hsm 88 o capitalismo do valor compartilhado - porter

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5/11/2018 HSM 88 O Capitalismo Do Valor Compartilhado - Porter - slidepdf.com

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o início de agosto, uma

notícia correu o mun-do. Caiu o reinado decinco anos da ExxonMobil como empresa

de maior valor de mercado dos EstadosUnidos, derrubado pela Apple, a criati-va fabricante de iPhones, iPods e iPads.Mesmo que ainda mude com as marésde instabilidade das bolsas de valores,esse ranking já confirmou a atualidadedo mestre da estratégia Michael Porter,em dois grandes pontos: (1) a Apple é oexemplo acabado do modelo de cincoforças de Porter e (2) a Exxon Mobil,que pratica responsabilidade socioam-biental empresarial (RSE), mas cujocore business gera elevado impactoambiental, deixou de ser a empresanorte-americana número um.

Assim como acertou nas cinco for-ças, Porter pode estar certo sobre a ban-deira que oficializou este ano: a cria-ção de valor compartilhado (CVC), queé o valor econômico gerado por em-presas atendendo a necessidades decunho socioambiental que sejam partede seu core business. “O modelo ca-

pitalista se encontrava dentro de umaredoma de vidro, onde só satisfazia ne-cessidades convencionais de consumi-dores convencionais; está na hora de asempresas competirem de forma maisabrangente e sofisticada”, explicouPorter durante sua entrevista exclusi-va a José Salibi Neto, chief knowledgeofficer da HSM. Como se nota a seguir,Porter está convicto de que apenas ocapitalismo –e sua promessa de gerarvalor– pode fazer com que os gestoresde negócios o consertem.

O pessoal de RSE fica bravo porqueentende que estamos dizendo que elesnão têm respostas ou que queremosreinventar a roda deles. Falar em fazero bem e se preocupar com o futurodo planeta é um belo discurso, mas ofato é que a palavra “sustentabilida-de” é muito vaga para as empresascom fins lucrativos. O que estamostentando fazer é trazer o conceito desustentabilidade para o capitalismo,em vez de mantê-lo do lado de fora.

Há grande número de debates inte-lectuais acontecendo, o que é natural,pois, além de termos pessoas que sãodefensoras fervorosas da RSE, já temosdiversos mecanismos de classificaçãode RSE e investimento responsável, oque não pode simplesmente ser joga-do na lata do lixo. Mas estou convictoquanto ao valor compartilhado.

Um modo de dizê-lo é: se você, de fato,

deseja causar impacto na sociedade,encontre uma empresa que esteja lu-crando enquanto aborda as questõessociais que a preocupem e não umaque faça bons relatórios sociais.

A RSE foi crucial para começar-mos, no mundo inteiro, a abordaresses assuntos –mostrou que não po-demos dilapidar o planeta em nomede benefícios de curto prazo. Massustentabilidade não é operacional,ela não pode ser embutida na ges-tão. Só podemos ir além na abordagemdessas questões se conseguirmos colo-cá-las dentro do modelo capitalista.

Como as reações mostram, no en-tanto, não é fácil a mudança de para-digma que estamos propondo. Resol-

ver o impacto socioambiental deixaria

de ser visto como custo pelo acionista,que passaria a encará-lo como opor-tunidade de gerar valor econômico e,assim, desejaria fazê-lo.

Mudanças nas universidades costu-mam ser lentas, mas, para mudar oparadigma, é necessária, sim, umaprofunda reforma curricular. A ideiada CVC precisa fazer parte de estraté-gia, marketing, operações etc. Estoutrabalhando em construir estudos decaso de CVC. Agora, eu diria que o in-teresse dos alunos pelo assunto é tantoque provavelmente eles mesmos exi-girão as mudanças nas universidades.Os alunos estão famintos por mudan-ças, enquanto a faculdade cresceu en-sinando estratégia sempre do mesmo

 jeito, operações sempre do mesmo jei-to, marketing sempre do mesmo jeito,porque olha tudo de trás para frente,focando em como temos feito as coisas.

O curso de marketing terá de incluirum segmento de como fazer marketinge distribuição para pessoas de baixarenda em vez de classe média.

Mas, na América, garanto que os jovensandam exultantes com o potencial dovalor compartilhado. Eles querem po-der orgulhar-se de estar no ramo dosnegócios e sentir que o capitalismo éuma força do bem; não desejam que otrabalho da vida deles seja criar apenasvalor para os acionistas.

 

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Bem, no início dos anos 1990, eu já tra-tava do assunto, ao dizer que melhor

desempenho ambiental pode tornar aempresa mais lucrativa, pois poluiçãoe desperdício são indícios de uso pobrede tecnologia –ou seja, quem acreditouem mim sabe, faz 20 anos, que melho-rias ambientais significam potencial-mente mais lucros.

Veja: no corpo de meu trabalho, pormuito tempo, não prestei atenção nogênero social. Mas desenvolvi há dé-cadas duas áreas de trabalho que têmtudo a ver com isso. Uma foi competiti-vidade e desenvolvimento econômico,

o que começou a sintetizar o papel dolocal, da comunidade, da cidade e re-gião em causar impacto no desempe-nho dos negócios ali localizados. Foi oque me levou ao conceito de cluster ecomo o ambiente da comunidade aoredor da empresa é primordial paraseu sucesso.

O outro campo foi o de meu interessepor filantropia, que comecei a mostrarno artigo “Philantropy’s new agenda:creating value”, escrito com Mark Kra-mer, no final de 1999. Em 2002, o as-

sunto evoluiu e rendeu mais um artigonosso: “The competitive advantage of corporate philantropy” . Em 2006, pe-gamos os conceitos de criação de valore filantropia e aplicamos a filantropiaaos negócios, o que resultou no artigo“Strategy and society”, que abordavacomo as questões sociais podem sercolocadas dentro da estratégia e men-

cionava pela primeira vez a noção decriação de valor compartilhado –umamenção bem rápida, só uma frase.

Foi a reação a esse último artigo e otrabalho inovador que vinha sendo fei-to pela Nestlé principalmente que nosfizeram prosseguir com a criação devalor compartilhado. Aí é que percebique não se tratava de filantropia, massim de capitalismo.

É tudo uma evolução de pensa-mento –e que vai continuar evoluin-do. De qualquer modo, não creio que

nem Estados Unidos, nem Brasil,nem outros países emergentes estãolivres das falhas do capitalismo queestamos procurando consertar como conceito de CVC.

  Na visão mais ampla de capitalismo,os problemas se tornam oportunidadesde negócios. Oportunidades criam va-lor econômico e, sendo assim, um sis-tema de saúde eficiente cria valor eco-

nômico, diminuir poluição cria valoreconômico, melhorar a segurança notrabalho cria valor econômico, satisfa-zer as necessidades dos consumidoresde baixa renda cria valor econômico.

Não adianta; essas melhorias so-cioambientais têm de ser do interesseeconômico das empresas. O capita-lismo é o que defende o interesse da

empresa, por isso só vamos resolvernossos problemas por meio dele.

Eu me refiro sempre às centrais decompra de leite que a Nestlé implan-tou nas cidades indianas. Eu diria quepode ser descrito como responsabilida-de socioambiental estratégica, que é aCVC. O que a Nestlé fez foi aperfeiçoaro contexto competitivo, promovendo

treinamento dos produtores rurais;oferecendo-lhes assistência técnica deagrônomos e veterinários; patrocinan-do a perfuração de poços de água parao gado. Os cerca de 75 mil produtoresrurais de lá melhoraram seu padrão devida e ficaram mais produtivos, o quereverteu em lucro para a Nestlé.

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O conceito de criação de valor com-partilhado se junta a meu trabalhosobre clusters e localização. E tudo sebaseia nos fundamentos da estratégia–posicionamento, trade-offs, vantagemcompetitiva, cadeia de valor única. Oque meu novo trabalho faz é ampliar asoportunidades para as empresas pen-sarem em como gerar vantagem com-petitiva, posicionamento, trade-offs etc.

O valor compartilhado tenta trazer o

conceito de cluster para a linha prin-cipal de desempenho de uma empresaindividual, em vez de deixar que conti-nue a ser visto como apenas uma for-ma de desenvolver uma região.

Eu sinceramente acho que criaçãode valor compartilhado será a chavepara administrar vantagem competi-tiva no futuro. As oportunidades queesse conceito apresenta serão os gran-des diferenciadores nos próximos 20anos –não faltam evidências disso.

As empresas alimentícias que vão alémde nos fornecer comida para ficarmos

mais gordos e abraçam o conceito de

nutrição, ligada a saúde e bem-estar,são ótimos exemplos. Elas vêm resseg-mentando seu mercado e compreen-dendo novas oportunidades de diferen-ciação com essa ideia.

As empresas farmacêuticas que têmse saído melhor são as que encontra-ram uma forma de abrir novos merca-dos com consumidores de baixa rendaem áreas remotas –elas não pensamapenas em vender medicamentos aquem pode comprar, mas tambémbuscam maneiras de melhorar o siste-ma de saúde dos países.

Meus conceitos principais continuamsendo tão importantes quanto antes.Organizações ainda precisam man-ter uma posição competitiva única e,para isso, não podem tentar satisfazertoda e qualquer necessidade de cadaum de seus consumidores –ou seja,persiste a necessidade de fazer esco-lhas, trade-offs.

Os conceitos de trade-offs, posiciona-

mento, vantagem competitiva vêm doconceito de cadeia de valor, ou seja,de que é preciso configurar a empresa deforma a competir de maneira diferen-ciada para obter uma vantagem.

O que acontece com o conceito devalor compartilhado é que nós alarga-mos as oportunidades para estratégia,posicionamento, vantagem competiti-va; não pensamos mais nesses concei-tos de uma maneira estreita. Exemploprático: em vez de termos um produtoque só satisfaz as necessidades con-

vencionais, agora é possível adicionaras necessidades da sociedade no bolo.Do mesmo modo que pensamos

em criar vantagem e eficiência com agestão de nossa cadeia de valor, tam-bém podemos pensar em fazê-lo coma gestão de energia, recursos e impactoambientais ali dentro. A notícia é boa!Passamos a ter um novo grupo de fer-ramentas e oportunidades para estra-tégia e criação de vantagem dentro dacadeia de valor.

 

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Ele não basta mais. Nós nos tornamostão competentes em praticá-lo que eleestá perdendo sua eficácia.

Governos normalmente possuem re-cursos limitados e, além disso, são ine-ficientes. Estamos trabalhando ativa-mente em analisar o papel do governono novo panorama da CVC, ou seja, emcomo cada governo pode agir de modoa incentivar mais ainda o setor privadoa tratar dessas questões.

As ONGs têm sido muito celebradas,mas não estão resolvendo os proble-mas. Levantam muitos fundos, gerampublicidade, mas pecam na apresen-tação de resultados e mudanças. Issoocorre, muitas vezes, porque as ONGssão pequenas e com frequência assu-mem uma postura hostil às empresas,em vez de fazerem parcerias.

Nós [no FSG, ou Foundation StrategyGroup, firma de consultoria de impac-to ambiental de que Porter participa,fundada em 2000] estamos trabalhan-do com o setor de ONGs, descobrindocomo podem se reinventar para im-

pactar mais a sociedade, e uma das

principais formas de fazer isso é tra-balhar muito mais em parceria com osetor privado.

Primeiramente, não se pode perder devista que RSE não foi inútil; tratou-sede um primeiro grande passo em dire-ção a tornar as empresas mais sensí-veis ao ambiente em que operam.

O segundo passo é entender que aRSE não é a forma mais potente paraa empresa afetar a sociedade e que háoutro modo eficaz de fazê-lo, por meiodo core business da empresa.

Aí deve-se partir para olhar a cadeiade valor da organização e descobrirquais questões sociais e ambientais so-frem o maior impacto de suas ativida-des para, então, entender que oportuni-dades potenciais nascem disso.

O que eu acho que vamos ver sãoempresas ainda mantendo uma agen-da paralela de RSE, cumprindo a lei,fazendo doações a caridade e, em pa-ralelo, começando a testar atividades

que tenham impacto positivo sobre seucore business.

Como eu disse, é necessária uma novaforma de pensar sobre tudo isso, algoque não acontece da noite para o dia.Exemplos bem-sucedidos são o me-lhor motor da mudança e empresascomo Nestlé, Unilever, Novartis, Coca-

-Cola são alguns deles. Estamos tra-balhando na coleta de mais exemplospara provavelmente outro artigo, emque vamos explicar ainda mais a CVC.

Os debates globais sobre essasideias também ajudam. Há poucassemanas tivemos uma reunião com40 das empresas multinacionais líde-res mundiais e o debate não foi sobrea CVC conceitual, mas já sobre comoimplantá-la –em detalhes, tais como fa-zer com que as unidades operacionaiscompreendam esses conceitos em vez

 

 

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de somente o quadro corporativo e odepartamento de RSE.

Você sabia que o conceito de que aempresa se beneficia de um clusterforte ainda não é ensinado na maioriadas escolas de negócios? Mas ele con-tinua ganhando força. Sobre a CVC,vou falar, e repetir, e falar novamen-te, ilustrando com exemplos reais:há uma forma de capitalismo nova anossa espera, muito mais sofisticadaque a atual, neoclássica. E, se mu-

darmos a visão –artificial– de que háuma distinção entre social e econômi-co, as oportunidades de crescimento e

lucratividade nos próximos 10 ou 15anos vão disparar.

Vou lembrar que todo negócio sebaseia em atender a necessidades nãoatendidas, não é isso? Pois existe umnúmero imenso de necessidades da so-ciedade que não foram atendidas, bastaenxergar isso. Agora, os consumidoresnão têm necessidade de que as empre-sas possuam novos modelos de ética,responsabilidade social ou que sejamboazinhas. Existem, lógico, alguns pro-blemas sociais ao redor dos quais não

se pode criar um modelo de negócio –eaí precisamos de ação governamentale de ONGs.

Também vou enfatizar que o mo-delo capitalista tem, pelo menos,duas vantagens únicas: é escalável–expande-se sem limites– e é eficien-te –porque há motivação e recompen-sa para fazer as coisas e punição paraquem não faz. São vantagens muitopoderosas e os problemas socioam-bientais que enfrentamos requeremsoluções poderosas assim.