inserção pentecostal no cotidiano do cearense (1914 1945)
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INSERÇÃO PENTECOSTAL NO COTIDIANO DO CEARENSE (1914-1945)
Geovanio Carlos Bezerra Rodrigues1
Graduação em História - UFC
RESUMO
Este artigo tem por objetivo analisar a inserção do pentecostalismo clássico no
Ceará, no período de 1914 a 1945. O recorte temporal é embasado no livro "Breve
História da Assembléia de Deus no Ceará" de Teixeira Rêgo, principal fonte de
pesquisa e escrito no ano de 1945. Pretendo conceituar o que é pentecostalismo para, a
partir daí, compreender como ele se instalou no Ceará, desde sua inserção na Serra de
Uruburetama até os extremos norte e sul do Estado, mapeando seus principais lugares
de atuação. Pretende-se também analisar a relação entre o cearense e o pentecostal,
relacionando essa nova fé com o modo de vida local. O que se percebe é uma atuação
em espaços pouco assistidos tanto pela Igreja, como pelo Governo. Lugares habitados
por pessoas humildes e de pouca escolaridade. Este contexto desencadeia uma nova
forma de se relacionar com o sobrenatural, sendo assim, um protestantismo mais ligado
a questões regionais e ao modo de vida dos que o aderem.
Palavras-chave: Religiosidade, Ceará, protestantismo, pentecostalismo.
INTRODUÇÃO
A religião e a religiosidade nos cercam por todas as partes. Talvez um dos
países que isso se manifeste de forma mais contundente seja o Brasil. Nossa vivencia
social está marcada por uma relação especial com o sagrado. Esta relação se manifesta
de várias formas. Podemos pensar as expressões religiosas brasileiras como DaMatta
(apud ALENCAR, 2007, p. 83): “Assim, se no Natal vamos sempre à missa do Galo, no
dia 31 de dezembro vamos todos à praia vestidos de branco, festejar nosso orixá ou
receber bons fluidos da atmosfera de esperança que lá se forma. Somo todos
mentirosos? Claro que não! Somos, isso sim, profundamente religiosos”. Esse contato
com o místico abre espaço para a diversidade e a aceitação social de novas crenças em
nosso cotidiano. É nesse ambiente que o pentecostalismo se insere. Este tem ganhado
1 Geovanio Carlos Bezerra Rodrigues é aluno de licenciatura em história pela Universidade federal do Ceará. Endereço: [email protected].
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grande visibilidade na sociedade na sociedade, seja pela sua expansão eclesiástica ou
pela participação nos meios de comunicação.
O pentecostalismo brasileiro é dividido em três períodos, ou em três “ondas”. A
“primeira onda”, ou pentecostalismo clássico, é a fase marcada pela vinda das três
primeiras igrejas pentecostais para o país. Neste caso a Congregação Cristã do Brasil em
1910, e a Assembléia de Deus em 1911. É marcado pela distinção entre as duas.
Enquanto a Congregação Cristã se mantinha num regime sectário, fechado apenas a
comunidade italiana de São Paulo, nos primeiros anos. A Assembléia de Deus expandia
suas congregações pelo Norte e Nordeste, e a partir de 1927 ao Sul do país. A “segunda
onda”, ou deuteropentecostalismo, é marcada pela pregação em massa nos meios de
comunicação a partir da década de 1950. É aqui que surge o “movimento de Cura
Divina, difundido por intermédio da Cruzada Nacional de Evangelização”2. Neste
momento surgem a Igreja do Evangelho Quadrangular e O Brasil para Cristo. Aqui
começamos a ter a fragmentação do pentecostalismo, em seu caráter proselitista. A
“terceira onda”, ou neopentecostalismo, seria o movimento que vem desde a década de
1970, caracterizado por um aburguesamento da classe média evangélica; uma maior
adequação com a cultura brasileira e como modo de vida “secular”, reprimido pelo
pentecostalismo clássico; uma maior fragmentação denominacional; e por inserir a
“teologia da prosperidade” como corrente teológica mais difundida. Neste momento
destacamos o surgimento da Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Internacional da
Graça, Renascer em Cristo e recentemente a Igreja Mundial do Poder de Deus3.
Este artigo procura analisar a inserção do pentecostalismo clássico no Ceará
entre os anos de 1914 a 1945. Tendo como recorte temporal baseado no livro "Breve
História da Assembléia de Deus no Ceará" de Teixeira Rêgo. Escrito em 1945. É a
principal fonte sobre o período de minha pesquisa. Dividi este ensaio em três partes a
primeira da conceitualização do pentecostalismo, e como ele se instalou no Brasil. No
segundo momento, busco apresentar a inserção no Ceará a partir da Crente Maria de
Nazaré, a partir da Serra de Uruburetama até sua cegada em Fortaleza e as demais
localidades do Estado. Por ultimo, procuro perceber a relação entre o pentecostal e o
cearense, tanto católico, quanto protestante histórico. Como se dará essa relação que a
priori é tensa e conturbada.
2 CAPELLARI, 2001, p. 41.3 Sobre essa discussão das “ondas” pentecostais no Brasil, ver CAPELLARI (2001) e MAFRA (2001). A termologia pentecostalismo clássico, deuteropentecostalismo e neopentecostalismo são utilizados por MARIANO (2005) para designar o mesmo período.
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O PENTECOSTALISMO E SUA INSERÇÃO NO BRASIL
O pentecostalismo é um movimento originado no sul dos Estados Unidos
(Califórnia) na primeira década do século XX, que se diferencia das igrejas históricas
(advindas diretamente da Reforma Protestante). Tem como referencial teológico o
metodismo wesleyano e o movimento holiness4. O primeiro se trata do movimento
liderado por John Wesley no século XVIII, que rompe com o conceito de salvação
calvinista onde o homem estaria predestinado a ser salvo desde o nascimento. Mas
mantém a idéia de conversão repentina, onde o individuo tendo convicção de sua
salvação teria uma vida disciplinada, afastando-se dos prazeres do mundo e
concentrando seus esforços na oração e no trabalho religioso5. O metodismo também
pode ser explicado no que Weber (2007, p.111) chama de:
[...] um tipo de religião emocional e ainda assim ascética com a crescente diferença ou até repúdio as bases dogmáticas do ascetismo calvinista é também a característica do movimento anglo-americano, correspondente ao pietismo continental, chamado metodismo [...] E a ênfase no sentimento, despertada em Jhon Wesley pelas influências luteranas e moravianas, levou o metodismo, que desde o início viu sua missão entre as massas, e assumir um caráter fortemente emocional, principalmente na América.
O movimento holiness é um movimento do século XIX, inspirado no metodismo, que
buscava a perfeição cristã através da busca exacerbada de “santificação” pelo que é
chamado de “terceira benção”6. A “primeira benção” seria a conversão, que se seguiria
pelo “processo de santificação” (segunda benção), que desencadearia a “terceira
benção”, que seria o “batismo com o Espírito Santo”7.
Sendo assim em 1906, o pastor William Joseph Seymour deu origem a uma
crença que se propagaria por todo o mundo, e de forma especial no Brasil, o
pentecostalismo. O que ele fez? Em um apequena igreja localizada na Rua Azuza
chamada de Missão Evangélica Apostólica da Fé, ele uniu a primeira e segunda
“benção” em um só processo, evidenciando o que seria o “Batismo do Espírito Santo”.
Em pouco tempo este movimento se alastraria por todo os Estado Unidos e quatro anos
depois ao Brasil8. Não podemos deixar de lembrar que este período é marcado por uma
forte segregação racial nos Estados Unidos. Dentro do próprio protestantismo existia da
diferenciação entre igrejas de negros e brancos. Tendo em vista este contexto, o
pentecostalismo vem como uma resposta social ao embate racial nacional. 4 Loc, cit.5 SOUZA (2007).6 CAMPOS, 2005, n. 67, p.110.7 CAMPOS, Loc, cit. 8 CAMPOS, Op. Cit., p.111, 112.
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Além de fundada por um pastor negro de descendência direta de escravos do sul,
ela convergia a um publico esquecido pelas demais denominações protestantes da
época. Talvez o mais interessante de ser percebido neste movimento seja quem o fazia.
Não era mais uma igreja de negros ou de brancos, mas também de mulheres e latinos.
A fé pentecostal consiste é baseada na experiência descrita no livro bíblico de
Atos dos apóstolos, capitulo 2, que seria os “dons do Espírito Santo: falar em outras
línguas (glossolalia), a cura e o discernimento do espírito9. Dentre esses a glossolalia é o
que mais identifica o pentecostal.
O “falar em línguas”, neste sentido, é uma decorrência da manifestação do Espírito Santo na personalidade individual. Quando o crente “fala em línguas”, com efeito, ele sente que o faz por interferência do Espírito de Deus, manipulado por ele. A entrega ao Espírito Santo é carregada de emoção, não sendo raras as lágrimas e, às vezes, a perda de consciência durante o transe (CAPELLARI, 2001, p38).
A base teológica do pentecostalismo é bem simples, talvez por isso vá ter grande
aceitação em áreas periféricas, como vai acontecer no caso brasileiro.
O pentecostalismo chega ao Brasil no ano de 1910 respectivamente em São
Paulo, com a Congregação Cristã no Brasil, fundada pelo italiano Luigi Francescon; e
em Belém com a chegada Daniel Berg e Gunnar Vingren, fundadores da Assembléia de
Deus no Brasil. Ambos tiveram contato com o pentecostalismo norte-americano. Por
uma questão de fontes e documentação, nos deteremos ao caso da Assembléia de Deus.
No dia 19 de Novembro de 1910, desembarcam no porto de Belém os dois
missionários suecos que implementariam o pentecostalismo no norte do Brasil, e como
conseqüência, no país inteiro. Foram acolhidos pela Igreja Batista de Belém, já que
pertenciam a mesma denominação nos Estados Unidos. A sua relação com os Batistas
foi tensa em seu primeiro ano no Brasil. Como as idéias dos missionários estavam sendo
disseminadas através de reuniões não oficiais na casa dos missionários, estes dois logo
ganharam a antipatia da liderança Batista da cidade. O próprio Daniel Berg em sua
autobiografia narra essa relação:
Certa noite o pastor da igreja apareceu em nossa modesta morada. Quando abriu a porta, defrontou-se com uma onda de hinos e orações. Levantamo-nos e, depois de saudá-lo, convidamo-lo a participar do culto improvisado. Ele se recusou e declarou que havia chegado a hora de tomar uma decisão [...] Acusou-nos de havermos semeado duvidas, inquietações e de ser separatistas [...] A seguir, o pastor dirigiu-se ao pequeno grupo e perguntou: “Quantos estão de acordo com essa falsa doutrina?” Decididamente 18 pessoas levantaram suas mãos. Eles sabiam que essa atitude causaria a expulsão da igreja (BERG, 1982, p. 44-47).
9 MARIANO, Op. Cit., p.10.
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A partir deste embate, os missionários suecos foram expulsos da Igreja Batista
juntamente com os outros 18 membros da reunião citada, deram inicio a Assembléia de
Deus, em 1911.
Este confronto entre os batistas e os pentecostais pode ser entendido percebendo
o contexto social de Belém. A cidade tinha mais outras duas igrejas evangélicas na
época, a Presbiteriana e a Episcopal. Mas com certeza nenhuma delas tinham uma
atuação tão contundente na periferia como a Igreja Batista. Sendo assim, o
pentecostalismo, que desde sua origem privilegia as áreas de maior vulnerabilidade
social, vai tomar o espaço que antes era batista.
Para Clara Mafra (2001) o pentecostalismo teve grande aceitação nas classes
baixas por três motivos. Primeiro seria a santificação a partir da leitura da bíblia. Para
isso, tinha-se a utilização da escola bíblica dominical com forma de alfabetização em
massa, principalmente de trabalhadores rurais, balconistas, ferreiros, seringueiros, entre
outros. Em segundo lugar a facilidade que cada membro teria de abrir uma nova
congregação. Cada participante da igreja era um missionário. Sendo assim, cada novo
converso poderia ser chamado para a abertura de uma nova Assembléia de Deus. Em
terceiro lugar, a disciplina religiosa que se detinha basicamente aos comportamentos
socias dos fiéis – ao modo de se vestir e na proibição de vícios como fumo, bebida,
jogos de azar – e não a questões teológicas.
Desde o principio a nova igreja assustou a burguesia católica e evangélica. As igrejinhas da Assembléia de Deus se multiplicaram pelas cidades e interior do Brasil, reunindo gente humilde que se vestia segundo o molde dos missionários suecos: terno para homens, vestidos longos e cabelos compridos para mulheres (MAFRA, 2001, p. 30).
Outra forma de explicar a aceitação do pentecostalismo no Brasil é o hibridismo
cultural e o sincretismo religioso. Uma das recentes obras historiográficas que
apresentam esta discussão é a dissertação de mestrado de Emiliano Unzer de Macedo.
Segundo ele a religiosidade brasileira (sincrética) possibilitou a implantação do
pentecostalismo no Brasil, e a religiosidade brasileira é composta por muitos casos de
sincretismo10. Mesmo a Igreja Católica sendo a detentora do maior número de fiéis.
Outro fator é que o pentecostalismo brasileiro é nacional. As igrejas históricas estão
normalmente ligadas a comunidades de imigrantes europeus, em especial alemães e
italianos. Mas como ressalta Gedeon de Alencar “[...] o pentecostalismo, apesar de sua
10 MACEDO, 2007, p. 17-21.
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origem estrangeira, sempre esteve mais próximo da cultura nacional. Exatamente por
ser periférico e pobre”11.
A expansão do pentecostalismo se dá primeiramente ao nordeste para só em
1921 chegar ao sul12. Sendo assim, o Ceará foi um dos primeiros estados brasileiros a ter
conversos a essa nova fé.
O PENTECOSTLISMO NO CEARÁ
Neste tópico gostaria de me deter ao mapeamento das igrejas pentecostais que
foram surgindo no Estado a partir de 1914. Infelizmente não temos muita documentação
sobre a época, o que dispomos é do livro escrito pelo pastor Teixeira Rêgo13, em 1945
falando sobre a expansão da Igreja no Estado. Sendo assim, ele se torna a principal
fonte sobre o assunto, no período estudado.
A inserção do pentecostalismo no Ceará se dá em 1914 através da crente Maria
de Nazaré. Esta é apresentada como a segunda crente “batizada com o Espírito Santo”
no Brasil. Ela seria batizada no dia 9 de julho de 191114, um dia depois do inicio dos
trabalhos da Assembléia de Deus no Pará. Pouco se tem de documentação sobre ela,
mas o que se sabe é que conheceu o pentecostalismo enquanto esteve em Belém, em
1911. Quatro anos mais tarde voltaria para sua cidade Natal, São Francisco, na Serra de
Uruburetama, para testificar de sua nova fé aos seus familiares. Como não foi acolhida
pelos tais, se refugiou em uma Igreja Presbiteriana “independente” no Sítio Santana, na
mesma serra15. Esta congregação veio a aceitar o “batismo com o Espírito Santo”
pregado por ela. No mesmo ano é enviado de Belém o pastor Adriano Nobre, para dá
inicio aos trabalhos da Assembléia de Deus na região. Em 1919 as pequenas
congregações começam a se espalhar pela serra até chegar à região praiana com seu
estabelecimento em Paracurú. Também há de igrejas em “Calumbi”, “Casa de telha”,
“Maleitas” e “Muriti”, na mesma serra.
Diferente do protestantismo histórico, o pentecostalismo não teve sua inserção a
partir da capital do Estado, ou no sentido do litoral para o sertão16. De 1914 até a década
11 ALENCAR, 2007, p. 20.12 CAPELLARI, Op. Cit., 2001, p.40.13 RÊGO, José Teixeira. Breve História da Assembléia de Deus no Ceará. Fortaleza: Urânia, 1942.14 O próprio Daniel Berg se refere a ela desta maneira em uma entrevista ao programa de rádio da Assembléia de Deus em Santa Catarina na década de 1950.15 RÊGO, Op. Cit., p. 9, 10.16 Como aconteceu, por exemplo, no Pará. Par analisar a implantação do pentecostalismo neste Estado, ver BERG (1982).
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de 1930, o principal foco das igrejas pentecostais vai ser a Serra de Uruburetama. Isso
mostra uma característica de instalação em áreas periféricas, típicas do movimento
pentecostal, em seus primeiros anos. Sua expansão se dará sertão adentro em 1922 ter a
primeira tentativa de inserção em Fortaleza.
Outra característica que é percebida na implementação das igrejas, é onde elas
estão localizadas. Como já se imagina os protestantes da época não tinham muitos
templos para realizarem seus cultos. Normalmente essas reuniões aconteciam em suas
próprias casas ou em pequenos templos localizados em sítios. Podemos elucidar esta
questão como o exemplo da fazenda “lagoinha”. Onde se encontra a Igreja presbiteriana
que acolhe Maria Nazaré. Ela esta localizada no Sitio Santana, que é posse de Cordulino
Teixeira Bastos17. Na própria escrita de Teixeira Rêgo, percebemos a diferenciação que
ele faz sobre essas fazendas e os pequenos distritos e cidades que as igrejas começam a
aparecer. Normalmente os nomes dessas fazendas são descritas entre etapas, como no
caso de “Lagoinha”, já as cidades são descritas de forma natural, como Iguatú,
Fortaleza, Jardins.
O pentecostalismo chega a Capital em 1922, através de cultos familiares no
bairro São Gerardo. No ano seguinte as missionárias suecas Ingre e Esther Anderson
começaram a realizar cultos, em uma casa alugada na Rua Tristão Gonçalves. No
mesmo ano o pastor Bruno Skolimosky, vindo do Pará, abre uma congregação na rua D.
Izabel, próximo a travessa Menton de Alencar18. Este ganhou a antipatia das
missionárias suecas, o que culminou no fim das duas congregações. Assim como relata
Teixeira Rêgo (1945, p. 49): “Em novembro de 1926, passei em Fortaleza, com minha
esposa, indo para o Rio de Janeiro [...] e já não tinha mais congregação ‘pentecostal’ e
nem as missionárias estavam em fortaleza”.
Em 1929 a igreja envia o pastor Antônio Rêgo Barros, que restabelece os
trabalhos da igreja no Arraial Moura Brasil, em 7 de setembro de 192919. Esta data vai
ser escolhida com o aniversário da Assembléia de deus no Ceará. Em 1932 Teixeira
Rêgo assume da igreja e no ano seguinte transfere a congregação para o Benfica. A
partir de 1932, a congregação o para o Benfica. A partir de 1929, a congregação de
Fortaleza passa a administrar as demais igrejas em todo o Estado. A partir daqui temos a
17 RÊGO, Loc, cit.18 RÊGO, Op. Cit, p. 48.19 Tanto é que no dia 7 de setembro de 2009, foi comemorado os 80 anos das Assembléias de Deus no Ceará.
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expansão para as cidades circo vizinhas a capital, como Maranguape, Acarape e
Pacatuba.
Em 1936 surgem congregações no norte do Estado em cidades como Sobral,
Camocim e na Serra da Ibiapaba. Ao sul são abertos trabalhos religiosos em Crato e
Campos Sales. Na região central temos igrejas em Aracoiaba, Morada Nova, Riacho do
Sangue (atual Jaguaretama) e Quixadá.
O CEARENSE E O PENTECOSTAL
O que marca a relação entre o pentecostal e o cearense, no inicio do século XX,
é o conflito. A herança católica era muito forte desde os primeiros anos de colonização
brasileira. Essa herança faz com que haja um distanciamento por grande parte da
população e credos condenados pelo catolicismo. Um dos propagadores desse
distanciamento era o jornal “O Nordeste”. Este jornal sempre denunciou a ação de
outras religiões, como protestantismo e Kardecismo. Eram muito comuns notas
alertando o fortalezense sobre a atuação de vendedores de bíblias protestantes.
Avisamos ao publico que as bíblias e livros religiosos que um vendedor ambulante apregoa, na calçada, ali a esquina da travessa Morada Nova com a Floriano Peixoto, em frente as paradas de bondes, são genuinamente protestantes. Editados em sua maioria por uma Sociedade Bíblica americana. Vale o aviso porque tal vendedor ao ser perguntado sobre o assunto, foge manhosamente a resposta clara, dizendo “não há bíblias protestantes ou catholicas, pois a bíblia é só uma”. O povo não deve deixar enganar pela cirunstancia de os livros serem bonitinhos e baratos. Aquilo é fruto de dinheiro estrangeiro que vem para o Brasil com a [...] finalidade de arrancar aos brasileiros os seus sentimentos catholicos20.
Essa mesma nota foi publicada no dia seguinte, porém é vista com periodicidade
neste jornal. Não apenas notas de alertas, mas também o jornal promove um campanha
anti-protestante que intitulou de “Catecismo do Povo”. Do dia 22 de janeiro até 15 de
fevereiro de 1938, diariamente o jornal tinha uma coluna que explicava aos seus leitores
o que era o protestantismo e o que fazer diante de um crente proselitista. Essa ação era
resposta ao congresso batista que aconteceria na cidade em fevereiro do mesmo ano. A
ação deste jornal é um instante de defesa utilizado pela Igreja Católica, pois o leitor, ao
se deparar com estas notícias tende a enxergar o protestantismo como um mal a
sociedade cearense, o que ocasiona um distanciamento dos mesmos a novas ideologias
religiosas.
20 O Nordeste. 17.01.1936, p. 6.
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Neste contexto Gedeon de Alencar (2005) apresenta a questão pentecostal. Ele
vai observar que uma característica peculiar neste momento histórico, vai ser o
distanciamento da sociedade em que vive. Explico. Quando o pentecostalismo surge, ele
está inserido num contexto tenso. Como no inicio do século XX, está envolto na
eminência do fim do mundo típico de viradas de século. Não apenas isso, mas também
em um período entre as duas guerras mundiais, onde temos em Hitler como a figura
perfeita do que seria o anticristo. Sendo assim “o pentecostalismo tem uma ‘identidade
sectária’ [...] O pentecostalismo não tem esperança o alguma boa vontade para com o
mundo [...] Ele, o mundo está irremediavelmente perdido e a única relação possível é de
desprezo. Portanto pretende-se, literalmente, sair dele”21.
A pregação pentecostal vai ser voltada para o que seria a “segunda vinda de
Cristo”, onde todos os salvos (crentes) seriam levados para o céu, antes que o anticristo
reinasse sobre a terra22. Isso causou um distanciamento do pentecostal para com o
restante da sociedade. Essa aproximação se dava através da pregação em cultos públicos
e pela “evangelização” pela cidade. A venda de bíblias em praça publica também pode
ser percebido como uma tentativa de aproximação com a sociedade. Essa tática foi a
principal estratégia de pregação de Daniel Berg na inserção do pentecostalismo no
Pará23.
O embate entre pentecostais e católicos ganha tamanha proporção que leva a
igreja na Capital recorre ao poder publico. Em seu livro Teixeira Rêgo descrê em seu
livro uma carta mandada ao secretário de policia do Estado do Ceará. Esta se refere ao
que estaria acontecendo na cidade de Aracoiaba, onde a policia estaria proibindo os
cultos pentecostais e ameaçando os crentes de prisão e até agressão física.
Permita-me V. Excia. dizer o que foi dizer o que foi as ordens que cabo deu ao crentes: - Mandou chamá-lo á sua repartição os que o receberam a intimação foram prontamente , lá encontraram o cabo com uma Bíblia, nela leu algumas passagens e intimou os crentes deixarem sua nova fé e voltarem para a Igreja Romana. Estas determinações do snr. delegado os crentes não aceitaram; o delegado disse que no momento em diante não consentia mais cultos e orações em casas de familiares crentes; se não lhes obedecessem mandava prendê-los e castigá-los. Deante de tamanhas ameaças os crentes suspenderam seus cultos e mandaram comunicar-me, pois que eu já tinha mandado avisá-los de que ia enviar um meu auxiliar para fazer uma visita de costume (RÊGO. 1945, p. 37,28).
Esta relação entre a igreja de Fortaleza e ás do interior do Estado, acaba por
sendo a válvula de escape contra a perseguição imposta nos lugares mais inóspitos.
21 ALENCAR, 2005, p. 47.22 Ver essa discussão em GILBERTO, Antônio (Ed.). Teologia Sistemática Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2008.23 Ver BERG, 1982.
10
Normalmente a igreja da Capital era informada através de cartas e telegramas sobre as
ocorrências das demais localidades, e esta deveria ser o meio de mediação com a justiça.
Podemos perceber isso ao analisarmos a correspondência do pastor da Ibiapaba para
Teixeira Rêgo.
Ibiapaba, 20/6/938Teixeira RêgoRua D. Tereza, 673Rogo levar conhecimento Chefe de Polícia novos atentados contra nossa vida movidos Alberto melo e outros. Quebraram portas pedradas ocasião culto, delegado pedirá garantias delegado Crateús, contudo não confirmamos, rouge Chefe Policia telegrafar delegado Crateús mais firmeza. Minhaesposa periodo descanço choque lamentável. Movidos povo contristado ato selvageria. Freitas de Campos (RÊGO, 1945, p.39).
O telegrama ao ser encaminhado á justiça é prontamente respondido.
Fortaleza, 21 de Junho de 1938Snr. Teixeira RegoDevolvendo-vos o incluso telegrama, informo que, a respeito adotei as necessárias providencia. Atenciosamente. Cordeiro neto, Secretário de Polícia (RÊGO, Loc, cit).
O embate pentecostal não é travado apenas com a sociedade católica, mas
também com as demais denominações protestantes. Em Fortaleza, é convidado a
participar de um culto na casa de um membro da Igreja Presbiteriana Independente no
bairro de São João do Tauape. Neste dia tínhamos sete pentecostais na reunião, estes
escutam uma pregação onde são rotulados de “herejes, canalhas, indignos, mensageiros
do diabo”24. Ele também relata que nem sequer podiam sair da reunião, pois as portas
estavam resguardadas por pessoas que não os deixaram sair. Um encontro premeditado?
Acho mais interessante percebemos este acontecimento como uma resposta das igrejas
históricas a um novo rival que estava emergindo na cidade.
Esses embates podem ser percebidos dentro de uma discussão sobre identidades,
neste caso, religiosas. Essas relutâncias contra o protestantismo pode ser percebida nas
palavras de Bauman dentro de uma conceitualização do fundamentalismo religioso.
As seitas que as igrejas vêem com apreensão com, comprovadamente, a maior ameaça à sua unidade, se multiplicam – e as igrejas são forçadas a assumir a posição de fortalezas sitiadas e/ou instituições em “contra-reforma permanente”. O cânone da fé precisa ser defendido a unhas e dentes e reafirmando diariamente, distração é suicídio, vigilância é a ordem do dia, [..] deve ser identificada a tempo e cortada pela raiz (BAUMAN, 2005. P. 93).
É um sentimento de preservação que vai permear as ações católicas contra os
pentecostais. A identidade protestante destoa a sociedade de uma auto-afirmação
católica. Sendo assim esta deve ser perseguida para que os seus efeitos na sociedade
sejam obsoletos. Essa sensação também perpassa outros protestantes que vêem suas
identidades sendo feridas pela pregação pentecostal. O “batismo com o Espírito Santo”
24 RÊGO, Op. Cit., p.47.
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seria ao algo a mais, aquilo que faltava para o protestante histórico. Esta então vai ser
vista como heresia e condenada como uma pratica ligada a Satanás, fonte de todo mal.
Este sistema de autodefesa vai ser usado também por pentecostais que se distanciarão na
devida proporção, do restante da sociedade. Esta perseguição reforça a identidade
pentecostal na medida de que é vista como uma “provação” terrena, que contribui para
um aperfeiçoamento da fé para a eminente volta de Cristo.
Hoje o pentecostalismo mudou. Novas formas de culto e conceitos teológicos
estão inseridas na liturgia pentecostal. Em nossos dias ela assume um papel de
engajamento com a sociedade diferente do período estudado neste artigo. Alencar
(2005) vai se questionar sobre a contribuição evangélica para a sociedade brasileira.
Tendo em vista que as primeiras religiões que vão formar o panteão religioso tem a sua
contribuição na cultura e nos costumes vividos aqui. Ele se questiona em que o
protestantismo contribui para formação de um ethos brasileiro. Mesmo assim ele
defende um protestantismo tupiniquim, ou seja, mesmo com características estrangeiras,
temos sim uma identidade protestante tipicamente brasileira.
No caso do Ceará pentecostal, temos suas origens ligadas a questões trabalhadas
neste ensaio. O pentecostal poder e muito explicar as mudanças e permanências
históricas da sociedade. Com ele se relaciona e é recebido pelo cearense demonstra
como somos apegados a uma identidade pautada na religião e nas suas múltiplas formas
de ser expressada.
BIBLIOGRAFIA
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CAPELLARI, Marcos Alexandre. Sob o olhar da razão: as religiões não católicas e as Ciências Humanas no Brasil (1900 - 2000). 2001. 236 f. Dissertação (Mestrado) – F.F.L.C.H. Universidade de São Paulo. São Paulo, 2001.
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