melissa officinalis l: caracterÍsticas gerais e...
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_____________________________________________ISSN 1983-4209 - Volume 05– Número 02 – 2011
1 Acadêmica do curso de Farmácia, Universidade Estadual do Centro-Oeste, UNICENTRO.
2 Professor (Orientador) do Departamento de Farmácia da Universidade Estadual do Centro-Oeste, UNICENTRO.
Mestre em Química Orgânica (PGQu – IQ/UFRJ) e Doutorando em Química ((PGQu – IQ/UFRJ)
[email protected]. Rua Simeão Camargo Varela de Sá, no3, Departamento de Farmácia, CEP 85040-080,
Guarapuava, Paraná.
MELISSA OFFICINALIS L.: CARACTERÍSTICAS GERAIS E BIOSSÍNTESE DOS
PRINCIPAIS METABÓLITOS SECUNDÁRIOS
1Tábata Cristina
Colussi; Luciana Facco Dalmolin
1; Marielly Pachtmann
1;
2Guilherme B. Langoni
de Freitas
RESUMO
Estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que aproximadamente 80% da
população mundial recorrem ao uso de plantas medicinais para saciar suas necessidades de cuidados
primários de saúde. Grande parte dos medicamentos disponíveis atualmente tem origem
exclusivamente vegetal ou são obtidos a partir de precursores naturais (medicamentos semi-
sintéticos). O Brasil possui grande parte das espécies vegetais exploradas comercialmente com
finalidade medicinal e, dentre essas muitas espécies descritas está a Melissa officinalis L. Esta
planta teve excelente adaptação em todo território brasileiro, com isso, é encontrada em
praticamente todas as Regiões. Muitas propriedades farmacológicas são descritas para a Melissa,
sendo a principal sua atividade ansiolítica. Este trabalho de revisão teve como objetivo destacar os
principais metabólitos secundários, vias biossintéticas e as influências do meio na produção dos
princípios ativos da M. officinalis. Uma discussão e conclusão crítica encontram-se marcante neste
estudo que também engloba as possibilidades reais de utilização da Melissa como um fitoterápico
eficaz e seguro.
Unitermos: Fitoterápico, erva-cidreira, citral, ansiolítico.
MELISSA OFFICINALIS L.: GENERAL CARACHTERISTICS AND BIOSSYNTHESIS OF
MAIN SECUNDARY METABOLISM
ABSTRACT - Estimates realized by the World Health Organization (WHO) have showed that
approximately 80% of the world resort to the use of medicinal plants to satisfy their needs for
primary health care. Much of the currently available drugs are exclusively of plant origin or are
derived from natural precursors (semi-synthetic drugs). Brazil has most of the commercially
exploited plant species with medicinal purpose, among these described species is Melissa officinalis
L. This plant has had an excellent adaptation throughout the Brazilian territory, therefore, it is found
in almost all regions. Many pharmacological properties are described for Melissa, the main is the
anxiolytic activity. This review aims to highlight the main secondary metabolites, biosynthetic
pathways and the influences of the production of active principles of M. officinalis. A critical
discussion and conclusion are striking in this study that also includes the real possibilities of use to
Melissa as an effective and safe herbal medicine.
Uniterms: herbal medicine, citral and ansiolitic.
INTRODUÇÃO
O acúmulo milenar de conhecimentos empíricos sobre a ação dos vegetais por diversos
grupos étnicos contribuiu para que a utilização de plantas medicinais se tornasse uma prática muito
comum na medicina popular, independente de raça, crédulo ou fatores sócio-econômicos (Simões et
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al., 1998). Atualmente, esta prática encontra-se inserida em muitos tratamentos, na forma de
fitoterápicos, o que a torna engranzada em um meio não mais empírico, mas sim com forte
conotação científica e excelente potencial de crescimento.
Fitoterápicos são medicamentos que possuem propriedades reconhecidas de cura, prevenção,
diagnóstico ou tratamento sintomático de doenças. Eles devem ser manipulados exclusivamente
com plantas ou partes de plantas medicinais tais como raízes, cascas, folhas, flores, frutos ou
sementes (BRASIL, 2004). Com a evolução dos estudos sobre as plantas medicinais, estas estão
sendo cada vez mais indicadas pelos profissionais de saúde (Arnous et al., 2005).
Estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que aproximadamente 80%
da população mundial recorrem ao uso de plantas medicinais para saciar suas necessidades de
cuidados primários de saúde, sendo que destes, 30% dos pacientes utilizaram fitoterápicos por
indicação médica (Albagli, 2001; Martins, 2000). Dentre os 252 fármacos essenciais selecionados
pela OMS, 11% têm origem exclusivamente vegetal e boa parte consiste em medicamentos obtidos
a partir de precursores naturais (medicamentos semi-sintéticos) (OMS, 1991; Rates, 2001).
O Brasil é possuidor de uma flora rica, composta de uma infinidade de espécies com
aplicações terapêuticas e tem a maior diversidade genética vegetal (megabiodiversidade), contando
com mais de 55.000 espécies catalogadas, sendo assim a maior cobertura vegetal em todo o planeta
(Corrêa, 2002). No Brasil, a utilização de plantas medicinais teve origem na cultura dos diversos
grupos indígenas, com o uso, por exemplo, do jaborandi (Pilocarpus spp) e do guaraná (Paullinia
cupana). Outras plantas foram trazidas pelos europeus, como é o caso da camomila (Matricaria
chamomila) e da malva (Malva sylvestris). Espécies vegetais provenientes de outros países
sulamericanos, como o boldo de origem chilena (Peumus boldus), adaptaram-se bem,
principalmente em regiões ao sul do Brasil (Simões et al., 1998). Dentro dessas muitas espécies
descritas está a Melissa officinalis L. popularmente chamada de erva-cidreira, pertencente à família
Laminaceae, originária da Ásia e da região que circunda o Mediterrâneo. Esta planta teve excelente
adaptação em todo território brasileiro, sendo encontrada até mesmo na região do semi-árido (Lima,
1988). Muitas propriedades farmacológicas são descritas para a Melissa, sendo a principal sua
atividade ansiolítica (Mimica-Dukic et al., 2004; Pereira et al., 2005).
O cultivo de espécies aromáticas e a obtenção de óleos voláteis têm grande importância
econômica devido seu crescente uso nas indústrias alimentícias, cosméticas e farmacêuticas.
Avalia-se que há mais de 500 mil hectares com cultivos de plantas de espécies da família
Lamiaceae objetivando a extração de seus óleos essenciais (Simões & Spitzer, 1999). Diversos
fatores podem influenciar o rendimento e a composição do óleo essencial, entre eles a idade da
planta, a época da colheita, as condições ambientais e as partes utilizadas (Corrêa et al., 1994).
A principal classe de compostos que formam o óleo essencial da Melissa são os terpenos
(Hay & Waterman, 1993). Estes podem ser subdivididos em mono e sesquiterpenos, com esqueletos
de 10 e 15 carbonos, respectivamente. A principal característica dos terpenos é a presença da
unidade isopreno, formada por cinco carbonos. Assim sendo o citral, derivado isopreno que aparece
em maior quantidade no óleo essencial de Melissa officinalis L. e o qual teve ênfase neste trabalho,
é originado da rota do ácido mevalônico. O citral pode ser obtido por destilação com 98% de
pureza. Utilizado na indústria de perfumes e alimentos, tendo grande importância na síntese de
vitamina A e β-caroteno (Craveiro, 1981; Leal, 1998).
Este trabalho objetivou realizar uma revisão bibliográfica sobre as características
morfológicas da Melissa officinalis L., que tornam possível a identificação, bem como as
propriedades terapêuticas, os principais metabólitos secundários e os fatores ambientais que
influenciam na biossíntese dos princípios ativos presentes na planta.
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MATERIAL E MÉTODOS
A fim de realizar a revisão bibliográfica, foram feitas buscas com ênfase aos artigos
direcionados ao óleo essencial de Melissa officinalis L. e aos principais metabólitos secundários da
planta. Estas buscas foram alcançadas através da revisão de artigos científicos, teses, dissertações,
livros e resumos científicos. A pesquisa bibliográfica foi realizada nas bases de dados Scientific
Electronic Library Online (SCIELO), PubMed, Minerva, Scopus e Google Acadêmico. Os
descritores utilizados na pesquisa foram: citral, Melissa officinalis L., características morfológicas,
indicações terapêuticas, metabólitos secundários, interações medicamentosas, biossíntese e óleo
essencial, sendo estas utilizadas de forma isolada ou combinada. A partir do banco de dados
construídos, 45 trabalhos demonstraram melhor relação com o objetivo proposto na pesquisa, assim
sendo, estes foram selecionados para compor o corpo desta revisão.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS
A Melissa officinalis L. é uma planta arbustiva que pode atingir de 20 a 80 cm de altura.
Ramificados desde a base, seus caules formam touceiras, característica marcante da espécie. A parte
superior das folhas apresenta uma coloração verde-intensa enquanto a parte inferior possui uma
tonalidade verde-clara; medem de cinco a oito cm de comprimento, são pecioladas, opostas, ovais,
pilosas e com nervuras bem salientes (Hertwig, 1986; Launert, 1989). Quando surgem as flores são
brancas ou amareladas, porém à medida que o tempo passa tendem a ficar rosadas (Figura 1). As
características que indicam a idade da espécie, e.g. cor das flores, são fundamentais para predizer os
melhores períodos de colheita da melissa relacionando-os com a quantidade de metabólitos
secundários obtidos.
Figura 1. Floração característica da Melissa officinalis. As diferenças na tonalidade variam entre de acordo com o desenvolvimento da planta, onde o branco (A) representa a planta jovem, já o rosa (B) caracteriza o período do desenvolvimento. Adaptado de www.viable-herbal.com/singles/herbs/s395.htm; http://www.bragancanet.pt/brunhoso/flora.htm.
No Brasil a planta não produz florescência, diferente do que ocorre em seu habitat de origem
(Launert, 1989). Esta diferença demonstra um processo de adaptação da planta, o qual ainda não
está bem explicado. Por conter citral, um metabólito secundário pertencente à classe dos óleos
voláteis, a M. officinalis possui odor semelhante ao do limão, sendo este intensificado quando a é
planta seca (Reis et al., 2009). O odor pode se tornar menos intenso caso a planta esteja exposta a
A B
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forte calor e ventos fortes. Esta variação está diretamente relacionada à quantidade do óleo volátil
que é perdido durante a exposição da melissa a estas condições adversas.
A adulteração da M. officinalis é realizada através da inserção de partes da Erva-cidreira-
brasileira (Lippia alba) junto à melissa. Esta adulteração pode ser facilmente identificada através da
análise de cortes e testes químicos.
CARACTERÍSTICAS DO ÓLEO ESSENCIAL
O óleo essencial da melissa é obtido por hidrodestilação e seu baixo rendimento (0,02 a
0,40%) o torna pertencente a uma das classes mais valiosas de óleos essenciais. Aliado ao baixo
rendimento, importantes propriedades farmacológicas, fazem com que a melissa ocupe um lugar de
destaque no rol de plantas medicinais, tornando o preço de seu óleo extremamente alto quando
comparado aos óleos essenciais de rosas e de flor de laranjeira (Sanguinetti, 1989; Sorensen, 2000).
Apesar do baixo rendimento, a hidrodestilação ainda é superior as demais técnicas utilizadas para
extração dos óleos essenciais testados para a Melissa, i.e. arraste à vapor, enfleurage e prensagem a
frio. A metodologia empregada na hidrodestilação é extremamente simples e se resume na inserção
da matéria-prima vegetal em água, sem que a temperatura ultrapasse 100 oC, a fim de evitar perda
de material sensível a temperatura.
A qualidade do óleo essencial depende do estágio de desenvolvimento da planta, como
também dos micronutrientes fornecidos, qualidade do solo ou meio de cultura, temperatura, entre
outros fatores (Stefanini et al., 2006). A influência do meio de cultura foi evidenciada através de
estudos in vitro, onde foram alterados apenas os micronutrientes mantendo-se constantes todas as
demais variantes do meio. As técnicas de cultivo in vitro podem beneficiar no estudo da produção,
desenvolvimento da espécie, biossíntese de metabólitos secundários, variações fisiológicas e no
meio que alteram essa produção, além de facilitar a propagação das plantas (Hipolyte, 2000;
Panagiotopoulos et al.,2000). Após a identificação dos fatores sazonais e fisiológicos que alteram a
produção de determinados metabólitos secundários, os cultivos in vitro ou em meio controlado
serão essenciais para manter um padrão e, consequentemente abrir um caminho para um controle de
qualidade mais seguro e eficaz.
Estudos demonstraram que o sistema de cultivo, levando-se em conta os materiais da
cobertura do solo empregados e as condições edafoclimáticas em que essa cultura é desenvolvida,
pode interferir na produção das folhas e consequentemente na quantidade de óleo essencial
produzido pela planta, visto que estes se encontram em maior concentração nesta região. O plástico
preto é uma das coberturas do solo mais utilizada, pois aumenta a taxa de desenvolvimento, reduz a
infestação por pragas, controla as plantas invasoras, aumenta a produtividade e antecipa a colheita
da planta (Galambosi & Szebeni-Galambosi, 1992; Miranda et al., 2003). A proteção do solo pela
cobertura morta também leva a redução da perda de nutrientes por lixiviação e redução da erosão
(Corrêa et al., 2003). A melissa sobrevive bem em solos ricos em matéria orgânica e locais
ensolarados (Martins et al., 1998). Apesar de ser uma planta com alto potencial de adaptação, o
controle de alguns fatores é crucial na quantidade de metabólito produzido, por exemplo, um solo
bem drenado e com pH maior 5,5 acelera a biossíntese (Furlan, 1999). A colheita da planta é
iniciada após o aparecimento dos primeiros botões florais e realiza-se o corte a 10 cm do solo
(Oliveira, 1995). A secagem deve ser feita em temperatura de até 38°C e evitando a claridade, pois
esta pode provocar oxidação das folhas (Castro & Chemale, 1995). O processo de oxidação induz
muitas vezes isomerização de compostos químicos e formação de radicais reativos de oxigênio.
Estes produtos oxigenados podem gerar efeitos biológicos indesejáveis após a utilização da fração
seca.
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O óleo essencial da melissa encontra-se principalmente nos tricomas glandulares peltados
que se localizam em ambas as superfícies da planta, abaxial e adaxial. Os tricomas do tipo capitados
apresentam alguns lipídeos e carboidratos, porém não possuem o óleo essencial (Martins & Pastori,
2004). Esta seletividade na localização dos óleos essenciais pode ser de grande serventia em
processo de identificação vegetal, e.g. quando se analisam duas plantas semelhantes, assim como
em processos de controle de qualidade, ao mensurar a concentração de determinado óleo.
Ensaios in vitro do óleo essencial obtido das folhas de Melissa officinalis L. demonstraram a
presença de componentes tais como taninos derivados dos ácidos rosmarínicos e caféico, ácidos
triterpenóides e flavonóides. Entretanto, os componentes majoritários presentes na folha de Melissa
podem ser visualizados na Figura 2, isto é, citronelal (1, 2-40%), citral (2, mistura de neral e
geranial: 10-30%), seguidos pelo β-cariofileno (3), germancreno D (4), ocimeno (5) e citronelol (6)
(Simões et al., 1998; Lorenzi & Matos, 2002; Silva et al., 2005).
CH3
CH3H3C
CH3
CH3H3C
CHO
CHO
CH3
CH2
H3CCH3
CH3 CH3
CH3
CH3
CH3
CH3H3C
CH2CH3
CH3H3C
OH
(1) (2) (3)
(6)(5)(4)
Figura 2 - Estrutura química dos componentes majoritários das folhas de Melissa officinalis:
citronelal (1), citral (2), β-cariofileno (3), germacreno D (4), ocimeno (5) e citronelol (6).
Apesar do citral ser normalmente representado como na Figura 2 (2), ou seja, em uma forma
enantiomericamente pura, a rota biossintética da Melissa produz compostos diasteroisômeros
(Figura 3). Com isso, dois isômeros são formados, o primeiro conhecido como citral A ou isômero
E (geranial) e o segundo sendo o citral B ou isômero Z (neral); seus nomes químicos são,
respectivamente, (2E)-3,7-dimetilocta–2,6–dienal e (2Z)-3,7-dimetilocta–2,6–dienal. Por serem
diasteroisômeros, geranial e neral possuem propriedades físico-químicas diferentes, o que torna
possível a separação dos metabólitos com maior facilidade. Através de técnicas simples como
cromatografia, ponto de fusão ou extração com solvente, os dois produtos são isolados com grande
rendimento.
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Figura 3. Estrutura molecular dos isômeros do citral, componente do óleo essencial de Melissa
officinalis L.
Constatou-se que as folhas mais velhas produzem quantidade relativamente menor de óleo
essencial quando comparadas as mais jovens. Os metabólitos secundários geralmente são
degradados nas partes envelhecidas das plantas, como por exemplo, folhas e flores secas, o que
induz uma diminuição nas concentrações (Singh et al., 1991; Campos & Filho, 1975). Seguindo as
características gerais dos óleos voláteis, a presença de citral também é mais acentuada nas folhas
jovens (Singh, 1989; Carriconde et al., 1996). Após estas afirmações fica óbvio que qualquer
pretensão de extrair o citral, seja para fins terapêuticos ou comerciais em geral, deve levar em
consideração a idade da planta. Devido o rendimento do processo extrativo do citral ser
extremamente baixo, a identificação do período correto da coleta ganha importância significativa.
PROPRIEDADES TERAPÊUTICAS DO ÓLEO ESSENCIAL
Seu óleo possui propriedades farmacológicas relevantes, e.g. antifúngica, antibacteriana e
ansiolítica, sendo esta última, a principal característica da planta (Mimica-Dukic et al., 2004;
Pereira et al., 2005). A melissa possui ainda atividade antioxidativa, antimicótica, adstringente, anti-
inflamatória, antitumoral (confirmada em estudos recentes realizados com espécies endêmicas do
Nordeste brasileiro) e antiviral, principalmente sobre o vírus da Herpes Simples, causador da herpes
labial e caxumba (Teske & Trenttini, 1997; Lorenzi & Matos, 2002; Haber et al., 2005, Blank,
2005). Há um grande conflito quando se relaciona propriedades antimicrobianas ou antitumorais
com potencialidade terapêutica de determinados metabólitos secundários. Muitas vezes as
atividades são realmente observadas, porém em uma concentração extremamente alta, a qual se
torna tóxico até mesmo ao paciente. O ideal seria analisar in vivo e de forma comparativa a
atividade dos metabólitos com fármacos referências e, em seguida realizar estudos de relação
quantitativa estrutura-atividade, a fim de compreender quais são os grupos farmacofóricos.
Como já citado anteriormente, a principal característica terapêutica da planta é como
calmante, atuando no sistema nervoso central (SNC) através da modulação de processos cognitivos
e do humor, além de alterar movimentos espontâneos (Akhondzadeh et al., 2003; Kennedy et
al.,2002). Um dos pontos que vêm atraindo maior atenção são os efeitos positivos sobre os déficits
cognitivos observados em pacientes com doença de Alzheimer (Perry et al.,1999). O mecanismo
envolvido neste processo ainda não é bem elucidado, porém Wake e colaboradores (2000)
demonstraram que a Melissa exibe efeitos no sistema colinérgico sobre receptores nicotínicos e
muscarínicos. O mesmo estudo relatou que a maior ativação ocorre sobre os receptores nicotínicos
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presentes nos tecidos do córtex occipital humano (Perry et al., 1996; Wake et al., 2000). Apesar dos
efeitos observados, poucos compostos foram, até o presente momento, isolados e caracterizados
como geradores dos mesmos, o que causa certa frustração.
Ultimamente, diversas técnicas são utilizadas pelas indústrias farmacêuticas a fim de
obterem ou otimizarem novos fármacos. Dentre as estratégias mais empregadas estão screenings
farmacológicos e/ou virtuais, estudos in silico e técnicas clássicas de modificação molecular, i.e.
homologação, bioisosterismo, restrição conformacional ou simplificação molecular, por exemplo.
No entanto, ao mesmo tempo, a Melissa proporciona várias propriedades biológicas de grande
interesse as quais poderiam ser mais bem exploradas, entretanto, grande parte destes princípios
ativos, assim como seus receptores, ainda é desconhecida. Com isso, é incompreensível a dualidade
entre o desenvolvimento presente nas indústrias farmacêuticas com a lentidão no incremento da
fitoterapia, a qual ainda se encontra, muitas vezes, bem próxima do patamar inicial do
conhecimento empírico.
BIOSSÍNTESE DOS ÓLEOS ESSENCIAIS
Os metabólitos secundários das plantas provem de três rotas biossintéticas conhecidas como
via do acetato, mevalonato e do ácido chiquímico. O citral vem da rota do acetato o qual é derivado
do acetil coenzima A, onde pela combinação de três moléculas de acetato é formado o intermediário
ácido mevalônico (Figura 4, 1) com seis carbonos. O ácido mevalônico é então convertido no
isopentenilpirofosfato (IPP) (Figura 4, 2) e, este pela ação da enzima isopentenil pirofosfato
isomerase sofre isomerização e forma o 3,3-dimetilpirofosfato (DMAPP) (Figura 4, 3). Até este
ponto as reações usualmente se caracterizam como reações da etapa 1. Em seguida, os compostos
IPP e DMAPP se unem e, através de uma reação catalisada pela enzima geranil pirofosfato
sintetase, fornecem o primeiro monoterpeno reconhecível que é o geranil pirofosfato (GPP) (Figura
4, 4). Por fim, ocorre a perda da fração pirofosfato da molécula de GPP gerando produtos
oxigenados como o geraniol (Figura 4, 5) que após oxidação origina enfim o citral (Figura 4, 6)
(Martins, 2000). A união do IPP com DMAPP até a formação do citral caracterizam-se como etapa
2 da biossíntese. O conhecimento desta via biossintética disponibiliza uma visão clara da
importância de cada componente presente nas reações e torna possível o planejamento de
estratégias que inibam ou ativem as enzimas presentes no caminho metabólico. Isto demonstra que
o conhecimento, ainda obscuro, de enzimas que degradem o citral é essencial para se obter uma
planta Melissa que seja modificada e, portanto, apresente uma maior concentração do citral.
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Figura 4. Rota biossintética do citral dividida em duas etapas. Note que IPP (isopentenilpirofosfato),
DMAPP (3,3-dimetilpirofosfato) e GPP (geranil pirofosfato).
CONCLUSÃO
Com base nesta revisão bibliográfica, conclui-se que houve uma grande evolução em relação
às pesquisas sobre plantas medicinais. Demonstrou-se que há dados que comprovam os benefícios
da planta Melissa officinalis L., fatores que influenciam a composição e o teor de seus óleos
essenciais, e.g. de fatores ambientais. Regiões que apresentam um clima mais árido assim como
regiões características de ventos fortes geralmente possuem espécies de M. officinalis com uma
menor concentração de óleo volátil, devido às condições apresentadas pelo meio. Estes estudos são
de grande importância visto que a Melissa é amplamente utilizada pela população, principalmente
pela sua propriedade ansiolítica, sendo administrada na forma de infusão de suas folhas. Porém,
muitas pesquisas ainda podem ser desenvolvidas para um maior conhecimento sobre a planta e seus
metabólitos.
O interesse em compreender a importância dos outros metabólitos secundários presentes na
espécie é fundamental para uma utilização racional da mesma. Isto se deve ao risco de interações
farmacológicas, efeitos tóxicos e inibições químicas e fisiológicas do metabolismo humano
possíveis de ocorrer por moléculas biologicamente ativas.
Desvendar as etapas subseqüentes à formação do citral também é de suma importância, pois
o controle da concentração deste metabólito na planta passa por este entendimento. Enzimas
catabólicas e anabólicas poderiam ser controladas a fim de obter maior ou menor produção de citral.
Tendo este controle a etapa de extração que muitas vezes limita a obtenção do óleo essencial se
tornaria facilitada.
REFERÊNCIAS
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