fry, p. o que a cinderela negra tem a dizer sobre a política racial no brasil

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    P

    O

    V

    O

    Ne

    gro

    A CINDERELA NEGRA

    A estudante Ana Flvia Peanha de Azeredo, negra, 19 anos,

    filha do governador do Esprito Santo, segurou a porta do elevador

    social de um edifcio em Vitria enquanto se despedia de uma amiga.

    Em outro andar, algum comeou a esmurrar a porta do elevador.

    Ana Flvia decidiu ento soltar a porta e, depois de conversar mais

    alguns instantes, chamou o outro elevador, o de servio. Ao entrar

    nele, encontrou a empresria Teresina Stange, loira, olhos verdes, 40

    anos, e o filho dela, Rodrigo, de 18 anos.[...] Segundo Ana Flvia

    contaria mais tarde, Teresina foi logo perguntando quem estava

    prendendo o elevador. Ningum, respondeu a estudante. S de-

    morei um pouquinho. A empresria no gostou da resposta e come-ou a gritar. Voc tem de aprender que quem manda no prdio so

    PauloJares-AbrilImagens

    O ENTO

    GOVERNADOR DO

    ES, ALBUNO

    AZEREDO E A FILHA,

    ANA FLVIA

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    O que aCinderela negra

    tem a dizer sobrea poltica

    racial no Brasil

    P E T E R F R Y

    os moradores, preto e pobre aqui no tem vez, avisou. A senhora

    me respeite retrucou a filha do governador. Teresina gritou nova-

    mente: Cale a boca. Voc no passa de uma empregadinha. Ao

    chegar ao saguo, o rapaz tambm entrou na briga. Se voc falar

    mais alguma coisa, meto a mo na sua cara, berrou. Eu perguntei

    se eles me conheciam e insisti que me respeitassem, conta Ana

    Flvia. Rodrigo ameaou outra vez: Cale a boca, cale a boca. Se

    voc continuar falando meto a mo no meio de suas pernas. Teresina

    segurou o brao da moa e Rodrigo deu-lhe um soco no lado esquer-

    do do rosto. [...] A polcia abriu um inqurito a pedido do governa-

    dor. Se forem condenados [Teresina e Rodrigo], os dois podempegar de um a cinco anos de cadeia (Veja, 7 de julho de 1993).

    PETER FRY professor do Institutode Filosofia eCincias Sociais daUFRJ.

    Quero agradecer a FernandoRosa Ribeiro, Guy Massart,Olvia Gomes e Patrcia Fari-as, que leram o texto em tem-po mnimo e fizeram crticas e

    sugestes muito importantes.

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    A INTERPRETAO DE MICHAELHANCHARD

    Michael Hanchard, autor de um livro re-

    cente sobre o movimento negro brasileiro(Hanchard, 1994a), publicou no ano passadoum artigo que parte de uma discusso do casoAna Flvia para comentar a situao raci-al brasileira em termos mais gerais (idem,1994b). Arregimentando um batalho detericos, desde Jrgen Habermas a EdwardThompson, ele avana trs argumentos. Oprimeiro que afro-brasileiros tm recebidoacesso contingente esfera pblica, um do-mnio que tem sido definido explicitamente eimplicitamente como branco (p. 166). O caso

    de Ana Flvia o faz afirmar que o Brasil norepresenta nenhuma exceo a essa regra, eque a batalha de porta de elevador colocoumais um prego no caixo da ideologia dademocracia racial brasileira (p. 165). Umsegundo objetivo do artigo de Hanchard deargumentar uma racializao crescente daprtica cultural afro-brasileira e uma pola-rizao racial crescente na sociedade brasi-leira. Ana Flvia, ele afirma, sendo filha deum homem negro [black] e uma mulher bran-ca, poderia ser considerada uma mulata no

    Brasil do passado e do presente. Sua negritude[blackness] aos olhos dos seus atacantes im-plica um alargamento da categoria negro noBrasil e, mais importante, uma polarizaocrescente das categorias raciais (p. 178), umponto de vista compartilhado por ThomasSkidmore (1993). No bojo desta constatao,comenta o surgimento de organizaes eexpresses culturais que no eram nem brasi-leiros nem nacionais mas Afro-diaspricos,como os blocos afro da Bahia (p. 181). Con-clui que

    Atravs da segregao e de outras for-mas de alienao racial, esferas pblicasalternativas operam dentro de uma esferapblica largamente definida. Grupos mar-ginalizados criam comunidadesterritoriais e epistemolgicas para elesprprios como uma conseqncia da suaposio subordinada na esfera pblicaburguesa. Assim, afro-brasileiros cons-truram esferas pblicas deles prprios,que criticam as normas societrias e pol-

    ticas brasileiras (p. 167). As lutas entregrupos raciais dominantes e subordina-

    dos, a poltica de raa [the politics of race],ajudam a constituir a modernidade e oprocesso de modernizao no globo intei-ro. Utiliza fentipos raciais para avaliar e

    julgar pessoas como cidados e no-cida-dos.[...] Esta a poltica racial entre bran-cos e negros no apagar do sculo vinte, eo Brasil no nenhuma exceo. ParaAna Flvia, o relgio marcou meia-noiteno momento em que nasceu (pp. 182-3).

    A estreita relao entre racismo emodernidade tem sido magistralmente anali-sada por Louis Dumont, que tem insistido queracismo a hierarquia presente nas socieda-des igualitrias.

    No Ocidente moderno, no s os cida-dos so livres e iguais de direito, mastambm a noo de igualdade de princ-pio entre todos os homens acarreta, nonvel da mentalidade popular pelo menos,a da identidade profunda de todos os ho-mens, porque eles no so tomados comoos modelos de uma cultura, de uma soci-edade, de um grupo social, mas como in-divduos existentes em si e por si. Dito deoutro modo, o reconhecimento de uma

    diferena cultural no pode mais justifi-car etnocentricamente uma desigualdade.Observa-se que, em certas circunstncias[...], uma diferena hierrquica continuaa ser colocada, mas que ela se liga destafeita aos caracteres somticos, fisionomia, cor da pele, ao sangue(Dumont, 1992[1961], p. 314).

    Mas, mesmo assim, o problema que vejocom o argumento de Hanchard, e que estpresente tambm no de Dumont, na tendn-

    cia de ambos a no reconhecerem suficiente-mente as distines dentro e sobre amodernidade e o Ocidente. Como bemaponta Mariza Peirano, distintos autores fa-lam sobre a modernidade na tradio destamodernidade qual pertencem, o que faz comque ela, ao comparar os escritos de NorbertElias e do prprio Louis Dumont, possa le-vantar alguns pontos da ideologia intelectu-al alem (simbolizada por Elias) e francesa(atravs de Dumont) (Peirano, 1991, p. 243).

    A aproximao entre a poltica racial

    do Brasil e dos Estados Unidos que Hanchardprope parece plausvel basicamente porque

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    a linguagem utilizada para descrever e anali-sar a situao brasileira est repleta de signi-ficaes advindas dos prprios Estados Uni-dos e porque a anlise, essencialmente

    funcionalista, privilegia casos concretos dediscriminao racial sobre o conjunto dasociedade, sobretudo suas representaes. Hsinais, sem dvida, de que um modo bipolarde definir raas no Brasil esteja cada vezmais em evidncia. Enquanto termino esteartigo, leio no jornal um comentrio do mi-nistro Pel: Se o negro quer melhorar seunvel social, preciso colocar gente nossa nocongresso (Jornal do Brasil, 15/11/95). Masmesmo assim acredito que um olhar maiscuidadoso sobre o caso Ana Flvia, em parti-

    cular sobre a prpria reportagem da Veja ci-tada por Hanchard, possa mostrar que noBrasil a poltica racial continua sui generisno contexto do mundo moderno como umtodo.

    OS PERIGO S DA LINGUAGEM

    A regra fundamental do mtodo sociol-gico e antropolgico manter uma clara dis-tino entre os conceitos e categorias analti-cas e descritivas da linguagem do narrador/

    analista e os conceitos e categorias utilizadospelos personagens da sua histria. A grandemaioria dos textos escritos sobre raa erelaes raciais quebra essa regra sistema-ticamente. O exemplo mais claro disso odescuido com o termo raa em si. Ape-sar de todos concordarem que tal conceitopertence ao reino das categorias nativas e definido social e historicamente de maneiradiversa de lugar para lugar, e que no tem,portanto, nenhuma validade cientfica comoconceito universal, este pseudoconceito aca-

    ba sempre se infiltrando nos textos comoconceito descritivo e, s vezes, analtico.Mesmo neste texto de Hanchard, que umdos autores mais sofisticados, encontra-sedescrito como racial group, race e racialdifference sem itlico, sem aspas.

    O texto de Hanchard, como tantos outros, prejudicado ainda mais pelo fato de quemuitos dos termos utilizados para descrevere analisar a situao brasileira num artigoescrito em ingls e publicado nos EstadosUnidos tambm so categorias nativas da

    poltica de identidade dos Estados Unidos.Termos e expresses como people of African

    descent, black subjectivity, Af ro -diasporic populations, African-derivedpo pu la ti on s, blacks, Af rica n-Brazilians, blackness, African-American

    communities of the New World, whites,nonwhites, racial phenotypes e racialgroups so carregados de valor no contextoda poltica racial norte-americana. Por essarazo, os conceitos e categorias utilizadosfazem muito mais do que descrever e anali-sar; remetem ao sistema de significaes erelaes sociais do qual fazem parte. A suadimenso semntico-referencial ofusca a suadimenso pragmtica ou indexical - seguin-do Vincent Crapanzano, que define o semn-tico-referencial como aquela dimenso ou

    funo (intencional) de um enunciado onde osentido est com excees triviais indepen-dente do seu contexto extralingstico(Crapanzano, 1992, p. 15). O pragmtico ouindexical se refere dimenso ou funo(extencional) de um enunciado onde o senti-do depende do seu contexto extralingstico(idem, ibidem)(1).

    A dimenso pragmtica das palavras uti-lizadas por Hanchard para descrever a situa-o brasileira efetua, sub-repticiamente, umatransmogrificao dos sentidos locais nos

    sentidos do lugar de origem das palavras,assim erradicando a possibilidade de enxer-gar possveis (ou melhor, provveis) diferen-as mais ou menos radicais. uma situaoanloga descrita por Dumont, em que o sis-tema de castas indianas perde a suaespecificidade quando descrito como um casode estratificao social. As categoriasblacks, whites e racial groups, por exemplo,pressupem que, no fundo, os brasileiros sepensam divididos e classificados desta for-ma. Ser? People of African descenttambm

    pressupe um sistema binrio de classifica-o no Brasil, baseado, como nos EstadosUnidos, em critrios de descendncia. Ser?A expressoAfro-Brazilian lifepressupe queos afro-brasileiros (e aqui se insinua de novoa existncia de um grupo estanque) partici-pam de um estilo de vida distinto do resto dapopulao, como o caso dosAfricano-Ame-ricanos. Ser? Af ri ca n- Amer ic ancommunities of the New Worldassinala namesma direo, insinuando uma essnciacomum entre todos aqueles com antepassa-

    dos africanos. Ser? Af ri can- deri ve dpopulations sugere alguma comunho entre

    1 Minha utilizao destes con-ceitos derivados do traba-lho de Silverstein (Silver-stein, 1979) se deve a lon-gas conversas com Vin-cent Crapanzano e leitu-

    ra de um trabalho recentede Robin Sheriff (Sheriff,1995).

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    a frica (e deixo ao leitor a tarefa de ima-ginar qual frica) e aqueles milhes de indi-vduos que, conscientemente ou no, tm umantepassado africano. Ser?

    As respostas a estas questes deveriamresultar de pesquisa. Mas a utilizao decategorias nativas americanas disfaradas dedescritores na sua dimenso puramente se-mntico-referencial faz com que tais ques-tes sejam respondidas antes mesmo de se-rem colocadas. Alis, a linguagem utilizadaprobe a prpria colocao destas questes.A linguagem opera, por si s, uma eliso entrea situao brasileira e a situao norte-ame-ricana, induzindo o leitor a pensar o Brasil dademocracia racial e das mltiplas categori-

    as de classificao racial como, na pior dashipteses, uma espcie de erro ou aberrao,e, na melhor, como uma etapa de um caminhoevolucionrio que desembocar na plenitudedo tempo na situao atual dos Estados Uni-dos: a modernidade.

    REALIDADE E IDEOLOGIA

    O efeito lingstico de aproximar o Brasildos Estados Unidos reforado por uma abor-dagem funcionalista que atribui s relaes

    sociais maior realidade que as representa-es, interpretando as segundas em funodas primeiras. No caso em questo me refiro interpretao da democracia racial feitapor Hanchard e pela maioria dos que escre-vem sobre relaes raciais no Brasil. Quan-do Hanchard observa que o caso Ana Flviacolocou mais um prego no caixo da ideolo-gia da democracia racial brasileira, ele partedo pressuposto de que a discriminao raci-al empiricamente constatada ou subjetiva-mente experimentada (interessantemente ig-

    nora as inmeras instncias de amizade e con-graamento entre pessoas de aparncias fsi-cas - o que ele chama fentipos raciais -distintas) mais real que a democraciaracial, que definida como ideologia.Como a realidade considerada mais forteque a ideologia (a razo deve sempreprevalecer sobre a superstio), ela aca-ba por enterr-la morta. Alis, me perguntoporque Hanchard quer enterrar a democra-cia racial. Ser que a idia da semelhanade todos to nociva assim? Ela inclusive

    teve um breve momento de popularidadenos Estados Unidos na dcada de 1960 -

    mas voltarei oportunamente a este assunto.As representaes no so menos reais

    que as relaes sociais; antes, pelo contrrio,so, ou devem ser, o ponto de partida para

    qualquer anlise sociolgica ou antropolgi-ca. A diferena, como diz Dumont, entre umaabordagem antropolgica comparativa e omaterialismo sumrio ou o funcionalismoenfraquecido est em estudar homens quepensam e agem e estudar comportamentos,como se faria com insetos, com a condio desalpicar com representaes indgenas maisou menos epifenomenais (Dumont, op. cit.,p. 23). Vista dessa maneira, a democraciaracial no menos real que a discriminaoracial. Enquanto a democracia produz

    uma sociedade sem segregao racial e le-galmente universalista, a discriminao s possvel porque existe, anteriormente a ela,uma outra ideologia que contesta a ideolo-gia da democracia racial. Essa ideologiahierarquiza os corpos de acordo com sua apa-rncia. As desigualdades entre os mais cla-ros e os mais escuros, entre Teresina e AnaFlvia, so o resultado de um mercado decores, livre em princpio (a democraciaracial), mas restrito na prtica pela contra-ideologia da hierarquizao das raas (o

    racismo).

    CINDERELA NOVAMENTE

    Em primeiro lugar importante observarque Michael Hanchard no foi o primeiro aperceber que o caso Ana Flvia se prestavapara falar das relaes raciais no Brasil emtermos mais gerais. A prpria Veja faz exa-tamente isso no artigo sobre o caso Ana Fl-via e num segundo artigo que o segue. Minhaanlise parte, portanto, de uma leitura deta-

    lhada desse texto, que vai muito alm de umadescrio do caso Ana Flvia para uma an-lise bastante interessante sobre a polticaracial do pas.

    Procurarei analisar o artigo da Veja cita-do por Hanchard para ver como as dimensespragmtico-indexicais e semntico-referenciais funcionam para compor a hist-ria e falar da poltica racial no Brasil. Paratanto, darei preeminncia aos termos nativosdo texto, tentando controlar a dimenso prag-mtica da minha prpria linguagem, mesmo

    que isso implique num certo pedantismo enuma profuso de aspas e itlicos (que sero

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    usados sempre que se trate de um termo enun-ciado no texto), e mesmo consciente de que adimenso pragmtica, como a objetividadeem si, so mais metas ideais que realizaes

    concretas possveis. Como diz Crapanzano:No pode, na minha opinio, haver um pon-to de vista verdadeiramente externo, nenhumego transcendental, nenhuma verdadeira pos-sibilidade de uma reduo transcendental, ouepoch. Pode haver apenas a evocao detais transcendncias, que tm que ser vistas,ironicamente, dentro da nossa linguagem queengloba tudo (Crapanzano, 1992, p. 3).

    A ESTRUTURA DO TEXTO

    A Cinderela Negra ocupa seis pginasda revista, igualando em tamanho o artigo decapa sobre a expedio de mandado de prisocontra P. C. Farias. Comea com umaetnografia do caso, que citei no incio destetrabalho. Em seguida, o articulista fala daspersonagens, uma por uma. Depois, emite assuas opinies sobre o preconceito racial noBrasil. Fala de duas interpretaes quaseantagnicas correntes, uma que afirma queno h racismo no pas e outra que diz queo racismo est apenas dissimulado. Justa-

    mente por no ser explcito, o preconceitoseria pior. E nada ficaria a dever quilo quese v em pases de violentos conflitos raci-ais (p. 67). Conclui que as duas interpreta-es so falsas, reconhecendo a existncia deum grau de miscigenao impensvel numpas como a frica do Sul sem que isso anu-le o fato de que exista preconceito bastantepronunciado no Brasil, revoltante em algunscasos, exemplar em outros, como o da filhado governador (p. 67). Depois de terminar adiscusso do caso Ana Flvia com uma dis-

    cusso sobre a sua passagem pelo InstitutoMdico Legal para exames e a fuga tempor-ria dos rus, dedica as ltimas duas pginasda reportagem aos resultados de uma pesqui-sa de opinio pblica na qual 6.268 pessoasforam entrevistadas acerca das suas atitudesquanto s relaes raciais no Brasil. Dis-cute nmeros, conta outros casos de discri-minao e castiga o PT por ter apenas umnegro na comisso executiva.

    O artigo fartamente ilustrado com novefotografias e cinco tabelas da pesquisa. Na

    primeira pgina, h uma grande fotografia deAna Flvia e seu pai. Num enorme e suntu-

    oso salo (supomos que seja no Palcio doGovernador), ela est sentada numa cadeiradourada com seu pai, em p, ao seu lado. Napgina do lado h duas fotografias menores,

    uma da Teresina Strange num sof de chintzcom o dedo em riste, a outra, menor, do rostodo seu filho Rodrigo. Nesta pgina, h tam-bm um quadro chamado Quem tem maispreconceito?, contendo porcentagens tira-das da pesquisa a respeito a opinio de bran-cos e negros sobre qual dos dois tem maispreconceito. Dos brancos entrevistados, 40%admitem que eles prprios tm mais precon-ceito, 36% acham que os negros so maispreconceituosos e 3% culpam mais os mula-tos. Dos negros entrevistados, 55% di-

    zem que os brancos tm mais preconceito,27% afirmam que so os negros e 9% cul-pam mais os mulatos.

    Nas pginas seguintes, h mais trs tabe-las, uma sobre beleza, outra sobre escolha deparceiro em casamento e a ltima sobre opor-tunidades no mercado de trabalho. Nesta lti-ma, 71% dos brancos e 81% dos negrosconcordam que o negro leva a pior naconcorrncia para emprego. Nestas pginash tambm duas fotografias, uma de um ho-mem pretssimo abraado com uma menina

    loirssima, e outra do empresrio Jos Bar-bosa num bar. Na legenda da segunda, o em-presrio citado: As pessoas no admitemque eu, que sou negro, tenha sucesso profissi-onal. J me disseram que tenho os lbios finos,que eu sou s mulato. Nas ltimas duas pgi-nas, aparece mais uma tabela sobre a presenade negros em instituies de prestgio (qua-se no h), e mais quatro fotografias de pesso-as que sofreram discriminao.

    Chamado de Baile de Mscaras, o arti-go seguinte a A Cinderela Negra procura

    chocar o leitor apresentando fotografias dealgumas personagens famosas com as suasfeies alteradas pelo computador. O papaaparece com os olhos achinesados, o Pelcom a cara de Robert Redford, a Xuxa com apele escurecida (Xuxa Meneghel Mandela),e Michael Jackson com cabelos loiros e peledefinitivamente branca. A brincadeira doartigo est ligada ao argumento de que asdiferenas genticas entre as raas so ape-nas cosmticas. Cita um bilogo molecularnorte-americano que afirma que no h nada

    no DNA que defina as raas e que o racis-mo um fenmeno cultural e social. O

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    artigo termina com uma afirmao do cres-cente branqueamento do mundo.

    AS PERSONAGENS DESCRITAS

    E CLASSIFICADASAs vrias personagens so descritas pri-

    meiro pelo articulista (annimo) e segundopelas prprias personagens atravs donarrador.

    Ana Flvia aparece primeiro como estu-dante, negra, 19 anos, filha do governador doEsprito Santo, Albuno Azeredo, (p. 66).Mais tarde no artigo, o articulista acrescentaque uma menina baixinha de cabelos lisose bem compridos e estudante de Engenharia

    Civil da Universidade Santa rsula, no Riode Janeiro (p. 68).A segunda protagonista, Teresina Strange,

    apresentada como uma empresria, loira,olhos verdes, 40 anos(p. 66) e, mais tarde,descendente de alemes, dona de uma agn-cia de turismo em Vitria e de um apartamen-to de 400 metros quadrados no luxuoso con-domnio Pietrngela, na Praia da Costa, o lugaronde ocorreu a confuso. A nica informa-o sobre o filho seu nome, Rodrigo, e suaidade de 18 anos. Presume-se que tambm

    descendente de alemes.O governador aparece assim:

    Casado h 22 anos com uma branca,Waldicia, pai de um rapaz e duas moas,Azeredo um caso raro de ascenso soci-al entre 45% da populao brasileira com-posta de negros e mestios. Nasceu emuma famlia pobre no Morro da Argola,perto de Vitria. Perdeu o pai aos 11 anos.A me lavava roupas para fora e a avfazia doces, que ele vendia nas ruas da

    cidade. Foi vendedor ambulante de pe-dreira e jogador de futebol. Muito inteli-gente, passou em terceiro lugar no con-curso para oficiais da Academia Militarde Agulhas Negras, Aman, mas abando-nou a escola 45 dias depois, sem dar ex-plicaes. At hoje o governador no gostade comentar o assunto, mas a famlia sus-peita que existe uma histria de precon-ceito racial no episdio. Depois disso,formou-se em Engenharia Ferroviria efez carreira na Companhia Vale do Rio

    Doce. Em 1974, abriu um pequeno escri-trio de consultoria em projetos ferrovi-

    rios, que hoje se transformou em uma dasmaiores empresas do ramo na AmricaLatina(p. 67).

    Waldicia, sua esposa, aparece apenascomo uma branca. Nestas descries, oarticulista privilegia a origem familiar, a pro-fisso e a aparncia das personagens. Otermo aparncia apropriado porque muito usado no Brasil e porque foge de qual-quer apriorismo racial. Como a beleza estno olhar de quem v, a aparncia no nuncaobjetiva. sempre um juzo de valor, possi-bilitado pelas categorias culturais e pelasparticularidades sociais de quem olha e dequem visto.

    O narrador constri as duas protagonis-tas principais (Ana Flvia e Teresina) atravsde uma srie de pares de oposies. Em ter-mos de famlia, Ana Flvia filha de umhomem negro e governador e me bran-ca, enquanto Teresina descendente dealemes. No que diz respeito profisso,notamos a diferena de gerao. Ana Flvia estudante e Teresina empresria. Mas na aparncia que as duas divergem mais. AnaFlvia, negra, baixinha e com cabeloliso e bem comprido, se ope a Teresina,

    uma loira com olhos verdes. A descriodas protagonistas , ento, nada inocente:produz imagens contrastantes de vtima ealgoz atravs da dimenso pragmtica da lin-guagem. A invocao da descendncia ale-m de Teresina, junto com os seus olhos ver-des e a sua loirice, evoca uma imagem doesteretipo do alemo do sul do pas. de seperguntar se o articulista queria, atravs dainsistncia na descendncia alem deTeresina, salvar as outras mulheres loirasverdadeiramente brasileiras da pecha do

    racismo inato!Na construo do governador e de sua

    esposa Waldicia, o articulista privilegia da-dos da origem familiar e histria profissionaldo marido, restringindo a descrio das suasaparncias constatao de que ele negroe ela branca. Mas, mesmo assim, o sernegro do governador que justifica tamanhointeresse na sua ascenso social vertiginosa.Afinal, como diz o narrador, o governador um caso raro de ascenso social entre 45% dapopulao brasileira composta de negros e

    mestios. O que chama a ateno na lingua-gem utilizada nesta descrio o efeito prag-

    NA OUTRA

    PGINA, ANA

    FLVIA AZEREDO,

    QUE SOFREU

    AGRESSO FSICA E

    MORAL NO SAGUO

    DE UM PRDIO EM

    VITRIA, EM 1993

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    PauloJ

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    mtico de enunciar a ascenso social do go-vernador e seu casamento com uma brancana mesma frase. Remete o leitor diretamente ideologia do branqueamento, formulada

    por Oliveira Viana e parte do iderio brasilei-ro at hoje.H um outro aspecto da linguagem descri-

    tiva do articulista que merece destaque. Quan-do se trata da aparncia das personagens, eleutiliza termos que descrevem aspectos doscorpos visualizados (olhos verdes, cabeloliso e bem comprido) e apenas trs termos declassificao: loira, branca e negra(o).Quando fala da descendncia, utiliza tambmo termo mulato para se referir aos trs filhosdo governador negro e sua esposa branca.

    (De fato tambm utiliza o termo mestioquando se refere raridade da ascenso socialdo governador.) Este ponto merece destaquequando observamos que se Ana Flvia mu-lata em termos da sua descendncia, ne-gra quando descrita pelo narrador como per-sonagem da histria.

    As personagens citadas pelo narrador tam-bm falam de si mesmas e descrevem as ou-tras. Ana Flvia conta que Teresina a cha-mou de empregadinha e falou preto e po-bre no tm lugar aqui. o lugar dos mora-

    dores, assim sugerindo que os moradoresso brancos e ricos. A dimenso pragm-tica destes termos evidente: remonta a umaoposio bastante familiar no Brasil. A com-binao dos termos preta, pobre eempregadinha se refere a uma categoriasocial considerada por muitos como debaixssimo status social (Rezende, 1995),opondo-a ao empregador branco e rico.

    Quando Teresina se defende das acusa-es de racismo, ela procura palavras menospragmticas: Em primeiro lugar, para mim a

    Ana Flvia no preta. s uma meninabronzeada (p. 68)! Ou seja, a cor dela maisadquirida que adscrita. Teresina segue,inconscientemente ou no, uma tradio bra-sileira comentada por Gilberto Freyre: a quevaloriza o bronzeamento das mulheres. Obronzear da pele [tem] se tornado, entre brasi-leiras de todos os grupos sociais que compema populao feminina do Brasil, um quase ritoreligiosamente esttico, que vem agindo, quercomo superao de importncias outrora atri-budas a origens e situaes sociais, quer

    como revelao, no caso de mulheresmiscigenadas, dos positivos, ao contrrio de

    supostos negativos (Freyre, 1986, p. 39).Uma tia paterna da Ana Flvia tambm

    entrevistada. Ela acha que a sobrinha devesofrer muito, porque no atual crculo de ami-

    zades dela no h outras meninas pretas (p.68). Diz ainda: ela complexada e quaseno vai praia (p. 68). Comenta tambmque o irmo, Albuno Junior, de 17 anos, chamado pelos amigos do curso de pr-vesti-bular de Neguinho da Beija-Flor e Criolo[sic] (p. 68).

    a primeira-dama quem tem mais a falarsobre o incidente:

    No Brasil existe um apartheidvelado. Aposio social, o dinheiro e o poder po-

    dem diminuir o preconceito, mas no aca-bam com ele. como se as pessoas tives-sem passado um verniz, debaixo do qualo preconceito continua intacto. J enfren-tei muitas barras pesadas por causa dadiscriminao contra minha famlia. To-pei todas as brigas, mas nunca imagineique uma filha minha acabasse agredidapor ser negra. Quando soube da notcia,senti dor e humilhao, mas agora querover os dois atrs das grades. Isso tem deacabar um dia (p. 68).

    Os termos utilizados pelas personagenspara se descreverem e para descreverem asoutras se aproximam e se distanciam daquelesutilizados pelo narrador. Teresina e a tia uti-lizam termos como bronzeada, preta,neguinho da Beija-Flor, e criolo. O go-vernador, ao falar da sua infncia, se queixa deter sido chamado de macaco e saru quan-do era menino pobre. a esposa do governa-dor que utiliza os mesmos termos do articulis-ta, referindo-se sua filha como negra.

    Ficando um tanto perplexo com a varieda-de de termos utilizados para descrever as per-sonagens, e surpreso com a ausncia dodescritor moreno, to comum na linguagemcotidiana do Rio, conduzi uma pequena enquete

    junto a alguns vizinhos meus de Santa Teresa,no Rio de Janeiro. Cobrindo o ttulo da mat-ria com um papel branco, mostrei as fotogra-fias para eles perguntando como descreveriama aparncia das personagens. Um estofador,que se definiu como pardo,disse que o go-vernador era pardo, e a filha dele morena.

    Chamou a cor morenade cor internacio-nal. Uma empregada domstica que se decla-

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    rou brancaachou o governador morenofechado, e a menina morena clara, como sediz. Dois garagistas, que se definem comonegros, divergiram. Um achava o governa-

    dor mulato, e a menina morena. O outroinverteu a ordem. Um vendedor confirmouque o governador era mulatoe a filha mo-rena. O que mais me espantou que todos oshomens acharam Teresina morena, at queme dei conta de que, na fotografia, os seuscabelos parecem escuros! Apenas a emprega-da domstica me confiou que era branca, no?. Mais tarde ela me procurou para saber sea resposta dela era correta. Evidentemente notinha certeza e achava que eu, como professor,saberia a verdade!

    No final da breve conversa com os gara-gistas negros, caiu o papel que cobria o t-tulo do artigo. Leram o ttulo da reportagemcom espanto, comentaram que absurdo e,ato contnuo, riram s gargalhadas. No inda-guei sobre o motivo do riso, mas ficou maisou menos bvio que os cabelos longos e li-sosda Ana Flvia e a sua presena em umambiente to obviamente rico adesqualificavam do ttulo de negra.

    Os dados at agora apresentados apontampara alguns princpios que guiam a descrio

    das pessoas. Em primeiro lugar, todas aspersonagens so descritas de acordo com asua aparncia fsica, com a exceo deTeresina Strange, cuja descendncia alem evocada. Ana Flvia, por exemplo, aparececomo preta, negra e bronzeada, masnunca como uma pessoa de descendnciaafricana, ou africano-brasileira. Este pro-cedimento apenas confirma a atualidade dasobservaes feitas por Oracy Nogueira no seufamoso mas lamentavelmente pouco lembra-do artigo, em que contrasta os sistemas norte-

    americano e brasileiro de relaes raciais,mostrando que os brasileiros classificam apartir da aparncia da pessoa (a marca),enquanto os norte-americanos privilegiam adescendncia (a origem)(2).

    Mesmo se todos prestam mais ateno marca que origem possvel distinguirduas maneiras de classificao. O narrador eWaldicia distribuem as personagens emapenas duas categorias: negrose brancos.As demais personagens e os meus vizinhosutilizam categorias muito comuns na vida

    cotidiana brasileira como moreno, more-na clara, mulato(a), mulato fechado,

    pardo, criolo, neguinho, loira epreto(a) para colocar as personagens numagama de categorias bem mais ampla (3).Chamo a primeira maneira de classificar de

    modo binrio, e a segunda de modo ml-tiplo. Evito falar em sistemas de classifica-o, por no estar seguro, aps a leitura de umrecente artigo de Robin Sheriff, de que o modomltiplo, pelo menos, possua qualquersistematicidade (Sheriff, 1995).

    H tambm um terceiro modo de classifi-cao, uma espcie de reduo do modo ml-tiplo, ou ampliao do modo bipolar, que con-siste em trs categorias: negro, branco emulato. Este tambm o modo oficial docenso brasileiro, que pede s pessoas que se

    classifiquem como pretas, brancas oupardas (quando no amarelas ou outras).Nota-se um deslizamento das categorias ne-gro e mulato para preto e pardo.

    Por estes dados e por outros extrnsecosao caso, pode-se levantar a hiptese de que omodo mltiplo seria dominante nas camadaspopulares, por assim dizer, e o modo bipolardominante entre as classes mdiasintelectualizadas urbanas. Essa hiptese razovel quando se lembra que so justamen-te as classes mdias intelectualizadas as mais

    influenciadas pelo Movimento Negro e oscientistas sociais concernidos com relaesraciais no Brasil. Estes, desde os trabalhosde Florestan Fernandes, tm adotado os ter-mos negros e brancos nos seus escritos(Maggie, 1988). Em crculos universitrios,por exemplo, o modo bipolar o politica-mente correto.

    Mas outros dados extrnsecos ao casoAna Flvia complicam a hiptese. O ter-mo eminentemente popular pessoas decor e a expresso quem passa de branco,

    preto sugerem que, mesmo entre aquelesque costumam empregar o modo mltiplo,h um recurso bipolar tambm disponvel.As observaes de Robin Sheriff num mor-ro do Rio de Janeiro mostram que o modobipolar pode ser invocado, bem como omodo mltiplo (Sheriff, 1995). Mesmoassim, a bipolaridade popular diferenteda bipolaridade do Movimento Negro, poisa popular invocada situacionalmente;desta forma convive com o modo mltiplo.A bipolaridade do Movimento Negro

    impositiva e militantemente contrria aomodo mltiplo.

    2 Veja, nesse sentido, um ar-tigo recente de Maria LauraViveiros de CastroCavalcanti (1995).

    3 Na pesquisa conduzida porNelson do Valle Silva so-bre os dados da PNAD de1976, em que os entrevis-tados se autoclassificaramem termos de cor, 135 ca-tegorias apareceram. 95%das respostas recaram,mesmo assim, em apenassete categorias: as quatrocategorias do censo, bran-co, preto, pardoe amare-lo, e trs outras, mais cla-ro, moreno claro, moreno.Nos restantes 5% apare-ceram categorias como

    alvo, alvo escuro, alvo ro-sado, bronze, caf comleite, etc.

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    Os modos bipolar militante e mltiplo soradicalmente distintos um do outro. O modomltiplo permite que indivduos possam serclassificados de distintas maneiras de situa-

    o a situao. Alm disso, permite o quepodemos chamar da desracializao daidentidade individual. Os termos moreno emoreninho podem ser aplicados, como vi-mos acima, a uma grande gama de aparnci-as, a uma descendente de alemes, bemcomo, na vida cotidiana, aos indivduos comas feies associadas frica. O bipolarmilitante se aproxima do modo norte-ameri-cano, na medida em que divide a sociedadedicotomicamente entre brancos e negros.Difere, como j argumentou Oracy Noguei-

    ra, porque se baseia nas aparncias fsicas dosindivduos, e no primordialmente na suadescendncia. Do ponto de vista do Movi-mento, o modo popular antema. Catego-rias como morenoe mulato, vistas comoresultado das ideologias da democracia raci-al e do branqueamento, so consideradas ar-mas para ocultar a verdadeira identidadenegra, o que Hanchard chama de blacksubjectivity. o caso do empresrio citadoacima, que se ressente de ser chamado de smulato por causa dos seus lbios finos.

    O Movimento Negro, ento, quis rompercom o modo mltiplo, mudando as regras do

    jogo. E fez com tanta energia que comeou anegar qualquer especificidade brasileira, des-crevendo o pas como pior que o apartheid,por exemplo (a segunda interpretao do ra-cismo no Brasil mencionada no artigo da Vejae citada acima). Janurio Garcia, antigo lderdo movimento do Rio e ex-presidente do Ins-tituto de Pesquisa da Cultura Negra (IPCN),reconhece quo difcil tem sido fazer ressoara mensagem bipolar do movimento: A mas-

    sa no veio comigo porque no sei como mecomunicar com ela. [...] No conseguimosmais nos comunicar com a massa porque nonos identificamos com massa. [...] Era prin-cipalmente uma questo de linguagem.Garcia acertou em cheio, pois parece mesmoexatamente uma questo de linguagem na suadimenso pragmtica. A dificuldade de fazervaler uma linguagem que fala de negros ebrancos para quem fala uma linguagem demorenos, pretos, mulatos, crioulos,etc., exatamente a dificuldade de fazer com

    que as pessoas abram mo de um modo devida ao qual esto habituadas, um modo de

    vida baseado na crena de que a aparnciadas pessoas no deveriainfluir sobre as suasescolhas e carreiras, mesmo se se comparti-lha outra crena, igualmente forte, nas restri-

    es terrveis que se impingem s mais es-curas (citado em Maggie, 1988, p. 84).Entretanto, e apesar do modo mltiplo e do

    modo censitrio se localizarem mais forte-mente entre as camadas populares, e o modobipolar entre os militantes do MovimentoNegro e universitrios em geral, na prtica ostrs modos coexistem na sociedade como umtodo. De situao em situao, um ou outropode aparecer em modo puro, ou todos po-dem ser encontrados misturados. As tabelasapresentadas no artigo A Cinderela Negra

    so ilustrativas nesse sentido. Os que respon-deram ao survey so classificados de acordocom o modo bipolar como negros e bran-cos (no se sabe se esta classificao foi efe-tuada pelos pesquisadores ou pelospesquisados), mas as perguntas s quais res-pondem contm a categoria mulato.Reproduzo duas tabelas guisa de exemplo:

    Estas tabelas, cujas colunas estranhamenteno somam 100%, apresentam dados impor-tantssimos sobre a dificuldade mencionadapor Janurio Garcia em fazer valer a mensa-gem do Movimento Negro em grande escala.

    Demonstra que, quando as pessoas pensam abeleza (aparncia) e a escolha de parceiro(a?)

    O J ULGAMENTO DA BELEZA

    Em qual das raas voc acha que h uma maiorproporo de pessoas bonitas?

    A opinio dos brancos A opinio dos negros

    45% dos entrevistados 27% dizem que os mulatos so

    mais bonitos

    dizem que entre os

    brancos mesmo

    25% afirmam que h mais 22% acham que so os brancos

    gente bonita entre os mulatos

    3% dizem que h mais 17% afirmam que h mais gente

    negros bonitos bonita entre os negros

    A ESCOLHA DO PARCEIRO

    Entre uma pessoa branca, mulata ou negra,qual seria o seu parceiro ideal?

    Os brancos preferem Os negros preferem

    53% parceiros brancos 37% parceiros negros

    27% parceiros mulatos 31% parceiros mulatos

    3% parceiros negros 14% parceiros brancos

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    ideal, a categoria mulato(a?) surge entre umnmero nada desprezvel de pessoas. Resta sa-ber, mesmo assim, quantos dos negros e bran-cos que responderam consideram-se mulatos!

    AS CONSEQNCIAS

    O modo bipolar e o modo militante tmseu locus classicus nos Estados Unidos (nafrica do Sul existem coloureds). L, ataxinomia racial consiste em apenas duascategorias, negro (agora africano-ameri-cano) e branco. Assim, mesmo tendo setebisavs europeus e um africano, este quedetermina o status de africano-americano.Este modo de classificao se produziu num

    contexto intelectual em que se acreditava que,na prole das unies sexuais entre indivduosde raas distintas, a raa inferior seriasempre a dominante, manchando a purezabranca. Se os cientistas do final do sculoXIX no tivessem sido to preocupados coma superioridade e inferioridade das raas,teriam provavelmente inventado um outrosistema em que os indivduos seriam classifi-cados em termos de porcentagens, o que defato ocorreu nas colnias espanholas. Se issotivesse acontecido, hoje em dia um neto de

    um africano, um ingls e duas escocesas seriadenominado um africano 25% ingls, 25%escocs e 50% americano. Este absurdoimaginrio apenas coloca em relevo a arbi-trariedade real do modo de classificao ra-cial nos Estados Unidos como em qualqueroutro lugar. Mas como esta taxinomia per-cebida como natural, os americanos ficamsurpresos que no a encontrem no Brasil.Acham eles, e, devo dizer, um nmero cres-cente de brasileiros aclitos deste pensamen-to, que a maneira de classificar brasileira, to

    complexamente construda em cima de apa-rncias, apenas mascara a verdadeira dis-tino natural entre negros e brancos.Ficam perplexos de no existir um movimen-to negro de massas.

    possvel argumentar que o modo mlti-plo mais coerente, menos ambguo e atmenos racista que o bipolar dos Estados Uni-dos. O modo mltiplo efetivamente utilizaum sistema de porcentagens noquantificadas: assim, cabelo bom, narizchato, lbios finos e cor clara acabam

    reconhecendo a herana gentica africana eeuropia. O racismo entra quando os mais

    prximos da Europa so vistos como supe-riores. Est contido justamente nos descritoresbom e ruim do cabelo; a contra-ideo-logia racista qual me referi acima.

    O modo bipolar militante no correto.No existe retido universal no mundo dastaxinomias e classificaes, mesmo as ditascientficas. Ambos os modos, baseados emnoes neo-lamarckianas de descendncia,so racistas, mas o modo mltiplo maisconsistentemente neo-lamarckiano na medi-da em que reconhece mltiplas entradas ra-ciais na constituio da pessoa atravs dadescendncia. O modo americano/militante/bipolar endossa a noo racista de que bastauma gota de sangue negro para poluir a

    pureza branca e produzir um mundo deraas essencializadas.Se se pensa que o problema das desigual-

    dades raciais no Brasil deve ser resolvidoatravs do conflito, ento o modo bipolaraparece como necessrio. Ou, como afirmaHanchard, as lutas entre grupos raciais do-minantes e subordinados, e a poltica de raaajudam a constituir a modernidade e os pro-

    jetos modernizantes no globo inteiro. Espe-ro ter levantado a suspeita, a partir da discus-so em torno do caso Ana Flvia, de que as

    coisas no so to simples assim no Brasil eque, apesar da visibilidade do modelo bipolar,outras maneiras de definir as pessoas conti-nuam fortes ainda.

    A antropologia oscila entre ouniversalismo das suas grandes teorias e oparticularismo dos seus estudos etnogrficosempricos. Creio que a tenso entre estesdois plos que lhe confere a possibilidade deevitar os piores excessos da etnocentricidade,de estar ciente de uma possveltranscendncia. A poltica racial norte-

    americana parece ter optado definitivamentepelo particularismo das raas. Se no, comoexplicar as reaes ao julgamento de O. J.Simpson (a maioria dos negros o achouinocente e a maioria dos brancos o achouculpado, como se culpa criminal fosse coisade raa), ou a marcha de um milho dehomens negros em Washington, sob a co-ordenao do segregacionista Louis Farrakane seu Reino do Isl? O universalismo conti-nua forte no Brasil, na sua constituio e naidia da democracia racial, mesmo se h si-

    nais (se Hanchard e Skidmore tm razo) deuma crescente polarizao no pas.

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    A MORAL DA HISTRIA

    No acredito que seja possvel ser soci-logo ou antroplogo e ficar sem opinio neste

    debate, simplesmente porque nossas discipli-nas so construdas sobre duas pedras funda-mentais: a universalidade da humanidade e adesconexo total entre gentica e cultura. nossa incumbncia, portanto, no ficarmoscalados perante todas as modernas formas deessencialismo e racismo, mesmo se isso im-plica em assumir posies temporariamentepoliticamente incorretas. Afinal, racismo racismo, e to perigoso quando invocadoem favor dos fracos quanto dos fortes. Afi-nal, os fracos de hoje podem muito bem ser os

    fortes de amanh.Kwame Anthony Appiah, filsofo e filhode pai gans e me britnica, professor daUniversidade de Harvard, est aborrecido coma perpetuao do discurso militanteessencialista no seu pas adotivo, que nos diasde hoje presencia um caloroso debate univer-sitrio sobre o suposto eurocentrismo doscurrculos, o que tem produzido umafrocentrismo reativo. Comenta: A res-posta correta ao eurocentrismo no certa-mente um afrocentrismo reativo mas uma

    nova compreenso que humanize todos nsatravs de uma aprendizagem de pensar almde raa (Appiah, 1993).

    Hanchard afirma que o Brasil no ne-nhuma exceo a uma poltica racial ge-neralizada neste final de sculo. Peo perdo,mas acredito que a poltica racial no pre-cisa seguir os rumos do mundo anglo-saxo(4). Os Estados Unidos vivem surtos deuniversalismo dentro do seu particularismohistrico, como, por exemplo, no movimentodos direitos civis na dcada de 1960, e mes-

    mo agora, vozes de pessoas que se conside-ram misturadas racialmente, ainda tmidas,surgem para reivindicar identidades sociaisalm das categorias raciais existentes (Root,1992)(5). O Brasil vive surtos departicularismo dentro de seu universalismoconstitucional e consentido; afinal, como rezao ditado popular, na prtica a teoria outra.Mas nem por isso precisamos descartar ademocracia racial como ideologia falsa.Como mito, no sentido em que os antroplo-gos empregam o termo, um conjunto de

    idias e valores poderosos que fazem comque o Brasil seja o Brasil, para aproveitar a

    expresso de Roberto daMatta. Como tal, seguramente nada desinteressante num mun-do assolado pelos particularismos raciais,tnicos e sexuais que alhures produzem

    sofrimento e morte no pretenso caminho daigualdade.

    PO ST SCRIPTUM

    Logo depois de terminar este artigo, nosbado, dia 25 de novembro, estava voltandopara minha casa em Santa Teresa, de carro,acompanhado por um amigo negro, quandovi no retrovisor um carro com um nico farolmuito alto. Tapei o espelho retrovisor paraproteger os meus olhos. Aps alguns minu-

    tos o tal carro acendeu luzes vermelhas quepiscavam no seu teto. Polcia! Fui mais deva-gar para que ele pudesse me ultrapassar. Masno ultrapassou. Parou ao meu lado e meforou a parar. Saltaram de um Opala velhodois policiais armados com revlveres, quelogo comearam a me xingar por no ter pa-rado. Com arrogncia e brutalidade exigiramnossos documentos e vistoriaram o carro.Minhas tentativas de exigir civilidade apenasaumentaram a agressividade deles. Quandonada ilegal acharam (tomei o cuidado de se-

    guir seus passos caso quisessem depositaralgo), relutantemente nos deram autorizaopara seguir viagem. Anotei o nmero doOpala. Os policiais ento anotaram a placado meu e ameaaram me multar por ter recu-sado parar!

    Cheio de raiva, desci de novo para a cida-de. No caminho, sugeri ao meu amigo queera um caso de racismo. Ele disse que noqueria comentar isso, mas que era mesmo.Ele teria visto o Opala quando passamos porele na subida. Certamente os policiais dedu-

    ziram que um branco e um negro nomesmo carro s poderiam ser bandidos deum tipo ou outro.

    Fiquei arrasado por ter escrito um artigoapelando para a realidade da democraciaracial!

    De volta cidade, entramos num bote-quim, um botequim cheio de gente de todasas aparncias possveis, velhos e moos,mulheres e homens, de todas as cores poss-veis. O ambiente de convivncia bem-humorada foi o mais perfeito antdoto bati-

    da policial. Aos poucos fui relaxando.Um negro velho veio me pedir um real

    4 Tenho em mente aqui a im-portantssima questo dasdiferenas entre as colni-as portuguesas e as ingle-sas, questo essa tratadaatentadamente por Gilber-to Freyre. Para trabalhosrecentes sobre essa ques-to ver: Ribeiro, 1994; e Fry,1991.

    5 Root alega que o surgimentode uma populao racial-mente mista est mudan-do a face dos EstadosUnidos. Lana mo do con-ceito de ecologia racialpara rever a sociedade nor-te-americana. The racialecology is complex in ap h e n o t y p i c a l l y heterogeneous society thathas imbued physicaldifferences with significantmeaning in a conventionthat benefits select ivesegments of the society(Root, 1992, p. 4). Esta vi-so brasileira dos EstadosUnidos (isto : identidadeest nas aparncias) nosurgiu do nada; afinal conhecido que, mesmo nabipolaridade dos EstadosUnidos, sutis diferenas deaparncia so notadas,mesmo se nem sempreverbalizadas. Poder-se-ialevantar a hiptese de queo Brasil e os Estados Uni-dos diferem da seguintemaneira: no Brasil o modobipolar continua dominado

    pelo modo mltiplo enquan-to nos Estados Unidos asituao a inversa.

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    para o nibus. Espontaneamente comeoua me contar da sua vida de capoeirista com anavalha escondida entre os dedos do p. Atocontnuo, se referiu a sua cor, dizendo que

    no tolera quem o desfaz. Partiu, ento, paraum longo discurso, sem pieguice, sobre aigualdade de ns todos perante Deus.

    Dei-me conta, ento, de que meu artigotinha algum sentido.

    Os dois eventos, a brutalidade da polciaracista e a civilidade da mistureba do bote-

    quim, aconteceram na mesma cidade com adiferena de alguns minutos entre um e outro.

    Mas isso mesmo. O ideal da democra-cia racial e a brutalidade do racismo coexis-

    tem de tal forma que a situao - umas soprevisveis, outras no - que determina qualvai prevalecer. No tenho dvidas de que osdois policiais, ambos escuros, jamais ad-mitiriam qualquer racismo. No duvidotampouco que bebam fraternalmente nosbotequins da vida.

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