livro presídio 2013

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Vânia M. Lino, Wesley Campos G. Soares (Org.) Alunos da 1ª Etapa da Educação de Jovens e Adultos - EJA “E quando a solidão bate à porta?” 3º edição 2013

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Page 1: Livro presídio  2013

Vânia M. Lino, Wesley Campos G. Soares (Org.)

Alunos da 1ª Etapa da Educação de Jovens e

Adultos - EJA

“E quando a solidão

bate à porta?”

3º edição

2013

Page 2: Livro presídio  2013

2

Vânia M. Lino, Wesley Campos G. Soares (Org.)

Alunos da 1ª Etapa da Educação de Jovens e

Adultos - EJA

“E quando a solidão

bate à porta?”

3º edição

2013

Page 3: Livro presídio  2013

3

Governador do Estado de Goiás

Marconi Ferreira Perillo Júnior

Secretário de Estado da Educação

Thiago Mello Peixoto da Silveira

Subsecretária Regional da Educação de Uruaçu

Dania Solange Wobeto de Freitas

Tutora Pedagógica

Gilda de Fátima Mizael Lopes

Colégio Estadual Professor Joaquim Francisco Santiago

Diretora

Simone Pires Gomes

Vice-Diretora

Maria das Dores de Oliveira Gonçalves

Secretária Geral

Alcimária Antunes Borges Martins

Centro de Inserção Social de Niquelândia

Diretor

Gecélio Ferreira de Almeida

Sala de Aula Professora Querobina Daniel da Silva

Extensão do Colégio Estadual Professor Joaquim Francisco Santiago

Coordenadora Pedagógica

Lucilene Barbosa Fiúza

Edição de texto:

Vânia Moreira Lino / Wesley Campos G. Soares

Page 4: Livro presídio  2013

4

Edição de arte:

Vânia Moreira Lino / Wesley Campos G. Soares

Ilustração da capa:

Vânia Moreira Lino

Revisão:

Vânia Lino e Wesley Campos

Impressão:

Vânia Lino e Wesley Campos

Autores

Altiely Rodrigues da Silva

Célio Ferreira Franco

Deigivânio Barbosa de Barros

Dilvange Perira de Brito

Edivaldo Madureira Taveira

Eliel França dos Reis

João Batista Xavier Filho

Luciano Vicentin dos Santos

Odair Domingos da Silva

Oscalino Reges Rodrigues

Osvaldo Chaves Monteiro

Samuel Francisco da Silva

Suelber Sidney Belos de Lemos

Valdivino Rosa de Souza

Wedson Tiburcio dos Santos

Welliton Francisco da Silva

Page 5: Livro presídio  2013

5

SOBRE OS AUTORES

Os alunos referidos nessa obra não são exatamente iguais aos

demais, pois possuem uma experiência de vida diferente. São pessoas

que erraram e que desejam cumprir suas penas para se libertar do jugo

que se transformou suas vidas. São pessoas que constroem e

reconstroem suas histórias a partir do muito pouco oferecido na triste

realidade de um presídio.

No cotidiano das suas atividades procuram dar o melhor de si,

para quem sabe o dia passar mais rápido, ou para tentar extrair desse

ambiente tão triste, um pouco de alento para suas almas.

São pessoas que apesar de não possuírem muitas alegrias e

expectativas, não desistem, buscam incansavelmente a liberdade e a

dignidade como cidadãos. Enfim, são seres humanos comuns que

almejam uma vida melhor, de recomeço, tropeços, e quem sabe erros,

mas, sobretudo, uma vida intensa, verdadeira e digna, para então

poderem ser verdadeiramente denominados cidadãos.

Wesley Campos Gomes Soares

Page 6: Livro presídio  2013

6

AGRADECIMENTOS

À Deus por nos permitir vislumbrar horizontes outrora

desconhecidos.

À Equipe Gestora do Colégio Estadual Professor Joaquim

Francisco Santiago pelo apoio e credibilidade dispensados a nós,

durante o trabalho.

Aos professores pelo apoio e dedicação.

Ao Gecélio Ferreira de Almeida, diretor da Agência Prisional,

pela contribuição e empenho na realização desse projeto.

Ao apoio da Professora Daiane Narciso Dias Lima, que

assumiu a sala, dando continuidade ao trabalho iniciado pela

professora Coraci Gonçalves da Silva.

Page 7: Livro presídio  2013

7

EPÍGRAFE

“Sigamos em frente, desviando-nos

quando for necessário desviar, curvando-

nos quando for necessário curvar. Ora

seguindo por caminhos floridos, ora

enfrentando corredeiras. Em todos os

momentos, viver a VIDA, que avança cada

vez mais bela e majestosa!”

Anônimo

Page 8: Livro presídio  2013

8

SUMÁRIO

Apresentação................................................................................ 10

Introdução..................................................................................... 19

O Passado de Um Presente Desumanizador................................. 21

O Recomeço................................................................................. 29

Para Início de Conversa............................................................... 30

Desalento...................................................................................... 31

Uma Pequena Luz no Fim do Túnel............................................. 33

Um Sono Profundo....................................................................... 34

Malandro....................................................................................... 35

Cadeia: O Cômodo do Inferno..................................................... 36

Deus: Nosso Verdadeiro Amigo................................................... 39

A Liberdade.................................................................................. 40

Jogo de Dama............................................................................... 43

Lixo Humano................................................................................ 44

Dia de Visita................................................................................. 47

A Minha Vida na Prisão............................................................... 48

Ilusão do Crime............................................................................ 49

O Valor da Liberdade................................................................... 52

Drogas Matam.............................................................................. 53

O Amor: Espada Invisível............................................................ 55

Page 9: Livro presídio  2013

9

Código Penal................................................................................ 56

A Injustiça Social.......................................................................... 58

Gírias de Prisioneiro.................................................................... 60

Vida na Roça................................................................................ 62

A Vida de Um Filho Desobediente.............................................. 65

Modos de Respeito....................................................................... 68

Minha História............................................................................. 70

Obrigado Senhor Por Este Dia a Dia............................................ 73

A Política...................................................................................... 75

Versos da Pinga............................................................................ 76

A Minha Vida............................................................................... 79

O desencontro/ encontro da vida ...............................................80

Sonho Inesperado.......................................................................82

A Boa Convivência do Ser Humano.........................................84

A Vida de Um Detento...............................................................85

Lembranças................................................................................86

Avião..........................................................................................88

Um Novo Senhor........................................................................89

Referências Bibliográficas ........................................................90

Page 10: Livro presídio  2013

10

APRESENTAÇÃO

Quando a Subsecretaria Regional de Uruaçu propôs à nossa

equipe gestora do Colégio Estadual Professor Joaquim Francisco

Santiago, composta por Simone Pires Gomes, Maria das Dores de

Oliveira Gonçalves e Shirley Glória Reis, respectivamente, Diretora,

Vice–Diretora e Secretária Geral, para que assumíssemos as três

extensões que funcionam na Escola Municipal Padre Valentin

Rodrigues (Jardim Atlântico), Escola Municipal São Jorge (Povoado

do Machadinho) e Unidade Prisional (Bairro Santa Efigênia), a partir

de agosto de 2010, senti-me bastante apreensiva, sobretudo em relação

à última, pois seria uma clientela muito diferente da qual estava

acostumada a trabalhar nas escolas públicas estadual e municipal de

ensino, ao longo dos vinte anos da minha carreira profissional como

educadora.

Ao visitar pela primeira vez a Unidade Prisional, para conhecer

os alunos, e a estrutura física da sala, a princípio foi uma situação

angustiante e desafiadora, porém o diretor do Presídio à época Senhor

Genair da Abadia Souza Vieira, foi muito receptivo e atencioso

conosco, explicando-nos o funcionamento e normas da Unidade

Prisional, sempre dando-nos o suporte necessário. Adentraram à sala

de aula naquele dia, o coordenador pedagógico Wesley Campos

Gomes Soares, as professoras, na época, Maria Abadia Aparecida e

Maria Abadia Honório da Silva, os alunos reeducando e eu, ficando

Page 11: Livro presídio  2013

11

registrada em minha memória a conversa que tivemos, mantendo um

diálogo aberto, esclarecedor e respeitoso, com o intuito de nos

familiarizarmos, pois a partir daquele momento iríamos trabalhar em

sintonia para que as atividades pudessem acontecer de forma

planejada.

Hoje, tenho uma visão diferente da inicial, encaro as

adversidades com mais confiança, sempre acreditando que qualquer

situação, por mais dolorosa que seja, não é instransponível, a luz

sempre aparece após um dia nebuloso.

Os alunos que estudam ali merecem todo o nosso carinho e

atenção, independente da falta ou crime que cometeram. Não estou

justificando tais atos ou concordando com os mesmos, apenas, não me

considero no direito de julgá-los e condená-los. Essa tarefa, cabe à

Deus e às autoridades judiciárias legalmente constituídas para isso.

Em nossa escola, procuramos trabalhar a Inclusão em seus

diversos aspectos: físicos, psicológicos, comportamentais, sociais,

etc., buscando mecanismos para que todos os alunos possam

apropriar-se do conhecimento formal, dentro de suas possibilidades e

capacidades cognitivas, independente da faixa etária, série ou

modalidade de ensino, tendo direito a uma educação emancipadora,

onde os resultados qualitativos sejam superiores aos quantitativos,

proporcionando uma educação integral. Se a escola, não tem essa

missão ou filosofia no processo de produzir conhecimento, entendo

que é uma instituição ineficiente, não isentando a família e as outras

instituições constituídas (públicas, privadas, igrejas, associações,

Page 12: Livro presídio  2013

12

sindicatos, etc.) dessa responsabilidade, pois cada uma, de acordo com

as suas atribuições e competências, devem lutar incansavelmente por

uma sociedade mais justa, democrática e ética, num regime de

colaboração mútuo.

Esse livro foi idealizado pela professora Maristela Aidar,

diretora do Colégio Estadual Coronel Joaquim Taveira, pois as

extensões, na época pertenciam ao referido colégio. A diretora nos

informou sobre o seu desejo de ver essa obra concluída, fato que nos

impulsionou a dar seqüência ao trabalho e agora celebrarmos essa

grande conquista.

Ressalto ainda o grande empenho que os meus colegas

Coordenadores Vânia Moreira Lino e Wesley Campos Gomes Soares

tiveram na elaboração desse livro, orientando e recolhendo os textos

produzidos pelos alunos. Muitos desses, já não se encontram na

Unidade Prisional, pois cumpriram suas penas e retornaram à

sociedade, resgatando a dignidade perdida e vislumbrando melhores

oportunidades de trabalho. Torço para que eles continuem seus

estudos fora das grades que por muito tempo os separaram do

convívio familiar e amigos.

Vários títulos foram pensados e discutidos para essa obra, sendo

escolhido “E Quando a Solidão Bate à Porta?”, pois lendo os textos

produzidos pelos alunos-escritores, tivemos a sensação que mesmo

diante de uma cela abarrotada de pessoas, há momentos em que a

solidão é a única companheira, talvez, sejam nesses momentos que

cada um possa refletir sobre suas condutas e motivos que os levaram a

Page 13: Livro presídio  2013

13

passar boa parte de sua existência longe da LIBERDADE, palavra tão

almejada por todos que ali se encontram.

Acredito de forma muito convicta, na capacidade de

regeneração do ser humano, basta que ele manifeste através de seus

pensamentos e ações o desejo de mudar e toda a sociedade busque

mecanismos para ajudá-lo a concretizar o seu desejo.

“Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo

começo, qualquer um pode começar agora e fazer um

novo fim”.

(Chico Xavier)

Simone Pires Gomes

Diretora

Page 14: Livro presídio  2013

14

Fazer parte de um trabalho como esse, tanto na construção do

livro quanto no cotidiano com os alunos reeducandos, tem sido

gratificante, além de estar me proporcionando um imenso crescimento

pessoal e profissional. Agradeço de antemão à professora Vânia Lino,

por estar junto conosco nesta bela e impressionante empreitada.

Ainda na gestão da Professora Maria Abadia Aparecida, então

Diretora do Colégio Estadual Coronel Joaquim Taveira, uma das

fundadoras da Sala de Aula Professora Querobina Daniel Silva, dentro

da Unidade Prisional de Niquelândia-Go ouvi falar do Projeto

Educando para a Liberdade, fiquei curioso para conhecê-lo e, quem

sabe um dia, nele poder trabalhar. Porém, na época, estava eu no

período de estágio probatório, não podendo fazer parte do projeto.

Entretanto, com a transferência das extensões educacionais do Colégio

Joaquim Taveira para o Colégio Professor Joaquim Francisco

Santiago, recebi da Diretora desta Unidade de Ensino, a Professora

Simone Pires, o convite para assumir a Coordenação da Extensão na

Escola Municipal São Jorge no Povoado Machadinho, na Região do

Acaba Vidas, a mais de 120 km da sede do município, escola em que

ingressei na carreira do magistério e trabalhei por onze anos, e

também da Extensão na Unidade Prisional, Projeto Educando para a

Liberdade. Aceitei de imediato, ficando muito feliz, pois era a

oportunidade de realizar o meu desejo de conhecer melhor o projeto e

trabalhar nele.

A inserção social tem como meta integrar o indivíduo na

comunidade família e sociedade, assumindo o caráter de reconstrução

das perdas, e seu objetivo é a capacitação da pessoa para exercer em

Page 15: Livro presídio  2013

15

plenitude o seu direito à cidadania. Hoje, acredito estar, junto com as

Professoras Maria Abadia e Coraci, construindo mais um grande passo

para a reinserção social de nossos alunos reeducandos, dos quais

posso afirmar com certeza que, não só ensinamos, mas aprendemos

muito a cada dia.

Se desejamos que a Educação seja um instrumento para a

inclusão, o crescimento e o equilíbrio social, temos que correr os

riscos e enfrentar as adversidades de quaisquer situações em que

possam estar inseridas a Educação.

“A prisão não são as grades, e a liberdade não é a

rua; existem homens presos na rua e livres na

prisão”.

“É uma questão de consciência.”

(Ghandi)

Wesley Campos G. Soares

Coordenador Pedagógico

Page 16: Livro presídio  2013

16

Quando nos dispomos a implantar inovações no modo de agir

que a sociedade culturalmente aceita como correto, corremos o sério

risco de obter como réplica a discriminação e o descrédito.

Ainda que a intenção seja de mudar aquilo que não tem

funcionado bem, a resistência ao novo, característica natural do ser

humano geralmente fala mais alto. Quando dizem respeito ao modo de

tratar aqueles que por algum motivo encontram-se segregados em um

ambiente de cárcere, qualquer mudança toma dimensões absurdas do

ponto de vista daqueles que por ignorância desconhecem os benefícios

que podem advir da humanização da pena e recuperação dos

apenados.

Ao longo da história, tudo que se julgou eficaz para atenuar os

índices criminais foi exaustivamente tentado. Desde os castigos

físicos, passando pela segregação definitiva da liberdade e até a pena

de morte. Entretanto, nada do que foi instituído como forma de

correção e emenda surtiu o efeito desejado pelo homem. Cabe a nós,

componentes desta sociedade que sofre a cada dia mais os efeitos

cruéis da escalada do crime, refletir buscando novas formas de

amenizar os efeitos de uma desigualdade social tremenda onde talvez

esteja a raiz de boa parte da criminalidade.

A simples segregação do indivíduo, fora do convívio social, em

condições subumanas, não parece ser a forma mais adequada de

conter a escalada da criminalidade, tampouco constitui a maneira de

fazer com que quem passe por uma prisão não volte a delinqüir, pois

se assim fosse, não teríamos cadeias superlotadas e ruas infestadas de

Page 17: Livro presídio  2013

17

criminosos reincidentes, já que a maioria dos presídios do Brasil

ostenta escancaradamente uma podridão asquerosa, para onde nenhum

ser humano em perfeitas condições mentais gostaria de retornar depois

de ganhar a liberdade.

Quando lançamos o desafio de implantar uma extensão de sala

de aula dentro de uma unidade prisional, não obstante as críticas que

recebemos, várias foram as pessoas que acreditaram neste projeto e de

diversas formas nos ajudaram a levá-lo a termo, seja na doação de

recursos ou na disposição de trabalho. A essas pessoas nossos sinceros

agradecimentos, pois com suas atitudes mostraram um pensamento

inovador e despojado, como o saudoso Dr. Almir Araújo Dias, á época

presidente do Conselho da comunidade de Niquelândia, que nos

disponibilizou parte dos recursos para que pudéssemos adaptar o

espaço físico, ou o senhor José Eulálio, empresário niquelandense

carinhosamente chamado pela população de “Zé miau”, que foi nosso

parceiro no projeto, assim como o prefeito Ronan Rosa Batista, que

não mediu esforços em nos auxiliar na árdua tarefa de reformar e

adaptar uma estrutura decadente e arcaica e transformá-la num

ambiente aconchegante e adequado para se aplicar o ensino.

Igualmente, em nome das professoras: Maristela Aidar e Simone

Pires Gomes e do professor Wesley Campos G. Soares, estendemos

nossos agradecimentos aos servidores dos Colégios Estaduais:

Coronel Joaquim Taveira e Joaquim Francisco Santiago, que com

verdadeiro espírito de comprometimento, prontamente abraçaram a

Page 18: Livro presídio  2013

18

idéia de trazer a educação para o seio da execução penal, dando um

extraordinário passo á frente e ousando tentar o novo.

Agradecemos imensamente aos servidores da Agencia Prisional

que conosco trabalham esta unidade, sem os quais jamais teríamos

alcançado êxito em nossa empreitada e dos quais dependemos

incondicionalmente para manter funcionando nossos projetos

profissionais.

Aos reeducandos que fazem parte desse projeto, queremos frisar

que essa iniciativa é um marco no sistema penal e que vocês fazem

parte de uma pequena parcela privilegiada da população carcerária do

Brasil que está tendo a chance de reescrever a história da execução

penal e de mostrar que é possível oferecer ao mundo coisas positivas a

partir da transformação pessoal e da valorização da educação. Vale

lembrar que o cárcere não é necessariamente o final de tudo, mas pode

ser o recomeço de uma nova existência. È necessário conscientizar-se

de que ao sair da prisão para voltar ao convívio social, quase nada de

novo lhes será oferecido, mas as cobranças serão gigantescas e será

necessária muita força de vontade, humildade e fé, para romper as

barreiras do preconceito e conquistar o direito de um lugar ao sol.

Terminamos nossas palavras citando uma célebre frase de

Nelson Mandela, homem negro sul africano que ao sair da prisão onde

esteve preso por 28 anos acusado de terrorismo e traição, deu a volta

por cima e chegou a ser presidente de seu país: “Comenta-se que

ninguém de fato conhece uma nação até que se veja numa de suas

prisões. Uma nação não deveria ser julgada pela forma que trata

Page 19: Livro presídio  2013

19

seus mais ilustres cidadãos, mas como trata os seus mais

simplórios.” A vida deste homem, que sofreu na própria pele o mais

acirrado preconceito e a mais ferrenha intolerância, ilustra bem a

enorme capacidade intrínseca dos seres humanos em implementar

mudanças positivas em suas vidas, mesmo quando todas as coisas

parecem desfavoráveis e as condições no meio social são as mais

inóspitas possíveis. Assim, faço votos no sentido de que os egressos

do sistema prisional, alavancados pela inovadora idéia de educação no

cárcere, reflitam sobre as possibilidades de alçar novos vôos no

caminho do bem e que a sociedade compreenda que ao trabalhar pela

recuperação dos apenados, está buscando nada mais que benefícios

próprios, como a diminuição da reincidência criminal, a minimização

dos efeitos das desigualdades sociais e a soma de uma nova força de

trabalho no meio social.

Genair da Abadia Souza vieira

Diretor do Centro de Inserção Social de Niquelândia

Page 20: Livro presídio  2013

20

INTRODUÇÃO

Em 2010 assumimos o desafio de trabalharmos com três

extensões em diferentes lugares, dentre elas a extensão da Sala de

Aula Professora Querobina Daniel da Silva, na Unidade Prisional –

Centro de Inserção Social de Niquelândia, que na ocasião, possuía a 1ª

etapa da Educação de Jovens e Adultos - EJA. Naquele momento,

apesar das dificuldades do trabalho aceitamos o desafio e seguimos

adiante com a gratificante missão de ensinar.

Convivendo mais próximos com os alunos, pudemos perceber as

dificuldades que todos eles enfrentaram no decorrer de suas vidas, e

que direta ou indiretamente contribuíram para que eles chegassem à

triste condição de presidiários. Suas mágoas, tristezas, angústias,

ansiedade pela liberdade nos contagiou de tal forma, que decidimos

concretizar esses sentimentos e expectativas. Não foi um trabalho

isolado, professores, coordenadores, equipe prisional, e de forma toda

especial a gestão do Colégio nos incentivou e apoiou para que

nascesse desse trabalho uma nova cara para a triste realidade dessas

pessoas.

Seus depoimentos, embora verdadeiros, possuem nomes fictícios

para evitar exposição desnecessária e possíveis constrangimentos.

Assim, usando do anonimato eles puderam expor melhor seus

sentimentos e contar de forma muito real a história de vida de cada um

deles. Não esperamos que esse trabalho se torne um Bestseller, mas

que ao menos aumente a auto-estima e dê voz a esses homens

Page 21: Livro presídio  2013

21

esquecidos pela sociedade. E que acima de tudo, sempre gritaram por

socorro, agora encarcerados, gritam com mais veemência. É chegada a

hora, de talvez, conhecermos e compreendermos melhor os diversos

caminhos tomados por eles que nem sempre foram os ideais, mas os

únicos possíveis de ser trilhados.

Não é objetivo desta obra isentá-los de suas culpas, mas

sobretudo, alertar a sociedade para sua responsabilidade com o

cidadão carente, com o combate ao tráfico e principalmente com a

oferta de educação de qualidade, que nem sempre são cumpridas.

Como cidadãos, estado, justiça, entidades religiosas, enfim, cada um

de nós temos responsabilidades com o outro que se encontra em

situação de vulnerabilidade social. Quando lhes foi proposto

escrever textos e relatos de suas vidas que posteriormente comporiam

um livro, se encheram de entusiasmo e alegria, haja vista, que muitos

nunca foram ouvidos na família , na escola, em lugar nenhum. Eis que

agora é chegada a hora, de gritar ao mundo seus conturbados

sentimentos. Para muitos talvez, tardiamente, pois o caminho de volta

é difícil e a sociedade contribui para torná-lo quase intransponível. O

desfecho desse trabalho é desconhecido, porém, mesmo não

ultrapassando as grades de uma prisão, ainda assim, terá suas

recompensas, pois o importante é oportunizar quem sempre foi

excluído a fazer parte dessa sociedade, que embora falha e relapsa,

ainda é o melhor lugar de se buscar a realização pessoal e a felicidade.

Page 22: Livro presídio  2013

22

O PASSADO DE UM PRESENTE DESUMANIZADOR

Ao analisar os textos elaborados pelos alunos/detentos observa-

se que cada um apresenta razões bastante fortes que possa justificar a

sua atitude infracional. E partindo do aspecto humano, social, e

antropológico, constata-se que a razão da criminalidade tem muito de

suas raízes encravadas no abandono social que sempre se viveu no

Brasil. Grande parte dos textos relata uma vida privada de condições

mínimas de sobrevivência, falta de trabalho, falta de acesso à

educação de qualidade, saúde, bens culturais, enfim, condições

mínimas de dignidade humana. Não é intenção do presente discurso,

isentá-los dos erros cometidos, mas tão somente questionar e conduzir

o leitor a uma reflexão sobre as condições sociais oferecidas às

crianças e jovens da sociedade brasileira, assim como, oportunizá-lo a

conhecer um pouco mais a realidade que se encontra do outro lado da

grade.

É apontado por diversas pesquisas que a sociedade tem sua

parcela de culpa quanto ao aumento da criminalidade no Brasil e no

mundo, quando esta se exime de suas obrigações enquanto Estado e

gestor direto do bem estar social, ou enquanto cidadão não contribui

para melhoria das condições de vida de muitos, que gritam por

socorro. É notório em várias comunidades carentes espalhadas pelo

país que a criação de políticas públicas que contemplam o bem estar

do jovem com esporte, cultura, arte e educação, tem um índice de

criminalidade reduzido consideravelmente em um espaço de tempo

Page 23: Livro presídio  2013

23

relativamente curto, e que as comunidades onde reina o tráfico, a

violência aumenta a cada dia.

O famoso sociólogo Durkheim, dizia que:

“... a sociedade não é simplesmente o produto da ação e da

consciência individual. Pelo contrário, as maneiras coletivas

de agir e de pensar resultam de uma realidade exterior aos

indivíduos que, em cada momento, a elas se conformam.”

Parafraseando Durkheim, observa-se a importância da presença

do Estado na composição social, no sentido de oferecer subsídios

preventivos para violência e criminalidade. Essas ações globais podem

salvar milhares de jovens da ação devastadora das drogas que

influenciam diretamente nos demais atos de violência.

Nesse contexto de desigualdade social, a educação pode assumir

um papel singular de transformação, ainda que em longo prazo,

oportunizando a crianças e jovens, o acesso direto ao esporte,

conhecimento, cultura, e se afirmando enquanto agente social na

comunidade a qual está inserida. Porém, não se pode delegar à escola

a função totalizadora de salvação da humanidade, se faz mister que

todos se unam em prol de um mesmo objetivo e trabalhem por um

mundo mais justo e igualitário. Se, de acordo com Durkheim, o ser

humano é, parcialmente, resultado do ambiente em que vive e que

pode ser influenciado por ele, se faz obrigação do Estado, registrar sua

presença no âmbito familiar, educacional, social da criança para

prevenir, ou ao menos tentar fazê-lo, dos malefícios da falta de

perspectivas que hoje é tão comum dentre os jovens.

Page 24: Livro presídio  2013

24

Todo esse discurso não possui fundo sensacionalista, é a verdade

que se evidencia nos relatos redigidos nesse livro. Nossos alunos,

antes de serem detentos, são seres humanos, que tem sede de sonhar,

de conquistar, de se afirmar enquanto cidadãos de bem. Não são como

muitos pensam, o lixo da sociedade. No entanto, muitos se sentem

assim - como poderão observar nos textos - cometem erros, são

julgados, condenados, e jogados no depósito de seres humanos onde

não tem oportunidade nenhuma de se tornarem melhores.

A dignidade no trato enquanto ser humano é um direito inerente

a todos os indivíduos. A situação nos presídios brasileiros é caótica e

não atendem às finalidades essenciais da pena, quais seja punir e

recuperar. É necessário que sejam implementadas políticas públicas

voltadas para a organização desse sistema e promover uma melhor

efetivação da Lei de Execução Penal. O encarceramento puro e

simples não apresenta condições para a harmônica integração social

do reeducando, como preconizada na Lei. Punir, encarcerar e vigiar

não bastam. É necessário que se conceda à pessoa de quem o Estado e

a sociedade retiraram o direito à liberdade, o acesso a meios e formas

de sobrevivência que lhe proporcionem as condições de que precisa

para reabilitar-se moral e socialmente.

Esses homens reclusos, não fogem às suas responsabilidades,

querem pagar suas penas, mas anseiam por sair dali e reconstruir suas

vidas, com suas famílias e amigos. Todavia, o que é oferecido a eles

como subsídio para recomeçar?

Page 25: Livro presídio  2013

25

Na Agência Prisional de Niquelândia é oferecido cursos de

artesanatos que eles confeccionam e as famílias vendem para angariar

recursos de sobrevivência. Sabe-se, porém que ao serem libertos, esses

artesanatos não serão suficientes para prover o sustento dos filhos.

Em muitos casos não os restam outro caminho, a não ser a

reincidência.

Outro aspecto importante na vida do reeducando é a família, que

não deve ser vista como uma mera vítima estática da aplicabilidade da

Lei que a pune compulsoriamente; ela deve ser percebida como peça-

chave para o trabalho de diminuição da reincidência. Não perceber a

importância da família nesse contexto é não investir na possibilidade

de resgate do reeducando. No entanto, o que é feito pelas famílias

enquanto os provedores de seu sustento cumprem sua pena?

Percebe-se que sem o auxilio financeiro daquele que outrora a

mantinha, esta se torna alvo fácil e vulnerável do crime que a espreita.

As crianças, em função da pobreza, entram no mercado de trabalho

muito cedo, aumentando os índices de evasão e repetência na

educação. Quando na pior das hipóteses não se embrenha pelo

caminho das drogas e do crime. Cumpre-se aí o circulo vicioso da

marginalidade, onde por consequência do cárcere paterno, os filhos

sem perspectiva tomam o mesmo caminho.

A Lei nº 8213/91, estabelece o auxilio reclusão, que garante

provisoriamente o sustento da família do reeducando, porém, sem

nenhuma assistência no que se refere à profissionalização dos

componentes adultos da família, ou à vinculação do beneficio à

frequência escolar dos filhos ainda menores. Assim, cai-se na política

Page 26: Livro presídio  2013

26

assistencialista imediata e provisória que não contribui para a

independência financeira e profissional dos beneficiados. O auxilio

reclusão aparece como um importante recurso para as famílias e para

os encarcerados durante o cumprimento da pena, porém, é preciso

vislumbrar novos horizontes e oferecer instrumentos de trabalho e

dignificação para essas famílias.

Uma conquista imensurável para o reeducando foi a

possibilidade de retomar os estudos enquanto cumprem suas penas. A

educação oferecida a eles possui falhas e ainda galga os caminhos da

qualidade total, porém, apesar de imperfeita está levando a eles a

oportunidade de crescer intelectualmente e sonhar com dias melhores.

Nos textos redigidos, orientados pelos professores, é possível notar a

tristeza, a solidão e o desamparo próprio do lugar se entrecruzando

com a expectativa, as perspectivas, os sonhos e alegria de serem

reconhecidos como parte integrante da sociedade. É esse o caminho

que se acredita ser o certo, o caminho da valorização, do

reconhecimento, da solidariedade, e do apoio.

Em muitas ocasiões, durante as aulas, os professores precisam

deixar de lado o oficio de ensinar para ouvir como um psicólogo, dar

atenção como uma mãe, orientar como um conselheiro, evangelizar

como um pastor, amar como um irmão. E assim vai-se construindo um

emaranhado de relações que extrapolam à de professor – aluno, se

tornando uma relação humanizadora e capaz de transformar.

Vou contar a você, leitor, uma parábola que se trata dos sete

princípios para se alcançar a plenitude e a paz. Ela retrata um pouco

da realidade de tribulação, dificuldade, e superação vivida por esses

Page 27: Livro presídio  2013

27

alunos e professores, além de contribuir para amenizar o peso do

assunto aqui discutido:

Essa é parábola do bambu:

Depois de uma grande tempestade, o menino que estava

passando férias na casa de seu avô o chamou para a varanda e falou:

__ Vovô, corre aqui! Como essa figueira, árvore frondosa e

imensa, que precisava de quatro homens para abraçar seu tronco, se

quebrou e caiu no vento e na chuva, e este bambu tão fraco continua

em pé?

__ Filho, o bambu permanece em pé porque teve a humildade de

se curvar na hora da tempestade. A figueira quis enfrentar as forças do

vento.

O bambu nos ensina sete princípios. Se você tiver a grandeza e a

humildade dele vai experimentar o triunfo da paz em seu coração.

A primeira verdade que o bambu nos ensina é a mais importante:

ser humilde diante dos problemas e dificuldades, ter fé, otimismo e

não desanimar.

A segunda verdade: o bambu cria raízes profundas. É muito

difícil arrancá-lo, pois o que ele tem para cima tem para baixo

também. Você precisa aprofundar suas raízes na oração e em Deus.

A terceira verdade: o bambu vive em união. Antes de crescer ele

permite que outros cresçam ao seu lado. Sabe que vai precisar deles na

hora da tempestade. Uma das grandes forças de quem é fraco é

permanecer unido àqueles que ama.

A quarta verdade: O bambu nos ensina a não criar galhos. Como

tem a meta no alto, em coisas grandes, não perde tempo com coisas

Page 28: Livro presídio  2013

28

insignificantes. Para ganhar, é preciso perder tudo aquilo que nos

impede de subirmos suavemente.

A quinta verdade: o bambu é cheio de nós. Como ele é oco, sabe

que se crescesse sem nós seria muito fraco. Os nós são os problemas

que enfrentamos e que nos fortalecem.

A sexta verdade: o bambu é oco, vazio de si mesmo. Abandona a

si para doar-se aos outros, sem limites.

A sétima verdade: ele só cresce para o alto, ele busca o que é

grande. Essa é sua meta.

Esse é o retrato de quem é detento e de quem procura por meio

da educação levar um pouco de alento e esperança a esse lugar tão frio

e solitário, que é o presídio. São superações diárias de professores e

alunos, ambos lutam para isolar o ambiente em que estão inseridos e

buscar numa cela de aula pequena e trancada, a concentração para

ensinar e aprender.

Nos textos, os aluno reclamam constantemente da solidão

vivenciada por eles, isso parece bizarro quando os detentos vivem em

meio a dezenas de pessoas e são amontoados em celas pequenas, e

lotadas. Porém, a solidão que mais incomoda não é a física, mas a da

alma. Eles possuem seus colegas, mas se queixam da falta que sentem

da família, dos amigos de “fora”. Quando passam por um julgamento

acontece um rompimento de tudo que são e têm para iniciar uma

realidade que só tem a insegurança e o descrédito como certezas.

Assim, a partir do momento que são isolados do mundo externo,

inicia-se geralmente, um processo de esquecimento por parte dos que

são livres. Ainda que seja restrita a entrada no presídio, a família é a

Page 29: Livro presídio  2013

29

que possui acesso direto e frequente com os detentos, e não raras

vezes, nem mesmo ela oferece o apoio que se faz tão importante para

sua recuperação. Assim, quando a solidão bate à porta, não resta mais

nada e ninguém além de folhas frias de papel e caneta, onde podem

confessar suas mazelas e expor suas dores.

Para concluir essa reflexão as palavras do ilustre jurista e

professor João Batista Herkenhoff, neste momento final, servirão de

esperança para aqueles que acreditam ainda na recuperação não

apenas de infratores da lei penal, mas sim de toda a sociedade e do

verdadeiro sentimento de justiça:

Não creio no poder da repressão. Creio no homem. Creio no

respeito ao homem. Creio na igualdade entre os homens. Creio na

palavra. Creio no contato entre seres humanos, na possibilidade da

comunicação entre o homem que está sendo processado e o homem

que, eventualmente, está sendo o juiz de seu irmão. Creio, sem

pieguismo, no amor. E mais ainda creio na justiça, como valor

supremo.

A seguir, o leitor terá acesso aos textos redigidos pelos alunos,

na integra. Para facilitar a leitura e compreensão realizamos algumas

correções ortográficas e de pontuação, porém sem modificar o

conteúdo.

Page 30: Livro presídio  2013

30

O RECOMEÇO

Para uma pessoa andar ele precisa dar o primeiro passo.

Assim não foi diferente com as primeiras redações que iniciamos

a escrever. Começamos a escrever um pouco sem fé, sem acreditar

que ia dar conta de escrever, mais cada um de nós, tem muita história

de vida, mais não era isso que queríamos escrever sobre violência,

porque violência gera violência.

Gostaríamos de passar para os leitores desse pequeno livro,

como é a vida aqui dentro, e como nós pensamos e sentimos.

Nós estamos esperando pelo menos cinco livros editados, já vai

ser uma vitória porque jamais esperávamos que dentro de uma prisão

poderia acontecer algo de bom. Mas hoje estamos estudando no

presídio, o que era sonho virou realidade, hoje podemos enxergar a

vida, não só de forma quadrada, mais por maneira diferente, por causa

de duas pessoas que se arriscaram em trabalhar em área de risco. Mas

o que podemos é retribuir a professora e a diretora que elas fazem

tudo com muito carinho e se tornando uma nova pessoa e provando

para o mundo que estudar é o melhor caminho. Converter a Deus e ter

educação de qualidade para obter oportunidade de trabalhar, e nós

gostaríamos de parabenizar e oferecer este livro para esta duas

guerreiras, professora tia Abadia e diretora Maristela.

Célio

Page 31: Livro presídio  2013

31

PARA INÍCIO DE CONVERSA...

Quem somos nós?

Somos pessoas, somos gente de carne e osso, ser humano que por

falta de reconhecimento e Deus no coração viemos parar aqui neste

lugar que não é nada bom.

E o momento não poderia ser mais oportuno, pois estamos lançando

esse livro que são frutos de anos de convivência e cada um com sua

história. Com esse livro você vai aprender mais sobre o que é ser um

presidiário. Agora com todo esse reconhecimento você com certeza

vai pensar duas vezes antes de cometer qualquer besteira e vir parar

aqui, pense bem!

Que Deus ilumine o caminho de todos vocês e boa leitura.

Oscalino Rodrigues

Page 32: Livro presídio  2013

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DESALENTO

Assim foi a minha vidinha, sem graça até os 15 anos, nunca tinha

fumado bagulho, porque lá na roça, não tinha esses trem. Mas era coisa

de outro mundo. A única droga era umas pinguinhas feitas ali mesmo

alambique do finado Paulim Tadin. Pra estudar era um Deus nos acuda,

tinha que andar umas duas léguas, mas mesmo assim, era bom demais da

conta. Eu e meus irmãos ia todos dias e era o único jeito de escapar do

cabo da sem graça, (enxada) que era uma bichona grandona, uma pra

cada um. Nos finais de semana não tinha escapatória, o véio meu pai já

dava logo o grito cedo. Vambora, menino, apruma, passarin que num

deve nada pra ninguém já ta com us pé moiado, ligeiro, pode levantar, e

nóis sem querer, mais num tinha jeito não, tinha que levantar. A nessas

arturas já tava tudo pronto, um cafezinho quente, com uma broa e uns

pedaços de queijo, e vambora, menino, café bebido caminho seguido, e

lá ia continuando a prosa. Veio não sei de onde, uma tal de furna

(FURNAS) e não se falava de outra coisa, o tal progresso tava chegando.

E não demorou muito pra chegar em nosso rancho uns home com

palavra difice e uma prosa boa, e chamou o pai lá prus morro, pra isprica

até onde a água ia subir, e eu vi que o pai chegou diferente, discabriado

com o zoio cheio d’agua, e chamou a mãe, e disse: __ muié temo que ir

imbora. A mãe deu uma olhada pra nois, a escadinha sentada, no bancão

da sala.

__ Mais home pra onde nois vai, pelo amor di Deus, o que ocê ta falano,

pra onde nois vai e nossas coisa e os mininu? __ Eu não sei muié, eles

vão dar uma mixaria pra nois, é capais di dá pra nois comprar um

barraco, lá na Niquelândia. Silenciou a mãe, e foi fazer a bóia, e

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33

enquanto preparava pensava na sua vida, a ingratidão do destino que

agora depois de véia ter de enfrentá a cidade grande, tirano tudo do

braço, fazer hoje pra comer hoje mesmo. Teria que desfazer dos animais,

da raladeira de mandioca, do muinho de café, o tacho de cobre, e enfim

de tanta coisa pra ser trocada por um barraco apertado, em alguma vila

pobre de Niquelândia. Jantamos em silêncio, pela janela entrava uma

suave brisa, que fazia a luz da lamparina dançar tornando mais triste o

ambiente. O radinho ligado passava umas modinhas sentimentais, de vez

em quando uns anúncios da casa do fazendeiro. O pai foi deitar logo

após, carregando a dor de um homem simples da roça. A mãe sozinha

ajeitava as vazias da janta, penssano nas dores que a vida lhe impôs de

muié da terra, ligada aos fazeres da roça, de pernas inchadas, por

reumatismo, causadas pelas friaje do corgo, a torração di farinha, e ter

que sair na chuva. Olhei para céu e disse: __ Nosso Sinhozinho do céu,

num deixa nois sofrer não, e pegou a lamparina, fechou a janela e ajeitou

o fogo, que cozinhava o feijão. Desligou o rádio e si encaminhou para o

quarto, viu o pai deitado acordado. Eu achei que ela tentou consolar,

mais apenas fez o sinal da cruz e deitou ao seu lado, sem dizer nada, e

apagou a lamparina. E no final de tudo isso, aconteceu que aqui na

cidade, sem emprego, sem estudo e sem oportunidades, mim envolvi

com a vida do crime. Foi a única porta que achei aberta, foi o mundo do

crime. Fui preso. Torturado, fui humilhado, e não vejo a hora de sair e

voltar a sorrir de novo, eu era realmente feliz e não sabia.

Oscalino Reges Rodrigues

Obs.: Esse texto não foi corrigido ortograficamente sob risco de perder

a originalidade.

Page 34: Livro presídio  2013

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UMA PEQUENA LUZ NO FIM DO TÚNEL

Os nossos olhos foram feitos para enxergar no claro mas também

pode adaptar a enxergar no escuro. Quando uma pessoa cai dentro de

uma cadeia, a vida dele desanda, o desespero, a agonia, ajuda a

escurecer muito mais este caminho escuro que ele tem que caminhar,

carregando este martírio de dor e sofrimento. A pior coisa na vida é a

escuridão porque quando você está neste túnel cai, levanta, mais

sempre está com esperança de poder ver uma pequena luz no fim do

túnel.

Cada dia que passa é um dia a mais de cadeia e um dia a menos

neste inferno, cada ano que passa eu consigo enxergar uma pequena

brecha de luz muito longe, talvez quem esteja perto de mim não

consegue enxergar. Porque esta pequena luz é enxergada com os olhos

de artista, que quando pinta um quadro enxerga de uma maneira, mais

nunca aquele quadro vai ser enxergado daquela maneira quando

outros olhos for observar , vai ver de forma diferente. A escuridão

começa no dia que entramos aqui, presos, e esta tão sonhada luz irá

refletir o dia em que as portas deste inferno se abrir para que

possamos valorizar cada minuto de nossas vidas, e que Deus abençoe

e dê força a todos irmãos que passa para o outro lado do muro.

LIBERDADE....

Célio

Page 35: Livro presídio  2013

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UM SONO PROFUNDO

Por que não consigo largar de você? Às vezes sinto uma grande

fraqueza chego a respirar fundo por sua causa. Faço loucuras para

matar a minha ansiedade. Quando te conheci era como se fosse uma

brincadeira, não sentia tanta a sua falta, depois de algum tempo você

ficou fazendo parte da minha vida, você estava comigo em quase todo

lugar, eu ficava tão corajoso, e me sentia muito mais forte do que as

outras pessoas.

Mas na verdade eu era o fraco, porque não conseguia tirar você

dos meus pensamentos. Por que eu tentava e você sempre ganhava de

mim. Toda vez você me derrotava. Eu já não tinha mais forças para

lutar contra meus desejos, com passar do tempo você me apresentou

sua prima, a primeira vez que conversei e sai com ela, eu já não

conseguia largá-la, sofria tanto por sua ausência, que por muitas vezes

chorava como um bebê ansioso pelo leite materno.

Não conseguia mais largar você, parece que mandam em mim.

Doze horas com você sempre foi pouco, a minha vontade era muito

mais. Ultimamente eu estou tão longe, e não posso mais sentir seu

perfume, não consigo parar, entrei em desespero, não percebi que era

só uma ilusão, até que um dia eu caí de overdose e não consegui

sobreviver, mais com o sangue no nariz.

Crack e a cocaína tiraram minha vida não deixe tirar a sua.

Wedson Tiburcio dos Santos

Page 36: Livro presídio  2013

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MALANDRO

Tem alguns ditados certos, de que malandro é difícil chegar aos

30 anos, o malandro não cria cabelo branco.

Para quem está neste mundo é bom lembrar que se formos voltar

no tempo, não vai ser difícil lembrar de uma centena de pessoas que já

morreram, antes dos trinta anos pelo envolvimento no mundo do

crime.

O crime te dá muita ilusão, muitas regalias, mas te cobra um

preço muito caro. Primeiro de cobra a liberdade, depois a sua

juventude, e depois começa as perdas, de cabelos pretos, perda dos

dentes, a perda da cor da pele por falta de sol, a perda da saúde, total

perda da dignidade.

O malandro sonha muito alto, é um eterno sonhador, ele não

gosta de coisa ruim, mas é só ilusão, porque o diabo te dá muita coisa

com uma mão, e te envergonha tomando com as duas mãos.

O sonho do malandro, eu comparo com o sonho do garimpeiro,

porque ele bamburra e joga tudo para o ar, aí o dinheiro acaba, mas o

sonho de bamburrar, jamais. E quando dá azar vai parar na cidade dos

pés juntos.

Célio

Page 37: Livro presídio  2013

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CADEIA: O CÔMODO DO INFERNO

Hoje a pessoa precisa parar para pensar o que é uma cadeia.

Pensa numa criança que gera, nasce, mama, começa a dar os primeiros

passinhos começa a falar as primeiras palavras, mamãe ou papai.

Papai? Eu não vejo esse homem que eu estou chamando aqui mas é

que eu vejo quase todas as semanas naquele lugar sujo e fedorento,

escuro e cheio de grades, mas lá eu não vejo ninguém rindo, nem

alegre, mais eu vejo minha mãe ansiosa para ir até o meu pai. Ela

tomou banho, me deu banho e passou perfume na gente, eu vejo

minha mãe alegre parecendo que nós vamos para festa, mais logo

chegamos num lugar com muros bem grandes, e uma fila bem enorme

e muito quente, porque não tem lugar na sombra pra ficarmos, mas

quando nós entramos numa sala, todo mundo tem que ficar pelado, ai

eu fico chorando, mas quando a minha mãe vê o meu pai fica alegre,

eu sinto o coração dela bater mais forte, e quando o papai me dá um

beijo e mexe comigo, eu não aguento e logo eu entendo porque minha

mamãe fica alegre quando o papai dá um beijo nela. Com 6 anos

comecei a estudar e assinar o primeiro boletim com o nome da minha

mãe, porque o meu papai está preso.

Começo as perguntas por que todas as crianças têm um pai em

casa, eu estou pequeno e que não entendo o que está acontecendo

comigo, nos dias dos pais todos meus amigos ganham um beijo e um

presente dos seus pais e eu tenho que esperar o dia certo para vir

Page 38: Livro presídio  2013

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visitar o meu pai, e fico pensando porque só acontece comigo, mas

olho para mãe e fico perguntando por que a senhora fica chorando

escondida, e eu pergunto, ela me fala que caiu ciscos nos meus olhos,

e me dá um beijo, ai eu esqueço de tudo, mais logo eu pergunto,

mamãe o papai vai vir pra casa ? Quando mamãe enche os olhos

d’água e dá um nó na garganta e responde: __ Meu amor, se Deus

permitir o papai vai voltar pra nós quando a meu filho estiver com 10

anos. 10 anos? Mamãe, mas vai demorar muito, não meu filho quando

você estiver na quarta série. Mamãe eu vou estudar muito para que eu

chegue logo na quarta série. A mãe deu um beijo e sorriu, eu saí a

brincar.

Célio

Page 39: Livro presídio  2013

39

Célio

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DEUS NOSSO VERDADEIRO AMIGO

Pois esta é uma história real sobre a amizade, pois no mundo que

vivemos não podemos falar que temos amigos. Pois temos

conhecidos. Muitas pessoas que falam que é seu amigo, só são quando

você tem algo que interessa a ele, pois o mundo que vivemos tem

muita falsidade. Quando você tem dinheiro, um carro e casa têm

amigos, mas quando está na miséria não tem, ninguém pode falar eu

sou seu amigo, vou te ajudar porque gosto de você; pois tenho 31 anos

de idade e nunca vi isto acontecer. A prisão é a maior prova da vida

real, valemos o que temos hoje, falo com conhecimento de causa.

Muitos na sua frente é uma coisa, por trás falam mal de sua pessoa.

Mais fazer o que? A lei é da sobrevivência. Deixo aqui o meu recado,

temos um amigo fiel de verdade: Que é DEUS e meu SENHOR

JESUS CRISTO que está no céu, pois ele deu a sua vida para nos

salvar, a minha e de todos. Eu agradeço a ele pela saúde e pelo fôlego

de vida, por ter me castigado severamente, mais não me entregou a

morte.

Deigivânio Barbosa de Barros

Page 41: Livro presídio  2013

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LIBERDADE

Não sei se estou preparado para esse dia, está chegando este tão

esperado momento, afinal vai ser o meu recomeço, porque foram dias

longos trancafiado neste lugar triste, tenho pensado seriamente de

como vai ser minha vida quando chegar o grande dia. Até choro só de

lembrar quando as grades abrir. Oh! Meu DEUS que alegria, que bom

que o senhor ouviu minhas orações.

Lá fora está tudo mudado, não sei como vai ser a reação das

pessoas que me conhecem, o que elas vão falar, o que vão pensar não

sei, eu só sei é que não vai ser fácil, pois a discriminação e o

preconceito são muito grandes. Estou muito arrependido, errei e estou

pagando, só não imaginava que o preço seria tão alto, porque tiraria de

mim o bem mais precioso que é a minha liberdade, família e moral.

A caminhada vai ser longa, eu sei, mais o pior graças a Deus, já

passou, agora é olhar pra frente e pensar no futuro, não vou fazer a

minha “coroa” chorar, pois depois que vim pra cá, percebi que com o

passar dos anos ela ficou mais velha, mais séria e triste, sou o

causador de todo sofrimento não só dela, minha mãe, como de muitas

outras. Hoje eu sei o que é ter um dependente químico em casa, que

rouba, mente ou até mata por causa desse maldito vicio que atrasa e

destrói lares.

Se você que por acaso estiver envolvido com essa parada saia

fora enquanto há tempo, pra não provar do veneno que eu provei, não

Page 42: Livro presídio  2013

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tenho a ver com a sua vida, mais eu não desejo pro meu pior inimigo o

que eu passei na cadeia. Que sirva de exemplo pra quem ler, o diabo

lhe dá com uma mão e toma com as duas. Não compensa sangue bom,

vai por mim. Pra que escolher o destino pior se você pode ter o

melhor?

Que DEUS ilumine o caminho de vocês.

Oscalino Rodrigues

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Célio

Page 44: Livro presídio  2013

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JOGO DE DAMA

Eu vejo dois presos jogando damas para passar o tempo dentro

da cadeia. Mais como este jogo é tão parecido com a família, por que

se falta uma pessoa na família fica desfalcada. Talvez para os irmãos,

com o corre corre do dia a dia, esta peça de dama não pode fazer falta,

mais para a mãe, na hora da refeição, na hora de dormir, no final do

ano, junta todos os outros filhos, netos, genros, mas falta sempre um

lugar na mesa. A mãe pode estar no meio de tantas pessoas ao redor

dela, mais mesmo assim ela sente falta daquele filho.

Os filhos crescem, e os pais têm que deixar cair e levantar,

porque cair é do homem e levantar é de Deus. Nesta caminhada da

vida o destino coloca caminhos diferentes, mais em suas orações ela,

sempre entrega este filho, na mão de Deus. E que Deus carregue ele

em sua mão e ajude ele a caminhar entre espinhos, em um caminho

cheio de pedras, e na hora que ele achar que não tem mais jeito Deus

por ser um bom pai, pega ele em suas mãos e conduz para o bem,

porque Deus nunca abandona nenhum filho porque ele veio para

salvar quem está perdido.

O bom pastor vai atrás das ovelhas desgarradas, e coloca em seu

rebanho.

Célio

Page 45: Livro presídio  2013

45

LIXO HUMANO

Em vez de jogar pedras em nós presos reze por nós. Porque em

um lugar que se amontoa presos não pode esperar bom resultado, o

governo dá o cárcere mas não dá maneira de ressocialização do preso.

Dizem que a justiça é cega, mais não é possível que ela nunca

vai abrir os olhos, pra esta injustiça que faz com nós presos, porque

prende um homem e solta um lixo humano. Com muitos sonhos, mas

a sociedade prefere gastar milhões com segurança, mas insiste em

fechar os olhos para nós. Mas isso tem que mudar se nós estamos

falando em lixos humanos, eu gostaria de dar um exemplo pela boa

ideia que uma pessoa teve. “O lixo do nosso Brasil, com a reciclagem,

hoje o Brasil conseguiu reciclar mais de 50% do lixo, só não

conseguiu cem por cento do por causa das nossas leis que em vez de

investir no Brasil, exporta lixo de outro país. Nós precisamos de

políticos honestos que pensa em leis que beneficia a todos nós

brasileiros.

Você que está lendo agora? Nos deixar amontoados, sem

podermos ajudar nossas famílias, sem poder mostrar que cada um de

nós somos capazes de fazer algo para ajudar nossa família, temos

condições de ser regenerados ? Hoje nós acreditamos que só Deus

pode tirar o homem da miséria e do pó. Porque o governo prefere dar

pena alta para meia dúzia de presos, para mostrar pra sociedade que

está fazendo justiça. Mais, hoje prende um ladrão de galinha mas se

Page 46: Livro presídio  2013

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ele tiver a mente fraca sai roubando um carro ou um banco, agora eu

pergunto, você acha que pra sociedade melhorou alguma coisa?

Cada preso aqui já foi um dia parte da sociedade, hoje sou eu e

amanhã pode ser você? Por diversas maneira o tempo passa, o mundo

gira, a cadeia só está cada vez mais cheia por causa da criminalidade.

Hoje aqui, somos o que enxergamos o mundo, como um reflexo

de um espelho, tudo o que vemos e revemos. É o que estamos

reeducando, se prende um cachorro e só faz raiva nele, dificilmente

ele vai ficar manso. Mas a nossa justiça tinha que fazer cada preso ser

capaz de alguma coisa, de estudar e de fazer cursos, porque todos os

seres humanos é capaz. Erra mais é capaz de consertar seus erros.

Célio

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Célio

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DIA DE VISITA

Um dia muito esperado pelo preso.

Um dia que podemos ver as nossas mães, a nossa esposa, os

nossos filhos, dia de esperança. Dia de poder saber como eles estão

dia de saber noticia da rua, dia de aproximação com a pessoa que

amamos. Mais ao mesmo tempo em que é bom, para muito colega é o

momento de pensar em sua família que está longe, a pior coisa na vida

do preso é o abandono dos seus parentes, da sua mãe e da sua esposa,

porque irmão, tio, primos, só vem se puder vir.

Você não sabe como é bom uma visita. Eu acho que é o momento

de saber quem de verdade se preocupa com a gente e que lembra que a

gente é gente. Quando estamos na rua é muito fácil fazer amigos. O

homem preso e limitado a tudo, o amigo lá fora te esquece. Pode até

lembrar mais fica com medo de pedir alguma coisa. Mais eu acho que

uma pessoa presa, doente, sente falta de um gesto de carinho, porque

até Jesus Cristo relata na bíblia sagrada que ele esteve preso e

ninguém veio visitar, mais o ser humano só prefere ajuda dele depois.

Célio

Page 49: Livro presídio  2013

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A MINHA VIDA NA PRISÃO

A vida é como mil nuvens no espaço, são como o fim. A cada

dia que passa me sinto muito triste cheio de saudade da vida livre. Às

vezes fico pensando na rua da minha casa, tenho saudade daqueles

momentos de alegria no pensamento, e fico cheio da esperança de

voltar um dia para os braços da minha família. Quando estou

dormindo sonho com a minha liberdade, quando acordo eu estou atrás

de uma grade, é uma angústia que não tem fim. Parece que tem uma

agulha furando meu coração, mas só porque ainda não perdi minha

esperança em Deus. Sabe por quê?

Se não tiver lutas na vida não temos vitória. Peço a meus

irmãos, se você tiver algum problema na vida ponha na mão do mestre

que ele socorre na hora certa, e quero agradecer a Deus por me dar

essa inspiração.

Welliton Francisco

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ILUSÃO DO CRIME

Tenho momentos marcantes na minha vida, um desses

momentos foi quando a minha mãe me levou para a escola pela

primeira vez, com muita dificuldade ela conseguiu comprar meus

materiais chegando em casa a tarde me mostrando o meu primeiro

caderno e lápis.

Lembro das pequenas palavras que saiu da sua boca pela

manhã. Vamos para a escola estudar, eu perguntei meio assustado se

ela ia ficar comigo enquanto estudava, ela me respondeu: __ Não

posso. Depois venho buscar você, e assim foi. O sino bateu, a hora

chegou, e eu entrei para sala de aula. Muito envergonhado, meio

acanhado, conheci a minha professora e ela me apresentou para as

colegas de classe. Quando foi mais tarde, que acabou a aula, minha

mãe ainda não tinha chegado. Eu já estava sendo uma dos últimos a

sair do colégio. Mais alguns minutos e a vejo entrando no portão de

cabeça baixa e muito triste. A professora perguntou por que ela

demorou e minha mãe pediu que eu fosse lá fora.

Subi no banco do corredor para olhar o que as duas estavam

conversando, mas antes não tivesse subido, porque vi minha mãe

chorando e falando para a professora que não chegou na hora certa

porque tinha brigado com seu marido, ou seja, meu pai, e que as

coisas lá em casa não andava nada bem. Despedimos da professora e

Page 51: Livro presídio  2013

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fomos embora para casa, no meio do caminho minha mãe perguntou

como eu tinha passado. __Bem, e que tinha feito novos amigos.

Ela sorria e brincava comigo o tempo todo, mas eu via e sentia

que ela estava sofrendo calada. Continuei a estudar alguns meses, e ai

não passou muito tempo. Rapidamente num piscar de olhos eu já

estava com meus 12 anos de idade e comecei a sentir falta de dinheiro.

Quanto mais dinheiro eu tinha mais amigos aparecia. Fazia loucuras

para conseguir o que eu queria, sem pensar nas consequências que

mais cedo ou mais tarde estava por vir. Comecei a fumar drogas ao

frequentar as festas, sem pensar que tinha uma pessoa lá em casa que

sofria tanto por mim. Eu estava dominado pela ganancia e pelas

drogas, e pelos líquidos doces que exageradamente eu consumia, que

as vezes me tornava tão violento. Com 13 anos eu era tão popular!

Tinha tantas pessoas ao meu lado que eu pensava que era maioral.

Muitas dessas pessoas falavam que eram meus amigos e leais a mim,

tinha carros e motos. Era muita luxuria para eu poder desfilar pelas

ruas, não queria mais escutar minha mãe que sempre sonhou com

minha felicidade, para mim vencer na vida. Ela que esforçou tanto

para a sociedade me ver de igual para igual, uma mãe solteira como a

minha que já passou fome e muitas dificuldades para não ver seus 05

filhos de barriga vazia, e o que eu estou dando em troca? É só tristeza

e as mágoas, ela chega ver seu filho se matando aos poucos nas

drogas.

No prolongar dos tempos vim parar na cadeia e comecei a

perceber que toda beleza tem seu preço, quem dizia que eram meus

Page 52: Livro presídio  2013

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amigos viraram as costas para mim. Hoje em dia vivo chorando na

prisão, e pedindo perdão para todas as pessoas que eu fiz sofrer, peço

desculpa para minha mãe e minha família, por eu não ser tudo que

sonharam, e peço para eles nunca dizer para mim que é tarde demais.

Wedson Tiburcio dos Santos.

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O VALOR DA LIBERDADE

Eu diria que agora neste momento, não tenho a minha liberdade,

às vezes penso que sou um pássaro com as asas machucadas

esperando o tempo passar para me recuperar e poder voar. Hoje em

dia não posso fazer nada para poder desfrutar da minha liberdade,

porque estou pagando por um erro que cometi, não posso ir para as

festas, não posso levar minha namorada na praça para tomar um

sorvete, nem passear pelas ruas. Não posso abraçar meu filho, nem

dar o amor que ele merece. Porque eu não sou livre. Eu sou preso pela

mão do homem. Mas pela vontade de Deus eu sempre estarei livre,

todos os dias. peço ao pai que me livre deste lugar, quero viver com

liberdade que é uma das maiores riquezas que o homem possui.

Wedson Tibúrcio dos Santos

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DROGAS MATAM

Quando somos criança, não temos noção de quase nada na vida.

No passar do tempo as caminhos que descobrimos fazem nossos

destinos. Eu mesmo fui criado com meu primo e gostaria que vocês

voltassem no tempo comigo para rever uma história de vida diferente,

eu e meu primo éramos muitos amigos e entre nós não tinha segredos

e muito menos falsidades. Sempre que ele fazia algo de errado ficava

muito preocupado por que sua mãe, não podia ficar sabendo. Ainda

éramos duas crianças, a nossa infância era tão maravilhosa que nós

não queríamos ser adulto.

No decorrer do tempo fomos crescendo e conhecendo o prazer

que a vida nos oferece, meu primo já conhecia as drogas e a bebida.

Quando as drogas acabavam ele cometia furtos para sustentar o vicio.

Teve um dia que eu, meu primo, mais seus amigos, estava no

fundo do quintal da sua casa ouvindo o som e desfrutando do que era

proibido. Quando foi mais tarde escutamos um som mais alto na porta

da casa que estávamos, aí meu primo levantou para ver o que estava

acontecendo, foi quando viu que sua mãe tinha feito uma surpresa no

seu aniversário de 18 anos. O som alto era de um carro mensagens.

Ele se emocionou, seus olhos encheram de lágrimas, foi uma grande

festa.

No outro dia um amigo dele foi em sua casa chamar para fazer

um assalto, que era pra ganhar um dinheiro para eles matar a ressaca

Page 55: Livro presídio  2013

55

do seu aniversário. Marcaram a hora, pegaram as armas e os dois

foram mais não deu certo, e os homens pegaram eles.

Seu amigo menor de idade foi libertado e ele ficou preso, sua mãe

entrou em desespero. Toda nossa família ficou muito triste. Ele passou

01 ano e 06 meses atrás das grades. Duas viradas marcantes na sua

vida. Veja só. Depois de 2 meses ele falou para sua mãe que ia numa

festa, sua mãe pediu que não fosse , por que estava com

pressentimento ruim, mas não adiantou. Chegando lá, encontrou seus

amigos tomando uma cerveja e um inimigo do passado que pegou na

sua mão, e meu primo despediu-se deles dizendo que ia embora ,

quando ele virou as costas, essa pessoa sacou-se de uma arma e

disparou 5 tiros. Alguns meses na barriga de sua mãe, alguns anos

para entender a vida, um ano e seis para passar os obstáculos da vida e

com vinte anos nos deixou. Um minuto para morrer. Agora só restam

lembranças dolorosas. Infelizmente a estatística não era diferente,

quem envolvem com drogas, não se liberta, a vida é curta.

Eu nunca vou te esquecer, sinto muito a sua falta Tibério, nascido

em 18/ 09/1980 finado 21/05/2001. Que Deus te coloque em um bom

lugar, e que sua luz ilumine nossa família.

Wedson Tiburcío dos Santos

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O AMOR: ESPADA INVÍSIVEL

Amor, meu Amor, tu que fez de mim um sonhador, um viajante

no delírio de amar, que fizeste de mim uma criança, tamanha

inocência feliz a brincar. És que manda e demanda no meu coração,

sinto muita falta do calor da paixão.

Às vezes fico acordado nas madrugas e choro pelos cantos da

cela, sem ninguém perceber, choro por falta de carinho, e amor, falta

da minha família.

Toda visita minha mãe vem mim ver, mas quando ela vira as

costas e fala tchau pra mim , o mundo todo cai sobre minhas costas, e

fico muito triste , a espera por mais sete dias para matar minha

saudade das pessoas que amo.

O amor se fez falso infiel, e o que me resta é o rancor, a

insensata solidão que me devora calada por dentro do meu peito.

Wedson Tiburcio dos Santos

Page 57: Livro presídio  2013

57

CÓDIGO PENAL

O código penal é cheio de brecha na lei, basta um defensor saber

trabalhar bem para que o seu cliente possa se beneficiar desta lei, que

é feita para todos, mas infelizmente só para quem tem condições de ter

um bom defensor.

Hoje, dentro de um presídio tem muito preso que furtaram Art.:

155. Outros roubaram art.: 157. Outros, homicídio culposo Art.: 121.

Outro por porte de arma Art.: 14 .Outros por estelionato Art.: 180.

Outros por formação de quadrilha Art.: 288. Outros por lesão

corporal, Art.: 299, estes crimes são simples. A pena, a cada 12 meses

puxa 2 meses por ano, e recebe o direito de ir para o regime semi-

aberto, e o preso pode puxar um sexto da pena para passar para o

regime aberto (O regime que vem só dormir no final de semana ).

Puxa mais um sexto e vai para o regime condicional (uma pena

simples) ex.: um preso pega 8 anos, e puxa 16 meses , vai para o semi

- aberto sobra 6 anos e 8 meses. Puxa 1 ano e 40 dias e sai para o

regime aberto que vem só ao final de semana. Sobrou 5 anos e 6

meses e 20 dias. Ele puxa 11 meses e 15 dias sobrou 4 anos, 7 meses e

15 dias para pagar a condicional. O regime hediondo e 4 meses por

ano, ou 8 meses por ano, dependia do Estado que o preso estava

puxando. O crime hediondo são os crimes de homicídio doloso

(aquele crime premeditado, a intenção de matar Art.: 121. Tráfico de

Page 58: Livro presídio  2013

58

drogas Art.: 33. Estupro Art.: 213, 214 latrocínio, assalto seguido de

morte Art.: 157 parágrafo III.

Na lei velha este crimes se fossem em são Paulo ou Brasília ou

Rio de Janeiro um preso que pega 6 anos puxa 4 anos e saia pra

condicional.

Se fosse no Goiás poderia ter a regressão de regime e do seis

anos ele poderia puxar 2 anos e sair pro semi- aberto, 2 anos no

aberto, 2 anos condicional.

Isso são brechas da lei que só precisa de um bom defensor, hoje

esta matemática do hediondo acabou. 4 meses por ano agora é 2/5 da

pena, que é 4 meses e 26 dias por ano. Agora quando você ler este

texto , para e pensa se vale apena e mundo do crime.

Célio

Page 59: Livro presídio  2013

59

A INJUSTIÇA SOCIAL

Dignidade é uma palavra fundamental na vida do ser humano.

Porque quando falta dignidade a vida perde o sentido e a tendência é

afundar cada vez mais. Hoje eu vi num programa de televisão uma

família, catadora de papel, que a vida pra eles, não era tão boa,

moravam num barraco porque eles não tinham banheiro, e nem tinha

um teto bom que em dia chuvoso, a família não podia descansar, não

tinha uma alimentação para matar a fome dos filhos com dignidade.

Isso é muita injustiça porque qual o pai de família que não que ver

seus filhos com a barriga cheia?

O Brasil é muito rico, mas muito injusto, porque os nossos

políticos prefere fazer leis que beneficiam só eles. Hoje no senado

estão falando de fazer uma lei que não pode candidatar políticos

corruptos, mas isso no Brasil é um sonho, que quando nós acordamos

vira um pesadelo, porque só os pobres têm direito nesta lei falha e

lenta, porque dizem que toda pessoa tem direito a um defensor

público, mas na prática isso não existe porque este que ganha pelo

Estado pra defender um preso ele ganha não para defender , mas para

assinar papel. Hoje no fundo de uma prisão 90% do presos tem estes

tipo de defensor que não tem interesse, nem um pingo de dignidade

para defender o seu cliente, mas se for olhar quando vence a pena

ainda tem que fazer muitas novenas , pro preso hoje aqui até o

defensor particular não mudou muito as coisas porque enquanto saber

Page 60: Livro presídio  2013

60

que o seu cliente tem dinheiro eles ficam com muita promessa, até

secar a fonte, e para poder conversar com eles só Deus na causa, um

milagre está acontecendo.

Até que enfim está anunciando nos meios de comunicação, no

rádio, e na televisão que tem que dar uma chance pra um detento, que

perdeu a sua dignidade mas seria muito mais fácil dar uma segunda

chance pra um detento e muito mais fácil recuperar eles dando

oportunidade pra eles pagar sua pena enquanto ele está fechado

porque o Estado espera as pessoas pagar sua pena muito tem que

puxar 365 dias outros 3.650 dias ou mais e o Estado começa a

preocupar como reintegrar estes presos pra sociedade, mas quando um

preso sai do sistema ele acha as porta da sociedade fechada mas o

Estado dá uma ajuda pro preso, esquisita dá uma folha com umas Leis

mandamentos que não pode isso, não pode aquilo, mais o que os

presos queriam ouvir é que ele ia sair com um serviço garantido com a

sua carteira assinada, assim é o mínimo que o Estado poderia retribuir

a este preso, com uma vida nova pra que ele passasse e pudesse

recomeçar uma vida nova com a sua família, lamento dizer Brasil

escravo.

O Brasil de cor, o Brasil de injustiça, mais somos Brasileiros e não

desistimos nunca eu acredito que no nosso amanhã tudo pode mudar

mesmo sabendo que a tendência , é a cada vez mais arruinar , mais

tenho fé em Deus que ele é justo e nunca deixa os teus filhos

desamparados.

Célio

Page 61: Livro presídio  2013

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GÍRIAS DE PRISIONEIRO

Preso não tem estudo nem conhecimento, mais conversam por

dialetos diferentes, no popular e conhecido por “gírias”. Maneira

diferente de estorcer as palavras, o código penal, e combinado pelo

artigo de 171 estelionato. Na cadeia começa pelo o nome, meu nome é

Célio, mas todos me conhecem por Pernambuco. O meu primo chama

Fabrício e ele é conhecido por Nogueira, Quando você chega no

presídio pede licença pra entrar, e não precisa falar o que fez, já fala o

artigo que automaticamente todos vão saber o que a pessoa fez. Se o

boi estiver vazio pede licença pra pegar o boi e tirar o cheiro da rua. E

depois procura uma Jega pra poder descansar, mais nem sempre

encontra, ai eu tenho que ir pra praia e eu estou com fome e procurei

um irmão: a chepa aqui e boa?

Ele me falou: __ a brindada é só boi ralado zoizão e carne de

monstro. Aqui paga o marocos? __Paga cedo. Olha, hoje é o dia de

lavar a cela, se você não quiser lavar, eu pego por dois fragantes.

Dois fragantes? O que pode ser? Um caco de telha ou um mata rato,

ou uns pneus de fusca. Os irmãos de outra cela está ligando pra

mandar a teresa, pra mandar o moca, porque o nosso megulhão

queimou. Um irmão procurou se eu tinha uma gancha pra nós fazer

um jogo, uma peita ou uma bona pra nós fazer um jogo com o meu

bobo.

Page 62: Livro presídio  2013

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VOCABULÁRIO

Boi= banheiro

Jega= cama

Praia = piso

Bobo = relógio

Zoizão = ovo frito

Carne de mostro = carne de

pedaço preta.

Chepa e brindada= marmitex

Boi ralado = carne moída Caco

de telha = bolacha quadrada e

de sal

Mata rato = suco pequeno

Tereza = corda feita de lençol

Moca= café

Gancha= calça

Peita = camisa

Bona= boné

Pneu de fusca = bolacha de doce

de forma redonda.

Fragantes = pode ser um suco,

um miojo, ou bolacha

Célio

Page 63: Livro presídio  2013

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VIDA NA ROÇA

Trem bão é vida na roça, trem batuta de bão foi quando eu

morava na roça. No tempo antigo já quase esquecido, reza em casa,

festa de pouso de folia, casamento por atacado, assação de batata,

meninada espalhada pelo terreiro, muita lua clareando brincadeiras,

finca pião, ordem, anelzinho, esconder, biloca sentados do quintal

fazendo a gata parir. Programa de rádio, bichão grande resmungando

novas noticias da capital, coisa distante, gente mais velha contando

causos de assombração, lamparinas catingudas fazendo sombra nos

cantos. Pesadelo de noite mijo na cama. No terreiro, cebola e salsa

plantada numa bacia velha, num cocho cânfora e alecrim. Bicharada

para todo lado. O ninho batido na cerca, abriga passarinhada na

sombra, tratação de porco no mangueiro grandão, bicho redondo de

gordo, matação de capado, trabalheira o dia inteiro, mas faz choriço,

fazeção de lingüiça, vento na tripa, furação com espinho de laranjeira,

no quintal frutas demais, meninada bocuda com congestão,

esgubilança, danação. As roças o milho, a pamonha quente com queijo

e linguiça, colheita de feijão, varas batendo o dia inteiro, o tear velho

parindo no incessante rec rec e no vai e vem das canoinhas, panos

bonitos. O baile de noite, sanfona, viola, namoricos, a luz das

lamparinas catingudas, as romarias do muquém, procissões, chuvas,

viagem nos carros de bois.

Então isso meus amigos foi um pouco de mim, rapaz bobo, que

veio pra cidade, que me envolvi com uns caras de vida muito louca e

Page 64: Livro presídio  2013

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acabei com minha vida, e acabei sendo preso e sem previsão de

soltura.

Aqui onde estou agora só vejo grades por todos os lados. Há

meus amigos, como são tristes os dias meus, como eu me arrependo,

as vezes me dá um descabreio danado da vida, mas Deus é pai e não é

padrasto, tenho certeza que Ele vai me ajudar a sair desse inferno. Já

é madrugada e tarde, vou me deitar carregando a minha dor de homem

esmagado pelo destino.

Oscalino Rodrigues.

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Célio

Page 66: Livro presídio  2013

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A VIDA DE UM FILHO DESOBEDIENTE

Às vezes um filho paga um preço muito alto pela a

desobediência de seus pais, eu pela minhas aventuras da vida, que o

mundo nos oferece, estou pagando um preço muito alto, o qual é ficar

privado da liberdade por tempo indeterminado pela lei do homem, eu

até com a idade de 33 anos passei a ser infiel a minha família, os meus

amigos e principalmente a Deus, e a minha vida um dia era tudo de

bom e eu não sabia dar valor, mais hoje com 38 anos, já arrependi

muito de tudo que eu já fiz de errado e jamais vou voltar a praticar

qualquer tipo de crime que o ser humano comete, não vale a pena, eu

fui condenado por crime de baixa periculosidade que é dito pelas leis

do homem, mais para Deus todos são crimes, e quem comete qualquer

coisa errada tem que pagar, já tem cinco anos que venho tentando

acertar com a justiça do homem mais sempre fazendo coisas erradas e

com isto a minha pena foi só aumentando, e só depois da minha

sentença, já tá muito alta que eu fui dar conta o que eu tinha adquirido

de ruim para mim mesmo, e fui ver que nada vale tanto dinheiro, se

não tem como, e com o que gastar, usar o dinheiro com a gente

mesmo, porque um homem na prisão é igual a todos os outros seja

rico, pobre, todos são iguais, são vistos, como uma manada de porcos,

só come na hora que eles trazem a comida e você só sai um pouquinho

pro sol na hora que eles querem, se você é um cidadão que nunca

esteve em uma prisão e tem curiosidade de saber como é, para você

Page 67: Livro presídio  2013

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não precisar ir visitar, é só você fazer um chiqueiro e por uma manada

de porco que você tem uma imaginação de como pode ser, a vida em

uma prisão, a diferença que você vai ter, é só que uns são ser humanos

e os outros são animais mais o modo de sobrevivência é um só.

Hoje graças a Deus, eu tenho a minha família ainda, que me

perdoou tudo que eu fiz eles passar, por minha causa, tanto sofrimento

que eles sofrem comigo até hoje aqui neste lugar, mais tem sido fortes

para me ajudar a cumprir a minha pena com a justiça.

Vicentin

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68

Célio

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MODOS DE RESPEITO

Tem um ditado muito certo que pra andar tem que dar o

primeiro passo, já foi dado a primeira largada para mudar o tratamento

do preso. O encarcerado não chega doente, mais amontoa pessoas

como lixo humano, e a sociedade esquece que são seus filhos que

estão morrendo, estão vindo preso, se não veio ainda pode vir. Porque

hoje a família esta muito desgarrada, já não deixa Deus entra nos seus

lares, hoje o pai não leva o filho pra casa de Deus, os pais tem que

fazer a sua parte porque se um dia ele entra em caminhos cheios de

espinhos, aquela caminhada quando era criança indo para casa de

Deus pode pesar em sua escolha de vida, por que aqui não tem meio

caminho, ou a direita ou a esquerda. O governo tem que investir mais

na educação, na saúde, ninguém pede pra vim pra cadeia, mais se veio

vamos tratar este problemas, muitos criticam o preso, mais a

sociedade não vem aqui ver que o preso tem capacidade de fazer

serviço de qualidade, hoje a melhor pessoa pra poder falar alguma

coisa é o diretor, o supervisor, o agente prisional, a nossa professora, a

nossa diretora, o nosso coordenador, que conhece as dificuldade do

sistema, hoje o modulo de respeito tem oito presos mas em

Niquelândia as empresas poderiam ser parceira e ajudar os

reeducando, mesmo aqui com o seu trabalho ajudar sua família a abrir

vaga para muitos irmãos que queira mudar de vida, o trabalho é o

melhor remédio , físico, emocional e moral. Tudo no começo tem

crítica, nós somos pioneiros neste projeto, mas o que mais me alegra é

ter dado um pouco de dignidade pros meus irmãos do semi-aberto, que

Page 70: Livro presídio  2013

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muitos presos amontoados num quarto tendo que trabalhar no outro

dia é difícil. Eu sei que ainda tem como melhorar muito. Nós

conseguimos fazer 36 jegas (camas) para presos que dormiam

amontoados numa situação crítica, dois até três presos num colchão.

Hoje melhorou, cada preso fica em jegas separadas tem a sua cozinha

para colocar sua garrafa de café, até para lavar roupa hoje tem tanque.

Hoje eu sinto feliz por ter ajudado a dar um pouco de

dignidade aos meus irmãos, eu não sou a favor de preso parado não,

todos aqui tem capacidade de fazer alguma coisa e ganhar um pouco

para tratar da nossa família.

Célio

Page 71: Livro presídio  2013

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MINHA HISTÓRIA

Meu nome é Sidney, tenho hoje 22 anos, eu era um rapaz

feliz, sou feliz até hoje, não foi por causa disso que vou deixar de

viver, na verdade. Mas nós vamos falar como aconteceu a fita, a

cadeia e como estou hoje. Eu era um rapaz normal, gosto de trabalhar,

já trabalhei em frutaria e lava jato, em Pit Dog e de servente. Há um

certo tempo eu casei, estava bem no meu casamento, nós era feliz.

Mais a um certo tempo as coisa não foi dando certo. Mais como eu

estava na igreja busquei mais em Deus para que não deixasse

acontecer nada com o meu casamento. Mas o ciúme foi tanto, que nós

nos separamos, foi ai que eu perdi a cabeça, nós estava morando em

outra cidade, eu não agüentei voltei pra Niquelândia, ela também veio,

ai que eu perdi a cabeça mais ainda, fiquei doido. Amava ela muito e

até hoje eu a amo, ai foi passando o tempo, conheci os amigos que

dizia que era amigo, me chamava para sair, eu ia, foi passando tempo,

foi batendo mais saudade da esposa. Quando os amigos mim chamou

para fazer uma fita, como eu estava com a cabeça a mil, topei, fui lá e

roubei, mais aconteceu errado. Saiu completamente errado, não devia

ter acontecido, eu sai correndo e fui embora, nunca mais conversei

com eles, mas foi passando o tempo, eu voltei com minha esposa, tava

voltando tudo ao normal, já tinha esquecido que um dia a casa tem que

cair, ela caiu depois da fita, eu fui preso. Quando a policia me prendeu

eles não falou por que eles estava mim prendendo, só queria conversar

Page 72: Livro presídio  2013

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ai fui. Quando o Delegado me chamou ele perguntou, ai que eu fiquei

sabendo que o Delegado chamou os outro dois, eles já tinha dado o

depoimento, não tinha jeito falei tudo, confessei também o que tinha

acontecido, quando foi mais tarde fiquei sabendo que a minha mãe e

minha esposa estava lá, fiquei bastante triste e sabendo que um dos

dois falou onde eu estava trabalhando, já que os policiais não sabiam

que eu estava junto na fita, dei o depoimento, quando foi mais tarde

mim levou para o presídio, quando cheguei na cela que era chamada

de celão, a sela do inferno, porque era muito ruim, a pior cela do

presídio, mais não tinha como ir para outra, os preso não mim

maltratou foram todos de boa comigo, fiquei mais tranqüilo, foi

passando o tempo, fui conhecendo todos. Alguns ficou meus amigos

entre aspas, alguns se fingia de ser amigo, não pode confiar em todos,

você tem que ser bastante esperto, tem que ser malandro, peguei

conhecimento. Foi passando o tempo, fui ao fórum, fui julgado a 20

anos, dois quinto, é bastante grande a sentença, mais coloquei a minha

vida na mão de Deus só ele pode mim ajudar. Foi passando o tempo

aprendi a fazer artesanato por que a gente não pode ficar parado, então

a gente fica doido, o tempo não passa. Algum tempo atrás minha

esposa arrumou os papeis do nosso casamento, eu casei quando estava

preso. Casei no civil, fiquei muito feliz, por isso foi passando o tempo

e conhecendo a cadeia mais ainda. O ruim da cadeia e as micoses que

da na gente por causa do mofo por que todos dormiam no chão,

colocava o colchão no chão e deitava, agora melhorou mais um pouco,

fizeram beliche de concreto,mesmo assim a cadeia é ruim. Tomem

muito cuidado para não vir pra cá não é bom, é ruim, eu vim preso

Page 73: Livro presídio  2013

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com 19 anos, estava na flor da juventude. Cuida-se, pense bem o que

você vai fazer.

Vou ser papai estou muito feliz por esta noticia to muito

orgulhoso por isso, então é assim, fique com Deus e minha história.

Deus ama todos nós igual, não é só porque você fez alguma coisa de

errado, é só se arrepender Jesus te Ama Muito e eu também.

Suelber Sidney Belos de Lemos

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OBRIGADO SENHOR POR ESTE DIA A DIA

É o Senhor que nos da saúde e paz no coração. É da paz do

Senhor que todos nós precisamos para viver no dia a dia. É em Deus

que encontramos a verdadeira paz, só Ele nos da à vida eterna. Só é

possível quando seguimos os 10 mandamentos e colocamos em

prática diariamente a Bíblia Sagrada. Conhecer e viver os

ensinamentos que o Senhor nos deixa e segui-lo, para poder trilhar no

caminho da paz.

Quando pedimos algo a Deus, Ele conde a todos. Basta pedir

e o Pai realiza em nós a graça desejada e muito. É pena que às vezes,

quando estamos felizes, não percebemos que essa felicidade vem de

Deus e que somente Ele é a felicidade e tudo é dado por Ele. Se

seguissem o caminho que o Senhor nos ensina, o mundo seria um

paraíso de felicidade, não haveria sofrimento. Por isso quando for

pedir algo a Deus, primeiramente,deve pedir a sabedoria, porque é a

sabedoria que precisamos para conhecer o amor, somente Deus é o

amor. O amor é um sentimento de humildade, somente a humildade

vence o ódio que gera a guerra, que destrói a felicidade, é pelo o

caminho da humildade que reina o amor e o amor é um presente que

Deus dá para todos. Mais só será possível quando for capaz de colocar

em primeiro lugar o mandamento Sagrado, amar a Deus a acima de

qualquer coisa, lembrar sempre que Deus é a felicidade. Crer em Deus

e será feliz! Ele quem nos abençoa sempre, obrigado Senhor!

Page 75: Livro presídio  2013

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Só a te Deus Pai criador do Céu e da terra!

Senhor, guia nos no caminho da verdade, dá-nos sabedoria para

compreender o que certo e o errado. Guia senhor, para que sejamos

sábios, vivendo em vosso amor, amando o próximo, seguindo os

ensinamentos de Jesus. Senhor conduz a todos ao vosso amor,

seguindo fielmente os vossos mandamentos.

Guia Senhor a minha filhinha

Conduza-a no aprendizado

Da Sabedoria e abençoa todos

Que ama o próximo.

Que Deus proteja todos que estão em minha vida

Odair Domingos da Silva

Page 76: Livro presídio  2013

76

A POLÍTICA

A política representa uma Lei que ao mesmo tempo tem uma

coletividade por atuar de várias formas. Seria que tão bom que os

representantes colocassem em pratica e procurando buscar e criar um

desenvolvimento democrático para o crescimento e o bem estar de

todo cidadão. Como seria importante que a política fosse a busca de

compromissos sérios e responsáveis, visando cumprir e retribuir tudo

aquilo que é sua finalidade. Mais as maiorias das vezes sabem que não

é assim, não agem para obter um bem comum, a corrupção existe e o

mal feitor estraga a perfeição. Sendo que é através dessa casa de Lei

que acreditamos que poderá acontecer homens de bens que poderá

agir e construir um País melhor, baseado na verdade e na construção

de igualdade nos deveres e direitos para todos, assim teríamos um País

que sonhamos um mar de rosas, o respeito e valor para todos.

Mais acreditamos na política e por ela que encontraremos uma boa

solução.

Valdivino Rosa de Souza

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VERSOS DA PINGA

A pinga é filha do cão

e neta de satanás

junta 60 homem

e não faz o que a pinga faz.

Nasci na bacha da égua

Me criei no fim do mundo

Tirei carta de safado

Certidão de vagabundo

Subi pelo poleiro

E desci pelo pau cascudo

Só para de beber cachaça

Quando o copo cai o fundo

A chave da casa sumiu

E a minha mulher desapareceu

O delegado daqui é corno

E o homem daqui sou eu

Page 78: Livro presídio  2013

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Achei a chave de casa

Minha mulher apareceu

O delegado daqui é homem

E o corno daqui sou eu

Papagaio mata periquito,

Periquito mata jandaia,

O bicho que mata o homem

É um rabo de saia

Verde com verde,

rosa com rosa

Seu corpo é bonita

Tua boca é gostosa

Em encima daquela serra

Nasci água cristalina

Quem mexer com meu amor

Está na ponta da carabina

Vim de uma cidadezinha

Montado em seu pai

Campeando o seu avo

Page 79: Livro presídio  2013

79

Seu pai é bom de sela

E seu avo é machador

Obrigado por ter lido esses versos, professores, alunos e pais do

Colégio Estadual Francisco Santiago

Dilvange

Page 80: Livro presídio  2013

80

A MINHA VIDA

Eu Osvaldo Chaves Monteiro, casei em 1994, tinha um a vida

boa, até no ano de 2000. Por uma mentira fui preso. Por não ter

dinheiro, estou preso ate hoje, pagando por algo que fiz a minha vida

transformou em um pesadelo.

Apesar de tanta injustiça ainda sou um homem feliz, sei que não sou

rico, não possui bens matérias, mais sou rico de graças e bênçãos de

Deus. Tenho uma linda família. Hoje sei que bens materiais o único

tesouro coisa que me restou, a minha esposa e filhos. Hoje me

encontro com sérios problemas de saúde gravíssimos, a minha coluna

está quase entrevada tenho muitas dificuldades no andar. Não sei

como irei fazer para sair, pedir os meu recurso, estou doente e tenho 4

filhos para cuidar.

Osvaldo Chaves Monteiro

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81

O DESENCONTRO / ENCONTRO DA VIDA

Sou um sertanejo, que nasci as margens do rio Tocantins na

fazenda São Jacob, Município de Niquelândia. A minha família nunca

teve condições de colocar os filhos na escola para estudar ou melhor,

não havia escola na região e nem tinha recursos, para ir até uma escola

loca vim para a cidade.

Algo que marcou forte mente a minha vida, foi quando tinha 11

anos de idade. Numa tarde ensolarada, sai alegremente para buscar

algumas canas caianas. No memento em que estava cortando as canas,

uma enorme cobra cascavel, pecou-me no pé direito. Após esse

acontecimento fiquei dezoito dias sem enxergar nada, a minha mãe

ficou muito aflita e pensou seriamente: - Meu filho perdeu a visão,

está cego. Foi quando ela se agarrou no impossível. Depois de muita

oração e muita fé em Deus; conseguimos um grande milagre, voltei a

enxergar!

Sempre morei na fazenda e continuamente trabalhei como

lavrador. Sou uma pessoa que temo pela sinceridade, honestidade,

sempre vive do meu trabalho. Depois de alguns anos, fui esquecendo-

se das coisas mais preciosas que aprendi quando criança. Apesar, da

serenidade, fui envolvendo com pessoas, que tentaram destruir-me,

em todos os sentidos. Hoje me encontro no presídio, mais tenho Deus

como o meu escudo. Toda a amizade e envolvimento que vive antes

na vida são passado e nessa nova pagina da minha vida, que ser uma

Page 82: Livro presídio  2013

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nova pessoa, resgatada no amor de Deus e por incrível, o que não

pode ter quando criança, e nem mesmo, quando adulto, estou vivendo

agora. Tendo oportunidade de estudar, realizando o meu sonho de

criança. Hoje, aqui no presídio, apesar de tudo, estou estudando e sou

feliz por essa dádiva em minha vida.

Samuel Francisco da Silva.

Page 83: Livro presídio  2013

83

SONHO INESPERADO

A vida só tem senti quando há um encontro consigo

mesmo. Não importa quando e nem mesmo aonde. Fui preciso ser

preso, para perceber: quem sou eu? Os valores e dons especiais, que

só a mim, foi dado por Deus. As pessoas que realmente me amam e

nem dava valor e muito menos sentia. Era feliz e não sabia.

A dor que me consume, delata o me coração de dor, dor essa

que não se cura com remédio. O Único remédio que aliviará a minha

dor será no dia tão sonhado e desejado. O dia inesquecível! Que irei

passar pela porta da liberdade, livre e sendo uma nova pessoa.

Não desejo para ninguém, esse lugar. Aqui vivemos todo tipo

de sofrimento, que alguém possa imaginar. Além de ser privada da

liberdade, ausência da família, dos amigos e dava vida digna de um

ser humano. Mais apesar de todo esse pesadelo, reencontrei comigo

mesmo e estou buscando força e coragem para libertar do vício de

bebida alcoólica.

A certeza que hoje, tenho é essa: quando sair, quero ajudar a

minha família e dos valores em detalhes que antes não percebia, o

carinho de minha mãe e do meu pai. Sei, o quanto é bom ter uma

família. É a única certeza que temos na vida.

Três anos no presídio e nunca discutir com ninguém, fiz

grandes amigos, amizades que irei levar para sempre comigo. Graças

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essas amizades tenho força para suportar e esperar o memorável dia da

minha saída.

Eliel França dos Reis.

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A BOA CONVIVÊNCIA DO SER HUMANO

Como seria bom se todos fossem amigos um dos outros.

Dividindo as dificuldades, alegrias e conquistas. Assim,

compartilhando todos os momentos da vida.

Peço sempre a Deus que transforma a vida do homem,

principalmente aqueles que não conhecem a Deus e não busca a

sabedoria e prudência que vem dele. Pois ele poderá ser a nossa ampla

solução de resolver os nossos problemas, que as vezes parecem

impossível. O seu amor pode transformar e fazer tudo que é bom para

a nossa vida. Basta pedir com fé e confiar: pois ele e o nosso senhor

supremo, todo bem.

Eu, particularmente gosto de ser amigos das pessoas, tento

fazer-las felizes. Pois o Amor de Deus esta em todos os corações.

Somente amando uns os outros, será possível promover a paz!

Altielle

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A VIDA DE UM DETENTO

A vida passa por muitas mudanças a partir do momento

em que entrei no portão do presídio. Os meus primeiros dias na

cadeia, me encontrei profundamente aborrecido, com tudo que

havia acontecido. A maior alegria que invadiu todo o meu ser foi à

primeira visita, que recebi da minha família.

Hoje sei que cada dia, passo aqui não é em vão. Porque,

sei que nasce dentro de mim, um novo jeito de ver a vida , de

relacionar tranquilamente com todos, tenho um novo olhar para as

situações que envolvem o meu viver. Sou muito feliz! A palavra de

Deus faz parte do viver.

João Batista Xavier Filho.

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LEMBRANÇAS

Um dia estava eu, Nega e a minha filha. E nós vivíamos uma vida

feliz! Mas, eu tinha que planta uma semente de pimenta. Comecei a

enche o corpo de terra preparada e a minha filha perguntou:

- Pai o que o senhor está fazendo?

Eu disse: - Filha o papai está enchendo os copos de terra para plantar

pimentas.

Ela disse-me sorridente:

- Pai eu quero também plantar com o Senhor.

Disse a ela: - Filha, esta terra tem formigas, mas ela insistiu, até

chegou a chorar. Naquele momento a Nega, estava fazendo almoço.

Quando ela ouviu o choro da nossa filha, veio saber o que estava

acontecendo. E disse-me:

- O que está acontecendo com a Geovana?

Expliquei o que estava acontecendo e ela insistiu para eu deixar a

menina colocar a terra no copo. E assim fiz:

- A deixei ela encher os copos descartáveis. Estava sendo um

momento especial quando disse a ela:

- Filha, minha filha, enche os copos de terra e o papai plantarem as

sementes.

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Quando a Geovana olhou e viu os 40 copos para encher, eu comecei a

plantar as sementes e a minha filha olhou para mim, e falou chorando:

- Mãe o meu pai quer, que eu encho todos esses copos! Deixou e foi

embora. No momento, achei tudo muito engraçado, pensei que a

minha filha estava correndo das formigas. Percebeu que a brincadeira

estava virando serviço.

Filha o papai te ama muito!

Célio

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AVIÃO

Um dia resolvi comprar uma carroça, e ninguém estava gostando

da minha idéia, mesmo assim continuei com essa idéia.

A minha esposa já estava pensando a vida: - o meu cachorro

não gosta de cavalo. Sendo que a minha filha estava alegre por causa

do cavalo.

Quando arriei a carroça e a levei no colégio particular. Lá estava os

pais dos alunos chegando de carro. Eu e a Geovana chegando de

carroça. Foi normal na chegada. Quando foi a tarde as crianças logo

aproximaram do cavalo e para tirar fotos.Quando saímos a minha

filha perguntou:

- Pai, como chama o cavalo do senhor? Eu não sabia o nome dele,

mais pensei logo. Mo momento, quando percebi que ele era muito

lento. Foi quando, pensei logo no nome. Avião. No outro dia a tarde ,

quase todas as crianças, já sabiam o nome do cavalo.

Sei que o pai da Geovana não tinha nem uma Ferrari e nem um

fusquinha, mais tinha algo diferente, que deixava, a minha filha fica

toda fofinha, por isso o papai dela tinha um cavalo chamado avião.

Célio

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UM NOVO SENHOR

Descobri que a minha vida desde os dezessete anos, vive

sempre no presídio. Não contei muito com a sorte! Morei mais na

cadeia do que na rua. Nesse momento, o que eu, mais gostaria: seria

ser uma pessoa livre, para viver em liberdade com a minha família.

Há muito sofrimento aqui neste lugar. Sei que errei, por isso

preciso pagar pelos meus erros. Tenho uma certeza. A partir do

momento, quando deixar este lugar. Com a graça de Deus não

cometerei mais os mesmos erros.

Sou eternamente grato a Deus, por proteger a minha vida. Foi

aqui no presídio que aprendi a pensar melhor na minha vida, dar valor

no dom da vida, descobri o que é viver.

Fui uma pessoa cheia de vícios, cachaça, drogas. Hoje tem uma

única certeza. Não quero esse tipo de vida para mim e para a minha

família. Tenho fé em Deus , que estarei recuperado e serei uma nova

pessoa. Hoje, é essa convicção que quero e irei reconstruir o meu

viver.

Edivaldo Madureira Taveira

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Andrade, M. V. & Lisboa, M. B. (2000). Desesperança de vida:

Homicídio em Minas Gerais. In Henriques, R., editor, Desigualdade e

Pobreza no Brasil, pages 347 - 384. IPEA, Rio de Janeiro.

Araujo Junior, A. F. & Fajnzylber, P. (2001). O que causa a

criminalidade violenta no Brasil? Uma análise a partir do modelo

econômico do crime: 1981 a 1996. Belo Horizonte: Universidade

Federal de Minas Gerais, CEDEPLAR, 88p. Texto de Discussão 162.

Beato Filho, C., Peixoto, B. T., & Andrade, M. V. (2004). Crime,

oportunidade e vitimização. Revista Brasileira de Ciências Sociais,

19(55): 73{89}.

Kahn, T. (2000). Os custos da violência: Quanto se gasta ou deixa de

ganhar por causa do crime no Estado de São Paulo. Fórum de Debates,

Rio de Janeiro: IPEA, SESC.

Sites que tratam dos assuntos da criminalidade.

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Célio

APOIO:

PROFESSORA SIMONE PIRES GOMES

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