008), que serão analisadas no item a seguir, e outros.

Nesse contexto, em contrapartida à globalização e cosmopolitismo emerge a

tendência de acirramento de identidades12 coletivas, “que seguem os contornos

pertinentes à cada cultura, bem como às fontes históricas da formação de cada

identidade”, incluindo-se movimentos de resistência de crença religiosa, da

nação, da etnia, da família, e outros (CASTELLS, 1999, p.17). Onde ”uma

maior globalidade corresponde a uma maior individualidade” (SANTOS, 1996,

p.252), compreende-se a crescente valorização das tradições de comunidade

locais em nível global.

Para Castells (1999, p.22), identidade é “a fonte de significado e experiência de

um povo, […] processo de construção de significado com base em um atributo

cultural, um conjunto de atributos culturais inter-relacionados, que prevalecem

sobre outras fontes de significado”. Para o autor, o exercício de resistência

comunal identifica na “comunidade local” um processo de valorização de

tradições culturais no cotidiano das mesmas. O fenômeno da globalização

pode promover a valorização e a divulgação das diferenças culturais, sociais,

étnicas, históricas, geográficas etc., e a emergência de novos fatores

relacionados com o pertencimento a alguma identidade local. A sobrevivência

dos segmentos de Design de Moda em comunidades locais demanda uma

adaptação às diferentes culturas ao invés de imposição, em questões que se

concentram em técnicas artesanais e conhecimentos tradicionais. Conforme

12

“A palavra identidade vem de idem (versão latina do grego tó autò, “o mesmo”), que resulta no latim escolástico identitas, permanência do objeto, único e idêntico a si mesmo apesar das pressões de transformação interna e externa. Identidade – ou conformidade, por semelhança ou igualdade, entre coisas diversas – é, assim o caráter do que se diz ‘um’, embora seja ‘dois’ ou ‘outro’, por forma e efeito” (SODRÉ, 1999, p.33). “Seja pessoal ou nacional, a identidade afirma-se primeiro como um processo de diferenciação interna e externa, isto é, identificação do que é igual e do que é diferente, e em seguida como um processo de integração ou organização das forças diferenciais, que distribui os diversos valores e privilegia um tipo de acento” (SODRÉ, 1999, p.45).

Page 70: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

68

Bonsiepe (2011), é preciso atenção ao identificar padrões culturais relativos às

tradições e território local. Ele destaca:

[...] Frequentemente a produção artesanal é compreendida de forma reducionista ou limitada, em virtude de uma visão puramente estético-formal. Isso pode ser explicado usando-se o exemplo dos patterns de losangos aplicados em produtos têxteis, cerâmicos, cabaças e de madeiras [...] contatam-se visíveis dificuldades de interpretação desses patterns [...] com interpretações erradas por pessoas vindas de fora e não familiarizadas com a cultura local [...] Para compreender o significado recomenda-se fazer uma lista das suas diferentes manifestações (BONSIEPE, 2011, p.64).

É uma proposição interessante para identificar elementos nas tradições e

território locais. Vassão (2010) traz a padronização na abordagem de

Metadesign,:

Os patterns são considerados atualmente um modo muito acessível de compartilhar-se soluções de projeto de modo ágil e colaborativo. [...] Tais patterns seriam abstrações das soluções para os problemas levantados, independentes da linguagem específica em que seriam, por fim, programados. [...] permite trabalhar os problemas por meio de padrões aproximados, acessíveis cognitivamente ao programador, independente do seu nível de conhecimento – ampliando as vias de colaboração entre profissionais dos mais diversos extratos (VASSÃO, 2010, p.108).

Dessa maneira, o designer observa dos cenários, colhe informações e cataloga

de maneira eficiente os padrões materiais e imateriais, que envolvem, por

exemplo, algum material específico do território, alguma tradição ou saber

expressos na cultura local para posteriores propostas de projeto. Algumas

dessas questões serão analisadas no item a seguir, nas ações emergentes da

cooperativa de artesãs Coopa-Roca e do designer Jum Nakao (2008) na

comunidade de Manicoré (AM). Outras serão abordadas no cápitulo 3, que traz

ações de Design em redes colaborativas locais.

Page 71: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

69

1.3. Contextos históricos para construção do cenário emergente

Algumas das ações de Design de Moda por meios colaborativos em

comunidades locais podem ser observadas nos processos de projetos de três

designers brasileiros: Walter Rodrigues, Ronaldo Fraga e Jum Nakao. Esses

designers, entre os anos de 2002 a 2013, foram convidados pelo Museu do

Objeto Brasileiro, por fundações como o Sebrae13, Senai14, Senac15, Vale16, e

pelos Programas Talentos do Brasil17 e Fórum Inspiramais da Assintecal18 a

participar de projetos para apoio e valorização da atividade artesanal e fomento

dos talentos locais. Segundo os dados das propostas e dos projetos dos

designers citados, a realização dessas ações tem como objetivo o

desenvolvimento de artefatos em colaboração nas comunidades, com a

proposta de levar princípios de Design para as artesãs, potencializando

elementos da cultura local e práticas artesanais para desenvolver produtos de

mercado.

Proposições como essas aconteceram com mais força entre os anos de 2005 e

2008, mas desde 1982 pode-se citar como exemplo emergente o caso da

Cooperativa de Artesãs Coopa-Roca. Este é um caso de um sistema complexo

em si, com ações negociadas no meio social, um Metameta-espaço social

(VIRILIO, 1996), formalizado a partir dos modos de conduta – alguns impostos

pelos costumes tradicionais, outros pelas tecnologias, mas também pela

superestrutura ideológica que emerge da própria sociedade (VASSÃO, 2008).

A Coopa- Roca é um exemplo positivo de meta-estrutura social emergente que,

ao ter observadas e compartilhadas as emergências identificadas nesses

13

Sebrae: Agência de apoio ao empreendedor e pequeno empresário. www.sebrae.com.br 14

Senai: Serviço nacional de aprendizagem industrial. www.portaldaindustria.com.br/senai 15

Senac: Instituição de educação profissional aberta a toda a sociedade, com a missão de desenvolver pessoas e organizações para o mundo do trabalho. www.senac.br 16

Vale: Fundação que procura fortalecer o capital humano e contribuir para o desenvolvimento social e econômico das comunidades, potencializando os investimentos sociais da Vale. www.fundacaovale.org 17

Talentos do Brasil - Iniciativa do Ministério do Desenvolvimento Agrário com o objetivo de estimular a troca de conhecimentos entre designers e artesãos, valorizando a identidade cultural das mulheres manufatureiras, com o objetivo de geração de empregos e renda salarial, através do valor agregado aos seus trabalhos. www.talentosdobrasil.com.br 18

Assintecal: Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos. www.assintecal.org.br

Page 72: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

70

sistemas complexos, há a promoção de melhores soluções de Design. Vassão

(2010) destaca

[...] a proposta de entidades complexas dotadas de propriedades emergentes possui relações interessantes com processos colaborativos, tanto como uma forma de torná-los tratáveis (abrindo a complexidade de uma entidade à maciça ação de um conjunto extenso de pessoas), como também por um processo de identificação (as comunidades e as sociedades são elas mesmas, entidades complexas dotadas de propriedades emergentes) (VASSÃO, 2010, p.77).

A Cooperativa da comunidade da Rocinha (RJ) foi criada no início da década

de 1980, com a missão de ampliar o orçamento familiar e manter o cuidado dos

filhos e das atividades domésticas pelas próprias artesãs (figura 14). A história

da Coopa-Roca começou a ser desenhada em 1981, quando uma jovem

moradora do Leblon, a socióloga Tereza Leal (figura 14), motivada pela leitura

do educador Paulo Freire, decidiu conhecer de perto a vida cotidiana do morro:

Comecei visitando a empregada de uma amiga, que passou a me apresentar às vizinhas. O envolvimento com a comunidade acabou fazendo com que eu iniciasse uma oficina de reciclagem para crianças. Um dia, consegui uma doação de retalhos de tecidos e pedi a uma das moradoras que me ajudasse a fazer bonequinhas de pano. Ela se negou a deixar os retalhos nas mãos das crianças e disse que tinha uma ideia melhor para aproveitá-los e chamou amigas para fazer almofadas, tapetes e colchas. Estava plantada a semente. (LEAL, 2007).

Figura 14: Artesãs da Coopa-Roca (1981) e Tereza Leal (2005) Fonte: (PBS.ORG/OPB/THENEWHEROES, 2013)

Page 73: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

71

Segundo resultados em análise SWOT19 (Anexo 1), conforme apontamentos de

Tereza Leal, a cooperativa de artesãs da comunidade da Rocinha, apesar de

estar situada em um ambiente urbano, apresenta grande potencial relativo à

culturas tradicionais com circulação de técnicas artesanais das cidades de

origem das artesãs, vindas de diversas regiões do país, principalmente do

nordeste. A proposta inicial era elaborar produtos artesanais resgatando

técnicas tradicionais, como o fuxico, o crochê, o bordado, o nozinho e o

patchwork, com a sobra do corte industrial de confecções. As artesãs

começaram produzindo peças para uso cotidiano como colchas, tapetes e

almofadas de retalhos, vendidos a amigos e vizinhos (figura 15). A partir da

proposição de aliar as técnicas tradicionais ao uso de materiais e processos

contemporâneos, emergiram possibilidades de interação com outros setores

culturais. Manzini (2008) classifica esse tipo de iniciativa como ações

catalizadoras que transformam os ambientes em cenários férteis para melhores

soluções de Design. Sobre as ações projetuais nesses cenários de

organizações colaborativas, o autor destaca

Mesmo que as comunidades criativas e as inovações sociais difusas não sejam totalmente planejáveis, nos parece ser efetivamente possível ajudá-las a nascer, bem como facilitar sua existência. Isso significa que intervenções de suporte, ou soluções habilitantes, podem ser concebidas em diferentes escalas envolvendo diversos grupos de atores (MANZINI, 2008, p.83).

19

A Análise SWOT (ou Análise FOFA ou PFOA) observa Potencialidades, Fraquezas, Oportunidades e Ameaças nos cenários em questão.

Page 74: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

72

Figura 15: Detalhes de técnicas tradicionais de artesanato e proposições contemporâneas em peças desenvolvidas para o cotidiano pelas cooperadas da Coopa-Roca.

Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013).

A inserção da cooperativa no circuito cultural se deu a partir da exposição

“Retalho: feminino, plural”, realizada no Instituto Nacional do Folclore em 1987.

A figura 16 traz a imagem de divulgação veiculada na época e reúne um grupo

de artesãs da Coopa-Roca e Tereza Leal. No mundo da Moda, aconteceu no

Rio de Janeiro, em abril de 1994, um momento de vanguarda propiciando o

Page 75: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

73

início para propostas das “Semana de Moda”20 no Brasil, com parcerias da

cooperativa com marcas como a do designer Carlos Miele (figura 17).

Figura 16: Foto Coopa-Roca para divulgação da exposição “Retalho: Feminino Plural” (1981). Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013).

Figura 17: Foto do primeiro desfile de Moda Coopa-Roca em 1994 (à direita), e proposta de Carlos Miele em colaboração com a Coopa-Roca.

Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013) e (BLOGLOG.GLOBO.COM, 2013)

20 A Semana de Moda é um evento da indústria da moda, com duração de aproximadamente uma semana, o que permite que os designers de moda mostrem suas últimas coleções. As semanas de moda mais proeminentes são realizadas em quatro capitais da moda do mundo: Londres, Nova York, Milão e Paris. A primeira Semana de Moda Brasileira aconteceu em São Paulo em 1995. (BRAND, 2005, p.9); (pt.wikipedia.org wiki Semana de Moda ).

Page 76: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

74

A tabela 2 a seguir apresenta algumas das exposições e eventos que a

cooperativa participou, com o percurso e definições das ações das artesãs:

Eventos realizados com a participação da Coopa-Roca

1994 – 1º Desfile de Moda na Fundição Progresso, Rio de Janeiro

2000 - 1ª Edição da Exposição REtalhar

2001 - London Fashion Week

2002 - São Paulo Fashion Week

2002 - Participação especial na exposição Morro Labirinto, do Instituto Goethe

do Rio de Janeiro, no Museum, Utrecht, Holanda

2002 - Fashion Rio, no Rio de Janeiro

2002 - Exposição REtalhar, em São Paulo e no Rio de Janeiro

2003 - Workshop e Performance, no Teatro Volksbuhne, Alemanha

2003 - São Paulo Fashion Week

2004 - Brazil 40 Degrees, no Selfridges, Londres

2004 - São Paulo Fashion Week

2005 - Exposição Aller-Retour Paris-Rio, no Ateliers de Paris

2005 - Desfile Couture Equitable, Brésil/Brésils Parc de la Vilette, Paris

2006 - Exposição Global Fashion, Local Tradition, no Central

2007 - Exposição Retalhar Centro Cultural Branco do Brasil

Tabela 2: Alguns dos eventos da Cooperativa Coopa-Roca

Fonte: (COOPA-ROCA.ORG.BR , 2013) e ( IPEA.GOV.BR/DESAFIOS, 2013)

Destacam-se dentre esses eventos a primeira edição da exposição Retalhar

em 2000. O evento aconteceu no Parque das Ruínas, no Rio de Janeiro, e

também na unidade de Moda do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial

(Senac) de São Paulo.

O nome remete não só a retalho, a primeira matéria-prima utilizada pelas artesãs, mas ao significado do verbo, que é "talhar novamente". Queríamos dar uma nova forma ao nosso trabalho. Sendo assim, convidamos artistas plásticos, designers e estilistas para pensar novos produtos com as técnicas artesanais da Coopa-Roca. O sucesso da mostra foi tamanho que a cooperativa conseguiu fechar suas duas primeiras parcerias comerciais, com o designer Fernando Jaeger e a Osklen de Oscar Metsavanth, e M.Officer de Carlos Miele. (LEAL, 2007).

Page 77: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

75

Nesse contexto, Manzini (2008, p.75) aponta que “muitas vezes as

comunidades criativas surgem de iniciativas de baixo para cima”, mas que

“para que haja a possibilidade de sua existência em longo prazo depende-se

de mecanismos complexos, que envolvem troca de informações com outras

organizações similares ou intervenção de instituições, organizações cívicas ou

empresas em iniciativas que acontecem de cima para baixo”.

Como pode ser observado do contexto histórico da Coopa-Roca, nos seus

primeiros eventos os trabalhos eram realizados só pelas artesãs, com

proposições de peças que referenciavam o dia a dia delas. Nas edições de

exposições a partir da mostra “REtalhar”, foram convidados parceiros variados

para o desenvolvimento das peças. A primeira edição da exposição foi

realizada em 2000, na galeria do Parque das Ruínas, no Rio de Janeiro, e na

galeria do Senac Esmod, em São Paulo, com apoio da Secretaria de Cultura

da Prefeitura do Rio de Janeiro e Senac São Paulo. Os convidados foram:

Amaury Veras, Anne Deleport, Caco Borges, Carlos Miele, Chicô Gouvêa,

Fernando Jaeger, Gringo Cardia, Israel Nunes, João Maurício Pegorim, Jorge

Barrão, Lenny, Lia Siqueira, Luiz Stein, Romualdo Vieira de Mello, Rubens

Gerchman, Tunga. Algumas das peças da realização podem ser observadas

na figura 18.

Figura 18: Folders e peças desenvolvidas para exposição REtalhar (2000). Fonte: (PROXIED.CHANGEMAKERS, 2013)

Page 78: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

76

O sucesso da exposição foi tanto que gerou as principais parcerias comerciais

para a cooperativa e mais outras três edições em São Paulo e no Rio de

Janeiro em 2002. A segunda edição foi realizada no Sesc Belenzinho, em São

Paulo, e no Rio Design e Centro Cultural Justiça Federal, no Rio de Janeiro,

com o patrocínio do Sesc São Paulo e Sebrae, apoio da Secretaria de Cultura

da Prefeitura do Rio de Janeiro e do Instituto Goethe do Rio de Janeiro. Foram

convidados: Alfaias, Antônio Dias, Carlos Miele, Carlos Vergara, Couro Vegetal

da Amazônia, Ernesto Neto, Fernando Jaeger, Fred Gelli, Fumi Hashimoto,

Hermann Hiller, Jacqueline De Biase, Janet Costa, João Maurício Pegorim, Lia

Renha, Maria Cândida Sarmento, Michael Wesely, Papel Craft, Renato Renato

Inbroisi, Rosângela Rennó, Solange Meneghel, Tok&Stok. A seguir, podem ser

observadas algumas das peças desenvolvidas para essa exposição, figura 19.

Page 79: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

77

Figura 19: Peças desenvolvidas em colaboração entre artesãs, designers e artistas para a exposição REtalhar (2002).

Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013) e (1.FOLHA.UOL.COM.BR, 2013)

A exposição REtalhar de 2007 foi no Centro Cultural do Banco do Brasil no Rio

de Janeiro (figura 20), quando vinte designers e artistas plásticos foram

convidados para desenvolver o projeto com a cooperativa. Dentre artistas e

Page 80: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

78

designers de Moda, estavam: Lenny Niemeyer, Oskar Metsavaht e Carlos

Miele, Luis Zerbini, Pedro Lobo Alexandre Herchcovitch, Antonio Bernardo,

Batman Zavareze, Carlos Miele, Cordelia Fourneau, Cristina Salgado, Dautore,

Ernesto Neto, Interni, Luiz Zerbini, Murillo Meirelles, Osklen, Regina Kato,

Renato Bezerra de Mello, Sobral, Tátil Design, Tord Boontje e Sass Brown21. A

seguir, algumas das peças desenvolvidas em cooperação pelas artesãs,

artistas e designers são apresentadas, e pode-se observar como foram

incorporados os fazeres manuais e as características dos procedimentos com

os retalhos, em propostas elaboradas para instalações e peças de vestuário

feminino:

Figura 20: Mostra Retalhar 2007, peças em cooperação entre artesãs, artistas e designers. Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013) e (MULHER.UOL.COM.BR, 2013)

Dentre as exposições que a cooperativa participou também se destaca a

mostra que aconteceu na Holanda entre 2005 e 2006, intitulada “Global

Fashion, Local Tradition”, no Centraal Museum. A exposição reuniu trabalhos

21 Sass Brown, na ocasião, participou como artista plástica. Hoje, ela é reconhecida e bem conceituada como designer de Moda Sustentável.

Page 81: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

79

com a mesma proposta de aproximar artesãos, designers e artistas plásticos

localizados em diferentes partes do globo e deu origem a um livro com o

mesmo nome, que tem como intuito principal catalogar e disseminar os

diferentes padrões culturais e saberes tradicionais de culturas locais dos

trabalhos apresentados em nível global. Atualmente, as artesãs da Coopa-

Roca continuam desenvolvendo projetos com as mesmas características, em

parceria com designers de Moda de marcas conceituadas como a Osklen,

Marcelo Sommer e M.Officer (figura 21).

Figura 21: Convite para o primeiro desfile internacional da Coopa-Roca no Haus der Kulturen der Welt (Casa das Culturas do Mundo), em Berlim, Alemanha (2005) e algumas das peças

desenvolvidas com a M.Officer (2001) para Carlo Miele e desfile no Fashion Rio (2002). Fonte: Brand (2005); (MAIS.UOL.COM.BR, 2013) (ANABEATRIZBARROSFAN.COM, 2013)

Page 82: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

80

Outra importante observação é a gestão democrática da cooperativa, conforme

descreve uma das artesãs e Tereza Leal, e também está ilustrado no

organograma da cooperativa (figura 22).

Todas as decisões são tomadas em conjunto. Nosso caminho é construído com base nas necessidades do grupo. Há eleições para a admissão de novas cooperadas e para a escolha da diretoria. O voto de todas as mulheres tem o mesmo peso, e estimulamos a renovação do quadro (PAZ, 2007). Uma característica da Coopa Roca que salta aos olhos é o seu modelo de gestão democraticamente horizontalizado. Não há qualquer tipo de hierarquia, mas sim de organização, com as devidas responsabilidades. O trabalho começou com apenas cinco mulheres; já atingiu mais de 100 nos momentos de maior demanda de produção, mas sabe-se que, se houver trabalho, esse número pode ser muito maior. Certa vez, para se atender a um grande pedido da Lacoste, houve uma ampla divulgação na Comunidade para recrutamento de novas interessadas em participar. O resultado foi a inscrição de 250 mulheres em apenas três dias. (LEAL, 2011).

Figura 22: Organograma Coopa-Roca. Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013)

Essa característica de gestão horizontalizada destacada por Leal é semelhante

ao que Vassão (2010) descreve como rizoma formalizado em um diagrama:

Uma forma de organização não centralizada, desprovida de centro; suas entidades podem até mesmo variar de importância, mas isso não é determinado permanentemente ou sequer depende de sua posição no diagrama – um agenciamento não hierárquico (VASSÃO, 2010, p.51).

Segundo Vassão (2010, p.45), os diagramas são estruturas topológicas que

vão além de formas de representação, pois identificam processos relacionais

Page 83: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

81

de organização desses sistemas, e características emergentes como repetição,

dependência, função operacional etc. A entidade abstrata localizada nesse

processo se define como pattern. A identificação desse padrão no sistema

promove a percepção e ação sobre os princípios projetuais de maneira

aproximada, aberta a interpretação de quem o lê. Como destaca Vassão (2010,

p.49), “Por esse motivo ele é um objeto compartilhado para a colaboração

criativa, e promove a circulação de conceitos pelas comunidades e pela

cultura”. O diagrama (figura 23) representa como algo concreto os fluxos

operacionais da cooperativa Coopa-Rooca que se estabelecem de forma

complexa, compondo uma rede social descentralizada.

Figura 23: Diagrama de fluxos operacionais da cooperativa Coopa-Roca. Fonte: Desenvolvido a partir de modelo de Vassão (2010, p.50)

Page 84: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

82

Analisados sob a ótica da abordagem sobre os fluxos de informações e

processos, podem ser encontrados padrões de comportamento divergentes

apresentando operações diferentes do restante. As três setas indicam os

designers (1) Sass Brown, (2) Irmãos Campana e (3) Tord Bootje.

1. Sass Brown (figura 24) era artista plástica quando participou da 2ª edição da

exposição REtalhar. Depois dessa experiência, passou a prestar consultoria

voluntária para a Coopa-Roca entre 2003 e 2008, período em que passava

dois meses durante o verão e um mês durante invernos brasileiros na

cooperativa para auxiliar as artesãs em pesquisas, trazendo padrões para

projetos que envolviam arte, artesanato e criatividade. Esses projetos eram

desenvolvidos para designers de Moda como Alexandre Herchcovitch, Carlos

Miele e Marcelo Sommer. Atualmente, Sass Brown é diretora residente no

Fashion Institute of Technology. Suas pesquisas são desenvolvidas para área

de ensino, tendo foco em Design de Moda e sustentabilidade.

Figura 24: Sass Brown, artista plástica e designer de Moda voluntária na Coopa-Roca entre

2003-2008. Fonte: (ECOFASHIONTALK.COM, 2013)

2. Em 2009, a cooperativa associou-se aos irmãos Campana, produzindo e

aplicando 300 mil jacarés em uma coleção especial de polos da grife Lacoste –

uma interação diferente porque não envolveu diretamente o Design de Moda, e

sim Design de Produto para uma proposição de Moda.

Page 85: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

83

Figura 25: Camisas desenvolvidas em colaboração entre artesãs da Coopa-Roca e irmãos Campana para a Lacoste (2009).

Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013)

3. A parceria da cooperativa Coopa-Roca com o designer de produtos e artista

plástico Tord Boontje destaca-se como uma das mais promissoras. Além da

participação em uma das edições da exposição REtalhar, houveram muitas

outras parcerias de destaque:

• Selfridges – Brazil 40 Degrees - evento realizado em Londres, em 2004, em

homenagem ao Brasil. O projeto foi apoiado pelo British Council, com

participação das grifes Agent Provocateur, Paul Smith e do designer Tord

Boontje.

• Tokyo Design Week 2004 - exposição das luminárias desenvolvidas em

parceria com o designer holandês Tord Boontje.

• Moss Design - exposição das luminárias em parceria com o designer

holandês Tord Boontje 2005, em Nova York.

• Milan Design Week 2005 - exposição das luminárias desenvolvidas em

parceria com o designer holandês Tord Boontje.

• Vitrines Ann Taylor - Projeto desenvolvido em parceria com Tord Boontje para

a campanha contra o câncer de mama “The Breast Cancer Awarness”, em

2004.

Page 86: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

84

Na figura 26 abaixo, observa-se que tanto a cooperativa quanto o designer

desenvolveram uma linguagem comum: a discussão do cotidiano e a

incorporação de elementos orgânicos. Cada uma das partes passa a

desenvolver esses elementos em proposições futuras.

Figura 26: Elementos de linguagens em peça de Boontje (2004) e vestido Marcelo Sommer, desenvolvidos em colaboração na Coopa-Roca (2004). Fonte: (TORDBOONTJE.COM, 2013) e (RFI.FR, 2013)

As ações em colaboração procuraram identificar as características dos

contextos para serem compartilhadas entre todos os participantes. Isso faz com

que a emergência, entidade de patterns identificadas nesses cenários

(BONSIEPE, 2011) – no caso técnicas de artesanato manual de crochê

desenvolvidas para vestimentas femininas pelas artesãs da Coopa-Roca –

sejam incorporadas como uma oportunidade para melhores soluções de

projeto (VASSÃO, 2010), como fez o designer Tord Boontje nas peças de

cúpulas para lustres de cozinhas e salas de jantar. Em trabalhos posteriores

(figura 27), observa-se que tanto a cooperativa quanto o designer

desenvolveram uma linguagem visual e técnica comuns, presentes tanto nos

Page 87: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

85

padrões de processos produtivos como nos de criação. Eles podem ser

observados na representação dessas peças, constituídas a partir de técnicas

manuais e repetição de elementos confeccionados primeiro em pequenas

partes separadamente para posterior união. Na questão de linguagem visual,

há também a representação orgânica e composição variada de cores em um

mesmo elemento. Nas questões de linguagem cultural, observa-se a discussão

do cotidiano nas instalações de Boontje e nas peças desenvolvidas pelas

artesãs da Coopa- Roca.

Figura 27: Peças desenvolvidas pela cooperativa Coopa-Roca e pelo designer de produtos e artista plástico Tord Boontje.

Fonte: (HANDEYEMAGAZINE.COM, 2013); (TORDBOONTJE.COM, 2013) e (PULPEDICOES.COM, 2013)

Ação semelhante é a do designer Jun Nakao (2008), figura 28, convidado pelo

Programa Talentos do Brasil (iniciativa do Ministério do Desenvolvimento

Agrário, que terá detalhes analisados no capítulo a seguir) a desenvolver o

projeto junto à comunidade de Manicoré (AM). Observando-se o resultado nas

peças voltadas para objetos do cotidiano e algumas peças para as pessoas da

própria comunidade, constata-se que ações dessa natureza são projetáveis.

Percebe-se, nessa ação, a escolha do designer em incluir as necessidades

cotidianas dos colaboradores, e não pontuar o contexto do projeto pelo

mercado – o que abre a questão de que, talvez para uma estratégia que

envolve inovação, os processos projetuais desenvolvam-se a partir das

Page 88: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

86

necessidades dos próprios participantes. As ações da cooperativa Coopa-Roca

e os contextos relativos às necessidades das artesãs trouxeram também a

questão de como se trabalhar a partir das sobras de material. Essas questões

foram incorporadas pelos designers e artistas plásticos convidados, que

atuaram como facilitadores da inserção de processos contemporâneos junto às

técnicas tradicionais das artesãs. Isso marcou um diferencial, apresentado nas

exposições e nos desfiles.

Figura 28: Produtos em colaboração entre Jum Nakao e as comunidades de Maricoré (2008). Fonte: (JUMNAKAO.COM.BR, 2013)

A análise dos contextos nos cenário dessas ações projetuais com processos

colaborativos de designers de Moda e comunidades locais leva a refletir sobre

a abordagem do Design como uma atividade mediadora de processos

dinâmicos nos mais diversos contextos. Incluir os processos colaborativos nos

projetos de Design de Moda, segundo Nakao (2008), “promove a troca de

saberes, trazendo para o design o conhecimento da tradição e, para o

artesanato, a ampliação do acesso aos mercados, buscando-se uma atividade

auto-sustentável”. Essa afirmação aproxima-se com a de Pamponet (2013),

quando este fala sobre projeto social:

Page 89: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

87

Todos os processos de aprendizagem envolvem obrigação de saída. Ninguém tem a expectativa de trabalhar lá. Faz parte do trato como aprendiz, desde o início, que ele terá que ficar pronto para viver por própria conta depois. É um componente que eleva a exigência de produção para eles (PAMPONET apud NACCACHE, 2013 p.158).

Leal (COOPA-ROCA.ORG.BR, 2007) destaca que a visibilidade midiática

colocou a Coopa-Roca no circuito da Moda com um “selo social”: através das

ações projetuais, promove-se, além da inclusão social das artesãs nos

mercados de Moda, o desenvolvimento social de aprendizagem, já que as

artesãs desenvolvem uma reflexão crítica sobre o seu papel na sociedade,

descobrem novas habilidades e como estas podem ser inseridas nos cenários

de Moda e no próprio cotidiano. O caso de trabalhos da Coopa-Roca com

artesãs trouxe um “componente inovador” (relação antes não existente entre

designers e artesãs) para os processos de projetos de Design de Moda, que

passaram a ser influenciados pela possibilidade de cooperação com

organizações e cooperativas. A pluralidade de saberes tradicionais é uma

característica brasileira que, diante da diversidade cultural, vem sendo

incorporada como elemento potencializador de processos projetuais. Nesse

sentido, Giaccardi e Fischer (2004) destacam:

Num mundo que não é previsível, improvisação e inovação são mais do que um luxo, são uma necessidade. O desafio do design não é uma questão de se desvencilhar da emergência, mas de incluí-la e fazer dela uma oportunidade para soluções mais criativas e adequadas.

(GIACCARDI e FISCHER, 2004).

Compartilhar os saberes entre diversos sistemas (designer/moda-

artesão/comunidade) pode constituir um novo valor atualizado pelos interesses

dos designers de Moda, agregar valor das culturas tradicionais em seus

produtos (e, no caso das comunidades, difundir um saber tradicional) e apontar

novas perspectivas no campo de ação mercadológica. Hoje, depois de trinta

anos confeccionando produtos artesanais para diversas marcas, a Coopa-Roca

construiu uma nova sede e abriu sua primeira loja própria no Fashion Mall,

shopping bem conceituado do Rio de Janeiro (figura 29). Nesse trajeto,

observa-se positivamente a emancipação da cooperativa com uma atividade de

organização auto-sustentável, na medida em que as artesãs não estabelecem

Page 90: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

88

uma relação de dependência comercial com os designers, como acontece

normalmente.

Figura 29: Artesãs cooperadas, loja no Fashion Mall e nova sede da Coopa-Roca em 2010. Fonte: (INICIATIVACULTURAL.ORG.BR, 2013)

Page 91: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

89

2. Ações metaprojetuais: inter-relação das variáveis adaptáveis com

cadeia de produção

Este capítulo aborda o ambiente em que designers e usuários podem colaborar

para a atividade de Design com práticas comunitárias em suas especificidades

temporais de projetar e desenvolver processos. Investigam-se

instrumentalidade e possíveis aproximações dos conceitos de Metadesign

(VASSÃO, 2008, 2010) e Metaprojeto (MORAES, 2010; CELASCHI e

DESERTI, 2006) enquanto modos de fluxo de informação nos processos

produtivos na cadeia de valor de Design de Moda na sistematização de fluxos

dos processos (informação e interação na cadeia de produção têxtil

distribuídos em redes, com abordagens de colaboração em relações

tecnológicas e sociais). Analisa-se o conceito de cadeia de valor visando

descrever características, critérios e discussões relevantes na escolha dos

contextos, processos de produção e tecnologias.

As questões de valorização do território são colocadas a partir de Krucken

(2009), e plataformas de conhecimentos prévios para fases iniciais de projeto a

partir de Moraes (2010). A partir de Monzoni (2012) e Krucken (2009), procura-

se descrever contextos, características e critérios para a sistematização dos

processos informacionais na construção da identidade cultural. Quanto aos

processos de produção tecnológica da cadeia têxtil, reorientação econômica,

social e ecológica, acrescentam-se também as proposições de Manzini (2008).

São analisadas as ações projetuais dos designers Ronaldo Fraga no Programa

Talentos do Brasil (2008), junto às comunidades de Coxim (MS), Agreste da

Paraíba (PB) e São Borja (RS), e também a ação projetual de Walter

Rodrigues, na coordenação do Programa do Fórum Inspiramais da Assintecal e

junto à artesã Yasmine (2012). Tomando as ações dos designers Walter

Rodrigues e Ronaldo Fraga no Programa Talentos do Brasil (2008) e no Fórum

Inspiramais (2013), respectivamente, evidenciam-se o compartilhamento da

informação nas fases processuais, a cadeia de produção, os serviços

prestados pelos colaboradores, e as estratégias de percepção de valor e

qualidade. Destaca-se a ação de Walter Rodrigues e estratégias para

Page 92: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

90

alternativas processuais junto à rede do Fórum Inspiramais, associados da

Assintecal, Abicalçados, Mix by Brasil, entre outros, evidenciando a ação em

comunidades locais e trazendo como referência o caso da artesã Yasmine, do

projeto “Artes e Tramas”.

Pesquisaram-se ações projetuais que abordam benefícios materiais, ou seja,

que promovem maior valor de mercado aos produtos/serviços desenvolvidos,

principalmente os valores relativos à sustentabilidade ambiental e social,

ampliando as proposições de consumo e apresentando a cadeia de produção –

materiais e tecnologias e as inter-relações culturais – local e global. Para

Krucken (2009), essas ações de Design que promovem o conhecimento

relativo aos processos da cadeia produtiva e em comunidades locais visam a

estimular uma participação ativa do consumidor, que, por meio das suas

escolhas, pode apoiar o desenvolvimento sustentável em processos

reorientados por questionamentos ecológicos e sociais. Segundo Meroni

(2008), ao planejar estratégias para valorizar produtos e serviços relacionados

a uma determinada origem geográfica, o designer propõe abordagens

sistêmicas promovendo a valorização do território – da cultura e da identidade

local, dos recursos ambientais e saberes tradicionais associados.

2.1. Processo, produto e serviço em cadeia produtiva

A cadeia produtiva da moda [...] engloba desde atividades manufatureiras de base até serviços avançados de distribuição: heterogeneidade estrutural e tecnológica; segmentação produtiva; relações de subcontratação; bifurcação entre as atividades produtivas (materiais) e as funções corporativas (imateriais). Atualmente atravessa um período de profundas mudanças, face ao processo de globalização e a abertura de novos mercados. Os componentes mais sensíveis dessas transformações são: deslocamento da produção devido aos altos custos operacionais; exasperação da concorrência; redução do ciclo de vida dos produtos de moda; incremento veloz das tecnologias e modificações complexas na estrutura dos mercados (PESQUISA ECONOMIA E CULTURA DA MODA, 2011, p.8).

Atualmente, a cadeia produtiva de Design de Moda insere-se na produção do

produto têxtil e particularmente, algumas vezes, viabilizada pela capacitação

humana, que agrega valor não somente por atributos técnicos, mas também

simbólicos e culturais. É o caso das peças produzidas pelas artesãs do

Page 93: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

91

programa Talentos do Brasil, que apresentam elementos de artesanato com

tradição local e identidade regional (figura 30), valorizando técnicas

manufatureiras de rendas e bordados manuais, técnicas para trançar a palha e

o curtume de couro de peixe, técnicas de modelagem em cerâmica,

marchetaria, traçados em ráfia etc.

Figura 30: Algumas técnicas de tradições locais de artesãs do Programa Talentos do Brasil. Fonte: (TALENTOSDOBRASIL.COM.BR, 2013)

Quando se pretende melhorar precárias condições de vida mediante projetos de cooperação, não é suficiente trabalhar apenas com design. Devem ser incluídas outras medidas de apoio como concessão de microcréditos e a comercialização. Frequentemente os artesãos vivem à beira da extrema pobreza, não podendo sequer comprar matéria-prima para a produção. (BONSIEPE, 2011, p.77).

O Programa Talentos do Brasil é uma iniciativa do Ministério do

Desenvolvimento Agrário Brasileiro, por meio da Secretaria da Agricultura

Familiar, que tem como objetivo estimular a troca de conhecimentos,

valorizando a identidade cultural das mulheres manufatureiras e promovendo a

geração de renda. O programa propõe que os grupos de artesãos recebam

treinamento com consultorias de designers com foco na prática local e

autogestão.

Segundo Krucken (2009), essas pequenas produções locais geralmente não

são absorvidas pelo mercado, pois produzem produtos não adequados à

Page 94: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

92

padronização massiva – por exemplo, quanto aos produtos (inviabilidade de

padronização de tamanho de manequim) e questões de logísticas (geralmente

as comunidades ficam em lugares afastados dos centros). As iniciativas, como

a do Programa Talentos do Brasil, reforçam o pensamento de Krucken (2009,

p.63) sobre “a importância de se buscar soluções integradas, articulando todos

os elos que formam as redes de produtores e consumidores”. Entende-se que

a sobrevivência desse sistema depende do exercício de solidariedade,

caracterizado pela dependência recíproca ou interdependência.

Nesse sentido, Manzini (2010, p.IX) destaca que o contexto econômico atual

coloca em evidência uma problematização crítica sobre os cenários dos

sistemas de produção e consumo, apontando o surgimento de uma “Próxima

Economia”. Para Manzini (2008, p.12), os designers, compreendendo tal

dimensão, “podem conscientemente dar rumo a um futuro sustentável com

passos de caráter sistêmico e colocando em prática estratégias para

descontinuidades desses sistemas”, e ressalta algumas diferenças:

“a próxima economia não é baseada em bens de consumo, mas

na interação entre pessoas, produtos e lugares”. Por exemplo: sistemas de

geração de forças distribuídos, novas cadeias de alimentos, sistemas de

locomoção inteligentes, programas de desenvolvimento urbano e regional,

serviços colaborativos de prevenção e cuidados com a saúde.

“a próxima economia não é orientada pelo produto, mas

principalmente pelo serviço”, baseada em redes sociais e tecnológicas, em

que as pessoas, produtos e lugares interagem para obter um valor de

reconhecimento comum.

“a próxima economia não é limitada à economia de mercado, mas

emerge dos quatro domínios econômicos convergentes: o mercado, o

estado, as verbas públicas e os negócios domésticos”.

“a próxima economia depende principalmente da inovação social”.

Nesse contexto, o cenário do Design de Moda brasileiro demonstra a

necessidade de mudanças e melhorias no entendimento sobre as tecnologias

existentes, demandas de consumo, contingente humano organizacional e

Page 95: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

93

técnico, inovação em serviços, e até questões mais complexas como não

pautar os produtos pelas tendências internacionais de mercado.

Segundo dados apresentados na pesquisa “Economia e Cultura da Moda:

Perspectivas para o Setor” (2011, p.51), a Moda como conceito, ou seja,

enquanto tendência de comportamentos podem influenciar diversas etapas da

cadeia produtiva do têxtil. É o que acontece quando algum tipo de técnica

manual de artesanato, como tricô e crochê, são incorporadas nas propostas de

coleções apresentadas nas semanas de Moda, ou ainda quando, por exemplo,

as indústrias de têxteis e corantes químicos são orientadas quanto a melhores

processos e produção de insumos com qualidades menos nocivas ao meio

ambiente. Outros setores também podem influenciar no âmbito das pesquisas

em Design, no desenvolvimento estratégico para organização e inovação, na

caracterização das peças de vestuários e dos tecidos etc. Por exemplo,

quando alguma característica do saber tradicional ou cultura local promove

novas relações entre os stakeholders, agregando valor de capital social aos

processos produtivos. O gráfico 2 a seguir ilustra algumas dessas inter-

relações possíveis na cadeia produtiva têxtil:

Gráfico 2: Participação da Moda nas etapas da cadeia têxtil e possibilidade de adaptação. Fonte: Adaptado da pesquisa “Economia e Cultura da Moda: Perspectivas para o Setor” (2011)

Page 96: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

94

Dessa maneira, na cadeia de produção, o Design de Moda pode ser regido por

propósitos de valor do designer-marca-instituição-organização, e ser

influenciado por fatores da indústria de base-usuário-consumidor-mercado-

sociedade. Ou seja, pode tanto oferecer as tendências que serão seguidas

pelos consumidores/usuários/colaboradores/sociedade, quanto atender às

demandas sugeridas por todos. A compreensão das limitações e das

possibilidades da cadeia produtiva promove um melhor entendimento da

mesma e, em consequência, promove também o conhecimento para uma

melhor gestão dos processos no desenvolvimento dos produtos e no

direcionamento dos fluxos das informações entre os stakeholders, que incluem

fornecedores, produtores, consumidores etc.

Segundo Valiati (et al., 2011, p.21), “a complexidade de uma cadeia produtiva

está fortemente ligada a um ambiente de criatividade, inovação e símbolos”

que implicam a tarefa de Design de propor alternativas para a construção da

mesma. Assim, expandir a compreensão da cadeia produtiva de Design de

Moda em um ambiente de pluralização de elos criativos, em um país como o

Brasil – de culturas diversas –, com vistas a produzir produtos de Moda, é um

caminho que só pode ser trilhado a partir da compreensão da direção e

amplitude dos fluxos (elos) que estruturam os caminhos de produção na cadeia

(Ibid, p.21). No âmbito de Design de Moda que pretende abordar o fator

identidade local, capital humano e tradição local, artesanato local, matéria-

prima regional etc. como valor agregado nos produtos, é preciso identificar

quais caminhos levaram aos elos e quais são os caminhos que os promovem.

Dessa maneira, o ponto de partida para a compreensão da estrutura e fluxos

desses caminhos é “localizar em quais níveis da cadeia estão as forças de

potências produtivas e de integração entre os atores envolvidos referenciados

em escala local, nacional e global” (KRUCKEN, 2010, p.35).

Em uma sociedade globalizada, a complexidade cultural intensifica-se cada vez

mais, exigindo repensar os processos de sistematização para detectar

aspectos de qualidade que sejam originais, ricos em significados e possíveis

de serem compartilhados em elementos de Design de Moda para a percepção

do valor agregado (KRUCKEN, 2009b). Vassão (2008, p.213) afirma que a

Page 97: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

95

abordagem de “produzir processos”, quando antes se produziriam produtos,

está no centro das questões de desenvolvimento da sociedade global atual.

Para o autor, encontrar os “princípios ativos” de uma determinada área de

interesse para a ação comercial envolve o isolamento desses princípios e sua

conversão em entidade registrável e reproduzível alhures (Ibid., p.213). Sobre

uma abordagem de Metadesign para a sistematização com fluxos fluidos e

dinâmicos, o mesmo destaca:

É justamente quando se torna necessário que se controle, limite os movimentos, converta-se um campo originalmente plástico em um campo estável (mesmo que dinâmico), que se possibilite a ação racional e linearmente estruturada, é que os níveis de abstração se envolvem em um esforço de coagulação, retenção de movimento, permitindo a conversão de um fluxo em um conjunto de dutos, direcionando o movimento de peças, entidades, coisas, enfim, na montagem/composição de um produto, este já considerado como estável em sua identidade e existência (VASSÃO, 2008. p.213).

Da mesma maneira que o autor aproxima as proposições de Giaccardi (2003),

mapeadas nas relações entre arte, mídia interativa e Metadesign como modos

de Design, estende-se esta proposição ao artesanato na relação entre o local e

o global, de caráter fluido e dinâmico, dependente do contexto de processo,

uso e/ou consumo. Mas há também questões teleológicas, como aponta

Bonsiepe (2011). Ao assumir o folclore regional e o patrimônio público e

cultural de alguma cidade como elemento visual representativo da cultura

nacional, é possível que a comercialização torne-se também representativa,

como acontece, por exemplo, com objetos de artesanato africano que são

confeccionados para comércios com fins turísticos. Essa situação não

caracteriza de fato uma valorização da cultura, território e tradição local – não

há valor por não haver um amadurecimento em branding. Portanto, apresenta-

se frágil assumir a padronização e reprodução de elementos do artesanato em

escala.

Por isso, a abordagem de Metadesign em processos locais pode identificar

entidades e constituir plataformas de “metadados”, possibilitando que a

informação contida seja contextualizada como um tipo de padronização não

pautada pela uniformidade, mas pela relação de diferenciação estabelecida na

Page 98: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

96

escolha dos patterns (que podem ser dos mais diversos). Isso torna possível

observar a diversidade das práticas locais nas comunidades, identificar

emergências e organizar modularidades, visando a aproximar características

de cada comunidade, tradição, local, território, artesão etc., de modo a incluí-

las no processo produtivo.

Nesse cenário, o designer precisa, diferentemente do modelo tradicional,

eleger como prioridade os processos e a viabilização das possibilidades e

promover inter-relações entre os colaboradores em diferentes níveis da cadeia

produtiva. Manzini (2010, p.XI) destaca a “próxima economia” como o campo

de atuação “Que em particular inclui serviços e redes colaborativas”. Para o

autor, os designers devem se considerar parte das redes e colaborar com

outros parceiros, compartilhando competências especificas. Esse pensamento

aproxima-se da seguinte afirmação: “o conhecimento de design é um

conhecimento que designers e não designers (indivíduos, comunidades,

instituições, empresas) podem usar em seus processos” (CHANGING THE

CHANGE, 2008).

Esse fato pode ser observado no gráfico 3, constituído a partir de modelo de

Franzato e Celaschi (2012). As ações projetuais de Walter Rodrigues na

coordenação do Fórum Inspiramais, restritas às etapas de Pesquisa, Análise, e

Síntese, referentes aos contextos informacionais da pesquisa conceitual e

processos da cadeia produtiva, vão compor uma plataforma de conhecimentos

que serão repassados para todos os colaboradores: consumidores e não

consumidores, comunidades envolvidas nos processos produtivos, empresas,

instituições e sociedade.

Page 99: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

97

Gráfico 3: Ações projetuais de Walter Rodrigues na coordenação do Fórum Inspiramais (2012). Fonte: Adaptado de Franzato e Celaschi (2012)

Nas ações do designer Walter Rodrigues junto a Abicalçados (2013), o produto

final é parte de um sistema que integra serviços e promove inter-relação entre

stakeholders distribuídos em diferentes localidades e fases. Por exemplo, uma

mesma peça tem sua fibra têxtil obtida em uma localidade, a fiação e

tecelagem em outras, a confecção com outro colaborador, as fases de

beneficiamento, trabalho manual, confecção de componentes manufaturados e

assim por diante, em diferentes locais. Isso exige que o designer ocupe uma

função de coordenação, elaborando a coleta de dados e distribuição das

informações de maneira integrada entre todos. Pode-se observar alguns

desses stakeholders participantes da rede no gráfico 4 a seguir:

Page 100: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

98

Gráfico 4: Redes e possíveis fluxos de informação nas ações de Walter Rodrigues. Fonte: Da autora.

Este gráfico foi constituído a partir de Vassão (2010, p.56) para uma

visualização do planejamento e execução de projetos complexos. Assim, o

gráfico proposto anteriormente representa as fases das ações de Walter

Rodrigues dentro do conceito de projeto e a dimensão da estrutura

identificando os fluxos de informação relacionados entre os participantes que

fazem parte do Programa do Fórum Inspiramais. Os grifos em azul

correspondem à área de concentração das ações de interações do designer

que estão diretamente ligadas às 2.785 empresas do setor. O grifo na cor

verde destaca as empresas que recebem a equipe de designers que

colaboram com Walter Rodrigues, para que sejam elaboradas as peças

expostas no Fórum Inspiramais. O grifo na cor rosa destaca a posição da

artesã Yasmine, e demostra como Walter Rodrigues e os outros atores

interagem nos caminhos até que a inter-relação da artesã com as empresas do

setor sejam processadas. Os grifos em preto correspondem a todas as

entidades que fazem parte do programa e os caminhos possíveis para fluxos

de interação. O grifo central destacado em um círculo vermelho diz respeito ao

número de visitantes que normalmente frequentam a feira, geralmente

Page 101: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

99

participantes externos que terão o primeiro contato com as pautas colocadas

em questão no próprio dia de apresentação do Fórum Inspiramais, aberto para

o público em geral, com palestras, oficinas, componentes e peças

desenvolvidas expostas.

No contexto organizacional, os gráficos promovem uma visão compartilhada

das competências estratégicas de forma integrada. Através da representação

da gestão dos recursos entre os stakeholders “há a possibilidade de melhoria

dos processos relacionados para otimizar a situação presente e potencializar a

situação futura” (KRUKEN; COSTA, 2005). Nesse sentido, as autoras

destacam: “Os gráficos desempenham um papel importante no contexto

organizacional, tanto como processo de construção de conhecimento coletivo

como representação codificada deste conhecimento” (KRUCKEN; COSTA,

2005).

Essa perspectiva de gestão da informação é reforçada pela atividade

econômica mundial que se deslocou gradativamente do foco na produção

industrial para a era da informação. O fim do século XX é caracterizado por um

novo tipo de riqueza: o “Conhecimento” (CHIAVENATO, 1996; PINK, 2005). O

recente desenvolvimento da miniaturização na eletrônica e dos processos de

digitalização no ambiente da internet possibilitam processos de geração e de

circulação da informação, que questionam modos centralizados para articular

trocas dialógicas entre produtor e receptor. Com isso, a informação passa a ser

um elemento estratégico para as organizações, e a velocidade de

disseminação é mais um fator de estímulo à valorização do produto ou

processo produtivo em escala global (CHIAVENATO, 1996). Conforme Krucken

(2009, p.42), “o paradigma do design caminha em direção à produção flexível,

sendo preciso redefinir o papel do design e sua prática. Inicialmente voltadas

ao produto físico, hoje envolvem produtos, processos, serviços e informações

categorizados e desenvolvidos sistematicamente”.

O Fórum Inspiramais é uma iniciativa da Associação Brasileira de

Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal). O projeto é um

programa conceitual, coordenado pelo designer Walter Rodrigues, com o

Page 102: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

100

objetivo de fornecer informações referentes às pesquisas da estação vigente

para empresas/comunidades/consumidores/etc. dos setores de componentes

para calçados, couro e confecção. A proposta tem como objetivo o incentivo ao

desenvolvimento de produtos diferenciados, buscando implementar no setor a

cultura do Design e inovação com ênfase na pesquisa e no desenvolvimento

de uma identidade própria em novos produtos. A pesquisa apresentada pelo

programa é desenvolvida pelo Núcleo de Design da Assintecal, coordenado por

Walter Rodrigues e uma equipe de quinze designers. As quatro etapas básicas

são:

1. Comportamento/ Tendência mundiais/ Para onde olhamos?/

Grandes marcas/ Comportamento de rua/ Referências de Coolhunters.

2. Como essas referências foram utilizadas no móvel, confecção,

joias, gemas, calçado, automotivo etc. (nacional e internacional).

3. Como essas referências mundiais podem constituir uma relação

para diferenciação nos produtos nacionais utilizando as referências brasileiras

(nesta etapa, são apresentados exemplos de desenvolvimento para todos os

stakeholders com tecidos, saltos, metais, solados, enfeites, cabedais, cor,

forma, textura etc.).

4. Pesquisa local. A pesquisa procura descobrir como adaptar essas

informações para cada localidade, de maneira que cada uma constitua uma

base de dados local. Esse conteúdo deverá estar nas apresentações do

Preview para enfatizar o DNA de cada localidade. (Dados coletados em

documentos impressos apresentados para stakeholders no relatório do

programa do Fórum Inspiramais, 2013).

A pesquisa é aplicada através de consultoria, onde membros da equipe do

Núcleo de Design realizam quatro visitas nas

comunidades/empresas/instituição, apresentando a pesquisa inicial para os

responsáveis de criação e auxiliando no desenvolvimento de seis novos

materiais. Esses materiais são então apresentados para o segmento de

componentes para couro, calçado e confecções na próxima edição do Fórum

Inspiramais. Mais do que antecipar os elementos vigentes para a coleção, a

ação de coordenação e disseminação desses fluxos de informação tem um

Page 103: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

101

alcance setorial estratégico, pois estimula os fabricantes de matérias-primas,

comunidades locais e fornecedores de grandes indústrias brasileiras a

estruturarem sua pesquisa de forma integrada.

Segundo Krucken (2009, p. 45), essas características de ciclo de produção e

gestão direcionam o trabalho do designer e estão “implicando modelos

colaborativos, contínuos e abertos e ou que incluam o usuário” (nessa

perspectiva, entende-se como usuários desse sistema os stakeholders e não

apenas os consumidores finais). Esse contexto demanda estratégias para

organizar a variedade de fornecedores locais que formam uma cadeia

produtiva; é preciso formular conceitos e critérios para as propostas e escolha

dos colaboradores nos projetos, segundo relações constituídas em um mundo

globalizado. Para a autora, é preciso desenvolver uma visão de projeto levando

em consideração produtos, serviços e comunicação de forma conjunta e

sustentável – para assim promover valor também no processo produtivo.

Manzini (2004) questiona o que vem a ser um produto, o que seria projetar, e

qual a função do designer no mundo fluidificado apontado por Bauman (2001).

Assim, o produto-evento22 deve ser compreendido como um artefato temporal,

estruturado pela interação de diversos atores (colaboradores do sistema de

serviços ligados ao produto), que cooperam na cadeia produtiva e podem

agregar valores ao produto. No Design de Moda, abre-se a questão sobre a

função do designer não ficar restrita à autoria do produto final, mas

compreender a coordenação dos processos como uma demanda ética quanto

à criação e autoria (observação que será questionada no capítulo 3 desta

dissertação). Neste sentido, Vassão (2008) destaca:

O Metadesign permite a banalização dos processos de formalização, procura tornar acessíveis conceitos como modularização, níveis de abstração, níveis de complexidade, níveis de formalização, e a própria formalização em si [...] envolve os “metamovimentos” de projeto, envolve o projeto dos processos, e não apenas produtos em específico. Identificamos as técnicas de projeto de sistemas que podem ser úteis a uma noção não específica de projeto: programação como

22

Segundo Manzini (2004), o produto-evento deve ser visto como um artefato em quatro dimensões, onde a quarta dimensão é o tempo. Como essa mudança ocorre graças à interação de diversos atores que cooperam para produzir um determinado valor, então os eventos ligados a essa produção de valor passam a ser o objeto do projeto de Design.

Page 104: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

102

especificação de procedimentos e ordenamento de um ecossistema, criação de ontologias e estruturas de meta-dados, taxonomias, diagramas, topologia e visualização de complexidade (VASSÃO, 2008, p.202).

Para Vassão (Ibid., p.199), “os fluxos de informação e estratégias dos

processos precisam ser formalizados e apresentados de forma a conseguir

demonstrar o que se deseja fabricar ou construir de maneira acessível ao leigo,

ou ao colega de projeto sem que haja um engessamento dos fluxos”. Nas

ações de Walter Rodrigues no Fórum Inspiramais, a comunicação do processo,

conforme pode ser observado na figura 31, acontece de maneira clara e

concisa, na qual as peças desenvolvidas pelos stakeholders são expostas. A

equipe de designers pode ser encontrada em uma oficina de criação, e

qualquer visitante da feira pode participar, mas a presença dos próprios

stakeholders promove uma comunhão das informações sobre os processos

projetuais já desenvolvidos, e abrem-se possibilidades de contatos

operacionais e uma maior integração entre os participantes do setor.

Figura 31: Fórum Inspiramais (2013). Fonte: (INSPIRAMAIS.COM.BR, 2013)

Page 105: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

103

Na fase de desenvolvimento, as peças gráficas funcionam como parte dos

procedimentos do projeto. Segundo Vassão (2008, p.199), pode-se assumir as

próprias como sub-componentes de uma máquina de projeto, o Meta-Espaço

em Níveis de Abstração. “Essa dimensão operacional do desenho e da

representação gráfica os coloca em fricção direta com a concretude de

conexões que conduzirão a uma realidade fabricada (Ibid., 2008)”. O autor

destaca:

“Meta-Espaço e Meta- Objeto” são os circuitos de projeto que não se resumem ao simples “projeto-execução”, mas desenvolvem-se em circuitos com mais oscilações, como o projeto que conta com avaliação pós-ocupação, já envolve o Modelo como parte integral da realidade construída, em um meta-espaço no qual a coisa construída e o modelo convivem, interligados por complexos e dinâmicos movimentos de realização e alteração (VASSÃO, 2008, p.201).

Essas peças gráficas ou máquinas de controle (VASSÃO, 2008) no projeto do

programa do Fórum de Inspirações da Assintecal se apresentam como:

peças gráficas variadas: uma peça com pesquisa

conceitual referente à identidade local das regiões brasileiras dos

stakeholders envolvidos no projeto relacionando-os em um

movimento de integração; um catálogo com fotos dos materiais e

partes de peças desenvolvidas pelos próprios stakeholders para a

estação vigente; um catálogo com informações de contato de todos

os stakeholders e envolvidos no projeto; uma peça gráfica conceitual

com uma expectativa de público-alvo, ou consumidor final (ver figura

32).

exposições de protótipos conceituais relacionando os

dados obtidos em peças produzidas (ver figura 32).

o programa disponibiliza também plataformas digitais, um

website, um blog, canal em grupos de redes sociais e aplicativo (ver

figura 33).

palestras com especialistas e representantes de interesses

ligados à sustentabilidade, como, por exemplo, nas retóricas sobre:

“Cultura como pilar para a sustentabilidade” com a palestrante Marta

Porto; “Certificação socioambienatal” com o palestrante Carlos

Page 106: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

104

Eduardo Frinckmann Young; “A dimensão social da sustentabilidade

– o pilar que tem centralidade nas pessoas” com o palestrante

Reinaldo Bulgarelli etc.

Figura 32: Peças gráficas do programa do Fórum de Inspirações (2013). Fonte: Documentos impressos Fórum de Inspirações (2013).

Page 107: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

105

Figura 33: Layout do website do programa Inspiramais da Assintecal, Blog, aplicativos e tags. Fonte: (INSPIRAMAIS.COM.BR, 2013)

Nesse tipo de procedimento, identificam-se padrões (características da

identidade regional, cultura e saber tradicional de determinado local), que

alimentam dados a serem codificados em patterns – entidades estéticas que

garantem unidade visual ao projeto. Estes também podem viabilizar os

standards (estrutura codificada de proposição do modo de uso), homologando

campos de atuação e propriedades de aplicação. Nesse sentido, Vassão

(2008) destaca:

Há uma diferença fundamental entre o Pattern (objeto abstrato, meta-objeto) e o Standard (normatização do uso de tais objetos abstratos ou meta-objetos). O standard opera como a sobrecodificação do pattern, ele faz a conversão de um conhecimento imanente em conhecimento transcendente, via a normatização que procura uma mobilidade absoluta a uma entidade que é singular. Os patterns estão localizados não só a um espaço de problemas – na acepção daquele meta-espaço formal que organiza as possibilidades de solução de um projeto – mas também nas comunidades que os lançam (VASSÃO, 2008, p.267).

Vassão (2008, p.200) aponta que “proposições de modelos de uso deste tipo

de sistema de informação podem ser estabelecidas por diagramas tratados

como modelos ativos. Os agregados de diagramas concretamente adernam

fluxos de informação e conectam-se a sistemas de controle do ambiente”.

Nesse caso, para representar em diagrama o programa do Fórum Inspiramais

Page 108: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

106

seria necessário uma série de mapas conceituais com as proposições de ações

referentes a cada etapa do projeto de processos. Na figura 34 a seguir, pode

ser observado um modelo simplificado de um destes mapas, adaptado de

Vassão (2010).

Figura 34: Mapa simplificado de fluxos de informação no programa do Fórum de Inspirações coordenado por Walter Rodrigues.

Fonte: Desenvolvido pelos autores, adaptado de Vassão (2010)

2.2. Estratégias de Design e valor

Se o processo ou serviço centraliza a prática do Design, é necessário um

método que permita a reflexividade na ação do projeto. Nessa perspectiva

sistêmica, segundo Ramirez (apud KRUCKEN, 2005), projetar dentro de uma

rede de valor, ou de uma constelação de valor, significa projetar com visão

estratégica para além das certezas atuais (pois os valores serão constituídos

com a integração dos sistemas e validação deste valor frente ao

consumidor/usuário).

Segundo Krucken (2009), para que exista produção de valor, a rede deve ser

ramificada no território local e internacional, em conexão com o mercado/aldeia

global e a empresa/instituição local. Fato que pode ser observado no projeto

Talentos do Brasil, uma iniciativa do Ministério do Desenvolvimento Agrário, em

Page 109: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

107

parceria com o Sistema Brasileiro de Apoio às Pequenas e Micro Empresas

(Sebrae), com apoio da Caixa Econômica Federal, Associação Brasileira da

Indústria Têxtil (ABIT), Associação Brasileira das Empresas Estaduais de

Assistência Técnica e extensão Rural (ASBRAER), Ministério do Turismo e do

Pacto de Cooperação Brasil e Alemanha Deutsche Gesellschaft für Technische

Zusammenarbeit (GTZ).

O Programa Talentos do Brasil foi criado para estimular a troca de

conhecimentos entre comunidades de artesãos brasileiros localizadas em

áreas rurais, possibilitando a geração de emprego. Hoje o projeto reúne 2.000

pessoas, que participam de 18 grupos organizados em cooperativas em 12

estados brasileiros. Os grupos de artesãos são formados, em sua maioria, por

mulheres, e têm como base o artesanato e o trabalho “feito a mão”, com

valorização de matéria prima local (palha de palmeiras, como o buriti e o tururi,

coco e palha de babaçu, cipós, couro de peixe, sementes, sisal, sobras de

madeira, bagacilho de cana, algodão orgânico, lã de carneiro, crina de cavalo e

pedras preciosas etc.). Há parcerias com designers, que auxiliam os artesãos

no desenvolvimento das peças. Destaca-se a ação projetual do designer de

Moda Ronaldo Fraga (2008), junto às comunidades de Coxim (pele de peixe)

no Mato Grosso do Sul, Agreste da Paraíba (renda labirinto) e São Borja (lã e

crina de cavalo), no Rio Grande do Sul.

O conceito das coleções produzidas parte da cultura e da produção simbólica

de tradição local de cada região onde vivem os artesãos. Segundo dados do

website da Cooperunica23, “natureza, sustentabilidade e espírito comunitário

local” são as palavras-chave do programa. Para esta pesquisa, a coleção

observada tem produção no ano de 2008 e vigência para o público consumidor

em 2010. O conceito de criação originou-se na migração dos pássaros no

território brasileiro (figura 35), onde cada parada das aves representa uma das

comunidades. Esse conceito desdobra-se em torno das cores, da raridade e da

23

Cooperativa Nacional Marca Única. Foi criada em 2009, para dar apoio jurídico aos integrantes do Programa Talentos do Brasil. Está entre os nove empreendimentos que expõem seus produtos, cadastrados na Rede Brasil Rural (RBR). A estrutura da Cooperunica foi planejada para expandir os produtos no mercado com capacidade de produção e entrega dos produtos, permitindo que o cliente possa comprar mais de 2 mil produtos com CNPJ único. Fonte: http://planetaorganico.com.br/site/index.php/talentos-do-brasil-em-paris/

Page 110: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

108

beleza dos pássaros pertencentes à fauna nacional e também a partir da

mitologia em histórias, contos, lendas e canções folclóricas tradicionais. A

coleção recebeu o nome “Coleção Passarada 2010, [Em Cada Canto, um

Canto]” e a comercialização das peças desenvolvidas é representada pela

Cooperativa Nacional Marca Única (Cooperunica).

Figura 35: Mãos que [Re]fazem o mundo (2010), Programa Talentos do Brasil. Fonte: (COOPERUNICA.COM.BR, 2013)

A passarada nos remete à liberdade almejada pela artesã, que busca alcançá-la por meio do trabalho valorizado. O lar é o “ninho” da família, mas representa também a produção local, que, grandiosa por sua riqueza cultural, se torna maior ainda, conquistando espaços e ampliando horizontes (MÃOS QUE [RE] FAZEM O MUNDO, 2010).

A diferença na elaboração do Programa Talentos do Brasil está na condição de

uso dos códigos e dos fluxos de informação relacionais, pré-estabelecidos de

maneira que simultaneamente se tenha a missão de integrar as comunidades

participantes em uma mesma lógica estrutural (commoditização), formalizando

a integração e, ao mesmo tempo, procura-se manter características individuais

(patterns). Cada comunidade local contribui para a elaboração do valor

agregado (standard) no processo da peça desenvolvida, favorecendo o

Page 111: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

109

fortalecimento da identidade nacional e potencializando a convivência da

diversidade cultural. Trata-se de um método de formalização para a

programação dentro de sistemas em nível de abstração, orientada a meta-

objetos relacionados em meta-espaços, que, quando encapsulados, permitem

que se possa projetar, desenvolver e implementar estratégias na gestão de

sistemas complexos. Vassão (2008) aponta:

A gestão de sistemas é uma variação deste método em níveis de abstração, implicando uma modularização extrema dos componentes. Esse é um dos requisitos da virtualização da riqueza industrial e agrícola, e o termo genérico é a “commoditização”: para que se possa negociar com liquidez uma riqueza qualquer é necessário que ela possa ser mensurada e composta, combinada, para que se possa equipará-la a outras riquezas. As demandas por regularização de “qualidade” para que se possa commoditizar um produto ou setor da economia dizem respeito a exatamente isto: que se possa modularizar as entidades, que se possa torná-las contáveis e equiparáveis, mais do que se atinja algum nível de qualidade específico. Para aqueles que estão familiarizados com as críticas à lógica instrumental e à reificação, é óbvia a dimensão cerceadora e reducionista deste princípio. No entanto, é sua aplicação que contribuiu decisivamente para o desenvolvimento do capitalismo avançado, especialmente sob a influência da cibernética e da teoria dos sistemas (VASSÃO, 2008, p.132).

O gráfico 5 a seguir, constituído a partir de Vassão (2010, p.47), apresenta a

estrutura relacional do Programa Talentos do Brasil e da Cooperunica junto às

comunidades e designers convidados. Destacam-se apenas as três

comunidades em que houve ações de colaboração do designer Ronaldo Fraga

(2008):

Gráfico 5: Estrutura relacional do Programa Talentos do Brasil. Fonte: Desenvolvido pela autora a partir de Vassão (2010, p.47)

Page 112: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

110

McKenna (apud KRUCKEN, 2005) argumenta que um produto só tem valor do

ponto de vista do usuário ou consumidor. Assim, o fornecedor prospecta um

valor potencial do produto, que será consolidado e/ou transformado pelo

consumidor. Dessa forma, deve-se incluir a participação do mesmo na análise

da criação de valor, sem o qual o processo não faz sentido. A "co-produção de

valores" é abordada também por Normann e Ramírez (apud KRUCKEN, 2005,

para descrever "as relações recíprocas entre atores (prestadores de serviços

que constituem os produtos), que caracterizam a economia de serviços".

Segundo os autores, as empresas – neste caso, o Programa Talentos do Brasil

– concorrem no mercado com ofertas e não com produtos, o que inclui

processos industriais, produtos e serviços disponibilizados ao usuário

organizados no tempo e no espaço, e através das relações entre os atores. O

Programa Talentos do Brasil, em parceria com a Cooperunica, disponibiliza sua

oferta em diferentes meios, conforme a figura 36. Os produtos desenvolvidos

pelas comunidades são apresentados em eventos, desfiles e comercializados

em feiras, e também disponibilizados em um website e-commerce (figura 37).

O único elemento que não consta na oferta é o nome do designer responsável

pela ação na comunidade.

É importante enfatizar a relevância da ação do designer no desenvolvimento

desses processos produtivos. Essa ação é justificada nas fases iniciais, de

modo que sua identidade não é evidenciada ao consumidor final, pois o

objetivo não é ofertar um produto como vínculo do designer, mas a

comunidade de origem. Ressalta-se que a ação é motivadora na valorização

da tradição e identidade cultural da comunidade local de origem referenciada

em tal produto e, nesse contexto, o objetivo do designer é promover um melhor

entendimento sobre as propostas do projeto, estimular troca de conhecimentos

e auto-organização nos grupos. Conforme aponta Giaccardi (2003)

Page 113: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

111

Sob essa perspectiva, o reconhecimento e a definição de um novo espaço de design significa uma tentativa de mudar de um "saber que" a uma atitude de um esforço "know-how

24”. Este movimento de espera

representa uma mudança de uma cultura do design como "planejamento" para uma cultura do design como "semeadura” (ou de emergência), onde os produtos da cultura, serviços e sistemas são concebidos como um todo integrado (GIACCARDI, 2003, p.250).

Figura 36: Desfile e Identidade Visual do Programa Talentos do Brasil. Fonte: (TALENTOSDOBRASIL.COM.BR, 2013)

24

Know-how é o conjunto de conhecimentos práticos (fórmulas secretas, informações, tecnologias, técnicas, procedimentos etc.) adquiridos por uma empresa ou um profissional, que traz para si vantagens competitivas. Está diretamente relacionado com inovação, habilidade e eficiência na execução de determinado serviço. É um produto valioso resultante da experiência. E está geralmente associado a algum ambiente organizacional. (BARBOSA, 1979).

Page 114: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

112

Figura 37: Layout do website e-commerce do Programa Talentos do Brasil. Fonte: (MDA.GOV.BR, 2013)

Dessa maneira, conforme Giaccardi (2003, p.251), o ponto decisivo é aprender

uma nova abordagem para “como fazer” em vez de estabelecer "o que fazer".

Qualquer capacidade adquirida através de Metadesign deve ser compartilhada

como ética know-how (VARELA, 1999); quando as escolhas de ações nos

processos estão direcionadas para o propósito de "como fazer", esse

entendimento pode transcender melhor para o desenvolvimento do grupo.

Sob esse ponto de vista, são as ofertas – e não os produtos físicos – que

representam o elemento chave na análise do valor. Segundo os autores

Normann e Ramírez (2005) e Krucken (2009), as ofertas demarcam as linhas

de um território composto por distintos atores; ou seja, a oferta adquirida e

experimentada pelo consumidor resulta do esforço conjunto (consciente ou

não) destes parceiros envolvidos.

Page 115: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

113

Isso pode ser observado no caso da bolsa e acessórios em couro de peixe

(figura 38), desenvolvidos pela comunidade de Coxim, Mato Grosso do Sul, em

colaboração com o designer Ronaldo Fraga (2008). Mantendo-se a

característica exótica do couro do peixe, tanto o valor estético como também os

valores relativos à escolha dos materiais e processos da cadeia produtiva

(como valorização de matéria-prima local e produção artesanal) são

explicitados no produto físico. As peças são produzidas a partir do couro do

peixe in natura, adquirido na região e sem o tratamento químico de cromo. A

matéria-prima usada para curtimento é com base de extrato vegetal da flor da

acácia, apenas as tintas para tingimento não são naturais. Segundo as artesãs,

levam-se em média 24 horas apenas nas etapas de preparação do couro para

só depois iniciar a fase de desenvolvimento de confecção da peça25.

Figura 38: Bolsas e acessórios de couro de peixe produzidos na comunidade de Coxim, croqui e desenhos técnicos desenvolvidos por Ronaldo Fraga (2008).

Fonte: Catálogo Talentos do Brasil (2008, 2009, 2010) e (RONALDOFRAGA.COM/BLOG, 2013)

Nesse sentido, Manzini (2008), aponta fatores de suma importância que dizem respeito às transformações necessárias na cadeia de valor nos sistemas de ordens física (fluxos materiais e energéticos); econômica e institucional (a relação entre atores sociais); ética, estética e cultural (os valores e juízos de qualidade que lhe darão legitimidade social) (MANZINI, 2008, p.19).

25

As técnicas para curtimento do couro de peixe em Coxim foram desenvolvidas pelas artesãs locais em colaboração com o programa do Sebrae de apoio ao empreendedor, à micro e pequena empresa, que teve início em 1997. Alguns detalhes dos processos são explicitados no documento “Histórias de sucesso: história e serviço: artesanato” (2007), do Sebrae.

Page 116: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

114

E ainda nas várias escalas do tempo (o que pode ser feito rapidamente e o que

requer um período de tempo maior) e do espaço (da “micro escala” – de um

único produto e serviço, para “macro escala” – dos sistemas sócio-técnicos

globais). Ou seja, para acontecer a descontinuidade sistêmica na escala

macro, ela deve ser precedida por muitas descontinuidades locais. Como pode

ser observado no projeto do Programa Talentos do Brasil, em escala micro, as

ações de Design em comunidades locais de artesãs promovem

descontinuidades sistêmicas diversas em escolhas de processos com valores

artesanais e culturais, e quando integradas no sistema do programa

Cooperunica as comunidades refletem as descontinuidade na escala macro em

nível nacional e internacional.

De acordo com Meroni (2008), o Design estratégico atribui um sistema de

regras, crenças, valores e instrumentos aos corpos sociais e de mercado,

tornando-os assim mais aptos para evoluir, bem como para defender e

desenvolver identidade própria para agregar valor. Fato que, conforme Forty

(2007) evidencia aspectos sociais e culturais na produção de Design como

bens manufaturados compartilhados apresentando um processo nada linear,

nem totalmente controlável. Ou seja, há vários resultados e escolhas possíveis

para definir o processo de materialização de um produto, por exemplo, uma

malha de tricô da figura 39 pode ser feita em escala de pequena quantidade

com trabalho artesanal e tradição local. Isso acontece na comunidade do

Programa Talentos do Brasil das artesãs de São Borja, Rio Grande do Sul, que

desenvolvem as peças com lã pura de carneiro e ovelha e tingem os fios de

forma artesanal. Ou escolhe-se produzir em escala industrial, considerando

energia, mão de obra especializada, prazo de entrega, questões estéticas,

conforto, durabilidade, comunidade local envolvida, valor cultural, questões

ambientais, entre outras, e será a escolha estratégica desses processos que irá

aferir valor ao produto.

Page 117: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

115

Figura 39: Peças produzidas por artesãs da comunidade de São Borja, Rio Grande do Sul e croqui e desenhos técnicos do designer Ronaldo Fraga (2008).

Fonte: Catálogo Talentos do Brasil (2008, 2009, 2010) e (RONALDOFRAGA.COM/BLOG, 2013)

Nesse tipo de projeto em comunidade local, conforme Krucken (2009b), a

abordagem projetual se baseia na valorização do patrimônio material e

imaterial em tradições e culturas construídas ao longo do tempo, específicas de

um determinado território. A autora destaca que é preciso que esses atributos

Page 118: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

116

sejam percebidos de forma favorável pelos consumidores. Nessa situação, o

Design pode contribuir significativamente buscando formas de tornar visível à

sociedade a história por trás dos produtos, formalizando nestes informações

que possibilitem aos indivíduos rastrear e identificar suas qualidades. Para

tanto, Krucken (2005) destaca que, nesse cenário, três conceitos são

essenciais para o projeto: valor, identidade e estratégia. Como afirmado por

Normann e Ramírez (2005) e Krucken (2009), a essência do fazer Design e da

mercadologia26 assume que produzir industrialmente e operar no contexto de

mercado é, antes de tudo, entregar valor ao cliente. Para os autores, a

capacidade de inovação do produto toma o significado como centro das

dinâmicas de troca. Portanto, produzir hoje diz respeito a definir e desenvolver

identidades plausíveis e significantes para os consumidores. Essa estratégia

implica em uma postura ética do projetista e designer frente ao seu trabalho (e

talvez, do designer frente ao mundo).

No programa Talentos do Brasil, o valor está nas peças de vestuário e

acessórios integrados e inferidos pela Cooperunica e suas estratégias de

valorização das tradições artesanais e matéria-prima locais. Essas ações estão

explicitadas também em catálogos e postais (figura 40), com a finalidade de

evidenciar ao consumidor final características particulares de cada comunidade

envolvida. As designers convidadas para essa etapa foram Tereza Santos,

para a concepção dos catálogos das peças produzidas, e Lorena Marinho, que

desenvolveu coleções de postais com imagens de cada comunidade e grupo

26

Mercadologia representa um neologismo, introduzido na língua portuguesa na tentativa de traduzir o marketing. Marketing, em português, seria mercadizando ou mercadização, mas tem sido traduzido como mercadologia, que em português significa estudo de mercado. Por isso, é importante ressaltar que mercadologia não é marketing. Mercadologia é o conjunto de atividades que visam a servir adequadamente o mercado a que seus produtos se destinam, operando lucrativamente e reagindo flexivelmente a competições, com o propósito de conquistar a maior parte possível do mercado consumidor. “A mercadologia estuda o mercado”, planeja a distribuição do produto, de acordo com suas previsões, providencia sua aplicação e orienta as forças de vendas. Essas medidas são guiadas por certos fatores ligados estreitamente às exigências do consumidor como: necessidades, preferência, gosto, hábitos de compra, economia etc. Marketing designa uma atividade comercial voltada para a orientação do fluxo de mercadorias ou serviços do produtor ao consumidor. Ou seja, trata-se de uma atividade que movimenta todos os sistemas econômicos em um conjunto de operações pelas quais uma empresa trata de assegurar a colocação de seus produtos no mercado. Ou então um conjunto de ferramentas que tem por finalidade aproveitar oportunidades ou criar necessidades no mercado. É uma atividade que está ligada à comercialização e representa outro conjunto de medidas que torna o produto comercializável (GIULIANI, 2003).

Page 119: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

117

de artesãs em fases dos processos de trabalho, da região de moradia e do

produto finalizado.

Figura 40: Catálogos da coleção Talentos do Brasil, desenvolvidos pela designer Tereza Santos (2008, 2009, 2010) e postais referentes às comunidades, desenvolvidos pela designer

Lorena Marinho (2010). Fonte: (TEREZASANTOS.COM.BR/CATEGORIA/PORTFOLIO, 2013) e

(LOMARDU.COM/?/PORTFOLIO, 2013)

Assim, o Design orientado para estratégia de mercado propõe-se como uma

disciplina complexa, que ao mesmo tempo define o processo de idealização

sugerindo caminhos de significação, e define a programação do processo de

pesquisa e projetação que se quer utilizar para atingir determinado resultado.

Conforme Celaschi e Deserti (2007), a fase metaprojetual proporciona, antes

de tudo, a redefinição do problema, agregando outros valores para além do

aspecto funcional e estético. A problematização desse tipo de projeto envolve

uma pluralidade de atores e sujeitos interessados em um conjunto amplo de

variáveis, valorizando o funcionamento, o controle e as intenções do processo

(que são, invariavelmente, tópicos de natureza social).

Sobre a constelação de valor, Krucken (2009, p.28) entende “os valores

estabelecidos de forma integrada e articulados ao longo da experiência com o

Page 120: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

118

produto ou o artefato”. A autora apresenta um modelo de gráfico que foi a

referência para constituir o gráfico 6, que representa os valores atribuídos às

peças da figura 41, desenvolvidas pelas comunidades de bordadeiras e

rendeiras do Agreste da Paraíba (2008) no programa Talentos do Brasil, com a

colaboração de Ronaldo Fraga.

Gráfico 6: Estrela de valor que define dimensões para produtos e serviços de Ronaldo Fraga, no Talentos do Brasil (2008).

Fonte: Adaptado de Krucken (2009, p.28)

Page 121: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

119

Figura 41: Peças desenvolvidas pelas comunidades de bordadeiras e rendeiras do agreste da Paraíba (2008) para o programa Talentos do Brasil, com colaboração do designer Ronaldo

Fraga. Fonte: Catálogo Talentos do Brasil (2008), (RONALDOFRAGA.COM/BLOG, 2013)

e (FFW.COM.BR, 2013)

Krucken (2009, p.27) destaca que valores antes compreendidos como

secundários hoje são “fatores determinantes e diferenciais competitivos

alçados à condição de atributos primários, como valor de estima; fatores

emotivos, estéticos e psicológicos; qualidade percebida; certificação de origem;

conceito de terroir” (reconhecimento da comunidade, tradição local e do

território onde se produz).

Page 122: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

120

2.3. Cadeia de valor: fluxos distintos de informação

O conceito mais conhecido e utilizado até hoje para cadeia de valor foi criado

por Michael Porter no final dos anos 1980. Segundo Porter (apud MONZONI,

2012, p.13), a cadeia de valor atua como parte das discussões que a definem

como “o conjunto de atividades que adicionam valor a um produto ou serviço

desde as etapas iniciais de projeto/produção até o atendimento ao consumidor

final”. Na década de 1980, uma questão chave para os trabalhos de Porter era

introduzir nas empresas um olhar integrador, onde a visão de processo

começasse a substituir a fragmentação típica das áreas funcionais e dos

departamentos. Se ampliado e contextualizado para os dias atuais, esse

conceito pode colaborar com os desafios e oportunidades da aplicação do

Metadesign no contexto do projeto “Artes e Tramas”, do programa do Fórum

Inspiramais.

Observa-se a estratégia do designer Walter Rodrigues em promover o fluxo

das informações processuais distribuídas na cadeia de valor, relacionando

cenários distintos de maneira a integrar processos distribuídos. Neste projeto, o

designer, provido da informação de que uma grande empresa estava com

resíduos têxteis em estoque fora de circulação, promoveu o encontro da

mesma com a artesã Yasmine (figura 42), que passou a elaborar esses

materiais em teares manuais de forma a ressignificá-los. Trata-se de uma ação

do Mix by Brasil, no qual uma equipe de designers dedica-se a incentivar a

valorização do artesanato em comunidades locais com a possibilidade de

contatos com os outros participantes. Como no caso de Yasmine, que primeiro

participou do evento como artesã e hoje fornece material enquanto empresa.

Page 123: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

121

Figura 42: Projeto Arte e Tramas (2013). Fonte: (INSPIRAMAIS.COM.BR, 2013)

Ações como essas, integradas à abordagem de Metadesign, definem a cadeia

de valor como a gestão de matérias-primas e serviços de fornecedores e

prestadores de serviços até o cliente final e vice-versa, considerando

explicitamente o aprimoramento dos impactos sociais e ambientais. Ou seja, o

designer assume um papel de facilitador, considerando aspectos econômicos,

sociais e ambientais em suas práticas de gestão e relacionamento com os

colaboradores, tornando-os parceiros na construção dos processos. Segundo

Monzoni (2012), a cadeia de valor inclui todos os parceiros anteriores

(nomeada cadeia de suprimentos, como fornecedores, produtores, prestadores

de serviço) e posteriores (distribuidores e clientes finais) ao processo de

produção.

Olhar a cadeia de valor do ponto de vista da sustentabilidade significa também

substituir a linearidade pela circularidade na sua gestão. Ou seja, substituir a

lógica “pega-faz-descarta”, pela “pede emprestado-usa-devolve”, que considera

os limites da capacidade do planeta. Conforme ilustra a figura 43.

Page 124: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

122

Figura 43: Cadeia de valor: esferas de controle e influência. Fonte: (GRI apud MONZONI, 2012).

A cadeia de valor considera também os fluxos de informação (conteúdos

relativos a todas as fases dos processos, que devem ser explicitados a todos

os participantes), tal como é definida por Handfield e Nichols (2012):

A cadeia de valor compreende todas as atividades associadas com o fluxo e a transformação de bens a partir do estágio de matérias-primas (extração) até o consumidor final, bem como os fluxos de informação associados a tais processos. Materiais e informação circulam tanto para cima quanto para baixo na cadeia de valor. A gestão da cadeia de valor é a integração de tais atividades através de melhores relações ao longo da cadeia, com o intuito de alcançar uma sustentável vantagem competitiva (HANDFIELD e NICHOLS apud MONZONI, 2012, p.14).

Assim, com o intuito de conciliar geração de valor com o menor custo possível

e maior satisfação para o usuário, o designer deve considerar a

sustentabilidade como contexto capaz de assegurar diferenciação para o

produto. Segundo Krucken (2009), ao escolher um produto, algumas pessoas

buscam informações que possibilitam rastrear e identificar suas qualidades. A

comunicação de elementos históricos, ambientais, culturais e sociais permite

ao consumidor conhecer a história do produto, relacioná-lo à origem e

produção, e, assim, apreciar seus atributos de forma mais ampla. Nesse

sentido, a busca pela transparência dos processos de produção também é

Page 125: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

123

essencial para o desenvolvimento de cadeias de valor sustentáveis, onde o

Design opera como um grande aliado na valorização de identidades e

territórios. Nesse contexto, Krucken (2009, p.61) propõe um modelo de cadeia

de valor (figura 44), no qual as conexões entre atores e fluxos de informação

promovem maior comunicação e sinergia e consequente clareza para o

consumidor final.

Figura 44: Mosaico de alguns dos atores que participam da cadeia de valor têxtil. Fonte: Adaptado de Krucken (2009)

No projeto “Arte e Tramas” (2013), figura 45, Walter Rodrigues, ao relacionar

informações e processos entre diferentes atores, promoveu sinergia na cadeia

de valor com a aproximação da artesã Yasmine Noguerol Bernardes, da cidade

de Novo Hamburgo (RS), com empresas têxteis. Como dito anteriormente, a

artesã reprocessou o material manualmente aferindo um valor diferente do

original. Na figura 45, da esquerda para direita, veem-se os tecidos produzidos

com resíduos de couro e lãs, com organza, e com resíduos de camurça,

tecidos com brilho e rústico, que fazem parte do catálogo de produtos do

programa.

Page 126: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

124

Figura 45: Tecidos produzidos de forma manual pela “Artes e Tramas”. Fonte: (CENTRODECOMPONENTES.COM.BR, 2013)

Nesse sentido, o Metadesign pode ser uma ferramenta importante

desenvolvendo indicadores que podem auxiliar o designer a avaliar um produto

ou serviço e a inferir essas ações em percepção de valor para os

consumidores. As informações devem trazer transparência em relação aos

itens que apoiam esta avaliação, como a identificação dos ingredientes, dos

processos de fabricação, da origem, do impacto ambiental, da embalagem, dos

valores adotados pelos produtores, dos serviços ambientais associados ao

produto/serviço, dentre outros. O designer deve projetar e pensar estratégias

para dar visibilidade à origem de produtos e serviços e aproximar produtores e

consumidores, contribuindo para a integração da identidade territorial e o

desenvolvimento de comunidades locais com outros setores, como o turismo,

meio ambiente, antropologia, biologia etc.

Page 127: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

125

2.4. Tecnologia produtiva: novos materiais e certificação de origem

Os produtos limpos podem requerer também a existência de tecnologias limpas, mas requer certamente uma nova capacidade projetual (é possível mesmo chegar a produtos limpos sem especiais sofisticações tecnológicas?). Dentro desse quadro destaca-se o papel do design, que pode ser sintetizado como atividade que une o tecnicamente possível com o ecologicamente necessário, promovendo novas propostas, social e culturalmente apreciáveis (MORAES, 2010, p.60).

Segundo Vezzoli (2009), a dimensão ambiental no Design apresenta três

fatores de fundamental importância para o desenvolvimento do projeto:

“utilização de materiais e processos de baixo impacto ambiental; consideração

no modelo do ciclo de vida do produto e design orientado para a

sustentabilidade ambiental”. Moraes (2010) acrescenta que nesse modelo de

prática de Design proposto por meio de orientação voltada para a

sustentabilidade ambiental, é preciso uma mudança de comportamento tanto

por parte dos designers como dos consumidores.

Hoje é fato que um grande número de empresas está anexando como um

componente (intangível) certificados de origem sustentável, que agregam valor

aos produtos condicionados a processos com tecnologias limpas27 ou ação

com grupos sociais. Essa necessidade pode ser observada, por exemplo, no

caso da Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados), que

mantém parcerias com alguns designers, dentre os quais Dijon de Moraes,

Walter Rodrigues e Ronaldo Fraga, para fundamentação de pesquisas e

propósitos projetuais.

27

O conceito de tecnologia limpa foi desenvolvido pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA, 1989), como uma abordagem para a conservação dos recursos e gestão ambiental, com o objetivo de incrementar o conhecimento sobre o conceito e promover sua adoção de produção mais limpa pela indústria. Produção Limpa implica em evitar (prevenir) a geração de resíduos. Produção Limpa afeta direta e objetivamente o processo, produto, embalagens, descarte, destinação, manejo de lixo industrial e restos de produtos, comportamento de consumidores e política ambiental da empresa. As metas da Produção Limpa são baseadas em critérios harmônicos, padrões internacionais elevados e na visão global do mundo e do mercado (FURTADO, 1998).

Page 128: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

126

Diante da necessidade da incorporação da sustentabilidade nas empresas, a

Abicalçados e a Assintecal estruturaram o Programa Origem Sustentável28, que

compreende um sistema de certificação desenvolvido especialmente para as

empresas da cadeia produtiva da Moda. Os principais objetivos desse

programa são: propiciar aos fabricantes de calçados, fornecedores e varejo um

maior engajamento em questões de sustentabilidade; ampliar as oportunidades

no mercado de exportação para países que possuem regulamentação

orientada à aquisição de produtos sustentáveis; alinhar a indústria de

componentes de calçados brasileira com iniciativas internacionais de

sustentabilidade como SAC, Biocalce, DOW Jones Sustainability Index, ISE-

Bovespa entre outras (CARTILHA ORIGEM SUSTENTÁVEL, 2013).

A cartilha Origem Sustentável descreve a busca por uma abrangência ampla

ao programa e o estabelecimento de critérios, denominados “indicadores” de

certificação, organizados segundo quatro pilares de sustentabilidade

(ABICALÇADOS, 2013) definidos como: (i) econômico – relacionado à

competitividade do negócio e à relação entre as empresas e seus stakeholders

(clientes, fornecedores etc.); (ii) ambiental – inclui ações de interação e

proteção do meio ambiente com os recursos renováveis, a eco-eficiência, a

gestão de resíduos e riscos que não comprometem o capital da natureza; (iii)

social – ações que podem afetar todos os membros da sociedade, incluindo-se

aí direitos humanos e trabalhistas, emprego, distribuição de renda,

envolvimento comunitário, equilíbrio social, diminuição da pobreza e da

violência, transparência e postura ética; (iv) cultural – no contexto deste Selo,

referem-se às técnicas artesanais, materiais locais, tradições e história, para a

inserção de elementos da cultura local, regional ou nacional em produtos,

28

Em 2011, a Assintecal submeteu um projeto junto ao Programa de Liderança em Sustentabilidade (MIT L-Lab) do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) sobre os desafios de implantação e adoção do “selo verde”. O projeto foi aprovado e, em janeiro de 2012, um grupo de alunos do MIT L-Lab desembarcou no Brasil para estudar o mercado calçadista brasileiro, sob a orientação da diretora do LASSU, Tereza Cristina Carvalho. Eles visitaram cerca de 12 empresas calçadistas em cidades como São Paulo, Cerquilho, Sorocaba, no estado de São Paulo, e em Novo Hamburgo e Rio Grande do Sul. São empresas que produzem insumos, solventes, botões, fivelas até os montadores do produto final. Segundo Tereza Cristina Carvalho, o Selo de Sustentabilidade para o setor calçadista foi concebido para valorizar as marcas brasileiras no mercado internacional, mas também para promover o engajamento das empresas detentoras destas marcas com a sustentabilidade (http://www5.usp.br/14620/selo-de-sustentabilidade-criado-na-poli-favorece-exportacao-de-calcados/).

Page 129: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

127

serviços ou atividades da empresa. Inclui ações por meio das quais as

empresas, comunidades e pessoas que manifestam sua identidade preservam

e cultivam conhecimentos (know-how), tecnologias, tradições e costumes

(cultura) de geração para geração, incluindo o acesso à educação e a bens

culturais.

A certificação do selo de origem sustentável ocorre conforme o nível de

indicadores que o fabricante apresenta segundo esses pilares. Está

estruturada em níveis com o objetivo de ser um programa inclusivo, ou seja,

todas as empresas poderão obter o selo, porém cada uma conforme o estágio

de incorporação da sustentabilidade em seus processos. Segundo dados

disponíveis no Portal do website do Programa29, “O Selo Origem Sustentável

contempla 5 (cinco) níveis: branco (o Pedido de Adesão do fabricante é aceito,

mediante assinatura do Termo de Compromisso); bronze (pontuação em

questionário de auto-avaliação, certifica a empresa com o nível bronze); prata

(ao responder o questionário de auto-avaliação, a empresa obtém indicação

para o nível prata, confirmada por auditoria específica); ouro (ao realizar a

auto-avaliação, a unidade fabril obtém a pontuação necessária, comprovada

por auditoria específica); diamante (ao realizar a auto-avaliação, a empresa

obtém a pontuação necessária, com evolução de no mínimo dois anos,

comprovada por auditoria)”. Na tabela 3 a seguir, o detalhamento dos

indicadores dentro de cada pilar.

29

Portal do website do Programa do Selo Origem Sustentável: <http://www.origemsustentavel.org.br/site/apresentacao.php>

Page 130: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

128

Tabela 3: Pilares de sustentabilidade. Fonte: Adaptado de ABICALÇADOS (2013)

O programa Origem Sustentável, realizado pela Abicalçados e Assintecal, é

patrocinado pelo Sebrae e tem como parceiros o Instituto by Brasil,

Universidade de São Paulo (USP) e Massachusetts Institute of Technology

(MIT). As auditorias30 para definir em que nível de selo a empresa se enquadra

30

A auditoria é o principal instrumento operacional sistêmico, analítico, de natureza pericial, para avaliar o estágio de atendimento à legislação (conformidade) e gerar informações para tomada de decisões em gestão e negócios da organização (FURTADO, 1998).

Page 131: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

129

– prata, ouro ou diamante – ficam sob a responsabilidade da SGS (System &

Service Certification) e ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). O

Instituto by Brasil31 é a entidade gestora que exerce o credenciamento de

instituições certificadoras e a emissão do Selo Origem Sustentável; possui

como entidades parceiras a Assintecal e a Abicalçados, responsáveis pela

divulgação do Selo e pela mobilização de seus associados para participação

do programa (empresas que produzem e vendem componentes, calçados ou

artefatos vinculados à indústria da Moda).

Nesse cenário, a emergência de inovação nas questões de certificação de

origem dos produtos implica a aplicação da abordagem metaprojetual para

repensar o modelo de sistema de gestão, para que os stakeholders também

auto-avaliem seus processos em busca constante de melhorias. Conforme

relatou Walter Rodrigues (2013), há um padrão (patterns) de comportamento

por parte das empresas que configuram processos (standards) visando à

sustentabilidade, mas ainda não há uma commoditização dos processos de

sustentabilidade nos selos. No entanto, para o designer, esse processo está

em curso. Segundo Merlin (2010, p.10), os standards devem garantir

confiabilidade das metodologias utilizadas, transparência nas transações,

qualidade e contribuição para o desenvolvimento sustentável. Atualmente, os

diferentes tipos de standard são fatores decisivos para as escolhas e tomadas

de decisão entre os stakeholders.

Para Voltolini (2010), por se tratar de uma fase ainda preliminar dessa

consciência socioambiental no Brasil, esse fator exige que as empresas

estejam abertas às constantes mudanças, pois os modelos internacionais

existentes nem sempre são adaptáveis às condições brasileiras. Para o autor,

os chamados “selos verdes” são quase sempre apontados como uma solução

para esse quadro, mas estão ainda em fase de implementação. Em sua grande

maioria, esses selos oferecem algumas indicações mais confiáveis para o

indivíduo tomar uma decisão de consumo responsável sem ter que se tornar

um pesquisador em ecologia. O autor destaca que, embora os indicativos não

31

O Instituto by Brasil, fundado em 2006 em Novo Hamburgo (RS), é uma sociedade civil sem fins lucrativos que possui o compromisso com o desenvolvimento científico, tecnológico e cultural da indústria de componentes para couro, calçados e artefatos.

Page 132: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

130

sejam as únicas medidas possíveis para se conferir valor sustentável em um

produto/serviço, é válida sua eficácia, ainda que esta varie conforme os

diferentes segmentos da economia. Isso confirma a importância das etiquetas

socioambientais como um fator crítico no reconhecimento do consumidor,

indicando quem é responsável, como e o por quê de determinado processo.

Voltolini (2010) também aponta a importância dos selos na educação e indução

ao consumo consciente, e por isso eles devem ser criteriosos e bem

comunicados.

Nesse sentido, Moraes (2010, p.64) contesta que a prática de Design orientada

para a sustentabilidade ambiental passa pelo conceito de cadeia de valor em

diferentes abordagens e que é preciso repensar e “integrar o conceito de

responsabilidade ambiental em nossas relações com os objetos e com o

ambiente artificial como um todo”. Chamar o consumidor para aceitar um novo

modo de viver é uma ação para os designers, que além de conceber produtos,

apontam novos sistemas com referências de novos valores na projeção do Life

cycle desses produtos.

Os níveis desses sistemas com modos de vida são tão complexos que

parecem estar fora de controle: “complexos demais para se compreender,

quanto mais para lidar e redirecionar” (THACKARA, 2008, p.23). Não se trata

de desacelerar tudo, mas possibilitar situações que sustentem uma infinita

variedade de formas rápidas e lentas de viver (Ibid., p.65). “Na primeira parte

da era industrial, progresso e desenvolvimento significavam a produção

contínua de tecnologia e mais produtos” (Ibid., p.12). O fato é que, neste início

do século XXI, tudo isso se configura como um grande desafio para os

designers, pois “os designers devem fazer com que os sistemas de

manutenção da vida que nos cercam sejam mais inteligíveis e desvendáveis”

(Ibid., p.37), pois “no conflito de informações demais e conhecimento de

menos, o mundo vai ficando mais complexo e as pessoas se dispõem cada vez

menos a tentar fazer sentido nas coisas” (CARDOSO, 2011, p.11).

Um dos maiores desafios que enfrentamos na transição para a sustentabilidade é o pensamento orientado aos sistemas integrados. Aprendemos sobre o comportamento de sistemas complexos que o pequeno não é pequeno. Não precisamos pensar grande ou agir

Page 133: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

131

grande para mudar grandes sistemas. Pelo contrário: pequenas ações de design podem ter grandes consequências, possivelmente positivas (TACKARA, 2008, p.36).

Tecnologia e informação nunca estiveram tão acessíveis; uma parte

considerável da população mundial desfruta de condições de consumo com

níveis sem precedentes. Todos os dias são noticiadas novas descobertas e

inovações, que se transformam em produtos, que vão compor os cotidianos

das pessoas. São movimentos que se mostram positivos para o mercado e

talvez para economia, mas quase sempre não para o meio ambiente – e

algumas vezes são nocivos até para os humanos.

Como aponta Tackara (2008), a complexidade dos sistemas que regem a vida

na contemporaneidade causa uma confusão na percepção dos indivíduos

sobre suas próprias escolhas do cotidiano, fato que representa um dos maiores

desafios para os designers desse milênio, que vão significar os artefatos

nesses novos sistemas (TACKARA, p.139). Para o autor, uma transição

positiva seria para um mundo menos voltado às coisas e mais centrado nas

pessoas, com abordagens de novas formas sociais de convívio com ênfase em

ações sociais em detrimento de ações tecnológicas (Ibid., p.169). Essa é uma

situação em que o designer deve compor diversidades para que a ação

projetual não se vincule a uma discussão sobre alguns valores sociais e

culturais em detrimento de outros, mas construa o sistema de forma criativa,

onde as próprias pessoas sejam capazes de interagir com ele e encontrar os

caminhos para os resultados em contextos específicos (Ibid. p.251). Essa

condição pode ser observada nas redes constituídas nas ações dos designers

Ronaldo Fraga (2010), Walter Rodrigues (2001) e Jum Nakao (2012) junto às

organizações e comunidades locais, que terão detalhes do processo

explicitados no capítulo a seguir.

Page 134: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

132

Page 135: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

133

3. Projetando localidades e relações sociais em redes

Este terceiro capítulo aborda o ambiente das redes sociais em estruturas

organizacionais que podem alterar papéis e padrões de interação e Design de

sistemas sócio-técnicos. Neste sentido são apresentados cenários em ações

de Metadesign (VASSÃO, 2008; VASSÃO 2010) para a compreensão dessas

estruturas organizacionais e são apontados questionamentos de Design,

percepção de valor e qualidade nas interações em distintas redes de intenções

e proximidades intersubjetivas, inerentes aos designers, mercado e às

comunidades de artesãos. Pontua-se a importância do papel ético do designer

de Moda nas escolhas projetuais e estratégias para composição social, de

território, cultura e tradição local.

O projeto de Design que contextualiza a identidade territorial, diferentemente

de outros, problematiza a integração de aspectos da produção material em

artefatos e serviços com saberes, que, nos estudos de casos desta pesquisa,

referem-se à manufatura de artefatos artesanais e experiência em processos

de produção e consumo, marcados pela cultura e tradição local. Em primeiro

lugar, existe uma dimensão ética e política no entendimento das maneiras de

gerenciar (e projetar) o território. Em outras palavras, se o interesse privado

não deve estar acima do bem comum, não é possível deixar que sejam

unicamente as lógicas de mercado a regular este espaço (REYES e BORBA,

2008). Em segundo lugar, o território em um contexto contemporâneo de

globalização promove sua espacialidade e temporalidade, não mais somente

conformado pelos limites físicos e administrativos, mas dentro de uma lógica

comunicacional – possíveis fluxos de informação. Os autores de referência

neste tema serão Krucken (2009), Manzini (2008), Moraes (2010) e Vezzoli

(2012).

Krucken (2009) afirma que, no início deste milênio, houve um aumento da

demanda por produtos autóctones (relativo ao lugar de origem), promovendo

produções regionais e suas materializações em artefatos. Sugere-se a

afirmação do local no processo de globalização. Nesse sentido, investigam-se

neste capítulo as ações projetuais de Jum Nakao em 2008 junto à comunidade

Page 136: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

134

de Manicoré (AM), e de Ronaldo Fraga com a coleção “Turista Aprendiz na

Terra do Grão” (2010), desenvolvida em colaboração com uma cooperativa de

artesãs do Pará. Para Hall (2006), a ideia de uma identidade única e duradoura

esvanece-se na contemporaneidade, e apresenta-se dinâmica, em construção

constante socialmente. Isso possibilita, segundo Manzini (2008), novos papéis

sociais e profissionais, em que designers têm seu campo de ação ampliado,

considerando em seus projetos aspectos étnicos, culturais, religiosos e de

formação histórica, dentre outros fatores, conforme será analisado nos projetos

“A Mão na Moda” (2001) de Walter Rodrigues, junto às comunidades locais das

rendeiras do Morro da Mariana, e “Reality Project” (2012) de Jum Nakao em

colaboração com estudantes de Design de Moda e artesãs do Ceará.

3.1. Percepção da qualidade como interações em redes: pessoas,

artefatos e lugares

Vivencia-se uma crise de percepção, desencadeada pelo desenvolvimento das

tecnologias perceptuais, como a da informação com o advento da internet e

comunicação móvel ou locomoção de coisas e pessoas pelo globo, com

possibilidade de uso desses meios frequentemente no cotidiano de grande

parte da população mundial. Para Virilio (1993), os meios de massa para

comunicação e transporte promovem uma interpretação do mundo ao mesmo

tempo massificada e particular, que relativiza diferenças entre o global e o

local. Nessa perspectiva, os projetos e ações dos designers em comunidades

estudados nesta pesquisa estão protagonizando questões que apresentam

constantes ambiguidades. Uma dessas ambiguidades, aponta Magnavita

(2011, p.77), diz respeito à maioria dos projetos lançados pelo Ministério da

Cultura que visam ao desenvolvimento e à inserção dos indivíduos de

comunidades carentes no mercado de trabalho e à distribuição de renda. São

propostas válidas, mas que, segundo o autor, não são alcançadas.

Para o autor, esquece-se o caráter pedagógico da atividade e a resistência à

produção do marketing cultural homogeneizado para importar o modelo que

chama de “Economia Criativa”. Assim, reconhece-se a criatividade como a

Page 137: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

135

nova mina de ouro, um bem imaterial inesgotável, que serve de mercadoria a

serviço do capitalismo pós-industrial, e destaca:

[...] à produção artesanal, passou a ser de certa forma “industrializada” (produção seriada de certos produtos confeccionados por máquinas), mesmo fora dos locais que lhe deram origens e inserida em rede de mercados, tornando assim homogênea essa produção enquanto setor complementar da indústria turística. Quanto à preservação da Memória, ela se realiza como atitude de respeito à herança cultural, todavia, também ela se insere no ciclo de programas e circuitos da indústria turística (a segunda no mundo depois da indústria bélica), portanto, como especial mercadoria (Ibid., p.77).

Nesse contexto, a ação projetual de Jum Nakao (2008), fomentada pelo

programa Talentos do Brasil na comunidade de Manicoré (AM), figura 46, é um

exemplo de projeto desenvolvido de forma bastante positiva. O município fica

situado às margens do rio Madeira, e a principal fonte de renda provém da

produção agrícola, de cultivo da banana, melancia e da produção de farinha. O

Grupo Floresta, que reúne cerca de 50 famílias de agricultores da comunidade,

foi o escolhido para participar do programa.

Figura 46: Foto da comunidade de Manicoré e comunidade de artesãos. Fonte: (aam.org.br prefeituras 353-prefeitura-municipal-de-manicore , 2013)

e (JUMNAKAO.COM.BR, 2013)

Esses programas e iniciativas são caracterizados como sustentáveis e

socialmente responsáveis, pois em grande parte, essas atividades pertencem

ao setor informal da economia e geralmente aplicam processos simples e não

intensivos de capital. Para Bonsiepe (2011), esse tipo de cenário exige uma

postura ética por parte do designer, pois de maneira clara nada se fala sobre a

capacidade dessas iniciativas fomentarem a autonomia dos artesãos, evitando

assim a ideia de assistencialismo. Nesse sentido, o autor elenca que o tema do

Page 138: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

136

artesanato e Design pode ser desenvolvido pelas seguintes posturas, que

podem aparecer em forma pura ou misturada:

1. “Enfoque conservador”. Busca proteger o artesão da influência do logos,

rejeitando aproximação com o Design, pois querem mantê-lo imune às

influências contemporâneas; aproxima-se das intenções dos antropólogos;

2. “Enfoque estetizante”. Considera os artesãos representantes da cultura

popular e eleva seus trabalhos ao status de arte, utilizando o termo arte

popular em referência à arte erudita;

3. “Enfoque produtivista”. Considera os artesãos como mão de obra qualificada

e barata, utilizando suas capacidades para produzir objetos assinados pelos

designers e artistas. Tal prática tende a perpetuar relações de dependência;

4. “Enfoque culturalista ou essencialista”. Considera os projetos locais dos

artesãos com base ou ponto de partida para verdadeiro Design latino-

americano ou indo-americano;

5. “Enfoque paternalista”. Considera os artesãos, em primeiro lugar, como

clientela política de programas assistencialistas e exerce uma função

mediadora entre a produção e a comercialização (marketing), em geral, com

altas margens de lucros para os vendedores;

6. “Enfoque promotor de inovação”. Advoga a autonomia dos artesãos para

melhorar suas condições de subsistência, muitas vezes precárias. Nesse caso,

a participação ativa dos produtores é requerida (BONSIEPE, 2011, p.63).

É preciso sensibilidade e ética por parte do designer para compreender

necessidades e potencialidades dessas comunidades locais, e reconhecer a

Cultura enquanto condensação de saberes, poderes e subjetivações em

processos de criatividade na formação social. Para Magnavita (2011), essa

riqueza criativa que emerge do mundo da representação do universo macro da

fenomenologia, da direta percepção que se relaciona com as quatro ilusões do

mundo32 apontadas por Deleuze (1988), passa pela captura e apropriação de

uma massa considerável de trabalho intelectual e afetivo, em troca de tarifas

32 A Identidade do Conceito que provém da expressão genérica da matemática A = A, enquanto

“coisas em si”, essências; a Analogia do juízo (a arquitetura é um organismo); Oposição dos predicados (arquitetura e não arquitetura) e Semelhança do percebido (essa arquitetura parece com... sempre faz uma referência a algo vivenciado), (MAGNAVITA, 2011).

Page 139: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

137

consideradas muito baixas em relação ao lucro que dela se aufere. Essa

prática é considerada uma forma “libertária” de lucrar, mas inclui a “auto-

realização” do trabalhador envolvido na ação que, todavia, nem sempre é

evidenciada (nem mesmo a cooperação e/ou associação no trabalho em

equipe que as sedes envolvem). Disso, conforme Magnavita (2011), pode-se

então concluir que “o capitalismo vem sofisticando o lucro em uma nova corrida

à procura da valiosa mina de inesgotável reserva: a criatividade humana,

traduzida em Economia Criativa”.

Não se trata, escreve Agamben, de valor de uso, porque o que está exposto é, como tal, subtraído à esfera do uso; nem se trata de valor de troca, porque não mede, de forma alguma, uma força-trabalho (BENJAMIN, 1985, p.78).

Essa discussão é colocada por Lévy (1994, p.115) nos quatro “espaços

antropológicos do saber”, onde a (1) Terra, espaço-tempo nômade, cosmo em

que os seres humanos estão em comunicação constante no desenvolvimento

da linguagem, processos técnicos e instituições sociais; (2) Território, neolítico,

um espaço atemporal, em que se estabelece efetivamente o mundo sedentário

da “civilização”; (3) Espaço das mercadorias, da revolução industrial, que

adquire autonomia em relação ao Território, não abole os espaços anteriores,

mas os sujeita e os organiza segundo próprios objetivos; (4) Espaço do saber,

período atual, um não lugar que ainda não existe por não se constituir com

autonomia, cosmopolita com esfera de artifícios subjetivos e cognitivos,

pluralizados, desregulares, nômades, configurados pelas novas tecnologias.

Os espaços vividos são relativistas: curvam-se e deformam-se em torno dos objetos que eles contêm e que os organizam. As pessoas, as imagens, as palavras e os conceitos são mais ou menos estruturantes de acordo com a intensidade afetiva que se liga a eles [...] Experimentamos todos os dias esses espaços que nascem das interações entre pessoas. Mas existem outros mais vastos, na escala de instituições, de grupos sociais, de grandes conjuntos culturais, e que põem em jogo não só os humanos, mas elementos não-humanos de todas as origens: sistemas de signos, dispositivos de comunicação, armas, ferramentas, elétrons, vírus, moléculas... (Ibid., p.125).

Nesse contexto, as ações projetuais nas comunidades locais, conforme Virilio

(1996), colocam o Design em vias de produzir “máquinas abstratas patrimoniais

diferenciadas, sem centralidades ou hierarquias, edificadas apenas no Saber e

Poder Local que se institui na coletividade” (MAGNAVITA, 2003). Como

Page 140: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

138

apontado por Magnavita (2003), são locais que apresentam específicas pré-

existências patrimoniais de bens culturais integrados aos processos do mundo

globalizado, garantindo as diferenças enquanto se reinventam em permanente

transformação. Dessa maneira, o processo de globalização pode constituir

totalidades, que se integram com o local nas diferenças produzidas.

As imprevisíveis relações estabelecidas entre elementos de naturezas

heterogêneas criam redes globais ou locais, que pressupõem uma

multiplicidade de conexões. Segundo Magnavita (2011, p.72), essas interações

contaminam configurações histórica e cultural, incluindo os desejos, crenças e

tradições de seus cidadãos. Uma situação de paradoxo coloca os projetos de

Design nessas redes de comunidades locais em estado constante de

contradição, pois pretendem buscar relações de equilíbrio e igualdade entre as

diferenças da lógica de mercado e os valores de cultura local. É preciso um

engendramento do criativo, que tende cada vez mais a se tornar uma

mercadoria padronizada, tanto pelas indústrias culturais quanto pelas políticas

públicas; o criativo torna-se um bem passível de consumo em larga escala,

através da estetização e espetacularização do fazer criativo (CIDADE E

CULTURA, 2011).

E sustentados pela falácia de que o julgamento sobre a qualidade e a pertinência dos bens culturais é subjetivo, sujeito à variação dos gostos pessoais e que, portanto, nenhum agente do poder público poderia levá-lo adiante sem violar os princípios da moralidade pública e da impessoalidade, os formuladores das leis de incentivo alegam que só a mão invisível do mercado cultural poderia fazê-lo de maneira equilibrada. O argumento é falacioso exatamente porque trata como bem cultural apenas o que pode ser, simultaneamente, conversível em mercadoria de consumo de massa (PORTELA, et al., 2011, p.8).

Assim, no cenário das ações de designers em comunidades locais, parece que

o único usuário que infere valor no processo projetual dos sistemas é o

consumidor final, localizado nessa massa de consumidores – segundo Portela

(et.al., 2011), essa é uma proposição no mínimo contraditória, pois os

consumidores em diferentes contextos inferem valor sobre os processos.

Nesse sentido, Fisher (1999, p.12) afirma que “Meta-design é o design para

designers, não para os consumidores”. Para o autor, pode-se “aprender e

desfrutar de muitas coisas em um papel de consumidor (por exemplo, ouvir

uma palestra, assistindo a um jogo de tênis, ou a participar de um concerto)”.

Page 141: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

139

De maneira que se participa de um processo mesmo apenas assistindo a este,

sendo um erro supor que ser um consumidor ou ser um designer tem que ser

uma escolha binária. Esse é um processo contínuo que vai desde consumidor

passivo, para consumidor ativo, para usuário final, para usuário, poder do

usuário, de domínio desenhista, à designer do sistema. Todo o caminho até

meta-designer. O autor afirma que a experiência de consumo pode trazer

perspectivas importantes ao processo de concepção, e nesse sentido, o

consumidor pode atuar como co-desenvolvedor, inferindo assim valor no

processo/produto/serviço. Fisher (1999) aponta que no Metadesign há uma

interação contínua entre os limites definidos como usuário e consumidor,

conforme a figura 47.

Consumido <-----------------------------------------------------------------------> Designer

consumidor passivo

consumidor ativo

usuário final

usuário

usuários de energia

designer de domínio

meta-designer

Figura 47: Além das escolhas binárias. Fonte: Adaptado de Fisher (1999)

Para Vassão (2008, p.171), uma maneira de lidar com o conhecimento

incompleto é envolver o objeto proposto em um máximo de experimentos; o

que, em gestão de sistemas, trata-se de capitalizar o envolvimento das

comunidades de usuários, consumidores, designers e todos participantes. No

caso das ações de Jum Nakao na comunidade de Manicoré em 2008 (figura

48), significa envolver todos os stakeholders desde os próprios designers,

artesãos, fornecedores de matéria-prima, distribuidores, consumidores

passivos e consumidores ativos no projeto, para que tenham na diversidade

das experiências a valorização da cultura local. Assim, as ações dos

stakeholders são “experiências cognitivas participativas determinadas na

Page 142: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

140

estrutura organizacional e configuração do contexto” (MATURANA, 2011, p.73),

e essas experiências definem os pontos importantes para o desenvolvimento

coletivo e sistêmico do projeto.

Dessa forma, pode-se entender a troca de conhecimentos entre os artesãos e

designers, realizada durante os cursos de capacitação promovidos pelo

programa Talentos do Brasil, como processo de criação de novas ideias para

as coleções. Há aulas de técnicas de modelagem, de corte e costura, de

Design, de mercado etc. Toda produção do grupo de artesãos é feita à mão,

apenas com o auxílio do tear e máquina de costura caseira. Os homens retiram

a matéria-prima bruta da floresta Amazônica e as mulheres atuam na

confecção das peças. Além disso, as sobras de látex colhido pelos homens

para produção de borracha são aproveitadas pelas artesãs na fabricação de

delicadas peças de artesanato. Nas tramas das fibras naturais, entrelaçadas

pelas cores de fitas coloridas, as artesãs transformam a juta, o cipó titica e o

cipó ambé, assim como as sementes da região em chapéus, bolsas, brincos,

colares e pulseiras. A integração da experiência das mulheres no trabalho

artesanal, da habilidade dos homens que retiram a matéria-prima da mata, do

conhecimento de Desgin de Jum Nakao e o apoio do Programa Talentos do

Brasil são um grande estímulo para o grupo Floresta (figura 48).

Page 143: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

141

Figura 48: Registros do processo de desenvolvimento da coleção. Fonte: (JUM NAKAO, 2013) e (TALENTOS DO BRASIL, 2008).

[...] tecnologia pode ser vivida como um instrumento eficaz para ação intencional, ou como um valor que justifique ou orienta um modo de vida em que tudo é subordinado ao prazer vivido em fazê-lo (MATURANA, 1997, p.9).

[...] assim, pode-se fortalecer os laços que tornam uma camada de abstração absolutamente coesa e submissa à outra, que a contém em um processo produtivo. É esse o procedimento possível de Metadesign, em seu sentido mais abrangente: o de fortalecer laços e caminhos de conformação de uma coletividade em função da produção de riqueza [...] e o padrão parece ser sempre o mesmo: organizar sistemas que tirem proveito das características emergentes de um processo. (VASSÃO, 2008, p.174).

Para Giaccadi (2003, p.206), nesse tipo de relação os participantes colaboram

com a co-criação dos baseados principalmente na interação entre os mesmos.

Vale esclarecer que colaboração, co-criação e cooperação não podem ser

Page 144: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

142

confundidos com alguma forma de consulta, co-produção ou co-

desenvolvimento, no sentido de fortalecimento da competitividade em

publicidade, marketing ou branding; procedimentos comuns entre as empresas

que passam a envolver consumidores, comunidades e fornecedores no

desenvolvimento de novos conceitos/produtos/serviços.

Conforme Franco (2012), nas redes que se estabelecem nesse tipo de

sistemas sociais, todos os stakeholders participam, mas nem todos colaboram

e cooperam com o ambiente de interação (sistema), que é de onde emerge a

criação. Segundo o autor, só há criação em sistemas sociais abertos (questão

que será analisada nos itens adiante) quando a estrutura e a dinâmica

acontecem por regulação de emergência, gerando abundância de espaços de

fluxos interativos num processo para ensejar a precipitação da inteligência

coletiva.

A co-criação é um processo composto por tentativas recorrentes de estabelecer e restabelecer congruências múltiplas e recíprocas entre ideias que mutam quando interagem, nem sempre se aproximando e se fundindo, mas frequentemente se distanciando e que podem ser novamente modificadas na interação para se combinar e reagir “quimicamente” umas com as outras em novas combinações gerando novas “substâncias” (novas ideias substantivas), (FRANCO, 2012, online).

Nesse contexto, em Metadesign o objetivo não é o produto final, mas os

processos. Assim, nas experiências de consumo até o usuário final devem ser

evidenciados aspectos cognitivos para que estes validem e infiram valor sobre

a qualidade dos processos no sistema como um todo. Para Krucken (2009), a

compreensão da qualidade é um processo subjetivo, determinado por questões

culturais. Segundo a autora, a qualidade de um produto só pode ser percebida

e avaliada por meio do seu uso, consumo, ou experiência, sendo que a

percepção da qualidade de um produto/serviço é o resultado conjunto de seis

dimensões de valor:

“Valor funcional ou utilitário”, com atributos objetivos pela

adequação ao uso. Diz respeito ao produto, composição, origem,

propriedades, segurança de consumo e aspectos ergonômicos;

Page 145: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

143

“Valor emocional”, de caráter subjetivo, está ligado às percepções

sensoriais e compreende fatores ligados à compra uso/consumo do

produto. Incorpora também a dimensão memorial;

“Valor ambiental”, vinculado principalmente à prestação de

serviços ambientais por meio do uso sustentável dos recursos naturais;

“Valor simbólico e cultural”, está associado ao desejo de

manifestar a identidade social, pertença em grupo ético, posicionamento

político etc. É fortemente influenciado pelo contexto sociocultural (época,

local) e pelos fenômenos contemporâneos, está relacionado ao “espírito do

tempo”;

“Valor social” relaciona-se aos aspectos sociais que permeiam os

processos de produção, comercialização e consumo dos produtos. Os

valores morais dos cidadãos e a reputação das organizações na sociedade;

“Valor econômico”, de caráter objetivo, baseia-se na relação

custo-benefício em termos monetários (KRUCKEN, 2009, p.27).

Esses valores se estabelecem de forma integrada e se articulam ao longo da

experiência que se vive com o produto ou artefato. Devem ser estabelecidos

claramente para que o consumidor compreenda a mensagem em toda a

magnitude; conforme pode ser observado no processo de desenvolvimento e

resultado das ações projetuais de Jun Nakao em 2008, na comunidade de

Manicoré (figura 49, a seguir):

Page 146: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

144

Figura 49: Peças desenvolvidas pelos artesãos em colaboração com Jun Nakao (2008) na comunidade de Manicoré.

Fonte: (JUN NAKAO, 2008) e (TALENTOS DO BRASIL, 2008).

Percebe-se um direcionamento no processo em que as peças ao mesmo

tempo são direcionadas para o mercado de Moda, mas também discutem

necessidades do cotidiano da comunidade. Isso salienta um posicionamento

ético por parte do designer, pois cada comunidade vive uma realidade diferente

e a qualidade do projeto está em evidenciar e entregar valor a todos os

participantes. Nesse sentido, em analogia a um provérbio Chinês, Fisher (1999)

destaca, parafraseando uma crítica de Freire (2002):

Dê um peixe a um homem e ele se alimentará por um dia. Ensine-o a pescar e o alimentará pelo resto da vida (Fisher, 1999, p.9).

Naturalmente, reinsisto, o empresário moderno aceita, estimula e patrocina o treino técnico de seu operário. O que ele necessariamente recusa é a sua formação que, envolvendo o saber técnico e científico indispensável, fala de sua presença no mundo. Presença humana, presença ética, aviltada toda vez que transformada em pura sombra (FREIRE, 2002, p.63).

Como aponta Nakao (2011), em análise SWOT (anexo 2) para a pesquisa

“Economia e Cultura da Moda”, o Brasil é um país monumental, com diálogos

Page 147: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

145

abertos e múltiplos, conectados com as questões contemporâneas e rico em

recursos naturais. Mas a Moda brasileira apresenta-se acostumada aos rótulos,

subjugados a uma elite que prefere transcrever tendências de mercados

internacionais. O autor aponta a necessidade de inovação na tecnologia, no

desenvolvimento humano para recodificar culturas existentes e ler os símbolos;

e também há necessidade de educar os consumidores, pois, para produzir um

trabalho autoral, implica-se demanda.

Nas questões relacionadas ao mercado, Moraes (2010) aponta a necessidade

de interpretação do estilo de vida local como componente diferencial nos

produtos que competem hoje em nível global, proporcionando aos

consumidores novas experiências de consumo. Segundo o autor, nesse

cenário, devem ser considerados fatores socioculturais de maior relevância

como possível referência para a concepção do produto/serviço e de igual forma

o uso sustentável dos recursos naturais. Como pré-análise devem ser

consideradas: fruição coletiva dos produtos pelos usuários, tecnologias e

materiais disponíveis, descobertas científicas, movimentos artísticos,

comportamentos e costumes, tendências da Moda, ritmos musicais, causas

que podem influenciar o redesenho de um artefato na busca pela inovação.

No caso de ações projetuais de designers de Moda em comunidades locais,

Moraes (2010) demonstra linhas de como projetar com a diversidade de

culturas, etnias e de cenários territoriais, em uma ordem dos sistemas

globalizados, que considera os usuários em cenários diversos

(topologia/clima/cultura) para a produção e consumo dos produtos/serviços. E

aponta a importância de resignificar tradições e culturas locais nesses projetos

em novos cenários globalizados para que sejam sustentáveis em longo prazo.

Page 148: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

146

3.2. Territorialidades: exercícios projetuais do local

Segundo Moraes (2010), nas ações projetuais devem ser notados para análise

do território os fatores socioculturais de maior relevância. O autor destaca que

devem ser considerados:

[...] a capacidade de produtores, designers e mesmo de cada país, na interpretação do estilo de vida local (local culture e local lifestyle), para que seja inserido como componente diferencial, de caráter sólido, nos produtos que competem em nível global, proporcionando aos consumidores, novas experiências de consumo. [...] a identidade local por meio do conceito de valorização do território (terroir), [...] que abrange o capital simbólico do produto; nisso devem ser inseridas também as relações socio-culturais e as característica do território, as quais foram se consolidando ao longo dos tempos [...] tradições, manifestações culturais, festividades e alimentação [...] o patrimônio material e imaterial de caráter marcante e simbólico e que determina por vez o produto local (MORAES, 2010, p.72).

Nesse processo, são contemplados também os públicos internos, que são os

stakeholders (colaboradores) primários das políticas de gestão do território e,

portanto, de projeto. Assim, a perspectiva do branding territorial (BONSIEPE,

2011) utiliza-se dos repertórios de atributos tecnológicos, patrimoniais, sociais

etc. das cidades/territórios, que podem servir como base para a construção de

marcas locais (GAIO e GOUVEIA, 2007). É muito importante, a esse respeito,

trazer a diferença entre identidade e imagem. Segundo Reyes e Borba (2008),

a primeira (identidade) é uma projeção de dentro para fora, podendo ser

descrita como o conjunto de características intrínsecas do território e suas

formas de expressão. A segunda (imagem) é a maneira como as pessoas, que

podem ser segmentadas em grupos, veem a cidade/território, e suas

representações. Nessa perspectiva, uma gestão de marca, ou branding

territorial eficaz, não pode prescindir da identidade do lugar. De outra forma,

correria o risco de criar ou promover uma imagem contraditória, onde o esforço

comunicacional não encontraria correspondência nas características do

território.

Segundo Gaio e Gouveia (2007), as cidades são experienciadas

cotidianamente por um conjunto amplo e diversificado de públicos e são por

estes “usadas” e “usáveis”, através da grande variedade de serviços que

prestam. Entretanto, dependendo das situações e oportunidades como, por

Page 149: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

147

exemplo, um evento excepcional, a gestão de um grande fluxo de público

externo pode se tornar o estímulo principal para um projeto territorial, como no

caso das ações de Jum Nakao na comunidade de Manicoré em 2008 (figura

50).

Figura 50: Moodboard conceitual Manicoré e algumas das peças desenvolvidas pelos artesãos. Fonte: (JUM NAKAO, 2008), (TALENTOS DO BRASIL, 2008) e (aam.org.br/prefeituras/353-

prefeitura-municipal-de-manicore , 2013)

As peças são desenvolvidas a partir dos códigos da cultural local, como festas

e comemorações da região – no caso traços miscigenados da cultura indígena,

o evento da festa da colheita da melancia e costumes como as fitas de

bandeirolas nas edificações. Essas evidências culturais são identificadas,

decodificadas e reconfiguradas nas peças produzidas pelas artesãs. Outra

característica importante é a escolha de matérias-primas da região para

Page 150: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

148

utilização na cadeia produtiva, como as sementes nativas e madeira de sobras

das grandes madeireiras da região.

No campo da reflexão metodológica sobre Metadesign no contexto territorial,

algumas considerações devem ser feitas. Em primeiro lugar, o território não

pode ser efetivamente projetado, por ser também um objeto projetante; por

isso, os momentos da idealização e da execução não podem estar

distintamente separados no projeto territorial (REYES e BORBA, 2008). Em

segundo lugar, como consequência disso, a pesquisa requer a imersão no

território da equipe e a instauração de um relacionamento e integração com os

stakeholders (colaboradores territoriais) e os sujeitos locais. Assim, segundo

Reyes e Borba (2008), as fases de um projeto de Design territorial podem ser

redesenhadas no modelo Metadesign:

(1) Uma primeira fase de observação e pesquisa, conduzida mediante uma

abordagem multidisciplinar;

(2) Uma segunda fase, onde os dados coletados são reelaborados e restituídos

através de representações, principalmente gráficas. Nessa fase, são utilizadas

boa parte das ferramentas de Design, como, por exemplo, mapas conceituais,

gráficos de polaridades, moodboards, análises SWOT etc. Os principais

outputs dessa fase são cenários e briefings/contrabriefings projetuais;

(3) Uma terceira fase de síntese e geração de ideias projetuais. A modalidade

de trabalho utilizada nessa fase é a do conceito da marca.

(4) Uma última fase, onde os conceitos propostos ao longo do projeto são

efetivamente desenvolvidos.

Nesse contexto, de acordo com os modelos de projeto de Design tradicional,

há o controle sob os resultados das intenções projetuais – projetar seria

determinar um futuro, por meio de técnicas e tecnologias. No entanto, segundo

Vassão (2010, p.68), “sob a perspectiva do Metadesign o projeto indicará

apenas os meios e caminhos, assim como os objetos devem ser ajustados,

segundo o entendimento que se faz da complexidade envolvida nas lógicas

sociais e culturais, tratada como o objeto do projeto concentrados nas

características das emergências”.

Page 151: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

149

“Essa atividade pode ser compreendida como a montagem e ajuste destas

máquinas abstratas, observando as consequências da operação do aparato

proposto“ (VASSÃO, 2010, p.72). No caso das comunidades, diz respeito a

todos os mapas conceituais e proposições citadas anteriormente, feitos a partir

dos dados coletados na região. Sob a perspectiva de Metadesign, o designer

propõe o projeto e depois reflete sobre o funcionamento do processo para

abordar possíveis ajustes e novas configurações, de acordo com as

emergências localizadas. Nesse sentido, Vassão (2010) destaca:

O Metadesigner tem a opção de adotar uma perspectiva de projeto que ainda insiste em exercer um controle estrito sobre os caminhos e os resultados de sua proposta, ou aceitar e aproveitar, as entidades emergentes que se manifestam à medida que sua criação se desenvolve e é implementada (VASSÃO, 2010, p.78).

Krucken (2009) levanta pontos importantes a serem considerados nesse

processo, destacando que é um grande desafio desenvolver produtos e

serviços com fortes associações simbólicas e emocionais que apresentem

raízes culturais e relacionem questões do território para serem pensadas nas

fases do projeto, como ilustrado pela autora na figura 51 a seguir:

Figura 51: Ações essenciais para promover produtos e territórios. Fonte: (KRUCKEN, 2009, p.108)

Page 152: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

150

Algumas dessas fases relacionadas às ações de designers para promover o

território local com preocupações sociais podem ser observados no projeto da

ação do designer Ronaldo Fraga, no desenvolvimento da sua coleção “Turista

Aprendiz na Terra do Grão Pará – Verão 2012/13”. Esse projeto foi concebido

em parceria com a cooperativa de Biojoias de Tucumã, comunidade do Pará

com promoção da Fundação Vale.

O processo de ocupação da área onde fica o município de Tucumã teve origem

na década de 1970; na época, um dos grandes objetivos do governo federal

era promover a ocupação de vazios demográficos. A comunidade fica no norte

do país, em áreas de baixa produção agrícola, sendo a maioria dos produtos

consumida na região produzidos no centro-sul do Brasil. A economia está

assentada no setor primário, especialmente nas madeireiras e algumas

relacionadas à agropecuária, extrativa vegetal e mineral. O nome de Tucumã

se deve a abundância desta palmeira na região, usada em grande parte dos

produtos do artesanato local, conforme pode ser observado na figura 52, a

seguir:

Page 153: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

151

Figura 52: Moodboad conceitual do território da comunidade de Tucumã (PA). Fonte: <http://prefeituradetucuma.pa.gov.br/>

< http://tvcultura.cmais.com.br/srbrasil> <http://coronelbessa.blogspot.com.br>

Nessa ação projetual de 2010, o designer Ronaldo Fraga optou por conceituar

não somente as peças que seriam confeccionadas na cooperativa das artesãs,

mas todas as peças do projeto, incluindo produção e desfile, como as linhas

guias (Moraes, 2010) ou o bias do projeto (Vassão, 2010), pautados pela

pesquisa de campo na região. Os processos na cadeia produtiva tiveram

influências diretas do artesanato local e dos conhecimentos das artesãs (que

serão analisados em detalhes no item a seguir). Entre os materiais utilizados

pelas artesãs para produzir as biojoias para o desfile, estão as sementes de

açaí, jupati, morototó, jarina, dedo de índia, paxiubinha e ouriço de castanha,

além de fragmentos de madeiras como amarelão, ipê, cumarú, muracatiara,

Page 154: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

152

tatajuba, roxinho e sobra de madeireiras. E também foram feitas peças com

técnicas de marchetaria com sobras das madeireiras da região. Em junho de

2012, as peças foram apresentadas na semana de Moda de São Paulo, na

Bienal do Parque Ibirapuera.

Antes de apresentar a coleção no desfile, o designer Ronaldo Fraga invoca

elementos simbólicos da cultura local colocando músicas da região do Pará e

declama ao vivo um texto, fazendo uma alusão ao poema "Evocação do

Recife", de Manuel Bandeira. Em analogia à ação realizada por ele e sua

equipe junto às artesãs na região de Tucumã no Pará, o texto também está no

release da coleção e pode ser ouvido no website do designer, declamado por

Gaby Amarantos, e em anexo 3 no final desta dissertação. A seguir um trecho:

Ô Manuel... Nestas andanças por este Brasil, tenho visto e vivido coisas estupendas! [...] Aqui Manuel, as pessoas são seres marchetados em madeira de lei. Os beijos amortecem como o jambu, os corpos têm cheiro de manga e as almas... Bom, as almas... Carregam mistério das águas profundas. [...] Daria todos os açaís do mundo para vê-lo enfeitiçado por este lugar. O mesmo feitiço amazônico que transforma mulher bonita em castanheira, flores em pássaros, pepitas de ouro em sementes da mata. Impossível, Manu, descrever em palavras escritas ou faladas os assombros e desassombros deste lugar [...] (FRAGA, 2012).

Pode-se observar como o designer teve a preocupação de materializar a

coleção interpretando a tradição da região e valorizando e preservando os

símbolos culturais (imateriais e materiais) e identidade local. A figura 53 revela

algumas peças de acessórios da coleção, e propostas apresentas no desfile.

Page 155: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

153

Figura 53: Propostas para coleção “Turista Aprendiz na Terra do Grão Pará – Verão 2012/13”. Fonte: (FFW.COM.BR, 2013)

Page 156: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

154

Também pode ser observada a preocupação do designer em discutir o cenário

atual de globalização e a inserção de novas tecnologias no artesanato regional.

As peças confeccionadas em linhos não apresentam processos com alvejantes

e não há também o uso de corantes, porém há componentes com tecnologia

fotovoltaica, iluminados no ambiente sem luz, produzidas em indústrias locais

(figura 54).

Figura 54: Propostas para coleção “Turista Aprendiz na Terra do Grão Pará – Verão 2012/13”. Fonte: (ROSIS, 2012)

Sobre as ações de designers em comunidades locais com artesãs, Ronaldo

Fraga, em 2011, em análise SWOT (anexo 4), destaca que esse tipo de projeto

pode romper positivamente as diferenças entre artesãos e designer, entre

distintos saberes – do tradicional local e da Moda nacional. Mas, ao mesmo

tempo, corresse-se o risco da competição de mercado promover uma

descaracterização de valores da cultura ou um predomínio das intenções de

produção em massa. Conforme também aponta Moraes (2008), em entrevista

(anexo 5):

Quando o designer faz a interface com o artesanato, ele deve ser capaz de se abstrair da lógica produtiva e industrial e se aproximar da lógica artesanal. Muitos conseguem fazer isso com mais precisão e arte, outros deixam transparecer a lógica e o ritmo da indústria na produção artesanal. Tudo depende da cultura de cada designer, de sua consciência política e social, somente assim ele poderá proporcionar uma contribuição relevante ao artesanato mesmo tendo como base uma formação capitalista que aponta para a grande produção e para o consumo de massa. Até agora, no que pude perceber, essa troca fortaleceu mais aos designers (como aprendizagem) que aos artesãos (MORAES, 2008).

Page 157: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

155

Segundo Moraes (2008), a princípio são duas forças distintas, mas que podem

interagir entre si. O artesanato pode ser validado no projeto na sua

manifestação autopoiética, com referência em Maturana e Varela (1997) – do

próprio fazer e gerir-se. O que parece imperfeição e falta de padronização são

valores inerentes às produções artesanais, e carregam a força da cultura

popular espontânea.

[...] Nós, seres humanos, como os sistemas vivos somos determinados pela estrutura, e tudo o que se aplica para estruturar sistemas determinados também se aplica a nós. O que é peculiar a nós, seres humanos, porém, é que existe a linguagem como o espaço operacional em que nos damos conta de nossa vida como tal. Ou seja, nós existimos no fluxo de viver juntos em coordenações recursivas de comportamento que determinam nossa existência cultural (MATURANA e VARELA, 1997).

Segundo Moraes (2008), a produção industrial tem outra lógica, outro ritmo em

outra escala de produção. A máquina busca eliminar o que seriam as

imperfeições e o homem manifesta-se nos conceitos e modalidades de uso,

estabelecidos pelo projeto.

Vassão (2010, p.79) afirma que, observando os nichos de interconexões entre

as práticas em questão, é possível identificar emergências entre objeto,

contexto, situações e interator/usuário/consumidor; estes são os laços mais

arraigados e possibilitam não a determinação direta dos processos de criação,

mas alguma manipulação através da formalização das emergências dos

contextos em questão.

Emergência, aquilo que “emerge”, “aparece sem aviso”. Indica situações urgentes que exigem atenção imediata. Em sentido rigoroso ligado a cibernética

33, indica todo tipo de característica ou

comportamento emergente sem que se tenha previsto, proposto ou se quer imaginado quando o sistema foi criado ou implementado. A característica emergente mais destacada é a capacidade de auto-organização, ou seja, do sistema tornar-se mais organizado com o passar do tempo, associada aos seres vivos, pois como a vida é capaz de se auto-organizar, envolve estabilização de metabolismos, e regeneração dos tecidos, a reprodução e a evolução, opera como uma “ilha de organização”, em meio a um mar de entidades menos organizadas (VASSÃO, 2010, p.70).

33 Cibernética é a ciência e teoria do controle da comunicação entre os seres vivos e as

máquinas, correspondendo à capacidade de poder ajustar alguma conduta futura em função do desempenho pretérito (WIENER, 1984, p.33.).

Page 158: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

156

Segundo o autor a complexidade dos sistemas dotados de propriedades

emergentes pode variar muito, mas a sua constituição fundamental pode ser

muito simples, pois o que gera a complexidade na larga escala do sistema é o

acúmulo de muitas interações. Ou seja, interações podem provocar mudanças

de estado ou de funcionamento do sistema, envolvendo auto-organização no

contexto sociocultural. A partir do Metadesign, é possível articular sistemas de

objetos produzidos colaborativamente para então projetar procedimentos e

regras – modos de operar. E, para tanto, precisam-se investigar maneiras

adequadas de gerenciar o conhecimento continuamente em transformação,

envolvendo o objeto proposto no máximo de ações de experimentos, das mais

diversas maneiras e situações. Especificamente nesta pesquisa, entende-se

que os projetos desenvolvidos em comunidades locais trataram de capitalizar o

envolvimento e as interações dos atores nas ações e atividades desenvolvidas

(no caso designer, artesãs, fornecedores e consumidores).

3.3. Projetar processos colaborativos em redes

A criatividade e as atitudes colaborativas não podem, por definição, ser impostas. As comunidades criativas são organizações sociais muito delicadas e cada intervenção externa coloca seu equilíbrio em risco [...] profundamente enraizados em lugares e comunidades específicas e a idéia de reproduzi-los em diferentes contextos [...] e serem replicados sem perder suas qualidades originais (MANZINI, 2008, p.83).

Como proposição projetual de compreender e exercitar a complexidade,

Vassão (2010, p.23) recupera a abordagem projetual do Metadesign,

referenciando a abordagem formalista da Escola de Design de Ulm, pela

“Arquitetura Livre”. Nesse contexto, construir o campo de ação, o espaço de

projeto, o contexto no qual e como o mesmo poderá ocorrer. O autor delimita

assim quatro características principais:

“níveis de abstração” (realidade e projeto como objetos

organizados sem módulos funcionais);

“projeto procedimental” (definição e adoção de procedimentos que

realizam espaços);

Page 159: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

157

“propriedades emergentes” (não determinismo e determinismo

indireto/procedimentos que centralizam um processo socialmente

descentralizado);

“topologia” (proposta e análise a partir de arranjo topológico).

A possibilidade de incorporar agregados (participantes e/ou colaboradores

externos), composições sócio-técnicas de grande complexidade, implica em

incorporar ações sociais e técnicas externas ao projeto, de maneira dinâmica.

Vassão (2010) afirma que este seria um fenômeno emergente a princípio não

constituído por causas externas. Nesse sentido, o autor propõe uma releitura e

uma ampliação dos princípios de Stallman34, não restrita ao software livre:

(1) Acessibilidade cognitiva – o acesso ao código fonte que permite a compreensão de um programa e sua alteração. (2) Compartilhar componentes – o que uma comunidade ou indivíduo cria pode ser muito útil ou interessante para outros. (3) Formação de comunidade – os projetos envolvem a emergência autodeterminada de comunidades. (4) Reputação e reconhecimento – indicação da genealogia, atribuir reputação e reconhecimento público aos atores envolvidos para que se garanta coesão da comunidade envolvida. (5) Corpo como principal referência de projeto – as propostas de alguma maneira devem responder: “Como o corpo participa do processo?”. O bias instrumental do Metadesign deve ser contrabalançado pelo primado da percepção, do corpo e da informalidade (VASSÃO, 2010, p.111).

Essa proposição interessa aplicar ao campo de Design de Moda, ao pensar em

novas redes de projetos colaborativos em comunidades locais, sendo este o

objetivo desta pesquisa. O próprio sistema Moda é por essência colaborativo e

enfrenta a impossibilidade de uma realização última, já que por sua natureza

precisa continuamente reinventar-se (auto-regular, atualizar, inovar). Nesse

sentido, também é interessante aproximar os conceitos de Design de Moda e

Metadesign trazidos por Youngblood (1986), como “a criação do contexto em

vez do conteúdo”. O autor afirma que as redes de telecomunicação, programas

34 A iniciativa de tornar os softwares livres partiu do programador Richard Stallman em 1983.

Entendendo que software é uma peça que pode ser tratada como parte da Indústria Cultural e não apenas anexo menor do hardware, Stallman defende a livre circulação de códigos de uso e possibilidades de mudanças e aperfeiçoamentos destes por parte dos usuários (VASSÃO, 2010, p.77). Software é o nome que se dá a parcela da computação que é composta de instruções e dados, hardware é parte ferramental, física e fixa da máquina computacional.

Page 160: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

158

de computador e tecnologias interativas são exemplos de Metadesign, pois são

ambientes nos quais se pode controlar o contexto de suas produções culturais.

Atua-se, portanto, sobre o contexto onde o problema se encontra inserido e

não sobre o problema diretamente – a ideia de Metadesign como uma

abordagem indireta dos problemas.

Aproximando ao Design de Moda, entende-se que as proposições das ações

dos designers nas comunidades colaborativas não objetivam o resultado do

produto final, mas as definições de contextos. Dessa maneira, o contexto é o

que direciona os processos nos projetos. Fato que pode ser observado na ação

do designer Jum Nakao, em 2010, em conjunto com os estudantes e artesãs

(CE), figura 55, quando desenvolveu estratégias para gerenciar os contextos

de processos produtivos de uma coleção de Design de Moda. Com

transmissão simultânea via web durante cinco dias de um evento na semana

de Moda do Dragão Fashion (2012), evidenciaram-se os processos e as

escolhas projetuais dos participantes em tempo real.

Ocorrência que também pode ser observada não ação do designer Walter

Rodrigues, em 2001, figura 56, quando foi convidado pelo Museu do Objeto

Brasileiro para desenvolver peças em colaboração com a comunidade de

rendeiras do morro da Mariana (PI). Como tentativa de promover a valorização

e preservar e resgatar culturas tradicionais da região, o designer não

estabelece todas as regras, e precisa adaptar-se às normas estabelecidas. No

projeto de Ronaldo Fraga, em 2010, figura 57, junto às comunidades do Pará

(RN), o contexto foi delimitado pelos elementos de cultura e tradições do

território, que possibilitaram ao designer descobrir e usar técnicas de

artesanato, matéria-prima regional e direcionamentos conceituais do projeto.

Page 161: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

159

Figura 55: Estrutura do “Reality Project”, ação de Jum Nakao (2010) com estudantes e artesãos no Senac de Fortaleza (CE).

Fonte: (JUM NAKAO, 2013)

Figura 56: Ação projetual de Walter Rodrigues (2001) na casa das rendeiras do Morro das Marianas, patrocinada pelo Museu A Casa do Objeto Brasileiro.

Fonte: (ACASA.ORG.BR, 2013)

Page 162: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

160

Figura 57: Artesanato local da comunidade de Tucumã, fotos do território e da cooperativa de artesãs de biojoias “Meninas de Tucumã”.

Fonte: Registros em vídeo Ronaldo Fraga (2012) e <http://www.prefeituradetucuma.pa.gov.br/>

Dessa maneira, percebe-se que cada projeto teve um percurso diferente; os

participantes designers, artesãos e atores envolvidos precisaram responder às

regras e etapas de processos de acordo com os cenários pré-estabelecidos em

contextos distintos. Essa situação evidencia a afirmação de Manzini (2008)

sobre uma atividade colaborativa em comunidade criativa não poder ser

imposta.

Nesse contexto, Youngblood (1986) vê no Metadesign uma via expressiva para

a articulação de ideias de forma não centralizada, na qual os designers criam

situações dependentes do contexto, atuando como facilitadores e contando

com as contribuições de outros. O autor aponta o designer como um

estrategista, que deixa de ser o autor individual e compõe com o processo

projetual.

O design para inovação social é atualmente um dos propulsores das pesquisas em design para a sustentabilidade [...], a redução do peso de nossas atividades no ambiente passa por uma regeneração do tecido social e por uma redescoberta do valor da convivencialidade, como os termos comunidades criativas e organizações colaborativas nos indicam. Esse enfoque dado a convivencialidade propõe aos

Page 163: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

161

designers, e demais pesquisadores, desafios projetuais e conceituais inéditos (MANZINI, 2008, p.15).

Nas pesquisas realizadas pelo grupo de Manzini (DESIS) para explorar o

potencial da inovação social, de caráter tecnológico e de produção, foram

detectados comportamentos de consumo em ações fundamentadas no apoio

mútuo, auto-organização, confiança e interação. Denominado de “serviços

colaborativos”, apresentam-se como características principais as qualidades

interpessoais, sociais e ambientais. Esses sistemas são considerados

protótipos de formas criativas de lidar com os problemas da vida cotidiana

como habitação, transporte etc. Segundo Manzini (2006), essas novas

propostas são consideradas inovações sociais, pois demonstram mudanças na

maneira pelas quais os indivíduos ou comunidades agem para resolver

problemas ou gerar novas oportunidades. “É nessa complexa teia de

interações que as redes de design estão constituindo. E é graças a elas que

espera-se que passos concretos em direção a sustentabilidade sejam

efetivamente tomados” (MANZINI, 2008).

Para Manzini (2010, p.XIII), no molde da “próxima economia os designers

devem estar capacitados a colaborar com uma variedade de interlocutores,

gerenciando os conhecimentos de leitura da macrofigura das mudanças e a

microfigura das características do contexto local e dinâmicas vigentes”.

Os novos processos de design são complexas interações do design: novas redes de design em que indivíduos, empresas, organizações sem fins lucrativos, instituições locais e globais usam na criatividade e empreendedorismo para obter alguns valores compartilhados (DESIS apud MORAES, 2010, p.XIII).

Isso significa que o designer vai interagir com outros não profissionais em um

modelo de parceria, usando conhecimentos e ferramentas específicas do

Design para facilitar a convergência de ideias e soluções potenciais. Portanto,

segundo Manzini (2010, p.XIII), “nesse cenário fluido, dinâmico e complexo

emergem novas abordagens projetuais evidenciando a necessidade de

métodos para oferecer uma plataforma de conhecimentos acessível a todos os

participantes que conformam as inter-relações do design”. Supõe-se que desse

Page 164: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

162

cenário surjam possibilidades com variadas soluções para produtos e serviços,

que ao mesmo tempo vão possibilitar outros sentidos para o Design e usuários.

Para Krucken (2009, p.48), “as ações em comunidades com alguma

criatividade local promovem a inovação voltada para a sustentabilidade com

alto grau de participação social exigindo dos designers visão sistêmica para

integrar competências de diversos atores; eles assumem o papel de facilitador,

ou agente ativador, de ações colaborativas, promovendo interações na

sociedade”. Nessa perspectiva, Monzoni (2012, p.55) destaca que, para trazer

inovações, os contextos organizacionais – no caso, as comunidades criativas –

devem ser participativos e favoráveis às mudanças, estabelecendo um bom

relacionamento com seus stakeholders (artesãos). Ao implementarem um

programa de gestão (etapas projetuais) que busca integrar a sustentabilidade a

partir do planejamento estratégico (decisão de contextos), ações e metas são

pautadas pelo equilíbrio entre as dimensões econômicas, sociais e ambientais.

Nesse contexto, Vezzoli (2012, p.51) coloca que, para “uma abordagem de

configuração de atores envolvidos, o projeto de interação e associação entre

os respectivos participantes reagem para uma específica demanda social para

satisfação”. Por esse motivo, é preciso

permanecer críticos, reflexivos, adotando metas e critérios apropriados, o que evidencia a grande importância de estudar e desenvolver métodos e ferramentas, gerenciar e orientar o processo do design destinado à sustentabilidade (Ibid., p.52).

Qualquer tecnologia, processo, produto, serviço disponibilizam-se enquanto

uma interação. E segundo Vassão (2010), caso ocorra alguma alteração

tecnológica, o nicho continua conformado enquanto expectativa de interação;

os laços existem, pois segundo o autor, os nichos de interação se conformam e

se reformam, alterando-se de acordo com as múltiplas e constantes variações

da Ecologia de interação.

Para compreender o funcionamento dos nichos de interação, Vassão (2010,

p.80) sugere observar as relações entre virtual, atual, possível e real em dois

“quadrívios”, desenvolvidos a partir de Lévy, Deleuze e Guattari (LÉVY, 1998).

Tratam-se de quatro dimensões de entrechoques culturais que se conformam

Page 165: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

163

como contextos de interação interessantes para a compreensão da

complexidade:

“Possibilidade: a partir de uma identificação criativa de possibilidade, de

agenciamento possível de tecnologias e interações em um objeto,

serviço ou produto. A percepção deste agenciamento é feita em primeira

pessoa, o(s) propositor(es) experimentam a inovação diretamente ou um

experimento direto suscita inovação e raramente há uma demanda

oriunda no meio social”.

“Experimentação e luxo: a adoção do processo ocorre por

experimentação em primeira pessoa. O ‘convencimento’ é fruto da

percepção imediata do produto ou serviço e pode ocorrer por meio de

campanhas ou por disseminação entre os envolvidos. As relações entre

as partes envolvidas são pouco formalizadas, e muito da inovação se

configura e reconfigura a partir das apropriações e alterações de

interação uso consumo que os interatores promovem”.

“Disseminação no cotidiano: a percepção imediata da inovação é

percebida na difusão do conceito de uso que circula pela sociedade em

um objeto abstrato compacto e de fácil reprodução. Ocorre um processo

de experimentação com formalização gradual das relações entre as

partes em demandas mais qualificadas”.

“Necessidade: a inovação passa a ser associada a um número cada vez

maior de atividades e funções, pessoais e sociais, torna-se um dado e

não mais apenas uma possibilidade interessante, entendida como fato

consumado de um contexto, função ou situação, onde a retirada de tal

processo/serviço/produto de circulação causará transtorno considerável

dependendo do papel no nicho de interação que desempenha”

(VASSÃO, 2010, p.80).

Esse primeiro quadrívio (figura 58) corresponde a um processo que se repete

com regularidade, quanto aos mais diversos processos, produtos e/ou serviços;

sua identificação inverte a relação tradicional estabelecida pelo Design, de que

o projeto é uma resposta a uma necessidade pré-estabelecida. Conforme

Vassão (2010, p.82), é o contrário: o Design cria a necessidade (FLUSSER,

Page 166: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

164

2007), onde seu agenciamento inicial é fruto da identificação de uma

possibilidade, a emergência.

Figura 58: Processo geral de instauração de um novo nicho de interação. De possibilidade (agenciamento original), a inovação torna-se experimentação (exploração das possibilidades

postas em ação) e gradualmente dissemina-se pela sociedade (torna-se perceptível e acessível a um grupo social maior) e, por fim, torna-se necessidade (torna-se parte integral da

Ecologia de Interação). Fonte: VASSÃO (2010, p.82)

O segundo quadrívio (figura 59), segundo Vassão (2010), representa o modo

como o processo, produto ou serviço é proposto para ser questionado

tacitamente ou explicitamente pelo contexto social de uso concreto, onde:

Page 167: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

165

Figura 59: Quadrívio como forma de compreender a sequência de concepção isolada e sua circulação pela sociedade, no caso processo artesanal auto-poético em escala industrial.

Fonte: Constituído a partir de modelo Senac (VASSÃO, p.83)

(A) Inicialmente, há identificação das possibilidades que são articuladas

no agenciamento do produto ou serviço, como um campo amplo e

variável de intenções baseadas em percepções concretas quanto aos

seus elementos: tecnologia, processo de interação, percepção do objeto

de interação.

(B) Em um segundo momento é feita a especificação técnica do

processo, produto ou serviço, tendo em vista a sua produção em série.

Essa descrição é feita em linguagens formais (desenho técnico) e são

entidades possíveis, que podem ser tornadas reais.

(C) Quando a entidade é efetivamente produzida ou tornada concreta o

produto pode ser distribuído ou o serviço disponibilizado no domínio do

real. No caso de um produto é uma cópia realizada através de projeto e

produção serializada ou não. Há espaço para imprevistos e

emergências, mas estão debeladas pelo controle escrito que há nessa

passagem do possível para o real, sendo a variabilidade compreendida

como defeito e não potência para inovação.

(D) O processo, produto ou serviço é adquirido/acessado/consumido

pelo usuário/interator/consumidor, podendo surgir potencialidades

latentes além das previstas, implicando em novas interpretações que

irão reconfigurar o mesmo.

Page 168: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

166

(e) Fechamento e início do ciclo. Os propositores iniciais reconhecem as

emergências de modo imprevisto pelas comunidades de

usuários/interatores/consumidores; uma dificuldade a ser corrigida que

se tornará oportunidade para mais um ciclo de inovação (VASSÃO,

2010, p.83).

Nesse contexto, a ação do designer Walter Rodrigues junto à Associação das

Rendeiras dos Morros da Mariana, no Piauí (2002), de Jum Nakao, junto aos

artesãos e estudantes de designer de Moda em Fortaleza, no Ceará (2010), e

de Ronaldo Fraga (2012), junto à cooperativa Meninas de Tucumã, no Pará,

proporcionam a análise de estratégias de Metadesign nos processos de

criação desenvolvidos. Os resultados são dados pela colaboração, exigindo

que os participantes disponibilizem competências culturais e perceptivas para

desenvolver os objetos e processos em questão.

Isso promove uma série de fatores sustentáveis nos projetos que são externos

às influências mercadológicas, como a contextualização histórica e cultural dos

atores envolvidos. Ao analisar cada ação projetual separadamente, percebe-se

que as estratégias processuais foram escolhidas de acordo com as

características do grupo de atores participantes e de cada contexto em

especial, e o desenvolvimento do processo de acordo com medidas que se

mostraram necessárias em cada grupo.

A ação projetual de Ronaldo Fraga (2010) junto à cooperativa Meninas de

Tucumã (figura 60) aconteceu no período de quatro meses e foi marcada pela

escolha projetual com bias determinadas pelas características regionais do

território e artesanato local. Para implementar o desenvolvimento dos

processos na cooperativa, Ronaldo Fraga contou com auxílio de uma equipe

composta pela psicanalista Mônica Godoy, pelos designers Marcelo Maia,

coordenador de produção, Miriam Pappalardo, designer de jóias, e pelo

videomaker Marcelo Belém. As atividades do projeto concentraram-se em

workshops com o intuito de trazer conhecimentos teóricos e práticos de Design

e técnicas produtivas. Foi apresentada também a preocupação de que as

artesãs desenvolvessem um olhar crítico para reconhecimento de

Page 169: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

167

possibilidades locais no território e de auto-conhecimento para identificar e

desenvolver o próprio potencial criativo. Conforme destacam Godoy (2012) e

Fraga (2012):

A nossa proposta com esse trabalho é que o alcance dele vá para além da cooperativa de Tucumã, além da confecção das biojoias. A construção deste simbólico, desse universo cultural, dessa apropriação de uma identidade é exatamente o trabalho que estamos tentando fazer nas entrelinhas da confecção das peças [...] na medida em que um sujeito consegue se constituir como um sujeito digno com valor com planos para o futuro, com orgulho do próprio passado, isso transforma a sociedade, isso não transforma a vida de uma só pessoa (GODOY, 2012). A matéria fina e bruta de um projeto como este é fartura da falta, da falta de uma série de coisas, falta entende-se como dificuldade, um Brasil que está distante de outro Brasil (FRAGA, 2012).

Figura 60: Fotos dos workshops e processos produtivos na ação projetual de Ronaldo Fraga (2010) na cooperativa Meninas de Tucumã.

Fonte: Vídeo de processos Ronaldo Fraga (2012)

Para analisar o contexto do projeto de Walter Rodrigues, é preciso retomar o

cenário em que se encontravam as comunidades da região. A Casa, o Museu

do Objeto Brasileiro, através de sua diretora Renata Melão, com a

coordenação da artista plástica Silvia Sasaoka, iniciaram um projeto em 2000,

com a associação de artesãs, financiado pelo Ministério da Cultura com apoio

Page 170: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

168

do Sebrae-PI (Piauí) e curadoria de Suzana Avellar, intitulado “A Mão na Moda

- Uma História Brasileira”. A ideia surgiu de um projeto de artesanato solidário

do Museu, em colaboração com duas estudantes de Design de Moda da

Academia de Design de Eindhoven, Holanda, e foi desenvolvido em maio de

2000 na cidade de Serrita, em Pernambuco.

O objetivo era trabalhar com a Moda como uma área possível de geração de

renda para comunidades artesãs. Segundo Borges (apud PEROBA, 2008),

esse projeto foi mal sucedido, pois os estudantes-visitantes trouxeram o

material pré-fabricado, ao invés de desenvolverem estes a partir das demandas

locais identificadas. Essa ação capacitou o Museu a investir em outro projeto,

“A Mão na Moda”, com curadoria de Suzana Avellar. A comunidade escolhida

foi a das rendeiras do Morro da Mariana35, catalogada no Sebrae-PI. As

rendeiras trabalhavam a renda de bilro, "artesanato originário da Itália, trazido

pelos portugueses durante a época do Brasil colônia" (AVELLAR apud

PEROBA, 2008).

O designer Walter Rodrigues foi convidado a desenvolver o projeto junto à

comunidade. O museu enviou uma museóloga e um videomaker para

acompanhar e documentar o projeto, ao longo de um ano. A visita à

comunidade modificou a cor das linhas usadas para confeccionar os motivos e

a utilização de espessuras diferentes de fios. É importante destacar que Walter

Rodrigues manteve o padrão dos desenhos e a prática das rendeiras,

alterando a função dos bicos de renda para a forma da roupa; ou seja,

manteve-se as características dos bicos usados em peças de decoração e

utensílios do cotidiano, como panos de prato e toalhas de mesa, alterando-se

as cores de linhas e adicionando as peças de forma adequada ao moldes do

corpo feminino. Algumas peças foram apresentadas na Semana de Moda de

São Paulo em 2001, pelo designer Walter Rodrigues. Esse tipo de ação

evidencia uma situação em que o processo de desenvolvimento depende de

um conhecimento de tradição local, no caso as técnicas de rendas artesanais.

35 O grupo escolhido foi o das rendeiras do Morro da Mariana. O nome surgiu como uma homenagem à Mariana, uma rendeira que ficou famosa na região. O Morro da Mariana faz parte do município de Ilha Grande de Santa Isabel, no estado do Piauí, norte do Brasil, a 350 km da capital Teresina.

Page 171: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

169

Esse tipo de técnica é difícil de ser catalogada por se tratar de um saber

popular, uma prática comum do cotidiano. Além da tarefa de materializar esse

saber popular para posteriores consultas e contribuições culturais no museu,

Walter Rodrigues teve que contextualizar a ação com as artesãs no momento

atual. O museu atuou como mediador do processo de legitimação do valor da

relação colaborativa designer/artesãs, metodologia formal e o saber cultural.

Com a colaboração do designer de Moda Walter Rodrigues, elas passaram a

inserir alguns elementos dos princípios projetuais no fazer manual tradicional.

Esse fato gerou maior valor de mercado de Moda aos trabalhos e também a

disseminação da cultura tradicional local em escala global, com prêmios e

exposições em alguns museus e peças desenvolvidas para muitos designers

brasileiros e alguns internacionais, como pode ser observado (figura 61).

Page 172: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

170

Figura 61: Detalhe de processo de algumas técnicas de desenvolvimento da renda no Morro das Marianas, ferramentas, almofadas, agulhas e teares usados para fazer a renda e detalhes de uma das propostas elaboradas em colaboração com o designer Walter Rodrigues em 2001.

Fontes: (ACASA, 2013)

Page 173: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

171

Propósitos metaprojetuais parecidos também foram evidenciados por Jum

Nakao, idealizador do “Reality Project” (2012) com estudantes de Moda de

Fortaleza (figura 62), durante a 13ª edição do Dragão Fashion Brasil 2012, com

a promoção do Senac-CE. Jum Nakao deveria auxiliar os estudantes de Design

de Moda a identificarem elementos culturais e materiais do nordeste, com

paramentos metodológicos, para formalizar e materializar uma coleção com o

tema "Breve Manifesto pela Redescoberta do Paraíso Brasileiro”. A proposta

era de 22 peças de vestuário, que deveriam ser confeccionadas em

colaboração com artesãs e colaboradores locais. Houve a participação de vinte

pessoas entre estudantes, artesãs e colaboradores. Durante cinco dias, todos

os participantes da 13ª edição do Dragão Fashion puderam acompanhar o

processo de criação, que foi filmado e transmitido em tempo real via internet.

Nessa ação, Jum Nakao optou por formalizar a estrutura do espaço e precisou

tratar com situações distintas para promover os agenciamentos entre os pares,

pois a composição híbrida do grupo implicava em formações diferentes. A ação

ainda apresentou outro diferencial que é a presença dos espectadores em

tempo real, tanto na feira quando via web; este fato, segundo Fisher (1999),

caracteriza os mesmos como um outro consumidor do sistema.

Page 174: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

172

Figura 62: Fotos propostas da coleção "A hora do Brasil: Breve Manifesto pela Redescoberta do Paraíso Brasileiro"

Fonte: (JUMNAKAO.COM, 2013)

[...] Em um inteligente coletivo a comunidade assume o objetivo a negociação permanente da ordem estabelecida, de linguagem, do papel de cada um, o discernimento e a definição de seus objetos, a reinterpretação de sua memória. Nada é fixo, o que não significa que se trate de desordem ou de absoluto relativismo, pois os atos são coordenados e avaliados em tempo real, segundo um grande número de critérios constantes reavaliados e contextualizados. Interagindo com diversas comunidades os indivíduos que animam o Espaço do saber, longe de ser os membros intercambiáveis de castas imutáveis, são ao mesmo tempo singulares, múltiplos, nômades e em vias de metamorfose (ou de aprendizado) permanente (LÉVY, 1994, p.31).

Page 175: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

173

Em um contexto como esse, diferentes tipos de conhecimentos são colocados

como objetos possíveis de agenciamento para criar valor no desenvolvimento

de processos projetuais – no caso, as ações dos designers nas comunidades

locais. Lévy (1994, p.110) apresenta um guia para a construção do saber em

ambientes coletivos, como escolher entre diferentes orientações possíveis, ou

mesmo prospectar outras. O autor propõe um critério de escolha ético-político,

uma visão organizadora, em que devem ser encorajados os dispositivos que

contribuem para produção de uma inteligência ou de uma imaginação coletiva.

Segundo esse princípio geral, devem ser encorajados de preferência:

os instrumentos que favorecem o desenvolvimento do laço social pelo

aprendizado e pela troca de saber;

os agenciamentos de comunicação capazes de escutar, integrar e restituir a

diversidade, em vez daqueles que reproduzem a difusão midiática tradicional;

os sistemas que visam os surgimento de seres autônomos, qualquer que seja

a natureza dos sistemas (pedagógicos, artísticos etc.) e dos seres (indivíduos,

grupos humanos, obras, seres artificiais);

as engenharias semióticas que permitem explorar e valorizar, em benefício da

maioria, os jazidos de dados, o capital de competências e a potência

simbólica acumulada pela humanidade (Ibid.).

Nesse cenário de complexidade, demandas constantes de avaliação e

experimentos em condições controladas, pontuam e configuram as relações

entre os participantes. Assim, entende-se que as ações projetuais dos

designers nas comunidades, ao agenciarem aproximação pelas entidades

emergentes nos sistemas, vão conferir valores aos processos, resultantes da

ação criativa de cada artesão onde a unidade da coleção depende do controle

do designer sobre estes agenciamentos. Assume-se, portanto uma abordagem

de projeto com manipulação indireta, na qual, conforme Vassão (2010, p.78),

há autores que falam de abandonar o controle e deixar que o processo

amadureça com grau amplo de autonomia, mas sob observação oportuna

(Ibid., p.79), processo no qual o imprevisto é algo a ser promovido e utilizado

como atitude ética frente à alteridade, aceitando aquilo que emerge da própria

sociedade e cultura ao invés de tentar determiná-las.

Page 176: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

174

Page 177: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

175

Considerações finais

Esta pesquisa é consequência de projetos anteriores, em especial do trabalho

de conclusão de curso em graduação de Design de Moda, em que se

questionava o desenvolvimento de vestimentas e produtos de Moda orientados

por questões de sustentabilidade. Nesta dissertação de mestrado, foi possível

aprofundar questionamentos de ações de Design sobre os processos

produtivos e ações sociais na cadeia têxtil que visam a posicionamentos mais

adequados quanto às questões de fluxos de informações, materiais e

processos em cadeia produtiva têxtil, ações projetuais sócio-técnicas, inclusão

social e desenvolvimento humano. Observou-se nesta pesquisa cenários de

ações de Design de Moda em cadeia produtiva têxtil e ações projetuais de

designers em comunidades locais, em contextos de globalização com sistemas

distribuídos em redes com materiais, pessoas e informação em constantes

transformações, frente a questionamentos sobre reorientações econômica,

ecológica e social. Nesses cenários, os designers são colocados frente às

questões de escolhas de processos e estratégias nos projetos, tornando-se

facilitadores de interações entre stakeholdes diversos e distribuídos em

diferentes redes, localidades e realidades (que pode ser uma comunidade de

artesãos de determinada região ou um fornecedor com tecnologia específica

na cadeia têxtil). Essas características configuraram panoramas complexos em

ambientes de decisões dinâmicos, aos quais os designers são frequentemente

colocados a agir e compor os projetos. Dessa maneira, apontou-se a

instrumentalidade de Metadesign em desdobramentos de ações projetuais para

promover melhor fluxo de informação e interação na cadeia produtiva têxtil e

em comunidades locais com artesãs. Constatou-se a eficácia do Metadesign

como instrumento formalizador de questões abstratas em módulos gráficos e

mapas conceituais para manipulação de fluxos de informação e processos em

sistemas tecnológicos e sociais, distribuídos com fluxos relacionais que vão do

local ao global.

Entendeu-se que Metadesign e Metaprojeto são abordagens reflexivas, que se

valem do prefixo meta, a partir de Van Onck (1965), para instrumentalizar

ações projetuais com propósitos processuais distintos. Nesse sentido,

Page 178: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

176

procurou-se esclarecer as diferenças, possibilidades e limitações de ambas as

abordagens em que: Metadesign refere-se a uma abordagem com questões

filosóficas, além da cultura de projeto, podendo assim se estender para outra

dimensão da sociedade como, por exemplo, a própria linguagem humana.

Metaprojeto mantém-se nas questões tecnológicas e sociais relacionadas aos

escopos de projeto ligados à mercadologia e indústria.

A partir de Vassão (2010), Metadesign apresentou-se como um contexto de

questionamento frente às demandas epistemológicas nos projetos, onde foram

considerados fatores filosóficos e éticos direcionados ao controle de sistemas

inter-relacionais em nível de cadeia produtiva com stakeholders e fluxos

informacionais distribuídos em diferentes localidades, e também para

questionar a percepção da qualidade na interação entre pessoas, coisas e

lugares. Essas situações foram observadas na ação de Walter Rodrigues como

coordenador dos fluxos na cadeia produtiva têxtil do programa do Fórum

Inspiramais e na ação projetual com a artesã Yasmine, ambos em 2012.

Compreendeu-se que, quando formalizados e modularizados esses ambientes,

tornam-se tratáveis e possíveis de projetar a partir da identificação das

entidades emergentes. Nesse sentido, foram apontadas ferramentas

procedimentais para formalização, modularização e encapsulamento em níveis

de abstração, como o diagrama de rizoma e os diferentes fluxos na distribuição

das redes de interação. Procedimentos foram apresentados no organograma

de rizoma de fluxo relacional da cooperativa Coopa-Roca, fluxograma do

Programa Talentos do Brasil (2008), fluxograma do Fórum Inspiramais (2013),

fluxograma do Programa Origem Sustentável (2013) e quadrívio para

compreender os nichos de interação nas ações de Ronaldo Fraga em Tucumã

(PA) em 2012.

Sobre ações de Design de Moda na cadeia produtiva em comunidades locais,

a partir de Moraes (2010), constatou-se ser eficaz a instrumentalidade de

Metaprojeto quando em procedimentos referentes a questionamentos

mercadológicos e processos produtivos industriais. Como o autor não

questiona assuntos ligados à cognição e percepção social, esse fato torna as

plataformas de dados propostas por Moraes (2010) ideais para compor mapas

Page 179: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

177

conceituais, direcionados ao branding e know-how do território local, mas não

para questões enativas. Dessa forma, é pertinente utilizar ferramentas e

métodos apontados pelo autor, como análises SWOT e moodboard, para

análise de processos na cadeia produtiva tecnológica e cadeia de valor, mas

que não se estendeu para questões de interações e processos criativos em

colaboração nas redes sociais locais. Os mapas conceituais a partir de

Metaprojeto podem ser observados nas análises das comunidades locais com

ações de Manicoré (AM), Tucumã (PA), do Morro das Marianas (PB), e análise

SWOT de Tereza Leal, Ronaldo Fraga e Jum Nakao. Sobre inferir valor nos

processos na cadeia produtiva, Krucken (2009) faz importantes apontamentos

quanto às escolhas e estratégias de Design, visando a uma melhor distribuição

da informação entre os stakeholders e tornar perceptível valor e qualidade do

território nos produtos e serviços oferecidos aos consumidores.

As questões relacionadas às ações de Design de Moda em comunidades

locais que interferem na interação de redes colaborativas sociais, dadas pelas

tradições e costumes locais dos artesãos, foram colocadas a partir de

Giaccardi (2003) e Fisher (2004) como situação em que o contexto e estruturas

relacionais dos participantes formalizam as mensagens. Cenário em que

Vassão (2010) apontou que Metadesign torna-se um modo e não um modelo

de Design, sendo possível um projeto aberto onde os designers tornam-se

facilitadores de processos sociais coletivos auto-regulados, mediando

aplicações de ferramentas e formalizações que tornam menos complexa e mais

clara a interação nos grupos. Como foi observado nas ações de Walter

Rodrigues (2011), Ronaldo Fraga (2012) e Jum Nakao (2012).

No decorrer da pesquisa constataram-se alguns pontos críticos que merecem

sérias reflexões futuras. Um deles é a questão dos selos de certificação, em

que precisam ser repensados os processos de maneira a incluir todos os

participantes dos sistemas na validação dos procedimentos escolhidos. Os

selos não devem funcionar apenas como etiqueta informativa, mas devem

também promover conscientização nos consumidores frente aos

questionamentos de sustentabilidade ecológica e social tão necessários na

atualidade. Outra questão importante refere-se às ações projetuais de

Page 180: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

178

designers de Moda em comunidades locais que visam a proporcionar

valorização de culturas e tradições regionais. Muitas vezes, pode-se confundir

valores mercadológicos com desenvolvimento social local, fazendo com que

questões importantes como a auto-sustentabilidade dos sistemas sócio-

técnicos visando à auto-suficiência para os artesãos não sejam explicitadas, o

que impossibilita que esse sistema funcione a longo prazo. Alguns

procedimentos apresentaram escolhas projetuais que direcionam os processos

dos projetos para práticas sociais de desenvolvimento humano em lugar do

mercado. Apontamentos interessantes para essa questão foram identificados

nos projetos de Jum Nakao (2008 e 2012), Ronaldo Fraga (2012) e Walter

Rodrigues (2001) a partir dos critérios de abordagens de Metadesign, citados

por Vassão (2010). A formalização dos fluxos relacionais nas redes são

colocados em cenários a partir de direcionamentos deterministas indiretos de

projeto, situação semelhante a de Walter Rodrigues na coordenação do Fórum

Inspiramais, em que o designer não tem controle direto sobre os processo mas

agencia interações e sugere contextos de produção através das peças

gráficas. Essa ocorrência possibilita procedimentos em projetos abertos que

também podem acontecer a partir da observação dos contextos e das

interações nas comunidades, como fez Ronaldo Fraga e Jum Nakao, que

elaboraram as etapas processuais dos projetos de acordo com as entidades

emergentes localizadas em cada grupo e localidade.

Page 181: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

179

Referências bibliográficas

ABICALÇADOS. Cartilha Origem Sustentável: sustentabilidade combina com

rentabilidade. Programa do Fórum Inspiramais e ABICAÇADOS (Associação

brasileira das indústrias de calçados), 2013.

AVELAR, S. Moda: globalização e novas tecnologias. São Paulo: Estação das

Letras e Cores, 2009.

BARBOSA, B. D. Conceito jurídico de “know how”, 1979. Disponível em:

http://www.inovacao.usp.br/images/pdf/Conceito_juridico_de_know_how_-

_Denis_Borges.pdf Acesso em 27/07/2013

BATESON, G. Steps to an Ecology of Mind, Ballantine, Nova York, 1972.

______.Mente e natureza: A unidade necessária, Rio de Janeiro: LlVRARIA

FRANCISCO ALVES EDITORA S.A.,1986.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

BAXTER, M. Projeto de produto. São Paulo: Edgard Blucher, 1998.

BERLIM L. Moda e Sustentabilidade. São Paulo: Estação das Letras e Cores,

2012.

BEST, K. Design Management: managing design strategy, process and

implementation. Lausanne, Ava Publishing SA, 2006. p. 192

BLACK, S. The sustainable fashion handbook. London: Thames & Hudson,

2012.

BRAND, J.; TEUNISSEN, J. Global fashion/ Local tradition: On the

Globalisation of Fashion. Italiy: Terra, 2005.

BOMFIM, Gustavo Amarante. Algumas palavras. 2005. 13 p. (Inédito).

______.Coordenadas cosmológicas e cronológicas como espaço das

transformações formais. In COUTO, Rita Maria e OLIVEIRA, Alfredo Jefferson

(org). Formas do Design - Por uma metodologia interdisciplinar. Rio de Janeiro:

2AB, 1999. Disponível em:

http://periodicos.anhembi.br/arquivos/PTL/386656.pdf Acesso em: 27/07/2013

______.Fundamentos de uma Teoria Transdisciplinar do Design: morfologia

dos objetos de uso e sistemas de comunicação. Estudos em Design. V, nº 2,

1997.

______.Morfologia dos Objetos de Uso: uma contribuição para o

desenvolvimento de uma Teoria do Design. In: Estudos em Design – Design

Articles Anais P&D Design, 1996. P.9-18

Page 182: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

180

______.Notas de Aula sobre Design e Estética. PUC-RIO Departamento de

Artes & Design Laboratório da Representação Sensível: Rio de janeiro, 2001.

Disponível em: http://periodicos.anhembi.br/arquivos/Apostila/382670.pdf

Acesso em: 27/07/2013

______.Metodologia para Desenvolvimento de Projeto. Campina Grande:

Universidade Federal da Paraíba, 1984.

BOMFIM, G. A., ROSSI, L. M., NAGEL, K.-D. Fundamentos de uma

metodologia para desenvolvimento de produtos. Rio de Janeiro: COPPE/UFRJ,

1977.

BONSIEPE, Gui. Del Objeto a La Interface. Buenos Aires: Infinito, 1999.

______.Design, cultura e sociedade. São Paulo: Edgard Blücher, 2011.

BROWN, S. Eco Fashion. United Kingdom: Laurence King Publishers, 2010.

BÜRDEK, Bernhard E. Design: História, teoria e prática do design de produtos.

São Paulo: Blücher, 2006.

CASTILHO K.; OLIVEIRA A.C. Corpo e Moda: por uma compreensão do

contemporâneo. São Paulo: Estação das Letras e Cores. 2008

CATÁLOGO TALENTOS DO BRASIL. Edição: 2008, 2009, 2010. Disponível

em: www.talentosdosbrail.com.br e www.cooperunica.com.br Acesso em:

janeiro de 2013.

CAPRA, Fritjof, A Teia da Vida - Uma Nova Compreensão Científica dos

Sistemas Vivos / The Web of Life - A New Scientific Understanding of Living

Systems (1996)

______.O Ponto de Mutação: a ciência, a sociedade e a cultura emergente.

Digital Source, 1981. Disponível em

:http://www.joseferreira.com.br/blogs/filosofia/2011/07/livro-o-ponto-de-

mutacao-arquivo-em-anexo-para-download-enec/ Acesso em : 27/07/2013

CARDOSO, Rafael. Design para um mundo complexo. São Paulo: Editora

Cosac Naify, 2011.

CASTELLS, M. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

______.O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

CELASCHI, F.; DESSERTI, A. Design e innovazione. Strumenti e pratiche per

la ricerca applicata. Carocci Editore, 2007.

CELASCHI, F.; MORAES, D. Metaprojeto: o design do design. São Paulo:

Blucher, 2010. p. XIV-XVII.

Page 183: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

181

CHIAVENATO, Idalberto. Os Novos Paradigmas: como as mudanças estão

mexendo com as empresas. São Paulo: Atlas, 1996.

DE CARLI, A. M. S. (Org.). Moda, Sustentabilidade e Emergências. Rio Grande

do Sul: EDUCS: 2012.

______.ROSS, G. E.; ZORZI N.; GALVANI M. A.; BATTISTEL M. Moda no

terceiro milênio: novos valores e novas práticas. Projeto de Pesquisa Cnpq:

Design, sustentabilidade e tecnologia. 2009/20011. Disponível em:

http://www2.cultura.gov.br/economiacriativa/wp-

content/uploads/2012/12/Projeto-Moda-no-Terceiro-Mil%C3%AAnio-Novos-

Valores-e-Novas-Pr%C3%A1ticas.pdf Acesso em 27/03/2013

______.; MANFREDINI, M. L. Moda em sintonia. Rio Grande do Sul: EDUCS:

2010.

De CARLI, A. M. S.; BASTTITEL, M.; LAIN, I.; RÜCKER, U. Design e

artesanato: novidade e tradição, um diálogo possível. REDIGE v.2, n. 02, ago.

2011. Disponível em:

http://www.cetiqt.senai.br/ead/redige/index.php/redige/article/view/116/186

Acesso em 27/07/2013

DELEUZE, Gilles. Conversações. Rio de janeiro: Ed. 34, 2000.

______.Diferença e repetição. Rio de Janeiro: Graal, 1988.

______.Mil platôs: Capitalismo e esquizofrenia, vol.5. Editora 34, Rio de

Janeiro, 1998.

DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs, capitalismo e esquizofrenia. Rio

de Janeiro: Ed. 34, 1997.

DESIGN COUNCIL. Eleven Lessons: managing design in eleven global

companies. Desk research report. Londres: Design Council, 2007. Disponível

em:

http://www.designcouncil.org.uk/Documents/Documents/Publications/Eleven%2

0Lessons/ElevenLessons_DeskResearchReport.pdf Acesso em: 27/07/2013

ECO, H. Apocalípticos e integrados.1964. Editor: Difel,

Edição/reimpressão,1991.

FISCHER, G. Symmetry of Ignorance, Social Creativity, and Meta-

DesignCenter for LifeLong Learning & Design (L3D). Department of Computer

Science and Institute of Cognitive Science University of Colorado, Boulder,

Page 184: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

182

1999. Disponível em: http://l3d.cs.colorado.edu/~gerhard/papers/kbs2000.pdf

Acesso em 27/07/2013.

FLETCHER, Kate. Moda & Sustentabilidade: design para a sustentabilidade.

São Paulo: Senac, 2011.

FLUSSER, V. O Mundo Codificado. Organizador Rafael Cardoso. São Paulo:

Cosac Naify, 2007.

FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Graal, São Paulo, 2000.

FORTY, A. Objetos de desejo: design e sociedade desde 1750. São Paulo:

Cosac Naify, 2007.

FRANCO, A. Cocriação: reinventando o conceito. Festival de Ideias, 2012.

Disponível em: http://net-hcw.ning.com/page/co-criacao-reinventando-o-

conceito Acesso em: 27/07/2013

FURTADO, J.S. Auditorias, sustentabilidade, ISO 14000 e produção limpa:

limites e mal entendidos, 1998.

http://teclim.ufba.br/jsf/producaol/iso%20e%20pl. Acesso em 27/07/2013

GAIO, S. e GOUVEIA, L. (2007) O Branding Territorial: uma abordagem

mercadológica à Cidade. Revista A Obra Nasce. Edições UFP. ISSN 1645-

8729

GIACCARDI, Elisa e FISCHER Gerhard. Metadesign: a framework for the

future of end-user development. In: End user development: empowering people

to flexibly employ advanced information and communication technology.

Dordrecht, The Netherlands: Kluwer Academic Publishers, 2004. Diponível em:

http://l3d.cs.colorado.edu/~gerhard/papers/EUD-meta-design-online.pdf Acesso

em 27/07/2013

GIACCARDI, Elisa. (2003) Principles of Metadesign: processes and levels of

co-creation in the new design space. 2003. Tese de doutorado apresentada à

Universidade Plymouth. Disponível em: http://x.i-

dat.org/~eg/research/pdf/Giaccardi_PhD04.pdf Acesso em out 2009

.“Metadesign as an Emergent Design Culture” in Leonardo, 38:2 (August

2005) Disponível em: http://x.i-

dat.org/~eg/research/pdf/Giaccardi_Leonardo05.pdf Acesso em out 2009

GIULIANI, A. C. Marketing em um ambiente globalizado. São Paulo: Cobra

Editora e Marketing, 2003.

Page 185: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

183

HANDFIELD, R. B.; NICHOLS JR, E. L. Introduction to supply chain

management. Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall, 1999.

IBM C. Expanding the Innovation Horizon – The Global CEO Study 2006.

Somers, Nova Yorque: IBM Global Business Services, 2006a. Disponíve em:

http://www-07.ibm.com/smb/includes/content/industries/electronics/pdf/Global_CEO_Study_-

_Electronics.pdf Acesso em 24/09/2013

_____.Insurance 2020 Innovating beyond old models. IBM Global Business

Services. IBM Institute for Business Value, 2006b. Disponível em: http://www-

935.ibm.com/services/us/gbs/bus/pdf/g510-6291-00.pdf Acesso em 24/09/2013

_____.Design as an agent of change: A seat at the strategy table. Lee Green,

IBM VP, Global Brand Experience and Design. Norwegian Design Day – March

2008. Disponível em:

http://www.norskdesign.no/getfile.php/Filer/Artikler/Foredrag/IBM_Oslo%20Norway%20Design

%20Day_03_08.pdf Acesso em 24/09/2013

_____.Capitalizando na Complexidade – Visão do Global Chief – Executive

Officer Study. Nova Iorque: IBM Global Business Services, 2010. Disponível

em:

http://public.dhe.ibm.com/common/ssi/ecm/pt/gbe03297brpt/GBE03297BRPT.P

DF Acesso em 27/07/2013

KAZAZIAN, T. Haverá a idade das coisas leves: design e desenvolvimento

sustentável. São Paulo: Editora Senac, 2005.

KRUCKEN, Lia. Design e território: valorização de identidades e produtos

locais. São Paulo: Nobel, 2009.

_____.Design e território: uma abordagem integrada para valorizar identidades

e produtos. In: Anais do 2° Simpósio Brasileiro de Design Sustentável (II

SBDS), Rede Brasil de Design Sustentável – RBDS, São Paulo | Brasil | 2009b.

Disponível em: http://portal.anhembi.br/sbds/anais/ISSD2009-P-06.pdf Acesso

em 27/07/2013

_____.A análise da cadeia de valor como estratégia de inovação. Revista

DOM. Fundação Dom Cabral 01/2010. Disponível em:

http://www.researchgate.net/publication/215640476_A_anlise_da_cadeia_de_v

alor_como_estratgia_de_inovao Acesso em: 27/07/2013

_____.COSTA, M. D. . Design no processo de criação de valor nas

organizações: o uso estratégico de gráficos. In: Anais do 2º Congresso

Internacional de Design da Informação, 2005, São Paulo. Disponível

Page 186: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

184

em:http://dspace.universia.net/bitstream/2024/128/1/IDIC+Krucken+Costa.pdf

Acesso em 27/07/2013

LÉVY, Pierre. O que é virtual? São Paulo, Ed. 34, 1998.

_____.Cibercultura. São Paulo, Ed. 34, 1999.

_____.Inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. São Paulo:

Loyola, 1994.

LUCHIARI, D. P. Urbanização turística - um novo nexo entre o lugar e o

mundo. In: LIMA, L. (Org.). Da cidade ao campo: a diversidade do saber-fazer

turístico. Ceará: UECE, 1998.

McLUHAN, Marshall; FIORE, Quentin. O Meio são as Massa-gens. Rio de

Janeiro: Record, 1969.

MAGNAVITA, P.R. O LUGAR DA DIFERENÇA. RUA- Revista de Arquitetura e

Urbanismo, Salvador, BA, v.8, p.64-73, 2003. Disponível em:

http://www.portalseer.ufba.br/index.php/rua/article/view/3233/2351 Acesso em:

27/07/2013

_____.Economia Criativa de Resistência: Cultura e Cidade- Subjetividade e

Micropolítica- Paradigma étici-estético. Cadernos PPG-AU/FAUFBA, v.

especial, p. 65-79, 2011. Disponível em: http://www.ppgau.ufba.br/node/39

Acesso em: 01/01/2013

MALDONADO, Tomás. El diseño industrial reconsiderado. Barcelona: G. Gili,

1993.

MANZINI, E. Il design in un mondo fluido. In: P. Bertola e E. Manzini (Ed.).

Design Multiverso: appunti di fenomenologia del design/ Milano: Edicioni

POLI.design, 2004. Ildesign in un mondo fluido, p.17-24

______.Design for Sustainability. How to design sustainable solutions. 2007

______.On Service Design. Copenhagen: Service Design Symposium 2008.

______.An Emerging Paradigm. Service Design Research 2009. Disponível

em: www.servicedesignresearch.com/ezio-manzini Acesso em 27/07/2013.

______.O Desenvolvimento de Produtos Sustentáveis. São Paulo: EDUSP,

2008

______.; MORAES, D. Metaprojeto: o design do design. São Paulo: Blucher,

2010. p. IX – XIII.

Page 187: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

185

______.Design para Inovação Social e Sustentabilidade: Comunidades

Criativas, Organizações Colaborativas e Novas Redes Projetuais. Rio de

Janeiro: Epapers, 2008

______.Scenarios of Sustainable Wellbeing. Disponível em:

www.changedesign.org/Resources/Manzini/Manuscripts/ManziniScenarios.pdf

Acesso em :27/07/12

______.Prometheus of the everyday: the ecology of the artificial and the

designer’s responsibility. In: BUCHANAN, R.; MARGOLIN, V. (eds.).

Discovering design: explorations in Design Studies. Chicago and London: The

University of Chicago Press, 1995, p. 219-243.

______.MERONI A.; KRUKEN L. Relação entre produto, território e

consumidor. Visibilidade e comunicação entre o local e o global. In: Seminário

Internacional Biodiversidade, cultura e desenvolvimento. PBIB, Curitiba, 2006.

Disponível em:

http://www.academia.edu/2487321/Relacao_entre_produto_territorio_e_consu

midor._Visibilidade_e_comunicacao_entre_local_e_global._Relazione_tra_prod

otto_territorio_e_consumatore._Visibilita_ Acesso em 27/07/2013

______.MERONI A.; ET AL. Creative communities: People inventing

sustainable ways of living. Edizioni POLI.design First Edition: January 2007.

Disponível em:

http://81.246.16.10/videos/publications/creative_communities.pdf Acesso em

27/07/2013

MÃOS QUE [RE] FAZEM O MUNDO. Catálogo Coleção Talentos do Brasil -

Mãos que [re] fazem o mundo, edição 2009/2010. Disponível em

www.cooperunica.com.br Acesso em 01/01/2013

MARTINS, R. F. de F.; MERINO, E. A. D. A Gestão do Design como estratégia

Organizacional. Londrina: EDUEL, 2008.

MATURANA, H. Cognição, ciência e vida cotidiana; organização e tradução

Cristina Magro, Victor Paredes. - Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001.

______.Metadesign: Human beings versus machines, or machines as

instruments of human versus machines, or machines as instruments of human?

Disponível em: http://www.inteco.cl/articulos/006/doc_ing.htm Acesso em

27/07/2013

Page 188: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

186

______.; VARELA, F. De máquinas e seres vivos: autoiése – a organização do

vivo. Porto Alegre: Arte Médicas, 1997.

MERLIN, S. Standards do Mercado Voluntário. Social carbono: 2010.

Disponível em: http://www.bmfbovespa.com.br/empresas/download/semi-

carbono-PDF4.pdf Acesso em: 27/07/2013

MERONI, A. Strategic design: where we are now? Reflections around the

fondations of a recent discipline. Strategic Design Research Journal. Porto

Alegre:.2008. Disponível em:

http://www.academia.edu/835073/Strategic_design_where_are_we_now_Refle

ction_around_the_foundations_of_a_recent_discipline Acesso em 27/07/2013

MONZONI, Mario. Inovação e Sustentabilidade na Cadeia de Valor. Centro de

Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getúlio Vargas, GVces. Disponível

em: http://gvces.com.br/arquivos/117/publicacao_iscv_ciclo2012.pdf Acesso

em 27/07/2013

MORACE, F. (Org.). Consumo autoral: as gerações como empresas criativas.

São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2009.

MORAES D. Metaprojeto: o design do design. Anais In: Congresso de

Pesquisa e Desenvolvimento em Design, 7, Curitiba, 2006b. p. 1-6.

______.Limites do Design. São Paulo: Editora Studio Nobel, 1999.

______.Metaprojeto: o design do design. São Paulo: Blucher, 2010.

MORALES, Luis Alfredo Rodriguez. Para una Teoria del Diseño. México:

Tilde,1989.

MORIN, E. Introdução ao Pensamento Complexo. Lisboa: Instituto Piaget,

1991.

NACACCHE, A.; LONGOBARDI, A. Criatividade brasileira: Alex Atala,

Fernando e Humberto Campana, Jum Nakao: gastronomia, design e moda.

Barueri, SP: Manole, 2013.

NAKAO, J. Entrevista - Pesquisa Economia e Cultura da Moda no Brasil.

Instituto das Indústrias Criativas, Conselho Nacional de Políticas Culturais

(CNPC), Secretaria Executiva, Secretaria de Políticas Culturais do Ministério da

Cultura, 2011. Disponível em:

http://www.iniciativacultural.org.br/2011/01/seminario-e-pesquisa-economia-e-

cultura-da-moda/ Acesso em 27/07/2013. p.49

Page 189: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

187

NORMANN, R.; RAMIREZ, R. (1995) Le strategie interattive d'impresa. Dalla

catena ala costellazione del valore. Milano: Etas. (Do original: NORMANN, R.;

RAMIREZ, R. (1994) Designing interactive strategy from value chain to value

constellation. Chichester: John Wiley & Sons.)

______.From value chain to value constellation: Designing interactive strategy.

Harvard Business Review, v. 71, n. 4, Jul-Aug,(1993) p. 65-78

OLIVEIRA, Carlos. Global Algorithm 1.7: the silence of the lambs: Paul Virilio in

conversation. Ctheory, 1996. Disponível em:

http://www.ctheory.net/articles.aspx?id=38 Acesso em 27/07/2013

ORTIZ, R. Mundialização e cultura. São Paulo: Brasiliense, 1994.

PAPANEK V. Arquitetura e Design: Ecologia e ética. Lisboa/ Portugal: Edições

70, 1995.

______.Design for the real world: Human Ecology and Social Change. New

York: Bantam Books: 1973. 2.ª Edição, Chicago: Academy Chicago Publishers,

2000.

PESQUISA ECONOMIA E CULTURA DA MODA NO BRASIL. Instituto das

Indústrias Criativas, Conselho Nacional de Políticas Culturais (CNPC),

Secretaria Executiva, Secretaria de Políticas Culturais do Ministério da Cultura,

2011. Disponível em: http://www.iniciativacultural.org.br/2011/01/seminario-e-

pesquisa-economia-e-cultura-da-moda/ Acesso em 27/07/2013

PLATTNER, Hasso; LEIFER, Larry; MEINEL, Christoph. (Ed). Design Thinking:

Understand – Improve – Appy. Understand innovation. Berlin Heidelberg:

Springer, 2011.

PORTELA, ET AL. Cidade e Cultura: rebatimentos no espaço público

contemporâneo. Cadernos PPG-AU/FAUFBA / Universidade Federal da Bahia.

Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. - Ano 10, número 1, 2011. Disponível

em: http://www.ppgau.ufba.br/node/39 Acesso em: 01/01/2013

REYES, P.; BORBA, G. Design estratégico aplicado ao território. Em: Atas do

IV

Congresso Internacional de Pesquisa em Design. Rio de Janeiro, 11-13

outubro 2008.

ROOZEMBURG, N.F.M., EEKELS, J. Product Design. Chichester: John Wiley

& Sons, 1995.

Page 190: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

188

SANTAELLA, Lúcia. Comunicação e Pesquisa. Projetos para mestrado e

doutorado. São Paulo: Hacker editores, 2001.

SANTOS, F. A. N. V.. O Design como diferencial competitivo. Itajaí: Univali,

2000.

SANTOS, M. A natureza do espaço: técnica e tempo - razão e emoção. São

Paulo: Hucitec, 1996.

SODRÉ, M. Claros e escuros: identidade, povo e mídia no Brasil. Petrópolis:

Vozes, 1999.

THACKARA J. Plano B: O design e as alternativas viáveis em um mundo

complexo. São Paulo: Saraiva: Versar, 2008.

THE GLOBAL COMPETITIVENNESS REPORT 2011-2012. World Economic

Forum, Geneva, Swtzerland. Center for Global Competitiveness and

Performace, 2011. Disponível em:

http://www3.weforum.org/docs/WEF_GCR_Report_2011-12.pdf Acesso em:

27/07/2013

ULRICH, K.T; EPPINGER, S. D. Product Design and Development. Boston:

Irwin, 2008.

VALIATI, L.; SILVA L. S.; OLIVEIRA L. M. B.; PEREIRA R.N. Pesquisa

Economia e Cultura da Moda no Brasil. Instituto das Indústrias Criativas,

Conselho Nacional de Políticas Culturais (CNPC), Secretaria Executiva,

Secretaria de Políticas Culturais do Ministério da Cultura, 2011. Disponível em:

http://www.iniciativacultural.org.br/2011/01/seminario-e-pesquisa-economia-e-

cultura-da-moda/ Acesso em 27/07/2013

VARELA. F. Ethical Know-How: Action, Wisdom and Cognition. Stanford

University Press,1999.

VASSÃO, C. Metadesign: ferramentas, estratégias e ética para a

complexidade. Nacional: Editora Edgard Blucher, 2010.

_____.Arquiterura Livre: Complexidade, Metadesign,e Ciência Nômade. Tese

de Doutorado. São Paulo: FAUUSP, 2008.

VEZZOLI, C. Sustainability in Design: Now! LeNS, a regenerative multi-polar,

open learning platform on design for Sustainability. In: Anais do 2° Simpósio

Brasileiro de Design Sustentável (II SBDS), Rede Brasil de Design Sustentável

– RBDS, São Paulo | Brasil | 2009. Disponível em:

http://portal.anhembi.br/sbds/anais/ISSD2009-P-30.pdf Acesso em 27/07/2013

Page 191: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

189

_____.Design e sistema de inovação para a sustentabilidade. In: DE CARLI, A.

M. S. (Org.). Moda, Sustentabilidade e Emergências. Rio Grande do Sul:

EDUCS: 2012.

VIRILIO, Paul. The vision machine. London: BFI, 1994.

______.The art of the motor. Minneapolis: University of Minneapolis Press,

1996.

______.Cibermundo: a política do pior. Lisboa: Teorema, 2000.

______.The aesthetics of disappeareance. New York: Semiotext(e), 1991.

______.Velocidade e Política. São Paulo, Estação Liberdade, 1996b.

______.O espaço critico e as perspectivas do tempo real. Tradução de Paulo

Roberto Pires. Rio de Janeiro :Ed. 34, 1993.

VOLTOLINI, R. Rótulos, selos e certificações verdes. Idéia Sustentável. 2010.

Disponível em: http://www.ideiasustentavel.com.br/2010/07/rotulos-selos-e-

certificacoes-verdes/m

WIENER, Norbert. Cibernética e sociedade – o uso humano de seres humanos.

São Paulo: Cultrix, 1984.

WORLD ECONOMIC FORUM – Annual Report 2005/2006, Genebra.

Disponível em:

http://members.weforum.org/pdf/AnnualReport/2006/annual_report.pdf Acesso

em 17/02/2012.

Webgrafia:

1.FOLHA.UOL.COM.BR,2013

http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u25297.shtml Editado em

03/07/2002 - 20h05, Acesso em 27/07/2013

ACASA.ORG.BR, 2013

http://www.acasa.org.br/arquivo.php?pchave=Morros+da+Mariana Editado em

01/08/2000 a 16/11/2001, Acesso em 26/07/2013

ANABEATRIZBARROSFAN.COM, 2013 http://anabeatrizbarrosfan.com/coopa-

roca-2004-springsummer/ Editado em APRIL 14, 2013, Acesso em 26/07/2013

BLOGLOG.GLOBO.COM,2013

http://bloglog.globo.com/blog/blog.do?act=loadSite&id=75&postId=474&permali

nk=true Editado em 11/9/2007, Acesso em 27/07/2013

Page 192: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

190

COOPA-ROCA.COM.ORG, 2013 http://www.coopa-roca.org.br/ROCINHA.ASP

e http://www.coopa-roca.org.br/quem_somos.asp Sem data de edição, Acesso

em 26/07/2013

COOPERUNICA.COM.BR, 2013 www.cooperunica.com.br Sem data de

edição, Acesso em 01/01/2013

FRANCEBRAZIL.COM/FASHION, 2013 http://www.francebrazil.com/fashion/

Editado em août 4, 2005 at 04:00, Acesso em 27/07/2013

ECOFASHIONTALK.COM, 2013

http://www.ecofashiontalk.com/book/#sthash.abLRsDap.dpbs Sem data de

edição, Acesso em 27/07/2013

FFW.COM.BR, 2013 http://ffw.com.br/desfiles/sao-paulo/todas/ronaldo-fraga/

Sem data de edição, Acesso em 26/07/2013

HANDEYEMAGAZINE.COM, 2013 www.handeyemagazine.com/content/force-

coopa-roca-0 Editado em BY SASS BROWN | APRIL 14, 2011, Acesso em

26/07/2013

INICIATIVACULTURAL.ORG.BR,2013www.iniciativacultural.org.br

http://www.iniciativacultural.org.br/wp-content/uploads/2011/01/coopa-roca2.pdf

e http://www.iniciativacultural.org.br/2011/01/seminario-e-pesquisa-economia-e-

cultura-da-moda/ Editado em 17/01/2011 , Acesso em 27/07/2013

INSPIRAMAIS.COM.BR, 2013 www.inspiramais.com.br Sem data de edição,

Acesso em 27/07/2013

JUMNAKAO.COM.BR,2013

http://www.jumnakao.com.br/produtos-interna.php?categoria=5&projeto=12

http://www.jumnakao.com.br/produtos-interna.php?categoria=5&projeto=70

Sem data de edição, Acesso em 26/07/2013

LOMARDU.COM/?/PORTFOLIO, 2013 www.lomardu.com/?/portfolio Editado

em Belo Horizonte, 2011, Acesso em 26/07/2013

MAIS.UOL.COM.BR,2013

http://mais.uol.com.br/mediasByTags.html?types=A&tagIds=44145&index.curre

ntPage=1&index.orderBy=mostRecent Editado em 03/02/2004 15h15, Acesso

em 27/07/2013

MDA.GOV.BR, 2013

http://portal.mda.gov.br/portal/saf/programas/talentosdobrasil/2297450

Page 193: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

191

http://mda.gov.br/portal/saf/noticias/ Sem data de edição, Acesso em

27/07/2013

MULHER.UOL.COM.BR, 2013

http://mulher.uol.com.br/moda/album/ccbb_retalhar_album.htm Sem

data de edição, Acesso em 27/07/2013

PULPEDICOES.COM, 2013) http://pulpedicoes.com/2008/08/01/o-poder-

transformador-do-design/ Editado em AGO 1 2008, Acesso em 27/07/2013

PBS.ORG/OPB/THENEWHEROES, 2013

http://www.pbs.org/opb/thenewheroes/meet/leal.html Sem data de edição,

Acesso em 27/07/2913

RFI.FR, 2013 www.rfi.fr/actubr/articles/067/article_107.asp Editado

em13/07/2005, Acesso em 27/07/2013

PROXIED.CHANGEMAKERS, 2013

http://proxied.changemakers.net/journal/02june/walbran.cfm Editado em june

2002, Acesso em 27/07/2013

RONALDOFRAGA.COM/BLOG, 2013 http://ronaldofraga.com/blog/?p=105

Editado em 22 set 2008, Acesso em 26/07/2013

ROSIS, 2012 http://www.flickr.com/photos/renataderosis/sets/ Sem data de

edição, Acesso em 01/01/2013

TALENTOSDOBRASIL.COM.BR, 2013 www.talentosdobrasil.com Sem data

de edição, Acesso em 01/01/2013

TEREZASANTOS.COM.BR/CATEGORIA/PORTFOLIO,2013

www.terezasantos.com.br/categoria/portfolio Sem data de edição, Acesso em

27/07/2013

TORDBOONTJE.COM, 2013 http://tordboontje.com/projects/chandeliers/come-

rain-come-shine/ Editado em 2004, Acesso em 27/01/2013

Websites consultados

http://2.uol.com.br/modabrasil/rio_link/fashion_rio_02/cooparoca/index.htm Sem

data de edição, Acesso em 26/07/2013

http://aam.org.br/prefeituras/353-prefeitura-municipal-de-manicore Sem data de

edição, Acesso em 26/07/2013

http://centrodecomponentes.com.br/forum-de-inspiracoes/inverno-2013 Sem

data de edição, Acesso em 26/07/2013

Page 194: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

192

http://coronelbessa.blogspot.com.br http://coronelbessa.blogspot.com.br/2009/02/bandidos-

invadem-cidade-dominam.html Editado em sábado, 28 de fevereiro de 2009, Acesso em

26/07/2013

http://mcpetesez.com/august152002.htm Editado em August 15, 2002,

Acesso em 26/07/2013

http://www.prefeituradetucuma.pa.gov.br/Galerias/Ver.aspx?Id=J3lewrNZU8eA

GPZU8JyiPAPCaszdReMUS Editado em 17/6/2013 11:08:28, Acesso em

26/07/2013

http://tvcultura.cmais.com.br/srbrasil/cesto-de-palha-de-tucuma Editado em

24/02/12 15:04, Acesso em 26/07/2013

http://estilo.uol.com.br/moda/ultnot/2007/08/15/ult630u6339.jhtm Editado em 15/08/2007 -

20h50, Acesso em 27/07/2013

Page 195: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Anexo1

Análise SWOT Coopa-Roca para a pesquisa: “Economia e Cultura de Moda”

(2011)

Page 196: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 197: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Anexo 2

Análise SWOT Jum Nakao para a pesquisa: “Economia e Cultura de Moda”

(2011)

Page 198: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 199: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Anexo 3

Poema de Ronaldo Fraga para a Coleção Turista Aprendiz na Terra do Grão Pará – SPFW –

Verão 2012/13

Em analogia ao trabalho que realizou na região do Pará, Ronaldo Fraga faz alusão ao poema

"Evocação do Recife", de Manuel Bandeira, recitado durante o desfile e presente no release da

coleção. Pode ser visto e ouvido no site do designer, declamado por Gaby Amarantos:

Ô Manuel...

Nestas andanças por este Brasil, tenho visto e vivido coisas estupendas! Agorinha mesmo

minhas retinas beberam a manhã mais linda do Rio Amazonas... mas nada que me traz

saudades hoje e que me extasia ver, me provocará um dia o desejo de rever com precisão

absoluta e fatalizada o que as terras do Grão Pará já o fazem.

Quero o Pará como se quer um amor sobressaltado, como de sobressaltado de paixão esta

terra tomou-me, deixando-me doente de desejo. Aqui, Manuel, as pessoas são seres

marchetados em madeira de lei. Os beijos amortecem como o jambu, os corpos têm cheiro de

manga e as almas... bom, as almas... carregam mistério das águas profundas. Você, como

mestre da escrita, meu querido poeta, conhecerá esta como a terra do superlativo, onde ao

procurar o belo e o feio encontrarás o tenebroso e o maravilhoso. Tudo cantado e encantado

por uma certa Matita Pereira.

Daria todos os açaís do mundo para vê-lo enfeitiçado por este lugar. O mesmo feitiço

amazônico que transforma mulher bonita em castanheira, flores em pássaros , pepitas de ouro

em sementes da mata. Impossível, Manu, descrever em palavras escritas ou faladas os

assombros e desassombros deste lugar. E é neste lugar do sem palavras que sua ausência o

faz mais presente! Só me resta nesta embriaguez de paixão vestir o meu linho branco e depois

da chuva sentar no terraço do Grande Hotel, com vista para as mangueiras que encobrem o

teatro da Paz e chupitar um sorvete de cupuaçu sem pressa de mais nada...

Você que conhece o mundo, conhece coisa melhor que isso, Manuel?? Com saudade, um

abraço deste turista aprendiz,

Sob licença poética reescrevo aqui esta carta imaginária, que possivelmente Mario de Andrade

teria enviado a Manuel Bandeira, caso este tivesse conhecido Fafá de Belém, Dira Paes, Paulo

Chaves, Dona Onete, Mestre Verequete e Mestre Catiá, Lino Villaventura e André Lima, as

meninas de Tucumã, e escutado as óperas de Waldemar Henrique ou se jogado em uma

aparelhagem com Gaby Amarantos. (Ronaldo Fraga, 2012).

Pode ser acessado e escutado quando declamado por Gaby Amarantos em:

http://www.ronaldofraga.com.br/turista/ Acesso em 27/07/2013

Page 200: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 201: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Anexo 4

Análise SWOT de Ronaldo Fraga para a pesquisa: “Economia e Cultura de

Moda” (2011)

Page 202: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes
Page 203: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes

Anexo 5

Trecho entrevista com Dijon de Moraes (2008)

"Design e Cultura por Dijon de Moraes" (entrevista concedida a Fernanda Cury,

Cláudia Regina Martins e Cecille Figueredo)

Após nosso encontro com Dijon de Moraes no evento P&D (2008), ele

gentilmente nos concedeu a entrevista abaixo, deixando clara a estreita ligação

existente entre Design e cultura, e lançando reflexões acerca do trabalho

desenvolvido pelos designers.

[trecho respectivo à pergunta de número 9]

P9: O que você pensa acerca da parceria entre designers e artesãos? A troca fortalece a

ambos?

A princípio são duas forças distintas, que podem sim interagir entre si. O artesanato pode ser

explorado na sua manifestação mais original, que é deixar a marca da mão do artesão no

produto. Isto é o que determina a imperfeição e a falta de padronização desejável no

artesanato, são valores inerentes às produções artesanais e fruto de uma cultura popular

espontânea.

A produção industrial tem outra lógica, outro ritmo e outra escala de produção. A máquina

busca eliminar as imperfeições e a mão do homem se manifesta através do Design, de seus

conceitos e de suas modalidades de uso ali previamente estabelecidos pelo projeto.

Quando o designer faz a interface com o artesanato, ele deve, a meu ver, ser capaz de abstrair

da lógica produtiva e industrial e se aproximar da lógica artesanal. Muitos conseguem fazer

isso com mais precisão e arte, outros deixam transparecer a lógica e o ritmo da indústria na

produção artesanal. Tudo depende da cultura de cada designer, de sua consciência política e

social, somente assim ele poderá proporcionar uma contribuição relevante ao artesanato,

mesmo tendo como base uma formação capitalista que apontava para a grande produção e

para o consumo de massa. Até agora, no que pude perceber, a troca fortaleceu mais aos

designers (como aprendizagem) que aos artesãos.

Postado por Cecille Figueredo, Cláudia Regina {Cacau}, Fernanda Cury às

06:54

http://novosboemios.blogspot.com.br/2008/12/design-e-cultura-por-dijon-de-

moraes.html

Acesso em 27/07/2013

Page 204: Metadesign no Design de Moda: Projetando localidades em redes