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As Primeras Líneas Uruguayas de Navegación Aérea são agora parte do passado. Ficam lembradas para sempre, aqui nas páginas da Flap, as décadas de serviços seguros e atenciosos que foram a marca registrada da companhia de bandeira uruguaia. pluna DEIXOU SAUDADES NO BRASIL Gianfranco Beting Gianfranco Beting FLAP INTERNACIONAL 84 FLAP INTERNACIONAL 85

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As Primeras Líneas Uruguayas de Navegación Aérea são agora parte do passado.Ficam lembradas para sempre, aqui nas páginas da Flap, as décadas de serviços seguros e atenciosos que foram a marca registrada da companhia de bandeira uruguaia. pluna

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A Pluna é fruto dos sonhos de dois irmãos uruguaios, Alberto e Jorge Márquez Vaeza, que em 1934 decidiram criar uma empresa aérea uruguaia. Bem relacionados, os irmãos foram discutir com o embaixador britânico, Sir Eugene Millington-Drake, a ideia. Afinal, naquele momento, todos os países vizinhos, sem exceção, já possuíam companhias aé-reas de bandeira. Millington-Drake gostou da ideia por dois motivos: enxergou a possibilidade de vender aviões britânicos para equipar a empresa que seria criada; e com isso fortalecia a presença britânica no país, diminuindo a influência germânica. É bom lem-brar que estávamos vivendo um momento histórico especial, com a ascensão do nazismo na Europa. Durante o segundo semestre de 1935, os planos ganharam vida. Os irmãos Márquez conseguiram com recursos próprios capital para adquirir, junto à De Havilland, um par de aviões DH 90 Dragonfly, com capacidade para dois pilotos e quatro passageiros.

Com a compra dos dois Dragonfly, os irmãos Márquez agora sentiam-se aptos a fundar a primei-ra companhia aérea uruguaia. Faltava, porém, um nome. A primeira ideia foi chamar a companhia de Líneas Aéreas Uruguayas (LAU). Diz a lenda que o nome definitivo teria sido criado pelo barbeiro de Millington-Drake, com quem o embaixador britâni-co dividia suas divagações: Primeras Líneas Aéreas Uruguayas de Navegación Aérea (Pluna).

Em 28 de outubro os dois Dragonfly (matricula-dos CX-AAR e CX-AAS) chegaram, desmontados, a bordo de um cargueiro. Pintados nas cores vermelho-escuro e creme, foram batizados de “San Alberto” e “Churrinche”, um pássaro escarlate. Estava tudo pronto para os voos inaugurais. Às 8 horas da ma-nhã de 20 de novembro, o “San Alberto” decolou do aeródromo de Melilla, pilotado por Noack e

Nudelman, levando dois passageiros, correio e 500 exemplares dos jornais diários. O destino foi as cida-des de Mercedes, Salto e Paysandú. Um mês depois, voos regulares a Rivera, com escalas em Durazno e Tacuarembó, foram iniciados. Os voos duravam 4 horas, eram operados três vezes por semana e as passagens custavam 70 pesos por uma viagem de ida e volta. A única competição era o trem, cujo bilhete de ida e volta custava 54 dólares – mas a duração da viagem era de mais de 22 horas. Ainda que convencer as pessoas a viajar por via aérea fosse um trabalho hercúleo, para todos os efeitos a Pluna era definitivamente uma realidade.

TurbulênciasEnquanto a Pluna abria suas asas, outra compa-

nhia era formada no país: a Companhia Aeronáutica Uruguaya S.A. (Causa). Elas não competiam dire-tamente entre si. A Causa, que fora formada por investidores mais capitalizados, pretendia cobrir rotas internacionais, adquirindo aviões maiores, próprios para esses mercados. Em 12 de março de 1938, serviços internacionais de bandeira foram iniciados entre Montevidéu e Buenos Aires, com a operação de dois Junkers 52. Em pouco mais de um ano, o Uruguai contava com duas companhias aéreas.

Em seu primeiro ano, a Pluna transportou 2.600 passageiros em 2.000 horas de voo, levando ainda

1.700 quilos de carga, sobretudo jornais, malas postais e outros artigos para os correios. O governo local decidiu subsidiar parte das operações através de um crédito de 6 mil libras esterlinas, prontamente utilizadas para adquirir novas e maiores aeronaves. Assim, a frota cresceu com a introdução de dois De Havilland 86B (CX-ABG “San Felipe y Santiago”e CX-AAH “Santa Rosa de Lima”), quadrimotores de 12 assentos. Veio a guerra e a Pluna permaneceu operando serviços domésticos. Em 1942, um tipo francês, o Potez 62, aeronave desenhada para até 16 passageiros, foi introduzido na frota da companhia. E, com ele, a Pluna contratou a primeira comissária de voo trabalhando na América do Sul.

Em janeiro de 1943, o governo local instituiu um decreto determinando por razões estratégicas que 49% das ações da companhia deveriam ser controladas pelo Estado. Aquele foi um período agitado na história do país, com a troca de co-mando: saiu o general Alfredo Baldomir Ferrari, sucedido por Juan José de Amézaga e, como soe acontecer em momentos assim, o novo governo mudou de ideia em relação à aviação e os subsídios foram cortados da noite para o dia. Como desgraça pouca é bobagem, as peças de reposição de aviões de origem europeia tornavam-se impossíveis de conseguir em função da Segunda Grande Guerra. Somadas, estas duas circunstâncias contribuíram para a total paralisação dos voos em 15 de março daquele mesmo ano.

Começar de novoQuando finalmente a companhia foi autorizada

a reiniciar serviços, em 15 de setembro de 1945, foi justamente o governo quem teve que bancar a re-tomada dos voos. Em consequência disso, os irmãos Márquez perderam o controle da companhia, pois a participação estatal saltou de 49% para 83,3% do capital, avaliado em 1 milhão de pesos. O dinheiro foi empregado para adquirir os primeiros equipamentos de origem norte-americana, um par de Douglas

Um De Havilland 86, terceiro avião da frota. Sua cor era predominantemente vermelha.

O DC-3 colocou a companhia em um novo patamar tecnológico.

Etiqueta de bagagem dos anos 1950. Tempos de uma aviação mais carismática.

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DC-2, e em fevereiro de 1946 três C-47, excedentes de guerra. Capitalizada, a empresa decidiu investir em sua primeira rota internacional. Voos para Porto Alegre foram inaugurados em 14 de maio de 1948.

Em 12 de novembro de 1951, o governo uru-guaio adquiriu 100% das ações. A empresa passou a ser, oficialmente, a linha aérea de bandeira do Estado uruguaio. Uma das primeiras medidas foi ampliar a frota. Foram adquiridos quatro De Havilland DH 114 Heron, para 17 passageiros, possibilitando a aposen-tadoria dos Douglas DC-2. Em 1952, uma linha para Assunção, Paraguai, foi inaugurada com escalas em Salto. Com a entrega de mais um DC-3, serviços para o Brasil foram ampliados, com a introdução de voos para São Paulo em janeiro de 1954. Nessa fase, o número de cidades servidas nas linhas domésticas atingiu o seu máximo: eram nove ao todo, incluindo Montevidéu. Os voos eram assim numerados, sempre partindo da capital com nú-meros ímpares e regressando com seus números pares superiores: o PU 1 servia Paysandu, Salto e Artigas; o PU 3 voava para Rivera e Artigas; o PU 7 para Treinta y Três, Melo, Vichadero e Rivera; o PU 9 para Paysandu e Salto; e, finalmente, o PU 25 para Paysandu, Salto e Bella Unión.

Novas rotas internacionais foram inauguradas. A primeira para Santa Cruz de La Sierra, com várias es-calas, entre elas Corumbá – segundo destino servido no Brasil. Esta linha duraria pouco mais de um ano. Voos para Buenos Aires, Rosário e Córdoba foram

agregados a partir de 1955. Já ia ficando claro que a companhia, para prosperar, deveria crescer para além das fronteiras nacionais. O problema é que, para competir em pé de igualdade com as outras empresas internacionais, os vetustos DC-3 não pode-riam ser considerados capazes de servir estas linhas.

Em 24 de novembro de 1955 foram comprados três Vickers Viscount V769D, com capacidade para 48 passageiros, pelo preço de 7 milhões de pesos uruguaios. Matriculado CX-AQN, o primeiro deles chegou ao Uruguai às 17h22 do dia 24 de junho. Os Viscount foram logo colocados em serviço no “puente aéreo” entre o aeroporto de Montevidéu/Carrasco e Buenos Aires/Aeroparque, em quatro rotações diárias. Em 1959, finalmente passaram a servir o Rio de Janeiro, terceira cidade brasileira na malha. O voo PU 501 decolava às segundas, quartas e sextas às 10h00 de Montevidéu, fazia escalas em Porto Alegre entre 11h30 e 13h00, São Paulo/Con-gonhas entre 14h50 e 15h40 e, finalmente, chegava ao Rio às 16h40. Nos dias seguintes (terças, quintas e sábados), os Viscount partiam como PU 502 do Galeão às 8h00, transitavam por Congonhas entre 9h00 e 9h40, Porto Alegre entre 11h30 e 12h55, até finalmente voltarem a solo uruguaio às 14h25. No limiar de uma nova década, a Pluna parecia bem posicionada para ganhar terreno ante suas compe-tidoras argentinas e brasileiras.

Mas o destino tinha outro plano de voo traçado para o Uruguai e sua linha aérea. O país, que até en-tão era conhecido como “Suíça da América do Sul” devido à estabilidade política, relativa prosperidade econômica e razoável distribuição de renda, estava entrando em uma era de acentuada decadência econômica. Consequentemente, o mercado para via-gens aéreas teria seu desenvolvimento comprome-tido pelas décadas seguintes. A debacle econômica logo descambou na ruptura da trama político-social. Grupos radicais surgiram e logo iriam se converter em facções armadas, sendo a mais famosa de todas os Tupamaros. Daí para a polarização e suspensão de

liberdades políticas foi um passo, com consequências graves para a economia e para o transporte aéreo. Com isso, a frota da companhia pouco cresceu nos anos 1960. Além da trinca original de Viscount, mais dois aviões semelhantes, da série V745D, foram comprados de segunda mão da Capital Airlines, nos Estados Unidos. Matriculados CX-BHA e CX-BHB, entraram em serviço ao final de 1967. Estes cinco turboélices britânicos eram complementados por um punhado de Douglas C-47/DC-3, que continuariam voando somente até 1971, quando as últimas rotas domésticas foram suspensas.

O indisfarçável orgulho por operar um dos mais modernos aviões do mundo à época, o Viscount, visto aqui neste folheto promocional.

A vistosa pintura do primeiro jato da companhia, o Boeing 737-200.

De Viscount rumo ao Uruguai, cinco vezes por semana, neste anúncio publicado no Brasil.

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Novos aresPara saudar a chegada de uma nova década,

os anos 1970, a companhia deu um salto: a incor-poração de seu primeiro jato, um Boeing 737-200 com 109 poltronas. A aeronave, matriculada CX-BHM, chegou ao Uruguai em 31 de dezembro de 1969, ostentando um novo e atraente padrão de identidade visual. Foi empregado nas linhas para Buenos Aires e na reabertura das linhas para São Paulo e Rio.

De todo modo, a crise social, política e econô-mica não mostrava sinais de arrefecimento. Pelo contrário. Em 27 de junho de 1973, um golpe de Es-tado dissolveu a Câmara dos Senadores e Represen-tantes, criou um Conselho de Estado com funções legislativas, suspendendo os direitos civis. O Uruguai entrava na fase mais negra de sua história recente. Para a Pluna, isso significou um notável retrocesso. O poder aquisitivo dos cidadãos comuns despencou. A procura por viagens aéreas só aumentava quando o destino era além-mar. Inicialmente centenas, depois milhares de uruguaios, a maioria em sua fase de vida mais economicamente produtiva, desempregados ou

subempregados, tomaram o caminho do Aeroporto de Carrasco para não mais voltar. Buscaram asilo político ou uma nova vida na Europa, Estados Unidos e até mesmo na Austrália.

O Boeing 737-200 CX-BHM foi devolvido em 1974 e a frota voltou a ficar composta somente pe-los Vickers Viscount, com uma segunda suspensão das linhas para o Brasil. Em 11 de maio, um deles, o CX-AQO, voando entre Carrasco e Buenos Aires/ Aeroparque, saiu da pista após pousar. Nenhum dos 57 ocupantes feriu-se gravemente, mas a aeronave foi considerada irrecuperável. Um dos raríssimos incidentes da companhia, que sempre se orgulhou de não ter sofrido nenhum acidente fatal.

Para repor a aeronave perdida e permitir um modesto crescimento, a companhia decidiu comprar mais alguns quadrimotores britânicos. Três Viscount V827 foram comprados de segunda mão junto à Vasp. Eram eles o CX-BIY (ex-PP-SRC), CX-BIZ (ex-PP-SRH) e CX-BJA (ex-PP-SRF). Configurados com 75 poltronas, foram incorporados à frota no segundo semestre de 1975. Após a entrega dos mesmos, voos para Porto Alegre foram retomados, restabelecendo

os serviços para o Brasil.Ainda que fossem confiáveis e confortáveis,

era simplesmente impossível para a Pluna, com os Viscount, tentar competir com os Caravelle e Boeing 727 da Cruzeiro e Varig ou os Boeing 737-200 da Aerolíneas Argentinas. Comprar equipamentos a jato não era algo apenas desejável: era imperioso para a própria sobrevivência da companhia. Em 1978, dois Boeing 727, com capacidade para 114 assentos, foram arrematados de sua proprietária original, a alemã Lufthansa, por 7 milhões de dólares. O primei-ro deles, o Boeing 727-30 CX-BKA, partiu rumo ao Uruguai no dia 10 de agosto. A segunda aeronave, matriculada CX-BKB, chegou a Montevidéu no dia 15 de novembro de 1978.

Na semana seguinte à chegada do CX-BKA, a Pluna retirou de serviço o Viscount CX-BHA da frota, primeiro do tipo a ser aposentado para dar lugar ao Boeing recém-entregue. Os trijatos foram colocados em serviço inicialmente na linha para Buenos Aires e depois para Assunção, Paraguai. Em 1º de dezembro entraram em serviço na rota mais longa da compa-nhia, operando cinco frequências semanais para São

Paulo e Rio de Janeiro. Os voos PU 503 partiam da capital uruguaia às 10h10, faziam escalas em Porto Alegre entre 10h25 e 10h45, em Congonhas entre 12h10 e 12h40 e chegavam ao Galeão às 13h30 às segundas, quartas e sextas-feiras. Retornavam como PU 504 pelas mesmas cidades, deixando o Rio às 15h00 e chegando ao Uruguai às 20h35. Às quintas e domingos, os voos operavam como PU 501/502, sem contudo realizarem escalas em Porto Alegre. Uma terceira aeronave Boeing 727, igualmente oriunda da Lufthansa e matriculada CX-BNT, seria arrendada por um curto período entre novembro de 1980 e outubro de 1981.

Naquele mesmo ano, a Pluna tomou uma de-cisão mais ousada em relação à frota: a aquisição de seu primeiro Boeing 707-320C. Matriculada CX-BNU, a aeronave foi comprada de segunda mão junto à Aerolíneas Argentinas, sendo entregue em 7 de maio de 1981. Com a chegada desta, a companhia realizou um velho sonho, que era servir a Espanha. A partir de 12 de maio, os voos foram operados entre Buenos Aires (Ezeiza), Montevidéu e Madri, com escalas, nos dois sentidos, no Rio de

Flagrante do ex-Vasp PP-SRH, visto aqui em Montevidéu logo após sua incorporação em 1975.

Enfeitando o Galeão, o CX-BKB foi o segundo 727 da companhia, recebido ainda nas cores básicas da Lufthansa.

Alinhando para decolar em Miami, vemos o primeiro 707 recebido pela companhia, o famoso CX-BNU.

Visto aqui no Aeroparque, o Boeing 737 CX-FAT recebeu uma pintura especial criada pelo artista uruguaio Paes Villaró.

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Janeiro/Galeão, todas as terças e sextas no sentido norte (PU 300), com retornos, no sentido sul, às quintas-feiras e domingos (PU 301). Por um curto pe-ríodo, ao redor de 1990/1991, uma escala também seria feita em Recife, nos voos PU 301 originados em Madri, tornando-se este o quarto destino brasileiro na malha.

Mas voltemos a 1982. Naquele ano, a com-panhia deu mais um salto significativo: a incorpo-ração de três jatos 737-200 novinhos em folha, matriculados CX-BON, CX-BOO e CX-BOP, que ha-viam sido encomendados em novembro de 1980. Com a entrega destes três, entre janeiro e fevereiro daquele ano, os Boeing 727 finalmente foram retirados de operação e vendidos. Mesmo destino tiveram os Viscount remanescentes. A frota agora era composta somente pelo trio de jatos 737-200 novinhos e pelo solitário Boeing 707. Em 1985, um segundo Boeing 707, CX-BOH, foi arrendado por poucos meses. No ano seguinte, 1986, dois voos semanais foram inaugurados com destino a Santiago de Chile, operados pelos Boeing 737.

Nas asas da privatizaçãoEm 1º de março de 1985 o país voltou a ser

uma democracia, com a eleição de Julio Maria San-guinetti, que fez um governo de transição, deixando o período de governo militar para trás. Em 1989, as eleições presidenciais foram vencidas por Luis Alberto Lacalle, que governaria até 1995. Lacalle, além de fazer o Uruguai aderir ao Mercosul em 1991, em-preendeu grandes reformas estruturais, privatizando a economia e entre as estatais vendidas estava

a Pluna. A empresa vencedora foi o consórcio argentino Tevycom, apoiado por empresários uru-guaios. Posteriormente, este consórcio venderia a sua participação à Varig, que comprou 48% das ações, com a obrigação de cuidar do dia a dia da companhia. O restante era dividido entre o Estado uruguaio, que ficou com 49%, empresários locais e funcionários da companhia.

Com a Varig no comando da companhia, uma das primeiras medidas tomadas foi reequipar a frota. Entre 1º de julho de 1994 e 30 de dezembro de 1997 a Pluna operou com aquele que viria a ser o maior avião em sua história, o McDonnell Douglas DC-10-30. A aeronave fora arrendada mantendo sua matrícula original, PP-VMW, mas operando com a atraente nova identidade visual adotada após a privatização. Os aviões foram configurados para duas classes de serviço, com a adoção da Blue Class, a nova classe executiva.

Em maio de 1998, chegou o quarto Boeing 737-200, ex- PP-VPD. Matriculado CX-FAT, osten-tava uma chamativa pintura do pintor uruguaio Carlos Paes Villaró, homenageando o sol de seu país. Nos meses seguintes, os Boeing 737-200 PP-VMI e PP-VPE (este depois matriculado CX-VVT) foram arrendados, mantendo as cores básicas da Varig com a adição do novo logotipo da “Pluna Uruguay”. Em maio de 1999, foi a vez do DC-10-30 PP-VMQ substituir o PP-VMW, vendido pela Varig à Northwest.

Era preciso renovar a frota da companhia, afinal, os Boeing 737-200 já completavam 20 anos de serviço ativo. Em janeiro de 2002, chegou o 737-300 CX-PUA e, em 2 de dezembro de 2002, o Boeing 767-300ER matriculado CX-PUB foi arren-dado para operar, três vezes por semana, na rota Montevidéu-Rio de Janeiro-Madri. Em dezembro de 2003, chegou o Boeing 757-200 CX-PUD, cujo alcance e capacidade maiores fizeram com que ele fosse empregado sobretudo em uma nova rota: Montevidéu-Salvador sem escalas. Em março de 2004, a companhia recebeu um único ATR 42-300, CX-PUC, empregado nos voos entre o Uruguai e a capital argentina.

Sob nova direção

Quando a Varig entrou em recuperação judicial, em 17 de junho de 2005, ela oficialmente colocou sua participação na Pluna à venda. Um período de dúvidas e incertezas tomou conta da companhia uruguaia, enquanto se buscava compradores para a parte da Varig. Em setembro de 2006 o governo uruguaio nacionalizou mais uma vez a companhia, tornando-se controlador de 100% das ações. Para alívio geral da nação, foi anunciado em 2 de janei-ro de 2007 que o consórcio Leadgate iria investir 177 milhões de dólares na empresa e ficaria com 75% dos papéis da companhia, permanecendo o restante nas mãos do governo uruguaio. A Pluna estava salva. Por enquanto.

Cartão-postal do novo orgulho da frota, o Boeing 737.

“Decola uma nova Pluna” sob a administração da Varig. Realmente, uma nova fase, ainda que breve, na vida da companhia.

O PP-VMW, arrendado da Varig, é visto aqui pousando em Madri.

A imagem corporativa foi renovada para lembrar a Varig e pode ser vista aqui neste 737-300 taxiando em Guarulhos.

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Os executivos do Leadgate aportaram inicial-mente 15 milhões de dólares e logo trataram de mudar tudo, da frota aos serviços, da estratégia de desenvolvimento de linhas à imagem corporativa. A nova ordem era transformar Montevidéu em um hub regional, conectando os países vizinhos com múltiplas frequências diárias. A frota seria composta somente por um único tipo de avião, simplificando toda a área operacional da empresa. A bordo, as refeições seriam cobradas à parte, somente para aqueles clientes que desejassem.

Em julho de 2007, a compra de sete Bombardier CRJ 900 de 90 lugares por 261 milhões de dólares foi anunciada, bem como a introdução de uma nova e espetacular identidade corporativa, criada pela empresa australiana Cato Partners. O desenho foi inspirado no próprio nome do país, que em sua língua nativa significa “rio dos pássaros coloridos”. Com a entrega dos novos aviões, todos os Boeing e o único ATR seriam aposentados, devolvidos aos arrendadores ou vendidos, o que acabaria de fato acontecendo durante os meses seguintes. Antes disso, porém, ao final de 2007, para atender à alta demanda da temporada de verão, a companhia ainda receberia mais um 737-200 (CX-PUF) e um 767-300ER (CX-PUG), este último empregado no último voo da Pluna para Madri, em março de 2008.

O primeiro Bombardier CRJ 900, matrícula CX-CRA, foi entregue em 11 de março de 2008.

Outros seis foram entregues até o fim daquele ano e matriculados CX-CRB a CX-CRG. Para o novo presidente da Pluna, o empresário argentino Matias Campiani, o futuro da companhia dependia da sua capacidade de tornar-se a preferida para viagens entre os países do Mercosul, atraindo passageiros dos países vizinhos.

Em abril de 2010, um grupo de investidores canadenses, a Jazz Air Income Fund, coligada da Air Canada, aportou 20 milhões de dólares na Pluna, adquirindo 25% das ações da Leadgate. Com o novo sócio a bordo, em setembro e outubro de 2010 três novos CRJ 900 (CX-CRH, CRI, CRK) foram entregues. Em abril de 2011 mais três foram encomendados, sendo recebidos entre setembro e novembro de 2011 (CX-CRL, CRM, CRN). A frota atingiu a cifra de 13 aeronaves, o maior número simultâneo de aviões em operação desde a fundação da companhia. Com essas aeronaves, deu-se uma rápida incorporação de novos destinos ligados sem escalas a Montevidéu: Curitiba (julho de 2008), Florianópolis (janeiro de 2009), Foz do Iguaçu (novembro de 2009), Campinas (dezembro de 2010), Belo Horizonte (fevereiro de 2011) e, finalmente, Brasília (novembro de 2011). No início de 2012, o mercado brasileiro era respon-sável por nada menos que 44% do tráfego total da companhia. O número de voos semanais para o Brasil era também impressionante, nada menos que 198 frequências semanais, assim distribuídas: Guarulhos,

O único Boeing 757 da companhia é visto aqui na curta final da 09R de Guarulhos.

O CX-PUC foi empregado sobretudo nos voos para o Aeroparque; hoje voa para a Trip como PP-PTJ.

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desencadeada em 2008, este mercado cortou dras-ticamente a demanda por viagens aéreas. Naquele momento, 21% das vendas da Pluna dependiam de tráfego argentino. Com o esfriamento da economia brasileira, mais notadamente a partir de 2011, a situação complicou-se ainda mais.

Em junho de 2012, Matias Campiani, em contraste com sua atitude confiante mostrada até então, sinalizou para a imprensa que a companhia poderia falir caso não fossem injetados novos recursos com urgência. O CEO da Pluna declarou que os prejuízos sofridos entre junho de 2011 e fevereiro de 2012 já passavam de 18 milhões de dólares. Logo ficou clara a real situação econômica da companhia. Entre a chegada da Leadgate em 2007 e a paralisação dos voos em 2012, os prejuízos operacionais chegaram a 100 milhões de dólares, segundo fontes locais. A notícia deixou o governo e o povo uruguaio perplexos.

Campiani, apenas alguns dias depois, anunciou que a empresa não havia encontrado interessados em resgatá-la e como o fundo Leadgate havia toma-do a decisão de não investir nem mais um centavo na empresa, os proprietários iriam devolver suas ações ao governo uruguaio. A notícia causou enorme

28 voos; Campinas, Curitiba, Porto Alegre e Rio, 14 voos; Florianópolis, Belo Horizonte e Brasília, sete voos; Foz do Iguacu, dois voos. Adicionalmente, na alta estação, um voo diário e sem escalas era operado entre Guarulhos e Punta del Este.

Amargo e súbito fim

A aposta da Pluna em se converter em com-panhia aérea do Mercosul esbarrava em um ponto principal: ficava à mercê dos humores de não apenas uma, mas de três economias – a doméstica, a argen-tina e a brasileira. E justamente esta foi a razão para o súbito agravamento das finanças da empresa. Com a severa crise econômica que abateu-se sobre a Ar-gentina, reflexo da recessão nos países desenvolvidos

constrangimento ao governo, ao povo uruguaio, ao público viajante e a todos aqueles que haviam apostado na escolha da Leadgate como sócia.

Uma greve dos funcionários foi iniciada em 3 de julho, tentando chamar a atenção da sociedade para o risco iminente da falência. Sem disposição política de herdar o abacaxi alado, o fim veio de forma súbita e traumática. Um comunicado lacônico afirmava que, devido a problemas financeiros, a empresa estaria “suspendendo todos os voos por tempo indeterminado” em 5 de julho de 2012.

A partir daquele dia, a companhia deixava de vender meio milhão de dólares e de transportar 8 mil passageiros em seus mais de 80 voos diários. Assim, da noite para o dia, 900 funcionários perderam seus empregos, deixando um passivo descoberto de 300 milhões de dólares. A colorida frota de 13 jatos CRJ 900 permaneceu imóvel pelos pátios do Aeroporto de Carrasco. A rica história de uma pequena grande empresa chegava ao seu epílogo: o último suspiro das Primeras Líneas Aéreas Uruguayas de Navega-ción Aérea. O anúncio

mostra o último flagship da companhia antes de sua nova privatização: o Boeing 767-300ER.

Dois CR J900 NextGen, tendo ao fundo o novíssimo terminal de Carrasco, ainda em construção.

Folheto apregoando as vantagens do ATR 42 nos voos de curto alcance da companhia.

O primeiro folheto promocional dos CRJ 900 foi feito com muitas fotos cedidas pelo autor desta matéria. Curiosamente as nuvens neste poente em MVD lembram o próprio grafismo da cauda das aeronaves da Pluna.

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