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Ao final desta aula, você deverá: perceber a evolução do conceito de literatura; situar, no tempo, o conceito de literariedade. Demonstrar como se configura a literatura ao longo do tempo. Meta Objetivos 2 aula HISTORICIZANDO A LITERATURA

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Ao final desta aula, você deverá:

• perceber a evolução do conceito de literatura;• situar, no tempo, o conceito de literariedade.

Demonstrar como se configura a literatura ao longo do tempo.

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HISTORICIZANDO A LITERATURA

29Letras VernáculasUESC

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AULA IIHISTORICIZANDO A LITERATURA

1 INTRODUÇÃO

Assim como a maioria dos termos que envolvem atividades culturais, intelectuais e artísticas, o termo “literatura” apresenta uma forte carga polissêmica, isto é, apresenta um leque de possibilidades diferentes.

Nesta aula, você verá que o caminho mais seguro para conceituar a literatura está no seu tratamento histórico. Isto porque, através da ingerência do tempo e dos acontecimentos sociais, o conceito de literatura, bem como a própria literatura, tende a se modificar.

30 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Historicizando a literaturaFundamentos de Teoria da Literatura

2 O CONCEITO DE “LITERATURA” ATRAVÉS DOS TEMPOS

Derivada do termo erudito latino

litteratura, o termo chegou ao ocidente,

por volta do século XV, em grande

parte das línguas europeias, mormente

aquelas relacionadas ou originárias do

latim, as chamadas neolatinas; demorou

um pouco mais em outras línguas, tais

como a alemã, que chegaria apenas no

século XVI e, no russo, no século XVII.

O crítico Vitor Manuel de Aguiar e Silva

(1986) aponta o ano de 1510 como a

primeira datação do termo “literatura”

em português.

Partindo da etimologia da palavra

“literatura”, há inicialmente o significado

de erudição, arte de escrever e ler ou,

ainda, gramática, significados estes que

permaneceram mais ou menos até o

século XVIII, alternando um sentido de

ciência em geral e de cultura relacionada

ao homem de letras, ou seja, aquele

afeito à literatura e seus fazeres. A partir

do século XVII, encontramos vários

termos que se equivalem à literatura,

atuando num mesmo campo de ideias.

Termos tais como poesia, belas artes e

eloquência tentam substituir “literatura”

na aceitação social.

A grande transformação do

significado coincide, já na segunda

metade do século XVIII, com a própria

mudança na sociedade europeia, quando

se verifica um profundo deslocamento

semântico. Deste modo, a palavra em vez

de significar cultura do letrado, saber ou

arte de ler, passa, então, a ter um sentido

de objeto sobre o qual nos referimos, não

Etimologia (do grego antigo ἐτυμολογία,

composto de ἔτυμον e - λογία “- logia”) é a

parte da gramática que trata da história ou

origem das palavras e da explicação do significado de palavras através da análise dos elementos que as constituem. Por

outras palavras, é o estudo da composição dos vocábulos e das

regras de sua evolução histórica. Algumas palavras deri-vam de outras línguas,

possivelmente de uma forma modificada (as

palavras-fontes são cha-madas “étimos”).

Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/Etimologia.

A história da

literatura se confunde

com a própria história da

escrita e do livro.

FIGURA 2

Fonte: UAB/UESC

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designando uma qualidade ou sujeito. Em fins do século

XVIII, o filósofo e poeta alemão Lessing dá contornos

definitivos ao problema quando sintetiza “literatura”

como um conjunto de obras literárias. No momento

seguinte, no auge da formação do Estado Moderno,

esse sentido é ampliado, passando a designar obras

literárias de um determinado país, a chamada literatura

nacional.Segundo Silva (1986, p. 23),

[...] por volta da penúltima década do século XVIII, a palavra ‘literatura’ conhece um novo e importante matiz semântico, passando a designar o fenômeno literário em geral e já não circunscrito a uma literatura nacional, em particular. Caminha-se para a noção de literatura como criação estética, como específica categoria intelectual e específica forma de conhecimento.

Assim, a nomenclatura literatura nacional ganha

destaque e diz respeito à literatura inequivocamente

representante de um país, com traços característicos

de uma nação. As literaturas com essas características

aparecem com a fundação dos estados modernos,

por volta do século XVIII. Geralmente, essas obras,

representantes da nacionalidade, encerram uma

temática peculiar que diz respeito ao espírito da própria

nação.

Como você pode perceber, após um período em que

“literatura” assume o significado de obra ou conjunto de

obras características de um determinado país, passa-se,

então, a entender “literatura” como fato estético, isto é,

como criação artística. Desta forma, da mesma maneira

FIGURA 3 - Algumas obras fundadoras de literaturas

nacionais. A primeira relacionada à Alemanha, a segunda à França

e a terceira ao Brasil.

Fonte: UAB/UESC

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O Estado moderno nasceu na segunda metade do século XV, a partir do desenvolvimento do capitalismo mercantil, nos países como a França, Inglaterra e Espanha, e, mais tarde, na Itália. Foi neste último que surgiu o primeiro teórico a refletir sobre a formação dos Estados Modernos, Nicolau Maquiavel, que, no início de 1500, falou que os Estados Modernos fundavam-se na força. Entre as características do Estado Moderno estão:

•Soberania do Estado: o qual não permite que sua autoridade dependa de nenhuma outra autoridade;

• distinção entre Estado e sociedade civil: evidencia-se com a ascensão da burguesia, no século XVII.

Fonte:pt.wikibooks.org/wiki/Estadomoderno.

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Gotthold Ephraïm Lessing (1729 - 1781). Considerado um dos maiores escritores alemães do século XVIII, é um autor de extrema importância para o neoclassicismo. Lessing é um dramaturgo alemão de grande importância por propor um drama burguês onde os heróis são figuras contemporâneas, abrindo mão, desta maneira, do conceito aristotélico de tragédia que só permitia reis como protagonistas. Ele também teorizou sobre o drama como um novo gênero teatral, que seria o “rebaixamento” da tragédia e a “elevação” da comédia, em que se buscaria a catarse trágica, ou seja, a purificação das emoções. Contudo, a catarse do drama se dá através das lágrimas, logo o objetivo dessas peças seria extrair lágrimas do público.

Fonte: pt.wikipedia.org/wiki/Gotthold_

Ephraim_Lessing.

32 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Historicizando a literaturaFundamentos de Teoria da Literatura

que se faz arte, pintura, escultura, música, se faz também arte

literária, literatura, em que o escritor é o sujeito.

Cabe esclarecer que o escritor começa a se diferenciar,

obtendo a peculiaridade do artista, na medida em que há a

valorização dos gêneros literários, como prosa e poesia (que

você estudará adiante), criando a necessidade de um conceito

que abarcasse todas as manifestações de caráter estético e

artístico que expressassem a palavra escrita, desde romances

e novelas até a dramaturgia. Daí, o sujeito que produz a arte

literária parece ser o escritor num sentido amplo. Cabe agora

saber o que esse escritor faz com o texto que o torna artístico,

que o torna literário.

A atenção para o caráter literário se deu já no século XX,

quando movimentos de crítica literária passaram a se preocupar

com a peculiaridade da obra de arte literária. O primeiro desses

movimentos foi o formalismo russo, seguido pelo new criticism

norte-americano.

O primeiro teve início por volta de 1910/1930 e ganha

projeção a partir do chamado Círculo Linguístico de Moscou.

Pesquisou métodos que explicassem a literatura através da

própria literatura, sem a necessidade de lançar mão de conceitos

externos, como eram os casos da psicanálise, da filosofia, da

história etc. Assim, chegou a uma forma rigorosa de apreensão

do literário, numa verdadeira formulação metodológica. Na

mesma linha formalista, o segundo movimento, o new criticism,

corrente crítica norte-americana, defendia uma análise

minuciosa do texto, o chamado close reading – texto fechado,

no sentido de se apreender suas especificidades intrínsecas.

Entre outras coisas, os dois movimentos, de origem

crítica, atentam para as qualidades específicas e diferenciais

da linguagem literária, em outras palavras, procuram de forma

incessante e rigorosa tal literariedade, que daria o diferencial,

singularizando através de valores únicos o discurso literário.

Mas, afinal, em que consiste a literariedade? É isso que

verá a seguir.

3 O CONCEITO DE LITERARIEDADE

O pressuposto de que haveria, na obra literária, uma

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propriedade que a caracterizaria como pertencente à literatura

é o fundamento da ideia de “literariedade”. Para denominá-la,

os formalistas criaram o termo literaturnost, que foi traduzido

para a língua portuguesa como “literariedade”, que consiste

na apreciação objetiva da existência de propriedades ou

características que, quando presentes em uma obra qualquer,

nos permitem não só classificá-la como literária, como também

inscrevê-la em um estilo de época. A “literariedade” seria aquela

propriedade, caracteristicamente “universal” do literário, que

se manifestaria no “particular”, em cada obra literária.

4 O PROBLEMA DA HISTÓRIA DA LITERATURA

A questão da História da

Literatura, desde o seu aparecimento,

no século XVIII, definindo sua

natureza, examinando suas relações

com as áreas afins e com a sociedade

de onde emergiu, e verificando sua

trajetória em literaturas de diferentes

comunidades, tem sido uma constante

ao longo do tempo. No Brasil, os

primeiros registros da literatura

precederam a Independência. Essas

histórias ocorreram em resposta à difusão da literatura em

função da expansão da imprensa, do aumento da produção

literária escrita em língua vernácula, da consolidação da escola

e do ensino.

A esses fatos, somaram-se a ascensão da burguesia,

que colocou a literatura e a leitura em lugar de destaque; a

disseminação do capitalismo, que tinha na industrialização

do livro uma de suas expressões possíveis; a formação dos

estados nacionais, que buscaram na língua e na literatura a

corporificação da identidade e da nacionalidade. Além disso,

a história da literatura pode ser relacionada com a teoria e a

crítica literárias, dando um caráter de disciplina e de científico

ao seu estudo.

Para sistematizar algumas informações, vamos às

atividades!

FIGURA 5 - A literariedade distingue uma obra literária de uma não-literária.

Fonte: http://www.sintrascoopa.com.br/wp-content/uploads/2009/03/bula-de-remedios.jpg

34 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Historicizando a literaturaFundamentos de Teoria da Literatura

Nesta aula, você viu o conceito e a aceitação da literatura ao longo do tempo, especialmente aquela relacionada à mudança de literatura de seu caráter de sujeito, daquele que faz, para um caráter estético, aquela que é feita. Viu também que a “literariedade” representou um dos marcos fundamentais na mudança do conceito de literatura, bem como a criação da literatura nacional como um marco na acepção de literatura.

ATIVIDADES

1. O termo “literatura”, no século XV, recebe a concorrência de vários outros que se mostram equivalentes. Quais são?

2. No século XVIII, há uma transformação substancial no conceito e entendimento de literatura. Em que consiste tal transformação?

3. Como se caracteriza uma literatura nacional?

4. A literatura como objeto estético ganhou um impulso definitivo com a criação do conceito de “literariedade”. Em que consiste tal conceito?

RESUMINDO

LEITURA RECOMENDADA

Para complementar esta aula, recomendo a leitura de LIMA, Luis Costa. Teoria da literatura em suas fontes. V. I e II, Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2002 e SOUZA, Roberto

Acízelo de. Teoria da literatura. São Paulo: Ática, 2007.

Na próxima aula... você estudará a natureza da obra literária.

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RE

FE

NC

IAS

AMORA, Antonio Soares. Introdução à teoria da literatura. São Paulo: Cultrix, 2004.

GOMES, Heidi Strecker. Análise de texto: teoria e prática. 10. ed. São Paulo, Atual, 1991.

GONÇALVES, Magaly Trindade; BELLODI, Zina C. Teoria da literatura ‘revisitada’. Petrópolis: Vozes, 2005.

JOBIM, José Luis. Introdução aos termos literários. Rio de Janeiro: Eduerj, 1999.

MOISÉS, Massaud. A criação literária. São Paulo: Melhoramentos, 1973.

SILVA, Vítor Manuel de Aguiar e. Teoria da literatura. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1986.

Suas anotações

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