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SUMÁRIO

CONSIDERAÇÕES INICIAIS...................................02

UNIDADE I – FILOSOFIA ANTIGA......................03

Capítulo 1 – Origem da Filosofia..................................03

Contexto histórico..............................................................03

O Mito..................................................................................04

A pólis e o surgimento da Filosofia...................................04

Pré-socráticos – Os primeiros filósofos...........................05

Capítulo 2 – Filosofia Clássica......................................07

Atenas em questão..............................................................07

Os Pluralistas.......................................................................09

Sofistas..................................................................................10

Sócrates................................................................................10

Platão....................................................................................11

Aristóteles............................................................................13

Capítulo 3 – Filosofia Helenística................................16

Contexto histórico - Alexandre o Grande.......................16

Epicurismo..........................................................................17

Estoicismo...........................................................................17

Ceticismo/Pirronismo.......................................................17

Cinismo................................................................................17

Questões...............................................................................17

UNIDADE 2 – FILOSOFIA MEDIEVAL...............20

Capítulo 4 – A Patrística e Santo Agostinho..............20

Capítulo 5 – Escolástica e São Tomás de Aquino....21

UNIDADE 3 – FILOSOFIA MODERNA...............22

Capítulo 6 – Renascimento............................................22

Contexto histórico..............................................................22

Galileu Galilei e o início da ciência experimental..........24

Maquiavel e o dilema do príncipe.....................................24

Capítulo 7 – Formação e consolidação do Estado...26

Thomas Hobbes e a mecânica do Estado........................29

Questões...............................................................................30

Capítulo 8 – Empirismo e Racionalismo..................33

Descartes e o Grande Racionalismo.................................33

Francis Bacon – Conhecimento (empírico) é poder.......35

Isaac Newton e o Grande Relógio Celeste.......................36

Questões...............................................................................37

Capítulo XX – Iluminismo............................................39

Iluminismo na Inglaterra....................................................39

John Locke: empirismo e liberalismo..................39

George Berkeley....................................................41

David Hume e o poder do hábito........................42

Adam Smith e o livre mercado.............................43

Iluminismo na França.........................................................44

Voltaire e a tolerância............................................44

Montesquieu e os três poderes ............................44

Rousseau e a vontade geral...................................45

Enciclopédia...........................................................46

Iluminismo na Alemanha...................................................46

Immanuel Kant......................................................46

Questões...............................................................................49

GABARITO.......................................................................51

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CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Sobre o ENEM.

Que o ENEM não é um vestibular tradicional você já está cabeludo de saber. Ele não aborda os conteúdos das disciplinas como fins em si mesmos. O que o Ministério da Educação quer saber é se você consegue compreender, avaliar e ter um posicionamento crítico sobre a realidade que o rodeia.

Para isso, mais do que testar sua decoreba, o governo quer saber se você tem as competências e habilidades necessárias para entender o seu contexto sócio-histórico-cultural, fundamentado nos conteúdos adquiridos no ensino médio. Ele quer saber se você é um cidadão crítico e consciente. Pelo menos, essa é a ideia.

Mas para se ter uma compreensão desse nível sobre a realidade é necessário uma visão, não multidisciplinar, mas interdisciplinar e contextualizada sobre a mesma. Esses são os conceitos chaves desse exame.

Tanto é que não há no edital o conteúdo das disciplinas da Área de Humanas divididos da forma tradicional em Português, Literatura, História, Geografia, Filosofia e Sociologia. Linguagens, Códigos e suas Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias são a forma que esses conteúdos aparecem. E isto é assim para que se possa, por meio dos conhecimentos dessas disciplinas, ter uma visão da realidade como um todo inter-relacionado e contextualizado.

Por isso, o estudo de Filosofia é tão importante para esse exame, mas contraditoriamente relegado a um segundo plano, seja nos colégios ou nos cursinhos preparatórios.

Não é sem propósito que a Filosofia vem ganhando destaque nesse exame, a ponto de ter 18 questões com conteúdo filosófico na última prova. Isso equivale a 40% da prova de Ciências Humanas, e 10% de todo o ENEM.

A Filosofia é a única disciplina que nos possibilita ter uma visão de conjunto interdisciplinar sobre a nossa realidade. E não estou falando aqui do estudo de mais uma disciplina escolar em que se tem de aprender mais conteúdos dissociados de nossa vivencia diária.

Não é a simples leitura do pensamento de determinado filósofo que viveu numa época totalmente diferente da nossa e que por isso não pode nos dar nenhuma lição para os nossos problemas atuais.

Nesse e-book vamos ver como as respostas às perguntas formuladas sobre os problemas de sociedades tão distintas da nossa podem nos ajudar a superar muitos dos nossos problemas atuais.

E para isso não podemos estudar o pensamento de determinado filósofo dissociado de seu ambiente social, alheio à sua história. Somente com a consciência de que todo grande pensador formula suas teorias a partir de seu meio social e dentro de seu contexto histórico, podemos entender melhor todo e qualquer filósofo.

Todos nós temos uma história, mas somente tendo consciência da teia, dos enredos das diversas histórias das instituições que nos cercam e que formam o contexto em que nossa própria história vai se desenrolar, é que poderemos tomar consciência dela e, por conseguinte, de nós mesmos.

Dessa maneira, vamos fazer uma viajem histórico-filosófica das ideias que formaram a nossa sociedade e suas instituições para que posamos assim, compreendermos como e por que nossa situação atual chegou a ser o que é hoje. Somente dessa maneira teremos um melhor embasamento para fazermos julgamentos sobre o sentido de alguma coisa.

Creio que abordar o conhecimento filosófico dessa maneira seja a melhor forma para você desenvolver as competências e habilidades exigidas pelo ENEM.

Por que estudar por esse e-book? Ele é voltado

especificamente para o ENEM, abordando os conteúdos

como o edital exige. Esse material está escrito em

linguagem fácil, prática, direta, e bem descontraída. Além

de trazer, divididas por assunto, todas as questões de

filosofia que já caíram no ENEM.

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IDADE 1 – FILOSOFIA ANTIGA

CAPÍTULO 1 – ORIGEM DA FILOSOFIA

Para uma melhor compreensão da matéria, é importante deixar bem claro que é um erro chamar as póleis gregas de cidades-estados, dentre tantos motivos destacarei apenas dois. O primeiro é a imprecisão histórica; o termo cidade é romano (civitas em latim), e o Estado é invenção da modernidade, ainda não existindo nesse tempo.

Alguns podem retrucar e argumentar que isso não tem importância. Para eles eu destaco o segundo motivo, que é a carga de preconceitos que esses termos carregam. E quando uso o termo preconceito não estou usando-o de forma pejorativa, mas em seu sentido literal, isto é, de ideias preconcebidas, sem reflexão.

Quando se fala em “cidade” imaginamos nossas formas de aglomeração humana em um mesmo espaço, uma arena em que cada indivíduo procura o seu bem, se dar bem sem prejudicar a busca do bem do outro, estejam esses bens correlacionados ou não. O termo “bem”, aqui, não está sendo usado no sentido metafísico, mas no sentido de propriedade mesmo, seja ele (bem) posses materiais, fama, dinheiro ou poder.

Noutra vertente, quando usamos o termo “estado” vem à nossa cabeça um poder exterior a nós que por meio de um governo, quer se intrometer em nossas vidas, quer seja positivando/regulando nossas relações sociais, quer seja tributanto nossos salários ou negócios, quer seja ditando quando, onde, e como será gasto nossas riquezas.

Quando se fala em estado, temos um governo, uma sociedade civil (organizada ou não) e uma democracia representativa. Uns que comandam e outros que são comandados.

Como veremos a seguir, a Grécia, melhor dizendo, a Atenas da época clássica, gerou uma forma de organização da vida humana que serviu de base durante esses milênios para nossas sociedades. Mas é importante deixar claro que usar o termo “cidade-estado” para designar essa forma de organização político-social dos gregos é uma monstruosidade que precisa ser corrigida pelos manuais do ensino médio.

Continuar com isso é permanecer no erro de olhar o outro pelo nosso umbigo, querer entender suas formas de expressão a partir das nossas. Esse tipo de pensamento é que causa discórdia e não aceitação do outro, o que gera guerras e mais guerras.

CONTEXTO HISTÓRICO

Na antiguidade a região conhecida como Grécia não era um estado unificado, com poder centralizado, governo único, e suas cidades-estados (póleis) obedecendo a esse poder. Era na verdade, uma região que por suas peculiaridades históricas e geográficas abrigava povos de origem, costumes e crenças comuns, unidos por uma mesma língua.

A história desse povo na antiguidade é dividida em quatro períodos. A sua formação se dá pela união das civilizações Cretense e Micênica no período que ficou convencionado chamar de pré-homérico (Secs. XX a XII a. C.), cujo fim ocorre com a invasão dórica que ocasionou a primeira diáspora grega, quando eles ocuparam todas as áreas banhadas pelo mar Egeu na forma de pequenos núcleos rurais.

Começa a partir de então o período homérico (Secs. XII a VIII a. C.), que leva esse nome por causa das obras do grande poeta Homero, que nos conta, por meio da Ilíada e Odisseia, como foi essa época.

Os pequenos núcleos rurais deram origem aos genos que, comandado por um pater, eram formados por pessoas que acreditavam ser de uma mesma descendência. Apesar de terem um líder, a terra era de propriedade de todos.

Nesse período, houve um grande aumento populacional que não foi acompanhado pela produção de alimentos, pois haviam poucas terras férteis. Muitos genos se dividiram, houve disputas e distribuição desigual de terras que passaram a ser propriedade privada. Foi um período de turbulência e muitas pessoas ficaram marginalizadas.

Desse modo, a sociedade, que era essencialmente agrária e patriarcal, ficou estruturada da seguinte forma:

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1) Eupátridas = os paters e seus parentes mais próximos que detinham as maiores e melhores terras;

2) Demiurgos = trabalhadores livres 3) Georgoi = pequenos proprietários de terras; 4) Thetas = homens livres, mas marginalizados por

que sobraram na divisão e disputas por terras; 5) Escravos

Essa instabilidade gerou a necessidade de alguns genos se aliarem. Dessas alianças resultaram as fratrias, e da união destas, as tribos. O poder do pater passou a ser exercido por grupos de latifundiários bem nascidos conhecidos como eupátridas. Até que finalmente foram formados os demos que tinha como líder o basileu (rei), que era o mais fodão dos eupátridas.

Para sobreviver, muitos gregos tiveram que buscar terras férteis para o cultivo de alimentos. Eles se lançaram ao mar à procura dessas regiões e se estabeleceram, além do Mar Egeu, por quase toda região europeia banhada pelo Mar Mediterrâneo (principalmente no sul da península itálica e na região da Sicília, que ficou conhecida como Magna Grécia), adentrando também na região do Mar Negro fundando apoikias (novos demos - colônias) em todos esses territórios. Essa busca de novas terras foi Segunda Diáspora grega.

Foi basicamente nessa época que houve o ressurgimento da escrita entre os gregos, quando eles adaptaram o alfabeto fenício à sua língua.

A Ilíada e a Odisseia descrevem vários aspectos da cultura e as diversas formas de relacionamento social dessa época, e mais importante, influenciaram muito as várias gerações gregas que tiveram o guerreiro bom e belo como um ideal de formação a ser alcançado.

O MITO

Antes mesmo do advento da Filosofia o homem tinha já possuía a curiosidade de saber sobre a origem das

coisas, e mesmo sem ter a tecnologia de que dispomos hoje, eles tinham a imaginação trabalhando a todo vapor.

Com ela criaram diversas histórias que foram passadas de forma oral por várias gerações. A palavra grega mythos significa contar, narrar, conversar.

O mito é uma narrativa fantasiosa que visa dar uma explicação para a origem de determinada coisa, seja ela o homem, o amor, a doença, o mundo, os deuses, etc.

Mas além disso, é também uma forma de justificação da estrutura social da época. Dito de outro jeito, o mito é uma forma de ver não só o mundo natural, como também de entender e aceitar a divisão e funcionamento da sociedade.

Tanto é que os mitos se sustentam apenas na autoridade de quem os conta. O poeta-rapsodo, tem autoridade inquestionável, seja porque recebeu a narrativa de uma tradição oral respeitada, seja porque é considerado alguém escolhido pelos deuses para receber uma revelação e passá-la aos outros. Esses devem receber a informação como verdade inquestionável.

Desse modo, os mitos não dão espaço para questionamentos e nem reflexão, perpetuando a forma de ver e entender tanto o mundo natural quanto o social. Perceba que os grandes reis (basileu) são protegidos ou escolhidos pelos deuses e os grandes guerreiros, como Aquiles, possuem vínculos com eles. Você se atreveria a discutir com eles, ou questionar sua autoridade? Fica difícil, não é?

Os mitos sobre a origem do mundo são as cosmogonias (cosmos = mundo ordenado + gonia = gerar), já os que narram a origem dos deuses são as teogonias (theos = seres divinos + gonia = gerar. Admitem incoerências, contradições e são muito limitados deixando vários questionamentos em aberto.

No entanto, sucessivos acontecimentos acabaram derrubando muitas dessas explicações e uma nova forma de ver o mundo (incluindo a sociedade) precisava ser criada.

A PÓLIS E O SURGIMENTO DA FILOSOFIA

Com a segunda diáspora, começa o período arcaico (Sécs. VIII a VI a. C.), quando tivemos a formação de vários demos espalhados por todo o mediterrâneo, intensificando as trocas de mercadorias e fazendo florescer novamente o comércio. É importante destacar que nessa época surge a moeda como um meio de facilitar as transações comerciais.

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A partir daí, foi só questão de tempo para que os demos se unissem e formassem as póleis (eram mais de 1000), que foram governadas por conselhos de eupátridas (proprietários de terras) dando início aos regimes oligárquicos (governo de poucos). Eles desenvolveram leis, distribuíam a justiça, e ditavam a divindade a ser cultuada.

Agora, com um número muito maior de póleis, e várias delas sendo importantes centros comerciais e portos estratégicos para a navegação, a principal atividade econômica deixou de ser a agricultura, e o comércio passa a ser o seu principal fator de desenvolvimento econômico.

Esse desenvolvimento econômico proporcionou uma melhora significativa na qualidade de vida material da população. A partir daí os gregos passaram a ter tempo para fazer algo além de comercializar, eles agora iriam pensar.

A consolidação das póleis seguido de uma relativa estabilidade política e econômica, e um longo período de prosperidade foi o terreno fértil para o nascimento da Filosofia. Algumas invenções e atividades que se desenvolveram, ou foram criadas, juntamente com a polis foram cruciais para o seu surgimento. São elas:

As navegações – ao desbravarem os mares os gregos iriam realmente descobrir se existiam os monstros e sereias que os mitos contavam.

A invenção do calendário – isso proporcionou aos gregos verem que as estações do ano não eram vontade dos deuses mas fenômenos naturais que podiam ser previstos.

A moeda – Você certamente sabe quanto custa uma caneta, um caderno ou uma meia. Mas você sabe quanto vale um real? Sabe porque um real vale um real, e cem reais vale cem reais? Pois é, esse é um exercício de abstração que requerem cálculos complexo. Os gregos deixaram de trocar as coisas e passaram a usar a moeda quando adquiriam essa capacidade de abstração.

A escrita alfabética – se eu desenhar um homem e te mostrar, você vai saber que aquilo representa um homem. Mas se eu te mostrar esse símbolo A política – Esse ponto é bastante importante porque marca uma ruptura no modo de encarar a organização social. A pólis é um lugar onde os homens decidem o seu próprio destino, e não mais os deuses. E esse governo dos homens só era possível porque eles eram livres para criarem suas próprias leis, que eram fruto do debate público, ou seja, da palavra que era posta sob questionamento.

E esse tipo de discurso proporcionado pela atividade política foi fundamental para o surgimento do discurso filosófico, que nasceu como diálogo. A palavra que sempre pode ser debatida e questionada. Lembrem-se que no mito, a palavra era inquestionável.

Nas póleis gregas não havia muita diferença de riqueza entre os cidadãos e a monarquia não era a forma de governo predominante entre eles.

Todos eram responsáveis pela defesa da pólis, então, não fazia sentido não terem participação na tomada de decisões sobre os rumos da mesma. Foi assim que nasceu a política na forma de democracia.

Os gregos acreditavam que um homem livre que vivia em pleno gozo de suas faculdades mentais e corporais deveria viver em uma comunidade política que se autodeterminava por leis que ela mesma criava por meio do debate, e não por um homem (rei) ou alguma divindade.

A vida na pólis era voltada para que eles desenvolvessem plenamente suas capacidades humanas, fruto de sua natureza. Cada cidadão era estimulado a exercitar as virtudes e reprimir os vícios. E a justiça necessária para controlar esse lado ruim só pode ser encontrada em uma comunidade bem ordenada, de homens virtuosos, justos e livres, que governam a si mesmos, ou seja, na pólis.

Essa visão histórica da formação da sociedade grega desde os núcleos rurais até a formação das póleis, nos ajuda a entender não apenas o surgimento da filosofia, mas o por que dela ter sido uma invenção grega. Ela não foi um “milagre” repentino desse povo, mas o resultado de uma gestação que vinha acontecendo no seio das transformações ocorridas na sociedade grega durante séculos.

PRÉ-SOCRÁTICOS – OS PRIMEIROS FILÓSOFOS

Tendo Sócrates como a grande referência na filosofia antiga, os historiadores consentiram em chamar esse primeiro período filosófico de pré-socrático.

É de se ressaltar que essa convenção tem como critério não apenas uma ordem cronológica, mas a linha de investigação filosófica, pois ao tempo de Sócrates ainda haviam pré-socráticos.

Esses primeiros filósofos se preocuparam em tentar explicar a physis (natureza/mundo/universo) de

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uma forma racional (cosmologia), dando uma explicação diferente da dos mitos, que recorriam aos deuses.

Diferentemente da explicação mítica que dizia que o universo havia sido criado do nada, para eles o universo havia sido gerado de um princípio universal. E descobrir essa arché seria a chave para entender todas as coisas.

Eles acreditavam que a physis apesar de estar em constante movimento (devir) possuía um elemento de permanência e que este seria o seu princípio originador, seu fundamento, e explicaria a causa da mudança.

Dentre esses filósofos haviam os que acreditavam que a arché era um único elemento, estes eram os monistas. Mais tardiamente, outros pré-socráticos começaram a defender que eram vários, e ficaram conhecidos como pluralistas.

Tales de Mileto (640-546 a. C.), que talvez tenha sido o primeiro filósofo, e estava na lista dos sete sábios da Grécia, acreditava que a água era a origem de tudo.

Anaximandro (610-547 a. C.) dizia que o princípio criador não poderia ser conhecido pelos sentidos, mas somente pelo intelecto já que ele é o apeiron (indeterminado).

Anaxímenis (588-524 a. C.) argumentava que o ar seria esse princípio originador de tudo.

Pitágoras de Samos (570-490 a. C.) creditava aos números a origem de tudo, mas desde que entendidos como harmonia e proporção. Ou seja, tudo na natureza é proporcional e harmônico.

Heráclito de Éfeso (535-475 a. C.), um dos filósofos mais importantes desse período, atribuía ao fogo a origem das coisas, já que para ele a realidade/physis é uma eterna luta de contrários que tem esse elemento como sua causa.

Autor da famosa frase que caracteriza bem o seu pensamento: “Um homem não pode se banhar duas vezes no mesmo rio, porque na segunda vez o rio e o homem não serão os mesmos.”

Para ele, o universo está em constante mudança, tudo flui, tudo está em transformação constante. E isso é assim porque todas as coisas possuem os oposto em constante guerra. O real é a mudança e a permanência é ilusória.

Você já não é tão jovem quanto quando começou a ler essas palavras, mas ainda é jovem, mas está envelhecendo, mas ainda é jovem, mas está envelhecendo, mas ainda é jovem, mas está envelhecendo, mas ainda é jovem, mas está envelhecendo.

Parmênides (510-470 a. C.) de Eleia, rompe com os filósofos que o precederam na maneira de pensar o mundo. E por isso não se adequa a classificação de monista ou pluralista.

Ele afirmava que o elemento de permanência, de

origem, de fundamento, das coisas/mundo (physis) não pode ser encontrado na sua mutabilidade constante.

Melhor dizendo, não se pode encontrar o princípio (arché) imutável do universo na sua própria mudança, ainda mais quando a investigação é conduzida pelos sentidos.

Para ele a mudança seria apenas uma ilusão dos sentidos, e o que é essencial nas coisas só pode ser captado pelo pensamento. Por esse motivo, é que haviam tantas opiniões contrárias sobre o Ser das coisas, porque os filósofos estavam trilhando um caminho errado que só os levava à ilusão.

A mudança (devir) não existe, é uma ilusão dos sentidos, Heráclito estava errado. “O Ser é e o não ser não é”. O Ser é o Logos (razão), a permanência, é imutável e sem contradições.

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Continuaremos a estudar os outros filósofos pré-socráticos (pluralistas) quando adentrarmos no período clássico, por que contextualizando-os socialmente poderemos entender melhor suas teorias e a influência delas em seu meio social.

CAPÍTULO 2 – FILOSOFIA CLÁSSICA

A maturação e desenvolvimento da filosofia clássica ocorre em Atenas devido a uma série de acontecimentos que passaremos a analisar a seguir.

É importante entendermos o contexto histórico para que as teorias filosóficas desse período possam fazer sentido, pois a Filosofia como construção humana está limitada a seu tempo e contexto social, embora muitos queria fazer parecer que não.

ATENAS EM QUESTÃO

Atenas foi fundada pelos jônios na região da Ática. Inicialmente esteve sob o regime monárquico, e depois oligárquico. Era governada pelos Eupátridas (bem nascidos), que além de possuírem as maiores e melhores terras, ainda tinham como escravos outros atenienses, que foram pequenos proprietários de terras que não conseguiram saldar suas dívidas.

Sem um solo propício para agricultura, e com um porto (Pireu) estrategicamente localizado no Mediterrâneo, os Atenienses se lançaram ao mar. Tornaram-se grandes marinheiros e desenvolveram o comércio de forma significativa.

O comércio enriqueceu muitos atenienses que não tinham o sangue azul dos eupátridas e estavam doidos por participação política. A isso, some a insatisfação dos escravizados por dívidas, dos potencialmente escravos, e ainda, rebeliões provocadas por estes. Pronto, o barril de pólvora estava cheio e prestes a explodir.

Dracon em 620 a. C., tentou acalmar os ânimos tornando públicas por meio da escrita, as leis da pólis, que antes eram conhecidas só pelos eupátridas. Não adiantou muita coisa.

Agora pasmem, em 594 a. C., os grupos dominantes da época, decidiram eleger um homem sábio para fazer reformas que pudessem colocar fim ao clima de guerra que afligia a sociedade ateniense.

Escolheram Sólon, um dos sete sábio da Grécia, que instituiu profundas reformas na sociedade. Dentre as quais podemos citar:

Perdoou a dívida dos atenienses escravizados, e acabou com a escravidão por dívidas;

Limitou o tamanho da propriedade;

Modificou o critério de classificação social, do nascimento para a riqueza;

Com isso, modificou o critério para participação nos cargos públicos (magistraturas), permitindo a participação dos comerciantes na política;

Permitiu a participação de todos os atenienses na Assembleia (Eclésia), mesmo o mais pobre;

Criou a boulé, que era um conselho de 400 membros escolhidos pela Eclésia, e que tinha a função de criar projetos de leis para serem votados por esta;

Deu cidadania a todo aquele que contribuísse com a pólis.

Ficou decidido que, o que Sólon fizesse não poderia ser modificado por 10 anos. Então, depois de fazer essas reformas Sólon deixou Atenas, tanto para não perder sua vida, quanto para não usar de seu prestígio e tornar-se um tirano.

Apesar de profundas, essas reformas trouxeram ainda mais tensões. E de toda insatisfação emergiu em 546 a. C. o primeiro tirano de Atenas, Pisístrato.

Nessa época o termo tirano não tinha toda a carga negativa que tem hoje, e designava apenas uma forma ilegítima de governo. Não é que o tirano fosse cruel e mandasse cortar a cabeça de quem olhasse torto pra ele, é que ele não chegou ao poder com o apoio dos que detinham o poder.

Pisístrato foi até um bom governante, manteve inalteradas as leis de Sólon, construiu grandes obras, patrocinou as artes, os jogos e os festivais, e projetou Atenas como grande centro comercial e cultural da Grécia.

Seus sucessores foram uns bocós e não souberam se manter no poder, abrindo espaço novamente para conflitos internos, quando Clístenes toma o poder em 510 a. C.

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Clístenes governou Atenas de 510 a 507 a. C, e ousou muito ao dividir o território da Ática em 10 tribos, e cada tribo em 03 DEMOS. Com isso ele queria acabar com a influência das tradicionais famílias nobres aristocráticas.

É claro que para ocupar cargos públicos ainda era necessário ter uma certa quantidade de riqueza, como Sólon havia estipulado. Mas cada vez menos isso dependia da família a que se pertencia.

A boulé (que criava projeto de lei) passou a ter 500 membros. Cada DEMO elegia 50, e cada tribo a presidia sucessivamente durante o ano. Perceba o salto qualitativo nesse regime de participação política que mais tarde viária a ser chamado de DEMOCRACIA.

A Eclésia (assembleia popular) passou também a, além de votar, discutir os projetos de lei. Provavelmente a boulé tinha mais poderes que a Eclésia no início do processo de construção desse novo regime, mas com o tempo a situação se inverteu.

O OSTRACISMO foi uma instituição muito famosa criada também por ele. Não era uma pena, mas uma forma de defender o novo regime contra levantes tirânicos. Se uma pessoa estava se tornando demasiadamente famosa, prestigiada, e influente, ela era banida da pólis por um período de 10 anos e depois retornava como se nada tivesse acontecido.

Pense bem. Num regime onde todos devem ser iguais, não deve haver essas grandes personalidades, senão, não haveria isonomia, que era a base do sistema.

As reformas de Clístenes no sistema político de Atenas acabou influenciando toda a Grécia, e seu governo foi a transição entre o período arcaico e o clássico.

No período clássico (Sec. V ao IV a. C.), as Guerras Médicas (os medos faziam parte do povo Persa, daí o nome) foram o pano de fundo para um maior destaque de Atenas dentre todas as póleis gregas. Eles já estavam se sentido os maiorais por terem suas instituições como modelo do que de melhor se poderia ter. Agora, iam colocar os músculos para trabalharem.

Diante dessas invasões as póleis gregas, persuadidas por Atenas, fizeram uma aliança militar conhecida como Liga de Delos. Claro que isso tinha um custo, e que ninguém era obrigado a participar. No entanto, seria bom contar com uma certa segurança não é mesmo?

Inicialmente os recursos obtidos ficaram na ilha de Delos (por isso o nome), mas com o tempo foram transferidos para Atenas. Mesmo com o fim das ameaças externas a Liga permaneceu, e ninguém mais poderia dela se desligar, pois Atenas logo interferia. O que antes não era obrigação, tornou-se submissão.

Dessa maneira, portanto, Atenas, sob a liderança de um líder democrático, construiria com as riquezas dos outros a sua ERA DE OURO. Foi nessa época que a cidade foi embelezada com grandes templos e obras públicas. Só para se ter uma ideia, o Partenon, um dos maiores feitos de arquitetura da humanidade, foi erguido nesta época.

É inegável que toda a glória alcançada por Atenas teve como sustentação material a submissão das outras póleis.

No entanto, deve-se deixar bem claro que apesar da relação dos atenienses com os outros fosse de hostilidade, entre eles, imperava os ideais mais nobres como igualdade, liberdade e justiça. Em virtude disso, a forma de governo que tem por base esses ideais pôde florescer em sua plenitude.

Em Atenas o exercício da atividade política era básico, algo comum na vida de seus habitantes. A participação na tomada de decisões dos assuntos que dizem respeito à administração da pólis era a principal e mais nobre atividade que um homem livre poderia se dedicar.

Foi nessa época que surgiu na cena política ateniense um grande orador, de família aristocrática, e excelente estrategista militar.

Péricles (495 – 429 a.C.) liderou Atenas em seu esplendor (não é à toa que esse século recebeu seu nome), quando na assembleia, juntamente com seus concidadãos, aprimorou o regime democrático a ponto de afirmar o seguinte em seu discurso fúnebre:

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“Nosso regime político não se propõe tomar como modelo as leis de outros: antes somos modelos que imitadores. Como tudo nesse regime depende não de poucos, mas da maioria, seu nome é democracia. Nela, enquanto no tocante às leis todos são iguais para a solução de suas divergências particulares, no que se refere à atribuição de honrarias o critério se baseia no mérito e não na categoria a que se pertence...”

O primeiro cidadão ateniense instituiu a mistoforia, que era uma justa quantia em dinheiro para que mesmo o mais lascado dos homens livres pudesse participar diretamente da administração da cidade. Agora, não precisava mais nem ser de família nobre, e nem ter riqueza suficiente para ocupar determinado cargo.

Tal salário era necessário porque esses gregos acreditavam que todos os cidadãos eram iguais (isonomia) e por esta razão, tinham direito de se expressar (isegoria) na assembleia, e de ter participação no poder (isocracia). Para eles não havia outra maneira, a única forma de DEMOCRACIA era a DIRETA.

Basicamente, a estrutura política estava arquitetada da seguinte forma:

ASSEMBLÉIA – Conselho de cidadãos que tomavam as decisões mais importantes da pólis. Eles se reuniam no monte Pnyx (imagem abaixo). Claro que não tinham essas cadeiras, mas olhe a vista que eles tinham da acrópole. Imagine os atenienses tomando as decisões da pólis com a vista das maravilhas que eles foram capazes de fazer. Era mesmo algo grandioso.

BOULÉ – Conselho de 500 cidadãos que propunham as leis.

ESTRATEGO – 10 generais com mandatos de 01 ano.

Para todos os cargo públicos uma pessoa só podia ser eleita uma única vez na vida, para dar oportunidade para outros participarem do poder. Na boulé podia-se eleger duas vezes, e para estrategos podia ser indefinidas vezes, isso por que esse cargo exigia habilidades especiais de guerra.

Somente podiam participar desses cargos os homems filhos de pais atenienses maiores de 20 anos, pois apenas eles eram considerados Zoôn politikons. Eram membros de famílias aristocráticas, pequenos proprietários de terras, comerciantes e artesãos.

Mas a sociedade ateniense não era formada apenas por eles; haviam também os que eram excluidos da cidadania. Nesse grupo temos os metecos, que eram os estrangeiros residentes ou não na pólis; as mulheres, que serviam basicamente para cuidar da casa e reproduzir; e finalmente os escravos, que eram os prisioneiros de guerra.

Não por coincidencia, os escravos começaram a aumentar quando a democracia estava em seu auge. Ora, para haver tempo livre para os cidadãos se dedicarem à política alguem tinha que ficar trabalhando. Estimasse que eles fossem ¼ da popolação, no máximo.

Em Atenas não havia tratamento duro com os escravos, não existiam pessoas acorrentadas andando pelas ruas, chicotadas e esquartejamentos em praça pública. Pelo contrário, era muito comum os escravos serem libertados.

Habitantes de outras póleis estranhavam quando andavam nas ruas de Atenas e viam escravos andando na rua como se fossem livres.

Nas fazendas e no mercado eles trabalhavam lado a lado com o seu senhor. Não há nenhum registro de rebeliam de escravos em Atenas. A possibilidade de conquista da liberdade que estava no horizonte, abrandava a relação entre senhor e escravo.

OS PLURALISTAS

Nesse período a filosofia continuou progredindo com os filósofos pré-socrático. O próprio Péricles tinha um desses sábios como mestre, seu nome era Anaxágoras (499-428 a. C.). Ele defendia que o princípio gerador de todas as coisas não é único, que

a physis era formada de várias partículas (sementes – espermatas) ordenadas por uma inteligência universal.

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Diferentemente dele, Empédocles (490-430 a. C.) acreditava que os elementos água, terra, ar e fogo eram os princípios criadores, que formavam as coisas pela união e repulsão, pelo amor e ódio.

Demócrito (460-370 a. C.) era contemporâneo de Sócrates, mas como o objeto de sua investigação ainda era a physis, ele é considerado um pré-socrático.

Segundo ele, o mundo é formado por partículas invisíveis e indivisíveis chamadas átomos, que se chocavam ao acaso no vazio para formar os corpos percebidos pelos nossos sentidos.

Percebam que esses pré-socráticos do período clássico, defendem não um, mas vários os elementos criadores do universo.

Será coincidência eles defenderem isso no tempo em que a constituição da pólis, ou seja, do mundo social, dependesse de muitos e não de um só? Ou terá sido essa forma de organização social fundamentada nessa nova visão da constituição do universo?

Independentemente da resposta, o fato é que havia agora uma nova visão do mundo, seja ele físico ou social, e em ambos não havia mais o predomínio de uma arché que a tudo governava, mas, a relação entre vários elementos que regidos por leis constituíam o cosmos.

No mundo da physis cabia aos homens descobrirem essas leis, no mundo da pólis cabia a eles criarem-na. E essa atividade divina de criarem as leis, que trariam ordem ao caos, era feita no espaço público da pólis, na ÁGORA (praça central onde se discutiam diversos assuntos), por meio da palavra, através do discurso.

SOFISTAS

É também nesse contexto de valorização do humano, da palavra, de se expressar bem e de convencer o público por meio da oratória para se sair bem no cenário político, que surgiram os sofistas, um conjunto de sábios que ensinavam retórica (arte de falar bem e persuadir o público).

A palavra sofista vem do grego sophós e quer dizer sábio. Eles eram homens que viviam viajando entre as

póleis vendendo seu conhecimento, pois não eram ricos para se manter no ócio intelectual.

Protágoras (480-410 a. C.) foi o primeiro e mais ilustre dos sofistas. Nascido em Abdera, mudou-se para Atenas onde se tornou muito famoso e requisitado pelas famílias ricas.

Defendia que não havia um conhecimento e uma verdade absolutas sobre as coisas, e que o mundo era relativo ao que os homens percebiam dele. Daí sua famosa frase: “o homem é a medida de todas as coisas”.

Sua doutrina relativista impossibilitava a construção de um saber objetivo no qual se pudesse chegar a critérios que estabelecessem e diferenciassem o verdadeiro do falso, o certo do errado. Tudo dependia de quem ou que grupo estava falando. As regras sociais, bem como a própria pólis são convenções, e como tal, mudam de acordo com que as convencionou, sendo, portanto, relativas.

O maior crédito que se deve atribuir aos sofistas foi o de ter voltado o debate filosófico da cosmologia, para a área do humano, da pólis, da ética, da política. Pois foi por se contrapor a eles que Sócrates deu início ao conhecimento filosófico herdado pelo ocidente.

SÓCRATES

Sócrates (470 – 399 a. C.) foi um marco na filosofia grega. Não deixou nada escrito e o que sabemos de seu pensamento é o relatado por seu discípulo Platão. Ele nasceu em Atenas, foi contemporâneo de Péricles, e crítico do regime democrático.

Ele viveu na época da GUERRA DO PELOPONESO (431-404 a. C.), que foi motivada pela forma autoritária e abusiva com que Atenas tratava os seus aliados.

Um grupo de póleis cansada da tirania Ateniense, sob a liderança de Esparta, formaram a Liga do Peloponeso, para enfrentá-la. Essa guerra foi o grande motivo da decadência das póleis gregas, pois elas foram se destruindo e abrindo espaço para que inimigos externos pudessem conquista-las.

Sócrátes participou de algumas batalhas, sendo condecorado por bravura.

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O Oráculo de Delfos o celebrou como o mais sábio dos homens por ele ter consciência de sua própria ignorância.

Ele travou um grande embate com os sofistas ao dizer que estavam errados, que poderíamos sim obter um conhecimento objetivo, um saber verdadeiro. Sustentava que o homem poderia conhecer a essência das coisas e que a primeira pergunta a ser respondida era qual a sua própria essência.

Para ele, a essência do homem é a sua alma, entendida como consciência de si. É isso que distingue o homem dos outros animais. Não é à toa que ele instigava seus discípulos a terem esse conhecimento, pois era isso que os tornavam humanos. “Conhece-te a ti mesmo” estava escrito no pórtico do oráculo que afirmou ser ele o mais sábio dos homens.

Mas essa consciência de si não era só o simples saber de um eu individual. Era a consciência de que somos parte integrante de um conjunto de relações que formam um todo maior, e que por fazer parte desse todo é que temos o poder e o dever de conhecer sua essência.

Desse modo, temos o poder de ter essa consciência moral que nos guia na interação com nossos semelhantes. Nessas relações só podemos agir conscientes se tivermos conhecimento da essência das coisas, sejam elas o bem, a amizade, a virtude, ou até mesmo a democracia.

O interessante é que Sócrates não trazia respostas prontas. Por meio do diálogo, ele se posicionava como um ignorante e começava a questionar as pessoas sobre o que eles pensavam saber, mostrando-lhes que nada sabiam, e que o que sabiam eram crenças que lhes foram passadas como verdades sem nenhum tipo de reflexão crítica. E ao final, ele fazia a própria pessoa chegar à verdade.

Talvez se ele aparecesse com verdades prontas não teria sido Sócrates, mas apenas mais um sabichão metido a besta. No entanto, como ele fazia a pessoa ver a verdade pro si própria, por meio da maiêutica, ele foi o mais sábio dos homens e por isso um perigo para o sistema.

Ora, pensemos um pouco. No auge do imperialismo ateniense, quando eles eram tomados como modelos pelas outras pólis (como o próprio Péricles afirmou acima); quando eles tratavam seus “aliados” da Liga de Delos como bem entendiam, usando os recursos da Liga para tornar Atenas a mais bela e poderosa pólis que já existira; quando eles estavam maravilhados com seu regime político, que eles próprios criaram; vem um cara e começa a botar caraminholas na cabeça dos jovens

perguntando: “será mesmo que vivemos uma democracia, quando temos um regime político que permite a um bom orador ir à assembleia e fazer um discurso bonito e pomposo que leve o povo a aprovar o que ele quer sem o mínimo de reflexão?”, “será que é certo tratarmos nossos aliados com toda essa arrogância, e usando mais a força que a justiça em nossas relações?”, “será mesmo bom essa democracia onde qualquer um possa influir nos destinos da pólis, mesmo não tendo conhecimento do que seja bom e justo?”.

Entendem agora porque Sócrates era um perigo a ser exterminado o mais rápido possível? Era um traidor, um corruptor da juventude.

A Guerra do Peloponeso durou 27 anos e terminou com a vitória de Esparta, no entanto, acabou deixando as partes envolvidas enfraquecidas.

Desde a derrota de Atenas nessa guerra, o regime democrático ficou desacreditado pelos próprios ateniense, e muitos deles começaram a criticá-lo. Eles argumentavam que em momentos cruciais da guerra, foram tomadas muitas decisões estúpidas por que foi colocado para a maioria decidir, e isso levou à derrota de Atenas.

O regime democrático ateniense foi substituído por uma oligarquia comandada por 30 tiranos indicados por Esparta. Nesse tempo ficou proibido o debate em público e o ensino de retórica. Mas, alguns anos depois a democracia foi restaurada e Sócrates voltou a importunar.

Ele foi acusado e, por mais forte que fossem seus argumentos de defesa, foi condenado, porque sua condenação já era certa desde antes mesmo do julgamento começar. Bebeu cicuta mas não renunciou ao que disse. O cara era macho, que nem outro barbudo que vocês ouvem falar desde criancinha.

PLATÃO

Platão (427 – 347 a. C.) foi o maior discípulo de Sócrates, e era um homem de família aristocrática e influente na política. Como todo jovem ateniense, era um entusiasta do regime democrático até conhecer seu mestre aos vinte anos de idade.

Sob influência de Sócrates passou a ser também crítico do regime, e depois de sua morte deixou de

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acreditar na possibilidade de uma vida justa e feliz. Deixou Atenas para fazer uma longa viagem, quando voltou e fundou a Academia, onde pôde desenvolver suas teorias e repassá-las a seus vários discípulos.

Na busca de um conhecimento verdadeiro, buscou um meio de contornar o beco sem saída deixado por Heráclito e Parmênides. Grande parte de suas ideias estão escritas em sua mais famosa obra, a República.

Metafísica

O constante devir que Heráclito afirmava ser a realidade foi chamado de mundo sensível (material) por Platão. Esse mundo captado pelos sentidos, a causa de nossos erros e ilusões, era uma cópia imperfeita do mundo das ideias (inteligível), que correspondia à permanência de Parmênides, um mundo captado apenas pelo pensamento, e, portanto, perfeito.

Tudo que existe nesse mundo material é porque tem sua ideia no mundo superior. Apesar da multiplicidade com que ela possa aparecer no mundo sensível, a ideia é uma só, indestrutível e eterna. Segundo

Platão, apesar de existirem diferentes tipos de cavalo, a ideia de cavalo é uma só. Quando pensamos em cavalo, pensamos a ideia e não determinado cavalo.

Mas como foi que aconteceu essa cópia? Platão nos diz que foi um demiurgo (construtor) que plasmou do mundo das ideias esse mundo imperfeito. Tudo que existe nesse mundo em que vivemos, já existe no mundo superior das ideias.

Seguindo esse raciocínio, a pólis deveria ser organizada de acordo com a pólis ideal, para que seus cidadãos pudessem viver de acordo com o supremo bem e a justiça.

Mas como fazer isso? Como conhecer esse mundo ideal e verdadeiro para viver de acordo com o que é bom e justo nesse mundo de erros, se eu estou nesse segundo e tudo que percebo vem dele?

Platão afirma que somente pela dialética é possível alcançar gradativamente o que é verdadeiro, e passar das ilusões ao real. Importante deixar claro que a dialética Platônica é o que a etimologia da palavra sugere, um diálogo crítico em busca da verdade que se passa do senso comum ao conhecimento verdadeiro.

Ele explica essa passagem do falso ao real pela alegoria do mito da caverna, ilustrada na figura abaixo.

Aqueles caras deitados no chão nasceram e cresceram ali, e a única coisa que eles viam eram aquelas sombras. Por nunca terem visto outra coisa, eles julgavam que aquelas sombras eram os objetos verdadeiros.

Só que um dia, um deles consegue se soltar e sair da caverna. Lá fora, ele não consegue enxergar nada porque é quase cegado pela luz do sol. Aos poucos ele vai conseguindo ver as coisas e se dá conta que aquilo que viam na caverna eram apenas as sombras, que eles tomavam por verdadeiro aquilo que era falso.

Depois, ele volta para alertar os outros de sua condição, mesmo sabendo que eles podem não acreditar no que ele estava dizendo. Alguns dizem que ele está louco e outros decidem acompanhá-lo.

Política

Platão não via a democracia como um bom regime, foi a democracia que matou o mais sábio dos homens. E foi a democracia que levou Atenas à guerra e à ruía. Como é que pessoas não instruídas sobre valores como o bem comum, amizade, virtudes, justiça, podem governar? Já imaginou dar poder de governar àqueles caras acorrentados na caverna que só veem sombras? Seria um desastre. Como de fato foi.

Por isso que ele defende que quem deve governar a cidade são os filósofos, aqueles que saíram da caverna (mundo sensível) e conheceram a realidade (mundo das ideias). Só eles possuem as virtudes e o conhecimento necessário (as ideias) para dar à pólis uma estrutura bem ordenada de forma que o bem e a justiça possam reger as relações entre seus cidadãos.

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Esses filósofos não pertenceriam a classe social alguma. Em, A República, ele apresenta um processo de educação que começa aos 07 e vai até os 30 anos, sendo que todos participam, independente da classe social e do sexo. Isso mesmo, Platão defendia que as mulheres poderiam ser educadas para participar da vida pública.

Platão entendia o homem como sendo corpo e alma. Esta, que antes era livre no mundo das ideias, agora vive prisioneira no corpo, esquecendo-se de tudo que já havia contemplado. Ela seria composta por três partes: a racional, representada pela inteligência; a emotiva, representada pelas emoções; e a apetitiva, representada pelos desejos carnais de sobrevivência e reprodução. Se livrar das emoções e desejos carnais era necessário para contemplar o mundo das ideias, porque eles não fazem parte daquele mundo.

Esse processo educacional, serviria para fazer a alma atingir o mundo das ideias, ou seja, relembrar (processo de reminiscência da alma) do lugar de onde veio. Por isso, só completariam todo o percurso educacional aqueles que adquirissem e exercitassem as virtudes necessárias a fazer com que a parte racional de sua alma se sobrepusesse acima das partes emotiva e apetitiva que o deixa preso nesse mundo de aparências. Somente esses seriam filósofos.

Em uma pólis bem ordenada os seus habitantes seriam divididos em três grupos, de acordo com suas virtudes, assim como a alma. Os que cuidam da subsistência (agricultores, comerciantes, artesão, etc), os que a defendem (guerreiros), e os que a governam (os filósofos). Cada um, ao exercitar suas virtudes, desempenha um papel na sociedade, contribuindo como podem para o seu bom funcionamento.

ARISTÓTELES

Juntamente com Platão, Aristóteles (384 – 322 a. C.) é a grande referência da filosofia grega antiga que vai influenciar na construção do mundo ocidental. Dante Alighieri dizia que ele foi o mestre dos mestres, e São Tomaz de Aquino se referia a ele como “o” filósofo.

Ele foi o pensador que analisou todo o pensamento grego e o melhorou; escreveu sobre quase tudo, de metafísica à biologia. Em resumo, ele foi “o cara”. Por isso, devemos estudar Aristóteles como o

porta-voz dos gregos instruídos, pois era assim que ele se considerava.

Apesar de ter sido um dos maiores pensadores que Atenas produziu, ele era um meteco, e como tal, sem direitos políticos.

De Estagira, na Macedônia, Aristóteles sai aos 18 anos para estudar na Academia de Platão em Atenas. Isso, provavelmente, uns 10 anos antes do domínio macedônico sobre a Grécia. Com uma mente notável, permanece por lá durante 20 anos até a morte de Platão.

Após a morte do mestre, a quem Aristóteles era muito amigo e admirador, não vê mais motivos de continuar na academia e sai de Atenas para viajar por um bom tempo.

Em 335 a. c., o rei Felipe II o chama para morar em Pela, capital do império macedônico, e ser professor de seu filho Alexandre, condição na qual permaneceu até este assumir o poder. Essa proximidade com a corte macedônica se dava pelo fato de Nicômaco, seu pai, ter sido o médico do rei Amintas, pai de Felipe.

Aristóteles foi um grande pensador sistemático, que dividiu os saberes em:

Produtivos – que se destinam a produção das coisas que são úteis aos homens. Ex: artes, arquitetura, carpintaria, etc.

Práticos - que tratam das práticas que os homens mantem entre si. Ex: política, ética, economia, etc.

Teóricos – dispõem sobre os conhecimentos contemplativos da realidade, das coisas que existem independentes do homem. Ex: física, matemática, astronomia, etc.

Metafísica

Segundo ele, enquanto os saberes particulares refletem sobre os seres particulares sujeitos ao movimento (devir), existe um saber que reflete sobre todos esses seres em conjunto, que estuda o que há de comum a todos eles, e que os estruturam em um todo organizado.

Esse saber ele chamou de Filosofia Primeira, que mais tarde ficou conhecida como Metafísica (meta + físico = além do físico). É ela que analisa os princípios e a essência última do mundo, do universal, contida em todos os seres. É ela que diz se o objeto (esse mundo que nos rodeia) dos saberes particulares é real e verdadeiro.

Na sua investigação do que seja a realidade, afim de fundar um conhecimento verdadeiro das coisas,

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Aristóteles superou Heráclito, Parmênides, e deu uma resposta diferente da de Platão, criticando a posição de seu mestre.

Para ele, esse mundo material que nos envolve e que é mutável, não é uma ilusão ou cópia imperfeita de algo (Parmênides e Platão), mas também não é toda a realidade (Heráclito).

A mudança não é algo que torne as coisas ilusórias ou imperfeitas, mas é na realidade a sua essência. E se Parmênides e Platão dizem que não dá para construir um conhecimento verdadeiro sobre ela, Aristóteles afirma que eles estão errados, que dá para obter um conhecimento verdadeiro desse mundo, esse conhecimento é a Física.

Crítico do dualismo platônico, ele não acreditava que deveríamos conhecer primeiro um mundo intelectual para só assim conhecermos o mundo material. Aristóteles voltou a investigação filosófica para a matéria afirmando que o ser (o real/inteligível) encontra-se nela, na matéria, e que a possibilidade de compreensão e apreensão do real (ser) deve-se dar a partir dela. Essa discordância com Platão ficou bem retratada na obra do renascentista Rafael Sanzio.

Ele acreditava que existe uma ordem (inteligência) regendo todos os seres (matéria). Cada objeto que existe possui essa ordem dentro de si, que o constitui, que o faz ser como ele é, e que pode fazer ele se tornar algo melhor, sempre almejando uma finalidade. Ou seja, o inteligível está nas coisas e não separado dela em um mundo exterior.

O que faz cada ser, ser o que é, Aristóteles denominou de Substância/essência, e pelo fato do homem ser dotado de consciência (racional), ele pode conhecer a essência/substância das coisas.

Esse conhecimento se dá, segundo ele, quando investigamos vários particulares até abstrairmos uma essência comum a todos, na qual podemos generalizar através do conceito geral/universal. Esse método de ir do particular ao geral é a indução.

Para Aristóteles, os seres se diferenciam pela quantidade de movimento a que estão sujeitos, e a depender dessa quantidade existe um conhecimento próprio ao seu estudo.

De acordo com a metafísica aristotélica, todo ser físico possui uma matéria de que é feito e uma forma que o individualiza. Essa matéria possui a capacidade de se tornar algo diferente, de assumir outra forma, atualizando-se. E é o movimento que lhe é inerente, essencial, que faz acontecer essa mudança.

Desse modo, os conceitos que Aristóteles desenvolveu em sua metafísica para entender a realidade são:

Matéria – é aquilo do que o ser é feito.

Forma – é o que o individualiza, tornando-o o que ele é.

Potência – é capacidade/possibilidade que a matéria tem de mudar.

Ato – é a forma que ele está assumindo agora.

Substância – é a essência do ser, aquilo que o faz ser o que é.

Acidente – são as características não essenciais do ser, que, caso ele tenha ou não, não o impede de ser o que ele é. Exemplo: grande/pequeno, amarelo/azul, leve/pesado, etc.

Mas quais são as causas dessa mudança, do movimento. Aristóteles diz que são quatro, a saber:

Causa material – refere-se à sua matéria. Uma pedra nunca vai ser um homem adulto

Causa eficiente/motora – refere-se àquilo que age sobre a matéria para que ela adquira outra forma.

Causa formal – refere-se àquilo que a matéria tende a se tornar.

Causa final – refere-se ao propósito ao qual a matéria sofreu todo o movimento para se tornar o que é.

Lembre-se sempre que no pensamento aristotélico, TODAS as coisas tem uma finalidade, tudo tem um propósito e uma função. A causa final é a causa mais importante de todas, é a inteligência (o logos)

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ordenando o mundo, e todos os seres estão sujeitos a ela, sejam eles animados ou inanimados. Tudo tem seu propósito e fim. Por essa razão é que o pensamento aristotélico é chamando de teleológico (telos + lógico = fim ordenado).

E quando ele investiga a causa das causa ele se depara com o princípio causador de todas as causas, qual seja, o Primeiro Motor Imóvel. Ele é ato puro, não sujeito a nenhum tipo de movimento, é o incausado que é a causa de todas as causas.

Política

Assim como o próprio Platão percebeu mais tarde que seu projeto de funcionamento de uma pólis ideal governada por reis filósofos não era viável, Aristóteles também sabia que esse projeto nunca daria certo.

Tendo isso em mente, ele elaborou um projeto político que fosse viável, e desenvolveu uma política para o homem comum. Mas não entenda esse homem como qualquer um. É o homem bem instruído, e de determinadas posses, que o permitisse ter ócio suficiente para se voltar aos estudos e à política.

Nessa linha de raciocínio, a polis que esse homem habitaria seria a melhor possível. Ela teria sua constituição como sendo um reflexo desse tipo de homem. E como seria essa polis?

Para dar essa resposta, Aristóteles analisou 158 constituições diferentes, e definiu os tipos possíveis de governo conforme o quadro abaixo:

BOM RUIM

UM MONARQUIA TIRANIA

POUCOS ARISTOCRACIA OLIGARQUIA

MUITOS REPÚBLICA DEMOCRACIA

A corrupção de um regime a outro, acontece quando quem governa se desvia do objetivo de atingir o bem comum, e passa a governar de acordo com seus interesses.

Quanto à melhor forma de governo, Aristóteles diz que vai depender do tipo de povo. Segundo ele, existe uma disposição natural em cada povo que o torna propício a determinada forma de governo. Particularmente, ele prefere a monarquia, e argumenta

que dentre as formas corrompidas de governo, a democracia é a melhor.

Para compreendermos bem o pensamento aristotélico sobre a política e a ética é importantíssimo sabermos que ele não entendia as duas separadamente. Isso porque ele, assim como os gregos instruidos, não entendia um modo de ser, um comportamento do ánthropos (homem) que não fosse o mesmo do zoôn politikon (animal político). Ser homem para ele era ser cidadão.

Tanto é que a palavra ética vem de ethos que de forma abrangente quer dizer modo de ser, e a palavra política vem de polis + ética, ou seja, o modo de ser da pólis. Não existe comportamento racional/inteligível que não seja dentro da pólis.

Segundo ele, um homem que não vivesse em comunidade, ou era um deus, ou uma fera. E se vivesse em comunidade que não fosse uma pólis, seria inferior. Por isso que um estrangeiro era inferior a um grego e era legítimo que ele fosse escravizado. Por isso, Aristóteles condenava a escravidão entre homens livres, por ser contrário à natureza das coisas.

Aí você pode pensar, mas não é todo mundo gente do mesmo jeito? Nananinanan, não. Vamos botar os pingos nos ís. Aristóteles tinha em mente que todos nós, gregos ou não, somos zoôn (animais), mas apenas os que vivem numa comunidade política, numa pólis, são zoôn polítikon, são ánthropos (ανθρώπου).

Ora, nós vimos acima que o pensamento racional surgiu com a pólis. A racionalidade, que é uma descoberta grega, que era, portanto, grega, é uma racionalidade política, no sentido de comunitária, e o que faz o ánthropos (homem) ser superior aos outros animais é justamente isso, ser racional. Mas ele só pode ser racional se fizer parte dessa comunidade política que é a pólis, pois somente nela, ele pode desenvolver a sua natureza racional. E se é assim, a pólis também é algo natural ao homem.

As leis que regem a pólis são criações da palavra (logos/razão), que não é mais ditada pelos deuses a um sacerdote que a transmite aos homens. Ela é genuinamente humana, fruto do debate, da dialética, expressão do logos (razão) que organiza a pólis e reina sobre os homens, não todos os homens, mas sobre os gregos.

É essa palavra (logos) que é o conhecimento do que é útil, do bem e do mal, do justo e do injusto; e viver de acordo com a justiça é viver a boa vida, permitida apenas na pólis. É isso que faz de um grego, um zoôn

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(animal) politikon (superior), e somente este é ánthropos (ανθρώπου).

Repito, tudo isso de que estamos falando foi construído por eles, por isso, não é obra do homem em geral, mas dos gregos em particular. Aristóteles está falando para os gregos, ele está ensinando a eles, e não a todos os homens do planeta. E por que não?

Por que ele acreditava que só os gregos eram capazes de entender o que ele estava dizendo, e é aqui que reside o preconceito que não é só de Aristóteles, mas dos gregos em geral.

Ética

Como viver essa boa vida, que só era possível participando da pólis? Aristóteles deixou essa resposta em sua obra Ética a Nicômaco. Como já vimos, ele concebia que tudo tem um fim, e não seria diferente com as ações humanas, que devem ser realizadas objetivando atingir o bem supremo que é a eudaimonia, comumente traduzida por felicidade.

Não devemos entender essa felicidade como uma emoção que temos quando algo bom nos acontece. Ela está mais para um estado de plenitude, uma forma de viver plena, voltada para o bem, para o saber, para a justiça, no aperfeiçoamento constante do caráter. E viver dessa forma não é possível sem as virtudes.

As virtudes são as qualidades do caráter que nos permitem conseguir os bens necessários (materiais e imateriais) para viver plenamente, ou seja, ter uma vida feliz. E a principal delas é a phronesis, a nossa conhecida prudência.

Ela é a sabedoria, o saber prático necessário, a chave da felicidade, para viver moderadamente. É a prudência que nos permite viver sem exageros e nem deficiências, ou seja, no meio termo. É essa virtude que nos permite saber como agir moderadamente em cada situação particular.

CAPÍTULO 3 – FILOSOFIA HELENISTICA

CONTEXTO HISTÓRICO - ALEXANDRE O GRANDE

Enfraquecidos pela Guerra do Peloponeso, os gregos não resistiram ao ataque macedônico na BATALHA DE QUERONEIA (338 a. C.) e sucumbiram diante do rei Felipe II.

O domínio macedônico não ficou só na Grécia. Com a morte do rei Felipe II, seu filho Alexandre (336 –

323 a. C.) de apenas 18 anos, assume o poder e conquista os grandes domínios do Império Persa, expandindo o poderio macedônico até a Índia.

Alexandre foi educado nos costumes gregos, teve Aristóteles como seu professor, e espalhou a cultura grega por um vastíssimo território. A expansão e mistura da cultura grega com a dos povos orientais originou o que foi conhecido de Helenismo.

Seu império não resistiu à sua morte, foi dividido entre seus generais, e foi conquistado pelos romanos. No entanto, as cidades fundadas por ele continuaram transmitindo a cultura grega pra diversos povos ao longo de séculos. Como exemplo, podemos citar Alexandria no Egito, Pérgamo na Ásia Menor, e a Ilha de Rodes no Mar Egeu.

Alexandria foi a que mais se destacou ao possuir a maior biblioteca do mundo de sua época, e por ter formado uma escola com grandes pensadores.

Abaixo, mapa indicando o tamanho da expansão do Império Macedônico.

Alexandre com suas expansão promove gradualmente a queda da pólis. Ele dá início ao primeiro projeto de globalização, com a convivência de povos de diferentes costumes vivendo sob um mesmo território e domínio.

Esse novo mundo que Alexandre estava criando requeria um novo homem, que deixaria de ser um cidadão da pólis para ser um cidadão do mundo, da cosmopólis, ou seja, um cosmopolita.

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Dessa maneira, todo aquele corpo teórico sustentado pelos filósofos gregos, que concebia a pólis como sendo o único lugar onde o homem poderia exercitar suas virtudes e fazer florescer suas potencialidades, foi perdendo sentido, pois a pólis estava deixando de existir em seu formato original.

Essas mudanças na forma de ver o mundo colocava novas questões que não podiam ser respondidas pelos escritos filosóficos já existentes.

É nesse contexto que surgem novas correntes de pensamento filosóficas, como respostas às novas questões postas por essas transformações.

Epicurismo

Fundada por Epicuro (341 – 271 a. C), o epicurismo ensinava que os homens devem se libertar dos medos e viver uma vida voltada para os simples prazeres (hedonismo), como beber quando se tem sede, comer quando se tem fome, aproveitar a presença dos amigos e familiares. Tudo com moderação.

Estes prazeres seriam entendidos como a superação dos desejos estimulados em sociedade, como a busca por fama, riqueza e poder. A felicidade seria, portanto, essa libertação dos desejos e prazeres, com o objetivo de se levar uma vida serena e simples, própria de um sábio.

Estoicismo

Outra doutrina foi a de Zenão de Cício (336 – 263 a. C.), que ficou conhecida por estoicismo. Segundo ela, o homem deveria viver indiferente aos problemas da vida. Teria que desprezar totalmente qualquer tipo de prazer, pois os entendia como a causa dos males.

Para esse filósofo, o homem deveria dedicar-se apenas à sabedoria sobre a ordem do cosmo para viver de acordo com ele, pois o homem não pertence a lugar nenhum, mas ao mundo.

Ceticismo

Pirro de Élida (360-270 a.C.) foi o maior nome dessa corrente filosófica. Ele tirou suas conclusões depois de participar das expedições de Alexandre o Grande, onde percebeu, ao ter contato com diversas culturas, que não há como se ter conhecimento do que seja verdadeiro ou falso, e que a maior sabedoria que o homem poderia alcançar é a aceitação desse fato. E negar isso é a causa de todos os males e infelicidades.

Cinismo

Figura emblemática do cinismo é Diógines de Sínope (400-325 a. C.), mais conhecido como Diógines o cão. Ele viveu em Atenas de acordo com o que acreditava, morando em um barril e comendo apenas o os outros lhe davam, pois o cinismo pregava que as pessoas deveriam viver da forma mais simples possível, como um cão, desprezando todas as convenções sociais.

Tudo que era natural deveria ser feito aos olhos de todos, e considerava coisas tolas a riqueza, fama, poder, e honras.

Em busca de uma pessoa que não fosse corrupta, ele andava com uma lanterna interpelando a todos que encontrava.

Certa vez o imperador Alexandre foi ao seu encontro e disse que lhe daria qualquer coisa que ele pedisse, quando então, Diógenes pediu apenas que eles saísse da frente do sol, pois estava impedindo-o de receber sua luminosidade.

QUESTÕES 1. (2012) TEXTO I

Anaxímenes de Mileto disse que o ar é o elemento originário de tudo o que existe, existiu e existirá, e que outras coisas provêm de sua descendência. Quando o ar se dilata, transforma-se em fogo, ao passo que os ventos são ar condensado. As nuvens formam-se a partir do ar por feltragem e, ainda mais condensadas, transformam-se em água. A água, quando mais condensada, transforma-se em terra, e quando condensada ao máximo possível, transforma-se em pedras.

BURNET, J. A aurora da filosofia grega. Rio de Janeiro: PUC-Rio, 2006 (adaptado).

TEXTO II

Basílio Magno, filósofo medieval, escreveu: “Deus, como criador de todas as coisas, está no princípio do mundo e dos tempos. Quão parcas de conteúdo se nos apresentam, em face desta concepção, as especulações contraditórias dos filósofos, para os quais o mundo se origina, ou de algum dos quatro elementos, como ensinam os Jônios, ou dos átomos, como julga Demócrito. Na verdade, dão impressão de quererem ancorar o mundo numa teia de aranha.”

GILSON, E.: BOEHNER, P. Historia da Filosofia Crista. São Paulo: Vozes, 1991 (adaptado).

Filósofos dos diversos tempos históricos desenvolveram teses para explicar a origem do universo, a partir de uma explicação racional. As teses de Anaxímenes, filósofo

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grego antigo, e de Basílio, filósofo medieval, têm em comum na sua fundamentação teorias que a) eram baseadas nas ciências da natureza. b) refutavam as teorias de filósofos da religião. c) tinham origem nos mitos das civilizações antigas. d) postulavam um princípio originário para o mundo. e) defendiam que Deus é o princípio de todas as coisas.

2. (2012) Para Platão, o que havia de verdadeiro em Parmênides era que o objeto de conhecimento é um objeto de razão e não de sensação, e era preciso estabelecer uma relação entre objeto racional e objeto sensível ou material que privilegiasse o primeiro em detrimento do segundo. Lenta, mas irresistivelmente, a Doutrina das Ideias formava-se em sua mente.

ZINGANO, M. Platão e Aristóteles: o fascínio da filosofia. São Paulo: Odysseus, 2012 (adaptado).

O texto faz referência à relação entre razão e sensação, um aspecto essencial da Doutrina das Ideias de Platão (427 a.C.-346 a.C.). De acordo com o texto, como Platão se situa diante dessa relação? A) Estabelecendo um abismo intransponível entre as duas. B) Privilegiando os sentidos e subordinando o conhecimento a eles. C) Atendo-se à posição de Parmênides de que razão e sensação são inseparáveis. D) Afirmando que a razão é capaz de gerar conhecimento, mas a sensação não. E) Rejeitando a posição de Parmênides de que a sensação é superior à razão.

3. (2014)

No centro da imagem o filósofo Platão é retratado apontando para o alto. Esse gesto significa que o conhecimento se encontra em uma instância na qual o homem descobre a A) suspensão do juízo como reveladora da verdade. B) realidade inteligível por meio do método dialético. C) salvação da condição mortal pelo poder de Deus. D) essências das coisas sensíveis no intelecto divino. E) ordem intrínseca ao mundo por meio da sensibilidade. 4. (2009.2) Segundo Aristóteles, “na cidade com o melhor conjunto de normas e naquela dotada de homens absolutamente justos, os cidadãos não devem viver uma vida de trabalho trivial ou de negócios — esses tipos de vida são desprezíveis e incompatíveis com as qualidades morais —, tampouco devem ser agricultores os aspirantes a cidadania, pois o lazer é indispensável ao desenvolvimento das qualidades morais e a pratica das atividades políticas”.

VAN ACKER, T. Grécia. A vida cotidiana na cidade-Estado. São Paulo: Atual, 1994.

O trecho, retirado da obra Política, de Aristóteles, permite compreender que a cidadania A) possui uma dimensão histórica que deve ser criticada, pois é condenável que os políticos de qualquer época fiquem entregues a ociosidade, enquanto o resto dos cidadãos tem de trabalhar. B) era entendida como uma dignidade própria dos grupos sociais superiores, fruto de uma concepção política profundamente hierarquizada da sociedade. C) estava vinculada, na Grécia Antiga, a uma percepção política democrática, que levava todos os habitantes da pólis a participarem da vida cívica. D) tinha profundas conexões com a justiça, razão pela qual o tempo livre dos cidadãos deveria ser dedicado as atividades vinculadas aos tribunais. E) vivida pelos atenienses era, de fato, restrita aqueles que se dedicavam a política e que tinham tempo para resolver os problemas da cidade. 5. (2013) A felicidade é, portanto, a melhor, a mais nobre e a mais aprazível coisa do mundo, e esses atributos não devem estar separados como na inscrição existente em Delfos “das coisas, a mais nobre é a mais justa, e a melhor é a saúde; porém a mais doce é ter o que amamos”. Todos estes atributos estão presentes nas mais excelentes atividades, e entre essas a melhor, nós a identificamos como felicidade.

ARISTOTELES. A Politica. São Paulo: Cia das Letras, 2010.

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Ao reconhecer na felicidade a reunião dos mais excelentes atributos, Aristóteles a identifica como a) busca por bens materiais e títulos de nobreza. b) plenitude espiritual e ascese pessoal. c) finalidade das ações e condutas humanas. d) conhecimento de verdades imutáveis e perfeitas. e) expressão do sucesso individual e reconhecimento público. 6. (2014)

TEXTO I Olhamos o homem alheio às atividades públicas não como alguém que cuida apenas de seus próprios interesse, mas como um inútil; nós, cidadãos atenienses, decidimos as questões públicas por nós mesmos na crença de que não é o debate que é o empecilho para à ação, e sim o fato de não se estar esclarecido pelo debate antes de chegar a hora da ação.

TUCÍDIDES. História da guerra do Peloponeso. Brasília: UnB, 1987 (adaptado).

TEXTO II

Um cidadão integral pode ser definido por nada mais anda menos que pelo direito de administrar justiça e exercer funções públicas; algumas destas, todavia, são limitadas quanto ao tempo de exercício, de tal modo que não podem de forma alguma ser exercidas duas vezes pela mesma pessoa, ou somente podem sê-lo depois de certos intervalos de tempo prefixados.

ARISTÓTELES. Política. Brasília: UnB, 1985.

Comparando os textos I e II, tanto para Tucidides (no século V a.C.) quanto para Aristóteles (no século IV a.C.), a cidadania era definida pelo(a)

A) prestígio social. B) acúmulo de riqueza. C) participação política.

D) local de nascimento. E) grupo de parentesco. 7. (2014) Alguns dos desejos são naturais e necessários; outros, naturais e não necessários; outros, nem naturais nem necessários, mas nascidos de vã opinião. Os desejos que não nos trazem dor se não satisfeitos não são necessários, mas o seu impulso pode ser facilmente desfeito, quando é difícil obter sua satisfação ou parecem geradores de dano.

EPICURO DE SAMOS. Doutrinas principais. In: SANSON, V.F. Textos de filosofia. Rio de Janeiro: Eduff, 1974.

No fragmento da obra filosófica de Epicuro, o homem tem como fim

A) alcançar o prazer moderado e a felicidade. B) valorizar os deveres e as obrigações sociais.

C) aceitar o sofrimento e o rigorismo da vida com resignação. D) refletir sobre os valores e as normas dadas pela divindade.

E) defender a indiferença e a impossibilidade de se atingir o saber.

8. (2014) Compreende-se assim o alcance de uma reivindicação que surge desde o nascimento da cidade na Grécia antiga: a redação das leis. Ao escrevê-las, não se faz mais que assegurar-lhes permanência e fixidez. As leis tornam-se bem comum, regra geral, suscetível de ser aplicada a todos da mesma maneira.

VERNANT, J. P. As origens do pensamento grego. Rio de Janeiro: Bertrand

Brasil, 1992 (adaptado).

Para o autor, a reivindicação atendida na Grécia antiga, ainda vigente no mundo contemporâneo, buscava garantir o seguinte princípio:

A) Isonomia – igualdade de tratamento aos cidadãos. B) Transparência – acesso às informações governamentais.

C) Tripartição – separação entre os poderes políticos estatais. D) Equiparação – Igualdade de gênero na participação política.

E) Elegibilidade – permissão para candidatura aos cargos públicos.

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UNIDADE 2 – FILOSOFIA MEDIEVAL

CONTEXTO HISTÓRICO – A QUEDA DE ROMA

Antes da queda, numa tentativa desesperada de salvar o Império Romano, em 380 o imperador Teodósio torna o cristianismo, que já era a seita religiosa com o maior número de seguidores, a religião oficial.

O Império caiu, mas a Igreja Católica (do grego

καθολικος /katholikos = universal) Apostólica, e agora, Romana emergiu e se tornou a maior instituição do mundo (até hoje).

Em um cenário de fragmentação, a Igreja surgia como um elemento de união, crescendo no vácuo que foi deixado pelo desaparecimento do império. Ponte entre o homem e Deus, ela teria a última palavra (a única) sobre como deveria ser a vida de seu rebanho e sobre o que era o bem e o mal, o certo e o errado, o justo e o injusto. Seria, portanto, a dona da mente e, por conseguinte, dos corpos das pessoas.

Poderosa não apenas do ponto de vista espiritual, mas também político, ninguém melhor do que ela para dizer como Deus queria que a sociedade fosse organizada, legitimando assim, uma sociedade hierarquizada, desigual e sem mobilidade social. Definida pelo critério de sangue, quem nascia nobre morria nobre, quem nascia servo, morria servo.

Por esses tempos o pensamento filosófico entrou de férias, pois os homes letrados, com raras exceções, eram os sacerdotes da igreja. Eles centralizaram o ensino em torno de si nos mosteiros, e posteriormente nas universidades. Desenvolveram o pensamento teológico, no entanto, não conseguiram fugir do estudo dos grandes filósofos.

Nesse período inicial de expansão da doutrina católica, os sábios da igreja tinham que deixar a fé cristã bem palatável aos olhos das classes mais cultas que conheciam bem os textos filosóficos. Esse movimento ficou conhecido como PATRÍSTICA por ter sido protagonizado pelos padres, e teve como seu principal expoente o africano Aureliano Agostinho.

CAPÍTULO 4 - A PATRÍSTICA E SANTO AGOSTINHO

O primeiro grande doutor da igreja foi o cara mais cachaceiro e raparigueiro que existia na cidade de Tagaste, uma província romana no norte da África.

Depois de passar por uma grande crise existencial na qual se perguntava pelo sentido da vida, Agostinho (354 – 430) se converteu ao cristianismo e passou a ser um grande pregador. Essa crise está descrita em sua obra autobiográfica As Confissões.

Ele acreditava e pregava que o homem bom é aquele voltado para o seu interior na procura de Deus e em busca de sua salvação, pois já nascera desgraçado, fruto do pecado original de Adão e Eva.

Não via como antagônicas fé e razão, mas afirmava que para se compreender era necessário crer, subordinando, portanto, a razão à fé.

Apropriou-se de muitos elementos da filosofia platônica para fundamentar sua explicação da doutrina cristã. Muitos autores afirmam que Santo Agostinho cristianizou Platão.

Assim como Platão julgava o intelecto superior à matéria, Santo Agostinho pregava a superioridade da alma ante o corpo, e sendo a alma um presente de Deus, devíamos nos voltar inteiramente à Ele.

Contemporâneo do declínio do Império Romano, Agostinho respondeu à acusação de que fora o cristianismo o culpado pela queda, e pôs a culpa no paganismo.

Sua resposta veio na obra Cidade de Deus, onde, segundo ele, há a cidade espiritual de Deus e a cidade material dos homens. Elas não coexistem separadamente, mas no plano de nossa existência a depender de nossa vontade de viver uma vida de pecado na cidade terrena dos homens, ou se voltar para deus e viver em sua graça como um de seus servos.

Percebam que a boa vida não é mais aquela voltada para o desenvolvimento da racionalidade humana dentro de uma comunidade política, cujo Bem era encontrado por meio da razão e ensinado por meio de um processo educacional virtuoso, como teorizaram os gregos.

Agora, o conhecimento do bem não dependia mais de uma instrução racional, mas apenas da vontade individual de cada um, por meio do livre-arbítrio, de viver uma vida voltada para Deus. E a compreensão de como vivê-la é obra da graça divina que ilumina o coração de quem estiver aberto para isso.

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Mas quem dizia o que era ter uma vida voltada para Deus? E ainda, quais pessoas viviam dessa maneira? Um xero no olho para quem respondeu: a Igreja.

Mas aí meu amigo, deu no que deu.

CAPÍTULO 5 - A ESCOLÁSTICA E SÃO TOMÁS DE AQUINO

No século VIII, o imperador franco Carlos Magno começou a estimular e difundir o ensino ao construir escolas que seriam dirigidas pela Igreja, retirando dos mosteiros o monopólio do ensino.

A cultura greco-romana passa a ser divulgada nos moldes romanos, ou seja, passa a ser ensinado gramática, retórica, e dialética (trivium), além de geometria, aritmética, astronomia e música (quadrivium), todas elas, é claro, sob um viés teológico.

Essa nova fase do pensamento da Igreja é chamado de escolástica e tem como principal expoente Tomás de Aquino.

Natural de Nápoles na Itália, Tomás de Aquino (1225 – 1274) foi ordenado monge dominicano e estudou

na universidade de sua cidade natal e na de Bolonha. Mais tarde tornou-se professor da maior universidade europeia daquela época, a de Paris.

Se Santo Agostinho cristianizou Platão, Tomaz de Aquino cristianizou Aristóteles ao usar sua teoria filosófica para

explicar a fé e até mesmo a existência de Deus. A influência de seu pensamento penetrou toda a Europa a ponto dele ser considerado o conselheiro dos conselheiros dos reis. Ou seja, o mestre dos mestres. Sua obra principal foi a Suma Teológica.

Se em Santo Agostinho o lema era “crer para entender”, aqui é “entender para crer”. Apesar de dar uma valorizada na razão, ele também a entendia como a serviço da fé.

Prova racional da existência de Deus

São Tomás desenvolve a teoria das cinco vias para explicar racionalmente a existência de Deus.

1. Movimento – Todo o movimento existente no mundo é causado por Deus.

2. Causa eficiente – não podendo ser causa de sua própria existência, os seres tiveram uma causa primeira que é Deus.

3. Contingente e necessário – sendo os seres contingentes, isto é, não podendo ser eles a causa de sua própria existência, existe algo necessário, que é a causa da existência de todas as coisas.

4. Graus de perfeição – os seres existem em graus diferentes de perfeição, mas somente Deus é a perfeição máxima.

5. Causa final – para que haja ordem, tudo no mundo tem uma finalidade, tem um propósito, seja uma pedra ou o homem. E o que rege a finalidade de tudo é Deus, a inteligência ordenadora.

Ética

O primeiro motor de Aristóteles, que era a causa de tudo, o puro ato, São Tomás o transforma em Deus, que tudo criou (a causa de tudo). Assim como Aristóteles entendia que a felicidade poderia ser alcançada e vivida na pólis, São Tomás também entende que ela pode ser vivida ainda nesse mundo, mas a felicidade que ele defende é uma felicidade mais alta, o conhecimento de como Deus é em si mesmo.

Política

Na época dele os reinos já estavam fortalecidos, pois as cruzadas haviam deixados os nobres senhores feudais empobrecidos e dependentes de um poder mais centralizado. Com isso, ele pôde desenvolver teorias sobres as leis internacionais, aquelas que regulam as relações entre os reinos, e sobre a melhor forma de governo. Não preciso nem dizer que era a monarquia, não é mesmo?!!!

Ele entendia que os reinos, orientados pela Igreja, guiavam seus súditos até certo pondo, quando então a Igreja os orientavam para a felicidade eterna.

O pensamento de São Tomás de Aquino, por ser o que de melhor a Igreja produziu na idade média, influenciou suas ações durante séculos. Foi o que os jesuítas, responsáveis pela educação dos jovens, ensinaram nos mosteiros, escolas e universidades. E foi sobre o seu aporte teórico que caíram as críticas de cientistas renascentistas como Galileu, e filósofos como Descartes e Thomas Hobbes.

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UNIDADE 3 – FILOSOFIA MODERNA

CAPÍTULO 6 - RENASCIMENTO

CONTEXTO HISTÓRICO – ROMPIMENTO COM O ANTIGO E O NASCIMENTO DO (MUNDO) MODERNO

A ruptura com o sistema feudal não aconteceu da noite para o dia. Foi um processo lento e gradual de transformações no mundo e no pensamento que aconteciam ainda na (baixa) Idade Média. Se ainda hoje existem resquícios desse tempo, imagine durante essa passagem.

A ponte entre esses dois mundos foi o Renascimento, que começou ainda no século XIV e se estendeu até o século XVI. Foi ele o combustível intelectual que justificou o abandono de uma forma (ultra)passada de ver a si mesmo e ao mundo, e deu novas cores, formas e respostas ao que já estava acontecendo e ao que ainda estava por vir. Por isso, é ele que passaremos a estudar agora.

Enquanto os grandes reinos estavam sendo criados, porque a situação estava um caos e precisava-se de um poder forte para controlá-la, na Península Itálica, onde se encontravam as principais rotas comerciais, cidades muito ricas ficavam cada vez mais ricas devido ao intenso comércio com o oriente.

As mais ricas cidades foram Gênova, Veneza e Florença, comandadas por ricas famílias de comerciantes e banqueiros, e onde um grande número de pessoas de todos os lugares passavam por lá e, além de comerciarem, trocavam ideias e experiências de vida, ampliando os horizontes de seus habitantes.

Nessas cidades, uma nova ordem social era criada. Lá os homens faziam seus destinos por conta própria, eram senhores de si, construtores de seu novo mundo. Este, era muito diferente daquele existente no campo, onde imperavam as regras sociais feudais sustentadas pela visão teocêntrica (Deus no centro de tudo) imposta pela Igreja.

Esses homens não aceitavam a imobilidade social, em que um servo morreria servo, quando homens pobres podiam ficar ricos e melhorar de via. Eles não aceitavam ter uma vida de penitências quando se poderia aproveitar os prazeres que a vida tem a oferecer. Eles não aceitavam que a busca pelo lucro fosse um pecado mortal, enquanto que esse lucro lhes proporcionava mudar para uma vida melhor, na medida de seu próprio esforço pessoal.

Percebam que nessas ricas cidades a visão de mundo feudal (teocêntrica) fundamentada pela Igreja não tinha muito espaço. Não é que todo mundo ficou ateu nas cidades, mas é que a interpretação de mundo passa a se dar a partir do homem, já que ele, realmente era um pecador, mas também fora feito à imagem e semelhança de Deus, do criador. E por ter algo de divino, a criatura mais perfeita criada por Deus, ele poderia também criar maravilhas.

O homem passaria a olhar o mundo desde então, não mais a partir de Deus, mas a partir de si mesmo. O centro das coisas agora era o homem (antropocentrismo). Por isso que os pensadores desse tempo ficaram conhecidos como humanistas.

Eles estavam no século XIII, onde poderiam encontrar fundamentos para essas suas ideias? Isso mesmo, eles tiveram que recuar mais de 1.000 anos para encontrar nos gregos antigos algo parecido com o que estava acontecendo com eles. E não foi muito difícil fazer isso, já que eles estavam, onde mesmo? Exatamente, no centro do que fora o maior império do mundo, o mesmo que conquistou os gregos e mesclou a cultura deles com a sua, preservando vários de seus escritos.

Os homens do renascimento foram buscar nos gregos e romanos antigos inspiração para louvarem o ser humano. Isso mesmo, “inspiração”. Eles não estavam querendo simplesmente copiá-los, prova disso é que diferentemente dos antigos que contemplavam a natureza, os renascentistas queriam conhecê-la para dominá-la.

Não bastava um pensamento contemplativo, eles queria um saber ativo que lhes permitissem ciar coisas.

O homem renascentista que rompeu com as imposições da sociedade feudal, agora queria romper também com as imposições que a natureza lhe impunha. Descobrir seus mistérios para usá-los a seu favor era algo muito rentável e promissor.

Pergunte aos navegadores que tinham que desbravar os mares, aos mineradores que tinham que encontrar metais preciosos para cunhar moedas. Pergunte aos estudantes de medicina que queriam conhecer melhor o corpo humano para trata-lo melhor, e aos engenheiros que queriam descobrir novas formas de construir armas para guerrear com mais facilidade.

Essa vontade de obter um conhecimento que os ajudassem em questões práticas (o embrião do conhecimento científico), se refletiu em todos os ramos da cultura, desde a política até as artes. Mas havia algo que os impedia em progredir, e que infelizmente também estava lá junto deles na Península Itálica.

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Era a Igreja com seus ensinamentos escolásticos, principalmente Santo Tomas de Aquino e Aristóteles, que ensinavam um conhecimento baseado na pura contemplação e que vinha sendo transmitido à gerações pela tradição, que era indiscutível.

Para a Igreja, esses desgraçados que já haviam rompido com a organização social que ela havia dito que era a única correta, pois reflexo da vontade de Deus, agora querem descobrir os segredos do corpo humano, da natureza, e do universo. Mas ela já havia dito tudo que tinha para ser dito.

Essa vontade de conhecer era uma blasfêmia tamanha que só poderia ser purificada pelo fogo da Inquisição do Santo Ofício. “Ousem questionar o que dissemos e sofrerão as consequências”, era o aviso que a Igreja havia dado.

Mas as famílias ricas ousaram, e, conhecidos como mecenas, financiaram vários artistas e cientistas, que com sua arte e invenções iam firmando os valores burgueses na nova sociedade.

Nas artes eram usados conhecimentos científicos e matemáticos, e nelas se destacaram grandes nomes na Península Itálica, tais como:

Leonardo da Vince (1452 – 1519) – grande gênio da época interessou-se por tudo, engenharia,

astronomia, pintura, escultura, filosofia, física, música, etc. Seus traços sempre valorizaram as formas humanas e suas invenções militares ajudaram os homens daquela época a se matarem com mais eficiência. Ele também dissecava corpos nas horas vagas, e seus desenhos ajudaram a entender melhor o funcionamento do corpo humano.

Michelangelo Buonaroti (1475 – 1564) – foi considerado o gigante do renascimento. As suas duas maiores obras, o teto da Capela Sistina e o Davi, foram relacionadas a temas cristãos. Mas olhe só a imagem que há por trás de Deus no momento da criação. Você consegue reconhecer? E o Davi, qual a diferença com as esculturas dos deuses e heróis gregos?

Rafael Sanzio (1483 – 1520) – o “pintor da madonas”. Veja só uma de suas obras mais famosas. A Escola de Atenas representa os maiores pensadores da grécia antiga, tendo Platão e Aristótels ao centro.

Nas ciências como a biologia, física, matemática, astronomia, tivemos grandes nomes que enfrentaram os dogmas (verdades indiscutíveis) da Igreja. Nicolau Cpérnico (1473 – 1543) desafiou a teoria geocênctrica (terra no centro do universo) defendida por Aristóteles e epla Igreja, e propôs o modelo heliocentrico (sol no centro).

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GALILEU GALIEI E O INÍCIO DA CIÊNCIA EXPERIMENTAL

Também na Itália, Galileu Galilei (1564 – 1642) conseguiu se impor como um grande matemático e inventor. Ele era estudante de medicina e abandonou o curso, para desgosto da família, no intuito de se aprofundar nos estudos de matemática, que era sua grande paixão.

Galileu, contrariando os ensinamentos formais da Igreja predominantes nas escolas e universidades de seu tempo, acreditava que era possível explicar o universo através da matemática, e dedicou sua vida a provar que estava certo.

Não fosse por Galileu, talvez você não teria que responder 45 questões de matemática, um quarto da prova. Mas também se não fosse por ele, talvez você não estivesse lendo esse mateiral agora, pois provavelmente não haveria a tecnologia necessária por fazer ele chegar até você.

Atraves de seus estudos de astronomia Galileu chegou às mesmas conclusões de Copérnico sobre a posição da terra no sistema solar, sustentano um sistema heliocentrico (sol no centro), contrariando a posição geocentrica (terra no centro) da Igreja.

Além disso, fez algo revolucionário. Desenvolveu o telescópio. Pronto, a Igreja ficou doida. Agora, qualquer pessoa poderia olhar por aquele negócio e ver com os próprios olhos as estrelas e a lua.

Esse foi o grande passo para o conhecimento experimental. Veja que um indivíduo, por meios dos sentidos, pôde sozinho desafiar os conhecimentos contemplativos sustentados por todo o clero da Igreja.

Além de desbancar Aristóteles com relação à queda dos corpos, por meio de seus cálculos matemáticos e suas experiencias na torre de Pisa, ele também provou que as esferas celestes não eram perfeitas como o filosofo grego sustentava.

Ele viu com seu telescópio as crateras lunares, e o extraordinário era que não se tratava apenas de uma disputa de opiniões, a palavra de Galileu contra a de

Aristóteles. Qualquer pessoa podeira ver isso pelo telescópio e atestar que Galileu estava com a razão.

Óbivio que a Igreja não ficou parada de braços cruzados. A inquisição caiu em cima de Galileu e ele teve de dizer que suas teorias eram apenas suposições (hipóteses).

Apesar disso, a Igreja não conseguiu conter a Revolução Científica que Galileu havia começado, e muitos foram os estudiosos que deram prosseguimento a seus estudos, sendo Isaac Newton quem aperfeiçou o sistema.

E o movimento renascentista não ficou só na Peninsula Itálica, ele se espalhou por toda a Europa. Na França tivemos Rabelais (1490 – 1553) e Montaigne (1533 – 1592), na Inglaterra, Willian Sheakespeare (1564 – 1616), na Espanha, Miguel de Cervantes (1547 – 1616), nos Paises Baixos, Erasmo de Rotterdam (1466 – 1536).

Ém importante destacar que talvez a principal invenção dessa época, sem a qual nada disso poderia ter acontecido, tenha sido a imprensa (1454) do alemão Gutemberg. Ela possibilitou a reprodução rápida e barata dos livros já produzidos e dos que estavam sendo escritos.

Ela foi também um importante instrumento contra a centralização do saber com o clero, já que antes dela os livros eram copiados pelos monges de capa a capa. Imagine quanto tempo levaria para copiar a quantidade de livros que circulou pela Europa nesse tempo.

Essas foram grandes realizações dos homens, que ainda continuaram no campo da política com a criação dos Estados Nacionais. Diferentemente dos reis feudais, esses novos Reis teriam tanto poder que alguns deles desafiaram até o representante de deus na terra, o Papa.

MAQUIAVEL E O DILEMA DO PRÍNCIPE

As transformações sofridas pelo poder político não passaram despercebidas pelos renascentistas, e a principal, e mais significativa personalidade nesse campo foi o florentino Nicolau Maquiavel (1469 – 1527).

Ele assumiu um cargo importante no governo de

Florença depois que a família Médici foi afastada do controle da cidade. Trabalhava como diplomata fazendo

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várias viagens aos grandes reinos que haviam se unificado, e não se conformava com o estado de guerra que se encontrava a Península Itálica.

Na época de Maquiavel as cidades mais expressivas dessa região eram: a sua Florença, Milão, Nápoles, e Veneza. Apesar de seu forte comércio elas eram frágeis politicamente e totalmente vulneráveis a ataques externos. Na época dele era a coisa mais comum uma cidade invadir e dominar outra, por isso a sua preocupação.

Além disso, Maquiavel acreditava que a região italiana só teria a ganhar se fosse unificada. Mas como fazer isso? Essa é a pergunta central de O Príncipe (1515), a sua grande obra prima que iria mudar totalmente o modo dos homens ocidentais enxergarem a política.

Maquiavel é considerado o pai da ciência política moderna porque não escreveu um tratado teórico de como deveria ser o governo ideal. Desde os gregos até sua época, todos fizeram isso.

Sua preocupação não era como deveria ser a política, mas sim em como ela é realmente praticada. Com isso em mente, tendo como fundamento empírico as lições que a história havia dado e como se comportavam os grandes políticos de sua época, ele escreveu um manual de como construir um estado forte e como se manter no poder para governá-lo.

Para isso ele entendia que o príncipe deveria ser guiado pelos resultados a serem alcançados, podendo tudo fazer. Não deveria ficar preocupado com questões morais, o importante era conseguir o poder e mantê-lo. Para Maquiavel, portanto, a política não é atrelada à moral, pois os “fins justificam os meios”.

O príncipe deve usar de todas as artimanhas possíveis, mentir, ludibriar, enganar. É o homem astuto, esperto o suficiente para conseguir o que deseja. Desse modo, para conseguir o poder ele tem que possuir a virtu, ou seja, qualidades especiais que o diferencie dos outros homens. É ela que vai possibilitá-lo a reconhecer as circunstâncias certas (fortuna) para agir como se deve no momento certo. A fortuna é o que muitos chamam de sorte, mas só a aproveita quem estiver preparado.

Esse é o elemento característico do pensamento renascentista nos seus ensinamentos. Maquiavel sabe que existem forças independentes da vontade do homem agindo sobre ele. Mas o homem como um ser racional, dotado de inteligência, não é uma simples marionete jogada de um lado a outro ao sabor do acaso. Ele pode usar sua racionalidade para decidir os rumos de sua vida.

Chegado ao poder, é preciso saber como se manter nele. Para isso, é melhor ser temido do que amado. Maquiavel tinha uma visão pessimista sobre o homem, acreditava que ele é um bicho escroto, que quando tá tudo bem, todo mundo é seu amigo, mas “na hora do vamos ver” todo mundo lhe vira as costas.

Não existe essa de bem comum. Os indivíduos vivem em constante conflito em sociedade, e não dá pra agradar todo mundo. Para manter a lealdade de todos é melhor que eles o temam, pois assim é mais fácil de obedecerem e se manterem fiéis. É até bom de vez em quando esfolar um infeliz para que todos vejam que o príncipe não está para brincadeira.

Para o leitor superficial de Maquiavel, O Príncipe o torna, sem sombra de dúvidas, um dos escritores mais sem escrúpulos de todos os tempos. Essa é a interpretação possível para quem analisa essa obra fora de seu contexto histórico.

Maquiavel escreveu essa obra, quando os Médici retornaram ao poder e ele foi posto para fora da cena política. Ele a dedicou a Lorenzo de Médici, o único homem que poderia, aos olhos dele, unificar a Itália e lhe trazer de volta o brilho e esplendor da Roma republicana anterior à ditadura de Júlio César.

Maquiavel era um republicano, e não escreveu um obra para um governante que quisesse se perpetuar no poder de forma absoluta e despótica. Ele tinha um sonho, mas não era um ingênuo. Sabia que teria de haver derramamento de sangue para que um grande Estado fosse criado, e que isso teria de ocorrer sob a liderança de um único homem.

No entanto, alcançada a estabilidade, um regime republicano deveria ser instalado para que o interesse coletivo pudesse guiar o destino de todos, e os rumos do Estado.

É claro que não encontramos isso em O Príncipe, que, como já dissemos, é um manual de como conseguir o poder e se manter nele. Esse perfil republicano de Maquiavel é percebido em outra obra sua, qual seja, Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio.

Vejamos um trecho dessa obra em que isso fica bem evidente:

“Percebe-se facilmente de onde nasce o amor à liberdade dos povos; a experiência nos mostra que as cidades crescem em poder e em riqueza enquanto são livres. É maravilhoso, por exemplo, como cresceu a grandeza de Atenas durante os cem anos que sucederam à ditadura de Pisístrato. Contudo, mais admirável ainda é a grandeza alcançada pela república romana depois que

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foi liberta dos seus reis. Compreende-se a razão disto: não é o interesse particular que faz a grandeza dos Estados, mas o interesse coletivo. E é evidente que o interesse comum só é respeitado nos repúblicas: tudo que pode trazer vantagem geral é nelas conseguido sem obstáculos. Se uma certa medida prejudica um ou outro indivíduo, são tantos o que ela favorece, que se chega sempre a fazê-la prevalecer, a despeito das resistências, devido ao pequeno número de pessoas prejudicadas”

Essas palavras não parecem ser de um homem que defenda um governo absolutista, que deseja ver um rei governar por toda a eternidade. Parecem mais o alerta de alguém que sabe a importância da liberdade para a grandeza e prosperidade de um povo.

CAPÍTULO 7 - FORMAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DO ESTADO

O Estado foi o artifício criado pela nobreza e burguesia para a manutenção de seus interesses e privilégios, respectivamente. No momento de seu nascimento ele tinha que vir ao mundo como uma Monarquia Absolutista, pois era preciso a concentração de poder nas mãos de alguém que personalizasse essa transformação que ocorria para fazer nascer uma nova ordem social.

Os burgueses, pagavam impostos, mas ganhavam com:

Leis unificadas;

Sistemas de medidas e pesos unificados;

Moeda única que facilitava o comércio; Segurança pública e jurídica;

Os nobres também ganhavam porque os reis eram nobres, e todo o corpo burocrático necessário para o funcionamento do estado era composto de nobres. Além disso, eles tinham leis diferenciadas que os beneficiavam de diversas formas, como por exemplo, a isenção do pagamento de tributos. Ou seja, seu status estava garantido.

Algumas medidas foram tomadas pelos Reis para que centralizassem o poder. Dentre elas podemos citar:

Somente o Rei poderia ter um exército;

A resolução dos conflitos e aplicação da justiça seria tarefa real. Acabaram-se os tribunais feudais e a Igreja passa a julgar casos que envolvam somente questões de fé;

O rei poderia criar leis que valeriam para todo o reino, sempre objetivando o bem comum;

As características que marcaram o sistema absolutista foram:

Centralização de poderes nas mãos do Rei;

Construção de um idioma nacional que pudesse dar unidade e identidade ao povo;

Unificação de moedas e de sistemas de pesos e medidas;

Demarcação do território do reino;

Ordenamento jurídico único que valesse para todo o território.

Os ibéricos saíram na frente na formação dos grandes reinos, enquanto Inglaterra e França ainda se matavam na guerra dos cem anos.

Somente depois, quando Portugal e Espanha já haviam até começado o processo de exploração de suas colônias americanas, é que aqueles dois países começavam a se fortalecer e emergir como monarquias absolutistas.

Na França, os conflitos religiosos entre a nobreza católica e a burguesia calvinista (huguenote) formaram, juntamente com a Guerra dos Cem Anos, o cenário que propiciou a formação e consolidação do absolutismo francês.

Já nessa época, metade do século XVI, o jurista e filósofo francês Jean Bodin (1530-96) defendia o direito absoluto do governante, que para ele tinha que ser um rei. A monarquia seria a melhor forma de governo, pois estaria em conformidade com a natureza das coisas e dos homens. Só existe um Deus, um Sol, e um chefe de família, por isso apenas um deve governar.

Suas ideias foram expostas em sua obra Os seis Livros da República, publicada em 1576, e é nela que encontramos a formulação moderna do conceito de soberania como sendo o poder supremo de governar, ou seja, é o poder que está acima de todos os outros poderes, não se sujeitando a nada. “Por soberania se entende o poder absoluto e perpétuo que é próprio do Estado” (Livro I, capitulo III).

Um poder tão grande como esse só poderia vir de Deus, cujo poder seria o único acima do poder soberano do rei. O rei possui um direito divino de governar. É por essa razão que Bodin não entende o poder soberano como absoluto no sentido de ilimitado, tirânico, porque ele não deve confrontar os direitos naturais divinos, dentre eles o direito à liberdade e propriedade dos súditos.

Pela teoria de Bodin, podemos ver que o poder da Igreja Católica era muito grande na França. Tanto que em 1589, quando o protestante Henrique IV tornou-se

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rei, teve que se converter ao catolicismo. Apesar disso, ainda conseguiu conceder tolerância religiosa aos protestantes com o Édito de Nantes, que não durou muito, pois seus sucessores foram eliminando aos poucos essas liberdades.

A consolidação do absolutismo na França se dá com o cardeal Rchelieu, que foi primeiro ministro de Luís XIII. Esse cardeal enfraqueceu o poder dos nobres, e atribuiu grande autoridade aos funcionários do rei. Para ele, as necessidades do Estado estavam acima de tudo e de todos, podendo o mesmo fazer tudo para alcançar seus objetivos.

E realmente fez. Para desbancar a Espanha como potência mundial, a França, num ato contraditório, apoiou os protestantes, a quem sempre perseguiu, no conflito que ficou conhecido como Guerra dos Trinta Anos (1618-48). Na metade do século XVII a França se tornou o Estado mais poderoso da Europa.

Foi essa potência que Luiz XIV governou de 1643 a 1715. Ele aprendeu direitinho com o Richelieu, e se tornou o todo poderoso Rei-Sol. O ápice do absolutismo monárquico se dá no seu reinado.

No plano teórico, depois de Bodin, e ao tempo de Luiz XIV, apareceu outro pensador francês para justificar o direito do rei de governar absolutamente. O bispo católico Jacques Bossuet (1627 – 1704) escreveu a obra Política tirada da Sagrada Escritura, onde também defendeu o direito divino de governar do rei. O rei deve obediência somente a Deus, que legitima o seu poder, e todos devem obediência ao rei.

Para fortalecer seu poder, Luiz XIV diminuiu influência política da aristocracia, enquanto fortalecia economicamente o Estado com as ações de seu ministro das finanças Jean-Baptiste Colbert, cujas medidas mercantilistas ficaram conhecidas como colbertismo.

Tais medidas foram basicamente:

O aperfeiçoamento do sistema de cobrança de impostos;

Incentivo às manufaturas;

Estímulo ao comércio internacional de seus artigos de luxo e produtos bélicos.

Fortalecimento da marinha para entrar na disputa por colônias;

Luiz XIV governou com o consentimento da aristocracia e o apoio da Igreja. Os primeiros, apesar de terem reduzida influência política, mantinham seu status de “amiguinhos” do rei, e detinham uma série de privilégios, como não pagar impostos. Já a Igreja, adorou

ver o rei abolir o Édito de Nantes e tornar o catolicismo a única religião a ser praticada em território francês.

Além desse apoio, um grande marketing político contribuiu para associar a imagem do rei à do próprio Estado, fazendo com que ele mesmo afirmasse: “O Estado sou eu”. A sensação que ele passa de ser o todo-poderoso, um homem perfeito que simboliza o próprio estado francês em sua grandeza.

Sua imagem foi cuidadosamente construída para representar a magnificência, a perfeição e o caráter divino do reino francês.

Ele ia morar em qualquer lugar? Claro que não. Teria que ser uma palácio digno se um rei sol. Luiz XIV, então, manda construir um palácio que represente sua realeza. E claro, tinha que ser o maior da Europa. Nesse sentido, o Palácio de Versalhes foi construído para mandar uma mensagem ao mundo: “Aqui é a casa/sede do homem/estado mais poderoso do mundo”.

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Mas Versalhes, e todo luxo em que viviam o rei e sua corte, além de guerras constantes em que o estado estava envolvido, tiveram um custo, que certamente não era pago com o trabalho suado do rei. A bomba estava se armando, e ela ia explodir na forma de uma das maiores revoluções do mundo ocidental.

Na Inglaterra, Henrique VIII ganhou amplo apoio da burguesia e de setores da nobreza ao romper com a Igreja Católica e fundar, como seu chefe, a religião anglicana (essencialmente calvinista, mas católico na forma), governando esse país de 1509 a 1547. Mas foi sua filha Elizabeth I que tornou essa nação uma potência ao governá-la de 1558 a 1603.

Atrasados na corrida para exploração das américas, Elizabeth quis recuperar o tempo perdido a todo custo. Ela incentivou a construção de navios para a formação de um poderosa frota que pudesse invadir e explorar territórios, fossem eles já dominados por outros países, ou não.

Foi nessa época que começou a ocupação da américa inglesa, que não dava muito lucro porque não havia muito o que explorar, pois as terras que produziam especiarias e tinham metais preciosos já estavam há muito tempo ocupadas pelos espanhóis.

Diante disso, esses navios serviam também para saquear outros, de preferência os espanhóis, que vinham abarrotados de metais preciosos.

Não tardou muito para os espanhóis responderem, e a Invencível Armada (a maior frota de navios do planeta) do rei Felipe II atacou os ingleses, mas estes saíram vitoriosos. A partir de então, os mares passaram a ter outros donos.

Mas as transformações econômicas ocorridas na terra da rainha não ocorreram só nos mares, o modo de produzir na terra também se modificou. As propriedades

rurais que antes eram usadas em proveito coletivo, passaram a ser exploradas por um único dono, principalmente na criação de ovelhas que forneciam a lã que impulsionava a nascente manufatura de tecidos nas cidades. Esse processo contribuiu para a criação de uma classe aristocrática aburguesada, e mais forte economicamente, os gentry.

Nesse processo houve o que ficou conhecido como cercamentos, onde os camponeses foram praticamente expulsos do campo para viver uma vida miserável na cidade. Isso forçou um descontrolado êxodo rural para as cidades que não estavam preparadas para receber todo esse contingente populacional que se tornou mão de obra barata e fortaleceu o mercado consumidor interno. Esse processo contribuiu para a consolidação do capitalismo na Inglaterra.

A “rainha virgem” morreu sem deixar herdeiros, sendo sucedida pelo seu primo escocês, e católico, Jaime. Este uniu Inglaterra e Escócia e governou de 1603 a 1625, iniciando a dinastia dos Stuart como Jaime I.

O cara mal chegou e já queria ter seus poderes reais aumentados. E quem dava a fundamentação para a legitimidade do poder ser ilimitado? Exatamente, o catolicismo. Então ele começou a enfatizar o caráter católico do anglicanismo. Mas não colou muito não. O parlamento, composto pela aristocracia rural aburguesada (gentry) e pelos burgueses fiéis aos ensinamentos calvinistas (puritanos), se manifestou contrário a essa jogada do rei, aumentando as tensões entre os poderes.

Já no reinado do sucessor de Jaime, Carlos I, o parlamento apresentou em 1628 uma Petição de Direitos limitando os poderes reais. O rei ficou doido, mandou fechar o parlamento e prender todo mundo. A situação só piorou, e em 1640 desencadeou-se uma guerra civil (1642-48) entre os “cavaleiros” (bajuladores do rei) e os “cabeças redondas” partidários do parlamento. Tem-se início a Revolução Puritana.

A fim de tirar um rei absolutista do poder, Oliver Cromwell lidera as tropas do parlamento, corta a cabeça do rei e assume como ditador com o apoio do exército, instaurando uma republica ditatorial conhecida como protetorado, e governa de 1649 a 1658. Forma em 1651 a Comunidade Britânica com a união da Inglaterra, Irlanda e Escócia.

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THOMAS HOBBES E A MECÂNICA DO ESTADO

Hobbes (1588 – 1679) nasceu na era de ouro elisabetana, mas sua vida adulta foi marcada por esses conflitos entre reis e o parlamento. Ele era crítico da democracia e por conseguinte, da monarquia parlamentar inglesa.

Quando estourou a guerra entre rei e parlamento ele se manteve a favor do rei, e teve que se exilar na França em 1640. Um país onde todo aquele quem quisesse defender o absolutismo era bem vindo.

Hobbes encarou a questão da legitimidade do poder absoluto e da fundamentação da criação do estado em sua grande obra Leviatã, que publicou na França em 1651, dois anos depois da vitória de Cromwell, e quando seu governo ditatorial começava a se consolidar.

Por que deve existir o Estado e de onde vem o seu poder absoluto? Essa é a pergunta central da obra magna de Hobbes. Na França, havia a teoria do direito divino dos reis de governar, mas nosso filósofo era um homem racional demais para abraçar tal teoria. Além de filósofo, ele era também um matemático que admirava a explicação matemática que Galileu dava à realidade. Sua explicação para o poder político estava embasada na nova forma de ver o mundo, oriunda da nova ciência que estava surgindo.

Hobbes inova no pensamento político da época ao defender que a organização social deve ser entendida e explicada não como uma teia de jogo de interesses entre classes sociais diferentes, mas do mesmo modo como a ciência explica o movimento dos corpos através de suas relações de causa e efeito, tendo como princípio básico o entendimento do movimento como um fenômeno natural. Filosofia, para ele, era física dos corpos.

Estado de Natureza

Para descobrir o fundamento do Estado e de seu poder soberano, absoluto, Hobbes não faz uma investigação histórica sobre as primeiras sociedades.

Tal como na ciência ele começa com uma hipótese, a de que os homens viviam inicialmente isolados, livres e iguais, em um estado anterior à sociedade, no qual tudo era possível, não existiam leis e muito menos justiça, onde havia a pura e simples barbárie, um estado de guerra de todos contra todos a

que ele chamou de Estado de Natureza. O homem é o lobo do próprio homem.

Hobbes parte de uma concepção de natureza humana para fundamentar o poder político. Como Galileu na física, no campo da política, ele também começa contrariando Aristóteles, sustentando que o homem não é naturalmente sociável, não é um animal político.

Ele é um ser malvado por natureza, que precisa de um poder superior ao seu para frear seus instintos naturais de destruição. Segundo esse filósofo, nesse estado, o homem possuía o direito natural (inerente à própria natureza humana) à vida, e à liberdade, que consistia em usar seu poder para fazer tudo o que quisesse para preservar sua vida, ou seja, de se autogovernar como quiser.

Mas esse mesma vontade de autoconservação que o impele à guerra, faz o homem querer também viver em paz. O que fazer então?

Contrato Social

Para sair desse estado de guerra, onde os homens podiam usufruir amplamente de sua liberdade para se autogovernar, todos eles devem concordar em renunciar parte desse poder, e transferi-lo a outro homem, ou uma assembleia, a fim de se criar um ente todo poderoso que

pudesse acabar com os conflitos.

Esse ente que surge desse contrato feito entre os homens, Hobbes chamou de Leviatã, um monstro marinho citado na bíblia, no livro de Jó.

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Veja que o poder do Estado, ou seja, sua soberania, advém não mais do direito divino do rei, mas do pacto feito entre os cidadãos de renunciar parte do seu poder de governar-se.

Estado e Sociedade civil

Perceba que o homem só consegue viver em sociedade, para Hobbes, quando cria o Estado. Portanto, diferentemente dos gregos que viviam numa instituição que era o reflexo do seu instinto natural de sociabilidade (pólis), o Estado é um ente criado artificialmente para que os homens consigam viver em sociedade.

A sociabilidade humana é algo criado e não natural.

E qual seria a forma de governo que deveria assumir o Estado? Hobbes defendia a monarquia. Ele acreditava que a guerra civil na Inglaterra aconteceu porque o poder soberano estava dividido entre o rei e o parlamento.

Dessa forma, a melhor maneira de se manter um bom governo seria concentrando todas as forças nas mãos de uma só pessoa, para que essa pudesse manter a ordem e evitar a guerra por meio da força. Não é à toa que o Estado está segurando uma espada na figura acima. Por causa disso, muitos de seus amigos o viram como defensor do governo de Cromwell.

A função principal do estado, portanto, é garantir a vida e a segurança de seus cidadãos. Quando ele não consegue garantir tais direitos a um indivíduo, a subordinação acaba, mas somente entre o estado e aquele cidadão em específico.

QUESTÕES

1. (2011) Acompanhando a intenção da burguesia renascentista de ampliar seu domínio sobre a natureza e sobre o espaço geográfico, através de pesquisa científica e da invenção tecnológica, os cientistas também iriam se atirar nessa aventura, tentando conquistar a forma, o movimento, o espaço, a luz, a cor e mesmo a expressão e o sentimento.

SEVCENKO, N. O Renascimento. Campinas: Unicamp, 1984.

O texto apresenta um espírito de época que afetou também a produção artística, marcada pela constante relação entre a) fé e misticismo. b) ciência e arte. c) cultura e comércio. d) política e economia.

e) astronomia e religião.

2. (2014) A filosofia encontra-se escrita neste grande livro que continuamente se abre perante nossos olhos (isto é, o universo) que não se pode compreender antes de entender a língua e conhecer os caracteres com os quais está escrito. Ele está escrito em língua matemática, os caracteres são triângulos, circunferências e outras figuras geométricas, sem cujos meios é impossível entender humanamente as palavras; sem eles vagamos perdidos dentro de um obscuro labirinto.

GALILEI, G. O ensaiador. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978.

No contexto da revolução científica do século XVII, assumir a posição de Galileu significava defender a A) continuidade do vínculo entre ciência e fé dominante na Idade Média. B) necessidade de o estudo linguístico ser acompanhado do exame matemático. C) oposição da nova física quantitativa aos pressupostos da filosofia escolástica. D) importância da independência da investigação científica pretendida pela Igreja. E) inadequação da matemática para elaborar uma explicação racional da natureza. 3. (2010) O príncipe, portanto, não deve se incomodar com a reputação de cruel, se seu propósito é manter o povo unido e leal. De fato, com uns poucos exemplos duros poderá ser mais clemente do que outros que, por muita piedade, permitem os distúrbios que levem ao assassínio e ao roubo.

MAQUIAVEL, N. O Príncipe. São Paulo: Martin Claret, 2009.

No século XVI, Maquiavel escreveu O Príncipe, reflexão sobre a Monarquia e a função do governante. A manutenção da ordem social, segundo esse autor, baseava-se na A) inércia do julgamento de crimes polêmicos. B) bondade em relação ao comportamento dos mercenários. C) compaixão quanto à condenação dos servos D) neutralidade diante da condenação dos servos. E) conveniência entre o poder tirânico e a moral do príncipe

4. (2012) Não ignoro a opinião antiga e muito difundida e que o que acontece no mundo é decidido por Deus e pelo acaso. Essa opinião é muito aceita em nossos dias, devido às grandes transformações ocorridas, e que ocorrem diariamente, as quais escapam à conjectura

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humana. Não obstante, para não ignorar inteiramente o nosso livre arbítrio, creio que se pode aceitar que a sorte decida metade dos nossos atos, mas [o livre-arbítrio] nos permite o controle sobre a outra metade.

MAQUIAVEL, N. O Príncipe. Brasília: EdUnB, 1979 (adaptado).

Em O Príncipe, Maquiavel refletiu sobre o exercício do poder em seu tempo. No trecho citado, o autor demonstra o vínculo entre o seu pensamento político e o humanismo renascentista ao a) valorizar a interferência divina nos acontecimentos definidores do seu tempo. b) rejeitar a intervenção do acaso nos processos políticos. c) afirmar a confiança na razão autônoma como fundamento da ação humana. d) romper com a tradição que valorizava o passado como fonte de aprendizagem. e) redefinir a ação política com base na unidade entre fé e razão.

5. (2013) Nasce daqui uma questão: se vale mais ser amado que temido ou temido que amado. Responde-se que ambas as coisas seriam de desejar; mas porque é difícil juntá-las, é muito mais seguro ser temido que amado, quando haja de faltar uma das duas. Porque dos homens se pode dizer, duma maneira geral, que são ingratos, volúveis, simuladores, covardes e ávidos de lucro, e enquanto lhes fazes bem são inteiramente teus, oferecem-te o sangue, os bens, a vida e os filhos, quando, como acima disse, o perigo está longe; mas quando ele chega, revoltam-se.

MAQUIAVEL, N. O principe. Rio de Janeiro: Bertrand, 1991.

A partir da análise histórica do comportamento humano em suas relações sociais e políticas. Maquiavel define o homem como um ser a) munido de virtude, com disposição nata a praticar o bem a si e aos outros. b) possuidor de fortuna, valendo-se de riquezas para alcançar êxito na política. c) guiado por interesses, de modo que suas ações são imprevisíveis e inconstantes. d) naturalmente racional, vivendo em um estado pré-social e portando seus direitos naturais. e) sociável por natureza, mantendo relações pacíficas com seus pares.

6. (2012)

Na França, o rei Luís XIV teve sua imagem fabricada por um conjunto de estratégias que visavam sedimentar uma determinada noção de soberania. Neste sentido, a charge apresentada demonstra A) a humanidade do rei, pois retrata um homem comum, sem os adornos próprios à vestimenta real. B) a unidade entre o público e o privado, pois a figura do rei com a vestimenta real representa o público e sem a vestimenta real, o privado. C) o vínculo entre monarquia e povo, pois leva ao conhecimento do público a figura de um rei despretensioso e distante do poder político. D) o gosto estético refinado do rei, pois evidencia a elegância dos trajes reais em relação aos de outros membros da corte. E) a importância da vestimenta para a constituição simbólica do rei, pois o corpo político adornado esconde os defeitos do corpo pessoal.

7. (2009.2) O que se entende por Corte do antigo regime é, em primeiro lugar, a casa de habitação dos reis de França, de suas famílias, de todas as pessoas que, de perto ou de longe, dela fazem parte. As despesas da Corte, da imensa casa dos reis, são consignadas no registro das despesas do reino da França sob a rubrica significativa de Casas Reais.

ELIAS, N. A sociedade de corte. Lisboa: Estampa, 1987.

Algumas casas de habitação dos reis tiveram grande efetividade política e terminaram por se transformar em patrimônio artístico e cultural, cujo exemplo é A) o palácio de Versalhes. B) o Museu Britânico. C) a catedral de Colônia. D) a Casa Branca. E) a pirâmide do faraó Quéops.

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8. (2012)

Que é ilegal a faculdade que se atribui à autoridade real para suspender as leis ou seu cumprimento.

Que é ilegal toda cobrança de impostos para a Coroa sem o concurso do Parlamento, sob pretexto de prerrogativa, ou em época e modo diferentes dos designados por ele próprio.

Que é indispensável convocar com frequência os Parlamentos para satisfazer os agravos, assim como para corrigir, afirmar e conservar leis.

Declaração de Direitos. Disponível em: http://disciplinas.stoa.usp.br. Acesso em: 20 dez. 2011 (adaptado).

No documento de 1689, identifica-se uma particularidade da Inglaterra diante dos demais Estados europeus na Época Moderna. A peculiaridade inglesa e o regime político que predominavam na Europa continental estão indicados, respectivamente, em: a) Redução da influência do papa - Teocracia. b) Limitação do poder do soberano - Absolutismo. c) Ampliação da dominação da nobreza - República. d) Expansão da força do presidente - Parlamentarismo. e) Restrição da competência do congresso - Presidencialismo.

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CAPÍTULO 8 – RACIONALISMO E EMPIRISMO

Apesar da atitude de voltar aos antigos na tentativa de recomeçar a empreitada humana como se o pensamento teológico da Idade Média fosse só um obstáculo a ser contornado, ele, obviamente, deixou sua marca na história do pensamento europeu, e por conseguinte, na nossa, já que somos, querendo ou não, herdeiros diretos dessa matriz intelectual.

Na antiguidade, com exceção de algumas correntes de pensamento, a investigação filosófica estava centrada em descobrir a essência das coisas, com o objetivo de entender a ordem do universo e do mundo e o lugar do homem dentro de toda essa trama.

Nessa empreitada, não se duvidava da capacidade do homem de compreender isso tudo. Mas depois da Igreja passar quase 1.000 anos dizendo que o homem era um ser desgraçado, que não tinha como alcançar o conhecimento das coisas, a não ser pela graça divina, isso ficou marcado no pensamento de todos aqueles que viveram essa época.

Desse modo, diante de uma concepção de razão enfraquecida em sua capacidade de conhecer o mundo, a pesquisa filosófica recua um pouco para, antes de perguntar pela essência das coisas, questionar primeiro se somos capazes de conhecê-las.

As questões passam a ser: “podemos conhecer?”, se sim, “o que podemos conhecer?”, e se sim, “como podemos conhecer?”, e “quais os limites dessa capacidade de conhecer?” .

A filosofia será reduzia à epistemologia/teoria do conhecimento, e cria-se dois grandes paradigmas, o RACIONALISMO, para aqueles que defendem que o conhecimento é oriundo apenas da razão, e o EMPIRISMO, para aqueles que sustentam que o conhecimento é fruto dos sentidos por meio da experiência.

DESCARTES E O GRANDE RACIONALISMO

René Descartes (1596 – 1650) é “o” filósofo da modernidade. Ele sintetiza o espírito do seu tempo e problematiza o que será discutido a partir dele.

Ele nasceu na França e estudou no melhor colégio daquele país, que obviamente era jesuíta e onde se ensinava

a doutrina escolástica aristotélico-tomista, é claro.

O espírito mecanicista

A sociedade de sua época estava maravilhada com as engenhocas mecânicas que divertiam a aristocracia nos grandes jardins europeus, como a água corrente em tubulações subterrâneas que movimentavam robôs autômatos fazendo-os produzir sons musicais e quase fazê-los falar.

Mas não era só isso, bombas hidráulicas, roldanas, guindastes facilitavam a vida de muita gente. E

a invenção mais impressionante para a época, o relógio mecânico, a perfeita aplicação das teorias da física e da mecânica na construção de máquinas.

É nesse clima de euforia científica que Descartes cresce, sempre

incomodado com o fato de que na escola não lhe ensinam nada disso.

Apesar de católico, Descartes não era ortodoxo ao ponto de obedecer cegamente os dogmas de sua religião, e percebia claramente a incompatibilidade entre, os ensinamentos sobre o mundo natural promovidos pela igreja através de seus propagadores jesuítas nos colégios e nas universidades e os avanços da ciência.

Não aceitava a relutância da Igreja em admitir que seus ensinamentos sobre o mundo natural estavam errados, que, segundo ele, não passavam de falsas opiniões e de apego cego à tradição.

Ele não via aplicação prática daquilo que lhe fora ensinado no colégio e no meio acadêmico. Descartes era contemporâneo de Galileu e não ignorava os avanços dele na explicação do universo, principalmente porque Galileu partia de um ponto de vista racional onde qualquer pessoa, livre de preconceitos, e que tivesse disposta a usar a razão, poderia chegar as mesmas conclusões que ele.

E qual a linguagem usada por Galileu para explicar a natureza? Isso mesmo, a matemática. O uso do puro raciocínio, que poderia ser feito por qualquer pessoa. Descartes era obcecado pelo uso prático que se podia fazer da matemática.

A missão de Descartes

Insatisfeito com os conhecimento ultrapassados que recebeu e que ainda eram ensinados nas instituições de ensinos oficiais, conhecimentos totalmente

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desconexos, sem um princípio unificador, sem sistematicidade, ele decide viajar para conhecer o que o mundo tinha a ensinar.

Em uma das noites de sua viajem, sonhou que deveria erigir um novo conhecimento, sistemático, lógico, e totalmente fundamentado na razão, portanto, universal.

Foi então que decidiu se fixar em um lugar para mergulhar nos estudos. Queria ficar em Paris, mas a vida agitada, e o medo das perseguições da Igreja fez com que ele se mudasse para um lugar onde houvesse tolerância de pensamento, e parte, então, para a Holanda.

Descartes tinha o projeto de abarcar a totalidade do conhecimento e organizá-lo de forma sistemática, a começar por princípios seguros sobre os quais todas as áreas pudessem partir, de modo que se pudesse chegar a conhecimentos complexos progredindo dos simples, tal como uma equação matemática. Ele imaginou o conhecimento humano como uma árvore organizada da seguinte forma:

Sistematizar logicamente o saber humano dessa maneira, era prover um meio, um caminho, um método seguro, para se construir um conhecimento verdadeiro e universal. Então, em 1637 publica a obra que inaugura a filosofia moderna, o Discurso do método. E para alcançar o maior público possível, ele publica o livro em francês numa época que era costume publicar obras na língua pura que era o latim.

O caminho (método) certo

O que há de radical nessa obra é que diferentemente de todos os sistemas teóricos anteriores que já partiam para conhecer o mundo físico, aqui descartes dá um passo atrás e começa pelo “como” conhecemos, para saber se podemos ter acesso a um saber verdadeiro, não passível de erro.

Nessa obra Descartes propõe quatro regas básicas para se chegar a um conhecimento verdadeiro, são elas:

l) Regra da evidência - não aceitar por verdadeiro senão aquilo que se apresenta clara e distintamente ao espírito;

2) Regra da análise - dividir as dificuldades em tantas partes quantas seja possível para melhor solucioná-las;

3) Regra da síntese - ordenar os pensamentos dos mais simples para os mais complexos; e,

4) Regra da enumeração - fazer enumerações gerais e completas para se ter certeza de nada omitir.

Para Descartes, mente, alma, espírito e razão são palavras de mesmo significado. Portanto, na primeira regra ele está colocando a razão como critério par se ter evidência, clareza e distinção de alguma coisa, pois os sentidos são enganadores.

Esses são os mesmo passos usados pelo matemáticos que chegam às suas conclusões por processo de decomposição e síntese.

A dúvida metódica

Desse modo, para decompor seu pensamento no intuito de chegar ao primeiro princípio verdadeiro, claro e distinto, Descartes se utiliza da dúvida metódica, que é o processo de duvidar de tudo, das coisas mais simples que me chegaram pelos sentidos até as evidências matemáticas.

E para duvidar da matemática Descartes usa o artifício do gênio maligno, que segundo ele é um deus enganador que nos faz acreditar que estamos certo quando dizemos que dois mais dois são quatro, quando na verdade estamos errados e o resultado talvez seja outro.

Cogito, ergo sum

Dessa forma, ao duvidar de tudo, não posso ter certeza de nada. Mas desse processo, pode-se tirar um certeza, que nem mesmo a dúvida metódica pode me fazer duvidar. É a certeza de que se eu duvido. E se eu duvido, eu penso, e se penso, eu existo.

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Descartes encontrou o primeiro princípio fundador de sua filosofia: “penso, logo existo”. O problema agora é partir desse princípio para saber se as coisas existem e como podemos conhecê-las.

E esse não é um problema simples. Ele toma consciência que duvida, que pensa, que existe, mas esse existir é como pensamento puro, como uma coisa pensante (res cogitam), uma substância pensante, e não como o indivíduo Descartes, com um corpo, com essa cabeleira que parece uma peruca e com esse bigodinho ridículo.

Como ele vai provar logicamente, como ele vai deduzir a existência do mundo, incluindo seu próprio corpo, a partir dessa única certeza que tem de que existe, mas somente como substância pensante? Ele sabe que não pode ser a causa das coisas, então como elas existem?

A existência de Deus e do mundo

A única ideia que ele tem que não depende dele é a de que existe um ser perfeito, que é Deus. Ele chega a essa conclusão porque ele sozinho, como ser imperfeito, não poderia ter a ideia de perfeição, pois o perfeito não pode vir do imperfeito, mas o contrário. E ainda, sendo ele imperfeito, não poderia conceber essa ideia, portanto, ele já foi criado com ela, ou seja, ela é uma ideia inata.

A existência de Deus é a segunda certeza no fundamento do conhecimento verdadeiro empreendido por Descartes. Daí que se existe esse ser perfeito, ele não pode ser enganador, então, o mundo realmente existe. As ideias que tenho do mundo sempre estiveram em minha mente, pois foram colocadas por Deus.

Mas se esse mundo exterior chega ao pensamento por meio de ideias, e eu como ser imperfeito que sou, posso me enganar quanto a elas, cabe ao próprio pensamento descobrir quais dessas ideias são claras e distintas, ou seja, verdadeiras.

Outra evidência é a de que como essas ideias se referem ao mundo exterior a mim, esse mundo, assim, como o próprio corpo existem como uma extensão, uma res extensa.

Certo, o mundo existe, mas dele só podemos conhecer o que a matemática pode nos dizer, ou seja, sua extensão, as propriedades quantitativas (o que pode ser medido), nada de propriedades qualitativas como cheiro, sabor, quente frio, etc. Apenas as propriedades quantitativas são as ideias claras e distintas (verdadeiras) que podemos ter do mundo.

No pensamento cartesiano, o homem é substância pensante e extensa. A primeira como algo

abstrato que não se submete às leis físicas, a segunda como algo material que está totalmente subordinada às leis dos corpos. Assim a ciência estudará a parte extensa do homem, enquanto que a filosofia se encarregará de decifrar os mistérios do pensamento/racionalidade, principalmente de sua capacidade de conhecer.

Essa é a maior contribuição de Descartes ao debate filosófico, essa mudança de rumo que ele imprime na filosofia. A partir dele a grande tarefa dos filósofos será estabelecer “como” conhecemos, e quais os limites desse conhecimento.

FRANCIS BACON – CONHECIMENTO (EMPÍRICO) É PODER

Francis Bacon (1561-1626) foi um parlamentar inglês que se destacou como um grande cientista. Ele acreditava que ciência deveria servir para o progresso e bem estar das pessoas. Por isso, para ele, conhecimento é poder.

Como era típico de sua época, era crítico de Aristóteles e contrário ao silogismo dedutivo, fruto da mera argumentação abstrata. Para ele o conhecimento deveria se fundar nas base solidas do experimento, do método indutivo de investigação.

Seu método está descrito em sua obra Novum organum, onde ele afirma que o homem só pode progredir na ciência quando se livrar de quatro ilusões, ou ídolos. Quais sejam:

1º - Ídolo da tribo: não existem conexões entre a natureza do homem e das coisas;

2º - Ídolo da caverna: o indivíduo não deve analisar a natureza a partir de suas crenças particulares;

3º - Ídolo do foro: não se descobre o que a natureza é apenas conversando com os outros;

4º - Ídolo do teatro: não acredite em falsas ideias de doutrinas filosóficas ou científicas.

Somente tomando esses cuidados o homem estará apto a explorar os mistérios da natureza usando o método correto, qual seja, o da experimentação, que consiste em fazer uma hipótese, testá-la, buscando a maior quantidade de dados possível, e somente depois confirmar sua veracidade, podendo torná-la lei geral.

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ISAAC NEWTON E O GRANDE RELÓGIO CELESTE

O grande cientista que completou a revolução científica do século XVII foi Isaac Newton (1642 – 1727). Ele também era fascinado pelos inventos mecânicos de sua época, quando criança construiu pipas, moinhos, e até um relógio d’agua.

Na universidade ele conheceu a filosofia mecânica de Descartes e seus trabalhos de geometria, a explicação matemática de Galileu para o universo, e as leis de Kepler sobre os movimentos planetários.

Quando estudou a luz usou o método de observação e experimentação de Francis Bacon, e descobriu que as cores são um propriedade da luz e não dos objetos.

Newton se vale das duas grandes concepções de ciência de seu tempo, a matematização e a experiência. Mas ele não é apenas um seguidor dessas diferentes concepções, ele as unifica e as supera, na síntese que faz do empirismo de Francis Bacon e do racionalismo de Descartes.

Apesar de se utilizar da filosofia mecânica, Newton não gostava do materialismo que estava por trás dela, do fato desta filosofia ter tirado Deus da explicação do funcionamento do mundo.

Na base de todo o pensamento de Newton estava a crença em um Deus racional que havia criado um universo racional que poderia ser descoberto pela análise e pela matemática.

Em 1687, chegara o tempo dele descrever racionalmente a grande obra divina que era o universo, na sua grande obra Os princípios matemáticos da filosofia natural, popularmente conhecido como Principia.

Kepler já havia dito que as órbitas planetária eram elípticas, mas não explicou o motivo. No Principia,

Newton explica tudo com a sua teoria da gravitação universal.

Perceba a grandiosidade de sua obra, ela não explica apenas os fenômenos terrestres, mas todo o universo. Ele diz até como calcular a quantidade de massa de cada planeta. Explica o motivo da terra ser achatada nos polos e porque há uma saliência na região do equador. Ele descreve as leis de funcionamento do universo. É algo extraordinário.

O Principia foi a primeira obra científica a apresentar um trabalho quantitativo, exato, de um sistema matemático, baseado em experimentação e observação crítica. Ele concluiu o processo de explicação matemática do universo, desde o cair de uma maçã, ao movimento dos planetas.

Apesar da grandiosidade do sistema newtoniano, ele próprio admitia que não sabia o que era a gravidade, apenas como ela atua. Por isso foi acusado de usar em sua teoria conceitos medievais como a magia. Mas essas críticas em nada abalaram a grandiosidade de sua obra.

Para ele, espaço e tempo são absolutos, tendo conhecimento do que acontecia num determinado momento era possível calcular o que iria acontecer em outro. Os eventos/movimentos eram determináveis, como em uma máquina, um grande relógio para ser mais preciso. Descobrindo-se a causa de um efeito, poder-se-ia prever os efeitos seguintes, como uma grande engrenagem de causas e efeitos.

Inaugurava-se então uma grande era de inovações, onde os homens fariam uso das leis da natureza para controlar seus destinos. A revolução

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industrial muito dificilmente teria acontecido sem as ideias de Newton.

QUESTÕES 9. (2013) Os produtos e seu consumo constituem a meta declarada do empreendimento tecnológico. Essa meta foi proposta pela primeira vez no início da Modernidade, como expectativa de que o homem poderia dominar a natureza. No entanto, essa expectativa, convertida em programa anunciado por pensadores como Descartes e Bacon e impulsionado pelo Iluminismo, não surgiu “de um prazer de poder”, “de um mero imperialismo humano”, mas da aspiração de libertar o homem e de enriquecer sua vida, física e culturalmente.

CUPANI, A. A tecnologia como problema filosófico: três enfoques, Scientiae Studia. São Paulo, v. 2 n. 4, 2004 (adaptado).

Autores da filosofia moderna, notadamente Descartes e Bacon, e o projeto iluminista concebem a ciência como uma forma de saber que almeja libertar o homem das intempéries da natureza. Nesse contexto, a investigação científica consiste em a) expor a essência da verdade e resolver definitivamente as disputas teóricas ainda existentes. b) oferecer a última palavra acerca das coisas que existem e ocupar o lugar que outrora foi da filosofia. c) ser a expressão da razão e servir de modelo para outras áreas do saber que almejam o progresso. d) explicitar as leis gerais que permitem interpretar a natureza e eliminar os discursos éticos e religiosos. e) explicar a dinâmica presente entre os fenômenos naturais e impor limites aos debates acadêmicos. 10. (2013) TEXTO I

Há já algum tempo eu me apercebi de que, desde meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões como verdadeiras, e de que aquilo que depois eu fundei em princípios tão mal assegurados não podia ser senão mui duvidoso e incerto. Era necessário tentar seriamente, uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões a que até então dera crédito, e começar tudo novamente a fim de estabelecer um saber firme e inabalável.

DESCARTES, R. Meditacoes concernentes a Primeira Filosofia. São Paulo:

Abril Cultural, 1973 (adaptado).

TEXTO II É o caráter radical do que se procura que exige a

radicalização do próprio processo de busca. Se todo o espaço for ocupado pela dúvida, qualquer certeza que aparecer a partir daí terá sido de alguma forma gerada pela própria dúvida, e não será seguramente nenhuma

daquelas que foram anteriormente varridas por essa mesma dúvida.

SILVA, F.L. Descartes. a metafísica da modernidade. São Paulo: Moderna, 2001 (adaptado).

A exposição e a análise do projeto cartesiano indicam que, para viabilizar a reconstrução radical do conhecimento, deve-se a) retomar o método da tradição para edificar a ciência com legitimidade. b) questionar de forma ampla e profunda as antigas ideias e concepções. c) investigar os conteúdos da consciência dos homens menos esclarecidos. d) buscar uma via para eliminar da memória saberes antigos e ultrapassados. e) encontrar ideias e pensamentos evidentes que dispensam ser questionados. 11. (2014) É o caráter radical do que se procura que exige a radicalização do próprio processo de busca. Se todo o espaço for ocupado pela dúvida, qualquer certeza que aparecer a partir daí terá sido de alguma forma gerada pela própria dúvida, e não será seguramente nenhuma daquelas que foram anteriormente varridas por essa mesma dúvida.

SILVA, F.L. Descartes: a metafísica da modernidade.

São Paulo: Moderna, 2001 (adaptado).

Apesar de questionar os conceitos da tradição, a dúvida radical da filosofia cartesiana tem caráter positivo por contribuir para o(a) A) dissolução do saber científico. B) recuperação dos antigos juízos. C) exaltação do pensamento clássico D) surgimento do conhecimento inabalável. E) fortalecimento dos preconceitos religiosos. 12. (2012) TEXTO I

Experimentei algumas vezes que os sentidos eram enganosos, e é de prudência nunca se fiar inteiramente em quem já nos enganou uma vez.

DESCARTES, R. Meditações Metafísicas. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

TEXTO II Sempre que alimentarmos alguma suspeita de que

uma ideia esteja sendo empregada sem nenhum significado, precisaremos apenas indagar: de que impressão deriva esta suposta ideia? E se for impossível atribuir-lhe qualquer impressão sensorial, isso servirá para confirmar nossa suspeita.

HUME, D. Uma investigação sobre o entendimento.

São Paulo: Unesp, 2004 (adaptado).

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Nos textos, ambos os autores se posicionam sobre a natureza do conhecimento humano. A comparação dos excertos permite assumir que Descartes e Hume a) defendem os sentidos como critério originário para considerar um conhecimento legítimo. b) entendem que é desnecessário suspeitar do significado de uma ideia na reflexão filosófica e crítica. c) são legítimos representantes do criticismo quanto à gênese do conhecimento. d) concordam que conhecimento humano é impossível em relação às ideias e aos sentidos. e) atribuem diferentes lugares ao papel dos sentidos no processo de obtenção do conhecimento.

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CAPÍTULO 16 - ILUMINISMO

O iluminismo é um movimento intelectual de valorização da razão que tem início na Inglaterra ainda no século XVII, inspirado pela revolução científica, mas que toma maior destaque na França no século XVIII (devido à estrutura social daquele país e o impacto que a revolução daquele país teve no ocidente), e na região que posteriormente iria se tornar a Alemanha.

Assim como a revolução científica deu à luz, por meio da razão, as leis que regem o universo físico, os iluministas queriam trazer à luz, a sociedade, afastando-a das trevas dos preconceitos oriundos da tradição e da religião que perduraram durante toda Idade Média.

E que trevas eram essas? 1) O absolutismo monárquico, 2) o mercantilismo e 3) a estrutura social hierarquizada e sem mobilidade; todos sustentados pela autoridade irracional da tradição e da religião. Em suma, o Antigo Regime.

Essa estrutura irracional e opressora aprisiona o homem e não deixa ele se desenvolver, causando a infelicidade humana, e por isso deve ser combatida e exterminada.

Mas já que o sistema era tão ruim quanto pintavam os iluministas, porque as pessoas não se voltaram contra ele por conta própria? Por que elas estavam nas trevas e não conseguem enxergar a luz, devendo serem educadas para perceberem sua situação.

Por que a natureza é do jeito que é? Por que o rei governa? Por que a sociedade é dividida e rígida? “Por que Deus quer”. Com os avanços da razão nas ciências, esse tipo de fundamento não se sustentava mais. A razão deve agora guiar o homem em direção ao progresso, por meio da educação.

E essa tarefa de iluminar a sociedade foi abraçada com toda força e vigor pelos iluministas. Eles conseguiram propagar as ideias que derrubariam regimes inteiros e instalariam uma nova ordem mundial baseada na razão, na liberdade e na felicidade dos povos.

Eles tinham um novo projeto de sociedade, que seria organizada racionalmente, assim como o universo mecanicista de Newton. Dessa maneira, o método empírico-matemático usado para descobrir as leis físicas, seria usado também para organizar essa nova sociedade.

Começaremos a abordar o assunto pelo iluminismo inglês, pelo homem precursor desse movimento e que influenciou os iluministas franceses.

ILUMINISMO NA INGLATERRA

JOHN LOCKE: EMPIRISMO E LIBERALISMO POLÍTICO

O inglês John Locke (1632 – 1704) vem de uma família de comerciantes puritanos, estudou na universidade de Oxford, onde se formou médico, e sempre esteve envolvido na política. Lá ele teve contato com as ideias de Francis Bacon e Descartes.

Era contra a monarquia absolutista e por isso teve que se exilar na Holanda em 1683 no final do reinado de Carlos II, contra o qual ajudou a elaborar uma conspiração.

Com a revolução gloriosa, e a ascensão ao trono do holandês Guilherme de Orange, ele volta à Londres e pode se dedicar inteiramente à filosofia.

Mesmo já vindo se desenvolvendo antes dele, muitos o consideram o pai do empirismo, mas não há dúvidas de sua paternidade quanto ao liberalismo político.

Empirismo

A obra que trata sobre a capacidade de conhecermos é Ensaios acerca do entendimento humano, onde defende o empirismo afirmando que ao contrário do que dizia Descartes, não temos ideias inatas, nosso conhecimento é adquirido por meio dos

sentidos através da experiência.

Seu objetivo nessa obra é investigar, não o que conhecemos, mas o que, como, e os limites do processo de conhecer. Sua preocupação é em saber como a mente funciona.

Segundo ele, a mente do ser humano ao nascer é como um folha de papel em branco/tábula rasa, onde vão sendo impressos conhecimentos/ideias ao longo da vida, que nos chegam por meio dos sentidos.

“Suponhamos, pois, que a mente é, como dissemos, um papel branco desprovido de todos os caracteres, sem quaisquer ideias; como ela será suprida?

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De onde lhe provem este vasto estoque, que a ativa e que a ilimitada fantasia do homem pintou nela com uma variedade quase infinita? De onde apreende todos os matérias da razão e do conhecimento? A isso respondo, numa palavra, da experiência. Todo o nosso conhecimento está nela fundado e dela deriva fundamentalmente o próprio conhecimento.” (Ensaio sobre o entendimento humano. Livro II, cap. I, sec. 2).

Esse conhecimento nos chega através de uma experiência sensível imediata/sensação e é processado internamente por meio da reflexão. Adquirimos ideias simples pelos sentidos e elaboramos as complexas através da reflexão.

Mas por entender que a matemática é um conhecimento válido em termos lógicos, Locke não pode ser considerado um empirista radical.

Liberalismo político

Assim como não há ideias inatas, não existe também o direito inato, divino de governar. Locke era contra um governo absoluto, que tudo pudesse fazer, desrespeitando os direitos dos indivíduos e invadindo a esfera da sua intimidade.

Assim como Hobbes, ele vai tratar sobre a origem e a legitimidade do Estado, mas via diferir deste em muitos aspectos.

Suas ideias políticas estão contidas no Segundo tratado sobre o governo, obra que foi escrita para justificar e legitimar a revolução gloriosa, investigando até onde deve ir o poder de governar e para que ele serve.

Essa obra é um marco histórico no pensamento político ocidental, pois serviu de base para as principais revoluções liberais da Idade Moderna. O Segundo tratado sobre o governo é o primeiro e mais completo trabalho sobre o Estado liberal.

Estado de Natureza

Na mesma linha de Hobbes, e contrário a Aristóteles, a teoria individualista de Locke afirma que o homem é anterior à sociedade e ao Estado.

Mas diferentemente de Hobbes, ele afirma que realmente, historicamente, existiu um estágio pré-social e político onde o homem vivia em liberdade e igualdade, que não era um estado de guerra, mas de relativa paz, chamado de estado de natureza.

Nesse estado o homem já era um ser racional detentor de propriedade, esta entendida em sentido amplo como sua vida, liberdade e seus direitos naturais. Locke, assim como Hobbes, também foi um dos grandes

defensores do jusnaturalismo (jus = direito, naturalismo = natural).

A propriedade

Em um sentido mais restrito, a propriedade para Locke é também a posse de bens, sejam eles móveis ou imóveis. Os burgueses quase deliraram de alegria quando leram o que ele escreveu sobre a propriedade, que era muito mais favorável a eles do que a concepção de Hobbes, além de ser algo inovador para a época.

Para Hobbes, a propriedade não existia em estado de natureza tornando-se somente possível com a criação do estado, por isso o soberano, a causa de sua existência, podia dela dispo como bem lhe conviesse.

Para Locke, não. A propriedade já era possível desde o estado natureza como um direito do homem. E por ser um direito existente antes mesmo da criação da sociedade, não pode ser violado pelo Estado. Que bacana, não é?

Em estado de natureza o homem era livre e dono de sua pessoa e de seu trabalho. E era este o critério de aquisição de propriedade. A terra foi dada por Deus aos homens, mas pode se apropriar dela quem lhe imprimir o seu trabalho. Quem trabalha num pedaço de terra se torna seu proprietário, não podendo ninguém mais ter direito sobre esse pedaço.

Desse modo, se só posso ser dono do que conseguir trabalhar, então, minha propriedade será limitada, porque não poderei trabalhar em grandes extensões de terra, certo? Errado.

Cm a invenção do dinheiro, o que era útil, mas perecível, como a carne, o leite, arroz, trigo, etc, pôde ser trocado por moedas de ouro e prata, ou melhor, pôde ser comprado. O dinheiro possibilitou o comércio, e uma nova forma de adquirir propriedade, além do trabalho.

De limitada, a propriedade pôde se tornar ilimitada, basta ter dinheiro para comprá-la. Aqui, Locke legitima a acumulação de riquezas e, por conseguinte, a desigualdade.

Contrato social

O estado de natureza pensado por Locke, não era um estado de guerra como em Hobbes, havia até uma relativa paz. Então, por que fazer um pacto para criar o Estado?

Para estabelecer leis gerais aceitas por todos, resolver os conflitos que possam aparecer, com imparcialidade e força para fazer valer as decisões. Não

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se pode deixar que os particulares resolvam sozinhos os seus conflitos, pois não haverá justiça no resultado.

Disso decorre que seus objetivos principais são:

1) Preservar os direitos naturais, entendidos como a propriedade em sentido amplo, ou seja, vida, liberdade, e a propriedade em sentido estrito (posse de bens), e;

2) Proteger a comunidade política dela mesma (evitar guerra civil) e de inimigos externos.

Em Hobbes, o contrato social é um pacto de submissão. Em Locke, é um pacto de consentimento. Os homens de livre e espontânea vontade criam o Estado para preservar os direitos que já possuíam em estado de natureza (direitos naturais).

Sociedade política ou civil

A passagem do estado de natureza para o Estado se dá pelo consentimento unânime de todos os indivíduos, mas o mesmo não ocorre com a escolha da forma de governo, que deve ser uma escolha majoritária (pela maioria).

No caso da Inglaterra, pós revolução gloriosa, impera um sistema misto de governo, onde o rei representa a monarquia, a Câmara dos Lordes, a oligarquia, e a Câmara dos Comuns, a democracia. Mas, mesmo para um homem comum participar desta última, era necessário ter terras e dinheiro, pois só assim teria condições de participar da vida política. A democracia pensada por Locke é, nessa medida, exclusiva e elitista.

Na teoria política de Locke, o Estado não é invasivo na regulação da vida do indivíduo em sociedade, devendo haver liberdade de expressão, de pensamento, e de culto, e principalmente, não deve interferir na atividade econômica.

Ele existe apenas para preservar o bem comum, qual seja, a propriedade dos indivíduos, que consentiram viver em sociedade justamente para esse fim. Fora isso, o estado deve deixar o indivíduo em paz.

Para Locke, o Estado só se legitima quando existe o controle do governo pela sociedade, quando o governo é comprometido com a proteção do direito de propriedade (bem comum), e quando há o controle do executivo pelo legislativo.

Direito de resistência

Quando o governo deixa de preservar o bem comum, e começa a exercer o poder em interesse próprio, ele se torna tirânico, e a sociedade tem o direito

legítimo de se rebelar contra ele, podendo usar até mesmo a força.

Conclusão

John Locke foi um grande filósofo, tanto por seus trabalhos em teoria do conhecimento, quanto em política. A teorização da defesa dos direitos naturais, como a vida, a liberdade, e a propriedade dos indivíduos como fim a ser perseguido pelo Estado, faz dele o pai do liberalismo político.

Suas ideias políticas justificaram a Revolução Gloriosa, a revolução norte-americana, e a Revolução Francesa.

Não tem como entender a política de nosso tempo sem estudá-lo, pois suas ideias estão na base de nosso sistema político.

GEORGE BERKELEY

A marca deixada por George Berkeley (1685 – 1753) na história da filosofia foi a sua afirmação da imaterialidade do mundo, pois para ele, nós não podemos saber se existem as coisas materiais.

Esse filósofo irlandês, e sacerdote anglicano, acreditava que a Europa estava perdida no materialismo científico e no ceticismo ocasionado pela dúvida estimulada pelo pensamento filosófico, o que retirava as pessoas do caminho da fé, afastando-as de Deus.

Com base nisso, pediu recursos ao parlamento inglês para fundar uma Universidade na américa do norte para educar os jovens de lá, que, segundo ele, ainda tinham salvação. Passou três anos em Rhode Island, colônia inglesa nos EUA, mas voltou para Londres depois que percebeu que os recursos nunca seriam enviados.

Para combater esse estado de degradação, Berkeley ataca, em sua obra Tratado sobre os princípios do conhecimento humano, a base fundamental da ciência moderna formulada por Newton, que é a matéria.

Ele sustenta um tipo diferente de empirismo, ao afirmar que só podemos conhecer através dos sentidos que nos dão a percepção das coisas, mas nada além disso. Melhor dizendo, nós conhecemos, apenas, as percepções das coisas, mas nunca as coisas mesmas, pois elas não existem.

A matéria não existe, o que existe são as percepções (ideias) que temos da existência das coisas. Por isso que, para ele, “ser é perceber e ser percebido”.

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E ainda, essas percepções são apenas ideias simples, de experiências com objetos particulares, nunca podemos ter ideias complexas ou abstratas, porque elas não são originadas de experiências que temos com determinados objetos.

Esse negócio de ideias gerais e abstratas, isso é invenção de filósofo e cientista. Ora, se isso não existe, não há como existir as leis formuladas por Newton para explicar a natureza, e tchau ciência.

Em síntese, Berkeley defende a imaterialidade do mundo sustentando um idealismo imaterialista, segundo o qual, tudo o que existe são os sujeitos com suas percepções oriundas da experiência.

Mas então, poderiam argumentar que as coisas que não estão sendo percebidas não existem, ao que ele refutaria dizendo que existe um ser supremo que garante a existência das coisas a serem percebidas. E adivinhem quem ele diz que é esse ser supremo? Exatamente, Deus.

Perceba que, para ele, o mundo não existe de uma relação direta do indivíduo para com esse mundo, mas do mundo com indivíduo através de Deus que garante a percepção e o conhecimento do mundo ao indivíduo.

DAVID HUME E O PODER DO HÁBITO

Nascido em Edimburgo, na Escócia, Hume (1711-1776) abandona os estudos de direito para se dedicar à Filosofia. Passa a maior parte de sua vida na Inglaterra, onde se dedicou à política e ocupou cargos públicos, como o de embaixador na França.

Foi um filosofo muito importante e famoso, escrevendo sobre política, moral, teologia, e foi muito importante para a teoria do conhecimento, avançando nos estudos do empirismo. E é nessa parte de sua filosofia que vamos nos ater aqui.

Empirismo

Hume é um empirista radical, para ele, não existe conhecimento que não tenha sido adquirido pelos sentidos. Não existem ideias inatas, todas elas vão se formando em nossa mente desde quando nascemos e durante toda a nossa experiência de vida. Na experiência reside a fonte de nosso conhecimento. E como fazer para verificar se o que pensamos saber é falsa ou verdadeira?

Segundo ele, o que existe em nossa mente são percepções, que são de dois tipos:

1 – impressões, que são percepções fortes. Quando queimamos pela primeira vez a ponta do dedo em algo quente, temos a percepção do calor e da dor. Quando isso acontece novamente, não temos mais a percepção, por que ela já está em nossa mente, o que temos é uma impressão, que é o sentir a percepção novamente.

2 - ideias/pensamentos, que são percepções mais fracas. São as lembranças que temos das percepções. Quando lembramos do dedo queimando, temos apenas uma ideia (percepção mais fraca) do que aconteceu, mas não sentimos novamente a dor e o calor. Nossas ideias, portanto, são apenas cópias das impressões.

De posse disso, podemos agora perceber quando uma ideia é verdadeira ou falsa. Somente as verdadeiras tem origem na experiência.

E para saber quais delas se originam na experiência temos que decompor as ideias complexas até chegarmos às simples, se essas tiverem por base a experiência, são verdadeiras, e se da sua união surgir uma ideia complexa que também tem por base a experiência, então, ela também é verdadeira.

Imaginemos um pégaso, ele é um cavalo com asas. Temos a ideia de cavalo unida a ideia de asas. As duas ideias provêm de percepções reais, pois cavalo e asa existem, todos já vimos na realidade. Mas quando essas ideias se juntam, não há qualquer

correspondente disso no mundo empírico, real. Portanto, só podemos concluir que pégaso é uma ideia falsa.

Esse processo de decomposição é importante porque nossa mente pode nos enganar com seus truques que a razão não pode controlar. Por isso que um conhecimento, proveniente somente da razão não pode ser confiável, ele deve ter a experiência como base de verificação.

O mesmo processo se aplica a ideia de Deus, e do eu cartesiano. Se Deus existe, nós não podemos conhecê-lo, pois não há essa percepção da realidade. De outra banda, há medida que vamos vivendo vamos adquirindo várias percepções do eu, e cada uma delas diferentes umas das outras. Portanto, não existe essa unidade constante que é uma substância pensante. Isso não passa de invenção da mente.

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O hábito, a crença e o fim da causalidade

Quando uma criança solta alguma coisa pela primeira vez, ela não sabe que aquele objeto vai cair. Mas quando ela cresce, de tanto ela soltar coisas, ela aprende que cai.

Newton respondeu que as coisas caem porque existe a gravidade que a atrai para o chão. Mas o próprio Newton não sabia o que era a gravidade, ele nunca a viu, ou tocou nela, e nem sentiu. Você, agora, está sentindo a gravidade? Quando você pula você sente a gravidade lhe puxando para baixo? Não. Você apenas cai. E sabe que vai cair porque sempre experimentou isso, não é?

Ora, não existe uma lei racional chamada gravidade que é a causa de todos os corpos tenderem ao chão. Pensar nisso é apenas um truque da mente, o que existe são percepções disso, nada mais. Por termos o hábito de experimentarmos isso toda vez, acabamos tendo a crença de que isso sempre se repetirá.

Hume diz que não existem causas gerando efeitos, o que há é uma crença, oriunda das experiências habituais, de que toda vez que um evento x acontecer, um evento y também irá acontecer como seu efeito.

Por isso não há um conhecimento certo e universal de que o sol nascerá todos os dias, ou de que a noite sucederá ao dia, ou de que se eu me atirar de um penhasco eu vá cair. Para ele, portanto, não existe esse negócio de leis imutáveis da natureza. Isso é só um truque da mente humana.

Lembrem que falei no início que ele havia sido um filósofo famoso, pois é, sua teoria foi levada a sério pelos pensadores de seu tempo. Por isso, o seu empirismo radical, levado às últimas consequências, tinha que ser refutado, pois ele acabava com toda esperança de um conhecimento racional.

Sem o princípio de causalidade não há como existir nem ciência, nem moral, muito menos uma política racional.

ADAM SMITH E O LIVRE MERCADO

O escocês Adam Smith (1723 – 1790) era filho de família de classe média que estudou na Universidade de Oxford, na Inglaterra. É o pai do liberalismo econômico, ou seja, do capitalismo em sua forma mais pura.

Criticava o mercantilismo e defendia uma economia livre da

interferência do Estado. A este caberia apenas criar e

manter instituições públicas, como a justiça, construir obras públicas e cuidar da defesa nacional.

Sua teoria está contida em sua obra Investigação sobre a na natureza e as causas da riqueza das nações, que foi publicada em 1776 em plena Revolução Industrial. Ela é um marco na história da economia e serviu de fundamento teórico para a expansão do capitalismo industrial.

Nessa obra ele defende que devemos medir a riqueza de uma nação, não pela riqueza do Estado, mas pela riqueza gerada pelo seu povo através do trabalho, que deve ser especializado para aumentar a produtividade de bens. Ao Estado não é permitido interferir nas relações econômicas, pois o mercado se autorregula. Mas como?

Para ele, assim como o universo possui suas leis universais e imutáveis, o mercado também têm suas leis naturais, e são elas que regulam a economia. Mas que leis são essas? A oferta e a procura.

Oferta e procura

A economia é a ciência que estuda a criação e distribuição das riquezas limitadas tiradas da natureza. Quando existe muito produto ofertado no mercado, ele se torna abundante e seu preço tende a cair. Quando existe muita procura por um produto, o seu preço tende a aumentar. Resumindo:

Oferta > procura = baixa no preço;

Procura > oferta = alta de preço.

Isso se aplica a tudo, são as leis universais e imutáveis do mercado.

Mas quando se chega ao extremo da procura por um produto ser tão grande que eleve o preço às alturas? Ou, quando a oferta é tão grande que o preço do produto fique muito pequeno?

Então, diz Adam Smith, entra em ação a mão invisível do mercado para equilibrar a situação, e o mercado se auto regular.

No primeiro caso, em que a procura é maior que a oferta e o preço aumenta, exatamente por causa da alta do preço, a procura diminui e o preço cai.

No segundo caso, em que a oferta é muito grande e o preço diminui, exatamente por causa da diminuição do preço a produção diminui por que não compensa produzir para vender muito barato. Então, a oferta diminui e os preços aumentam.

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Nos dois casos, a mão invisível do mercado regulou/equilibrou a oferta e a procura. E isso se fez sem nenhuma necessidade de interferência do Estado na economia.

ILUMINISMO NA FRANÇA

Em meados do século XVIII a França ainda era um país caracteristicamente feudal. Havia um rei com poderes absolutos, uma sociedade altamente estratificada e praticamente sem mobilidade social, e ainda, com a Igreja católica legitimando todo esse sistema e ditando o que as pessoas podiam ou não fazer.

O pessoal já estava puto por lá, de saco cheio dos padres, bispos e cardeais corruptos que viviam no luxo às custas do trabalho alheio.

Os intelectuais franceses visitavam Londres e ficavam maravilhados com a ampla liberdade que o indivíduo desfrutava naquele lugar. As pessoas tinham a possibilidade de mudar de vida pelo esforço próprio, e os cargos público eram preenchidos por qualquer um que tivesse competência.

E acima de tudo, todos pagavam impostos e o rei poderia criar novos tributos somente com autorização do parlamento. Era algo de se admirar.

VOLTAIRE E A TOLERÄNCIA

De família rica burguesa, Voltaire (1694-1778) é o maior propagador do Iluminismo na França. Hábil escritor, denunciava constantemente a intolerância religiosa, o clero, e a prepotência dos poderosos, sendo muito vezes perseguido, preso, e exilado. Mas sempre combativo.

É autor de Dicionário Filosófico, onde faz uma veemente defesa da tolerância. Ele é um dos grandes defensores da liberdade de crença. É famosa a sua célebre frase: “Posso não concordar com nenhuma palavra que você diz, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-la”.

Concordava com Locke sobre a necessidade de limitações ao poder real, assim como o fato dos homens serem dotados de direitos naturais que não podiam ser violados pelo governo.

Não era um democrático, pois acreditava que o povão não tinha capacidade para participar da política. Era defensor de uma monarquia esclarecida que governasse de acordo com a razão. Trocava cartas com Frederico II da Prússia e a imperatriz Catarina da Rússia, aconselhando-os a tomar decisões racionais que levassem ao progresso de seus países, como em investir em educação.

MONTESQUIEU E OS TRÊS PODERES

Montesquieu (1689 – 1755) era um nobre que desde muito cedo recebeu formação iluminista, tornando-se um crítico severo das monarquias absolutistas e do clero.

A sua principal obra é O espírito das leis (1748), onde

ele analisa o comportamento político dos diferentes tipos de sociedades apresentadas pela história, e suas relações com o poder. A partir daí, ele traça um panorama geral da natureza, do espírito, das leis.

Ele não está interessado na discussão da legitimidade dos governos, como Hobbes e Locke, o que ele quer entender é o funcionamento dos governos e como eles se mantêm.

E para começar a discussão, contrapondo ao conceito medieval de Lei como fruto da vontade divina, ele apresenta uma nova concepção de Lei influenciado pela física newtoniana, com o intuito claro de tratar de política como uma área totalmente independente da religião.

Para ele, Lei é a relação necessária que deriva da natureza das coisas. Com essa concepção ele quer mostrar que apesar da variedade de costumes das diferentes sociedades que funcionam por regimes políticos distintos, podemos encontrar uma uniformidade/universalidade (como na física) no funcionamento (movimento) dos governos (massa/matéria/corpos).

Dessa análise do funcionamento das diversas formas de governo (monarquia, república, despotismo), ele chega à conclusão de que a liberdade (o direito de fazer tudo aquilo que a lei permite), só pode existir verdadeiramente quando há a separação (bem definida), harmonia, e independência entre os poderes executivo, legislativo, e judiciário.

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Ele é fã de John Locke e vai para Londres estudar o funcionamento da monarquia constitucional parlamentarista, que é o modelo de governo que ele defende, sendo a favor de um liberalismo aristocrático e não da democracia.

ROUSSEUAU E A VONTADE GERAL

Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) nasceu em Genebra, mas era filho de franceses calvinistas que fugiram da França por causa das perseguições.

Foi talvez o único filósofo iluminista que não nasceu em berço de ouro. Desde muito cedo teve que

trabalhar para se sustentar, e em 1742 vai para a França em busca de se destacar profissionalmente como professor de música.

Rousseau era um Homem inteligente e escrevia sobre muitos assuntos. Ele escreveu sobre música, poesia, mas foi com Discurso sobre a origem e a desigualdade entre os homens (1755), O contrato social (1762), e Emílio (1762), que Rousseau deixou seu nome marcado na história como um grande filósofo, influenciando com suas ideias os rumos da França, e do mundo ocidental por conseguinte.

Essas três obras são um todo que formam o seu pensamento político. Suas obras eram tão radicas que ele recebia críticas severas até mesmo de outros filósofos iluministas, principalmente de Voltaire que dizia que se fossemos dar ouvidos a Rousseau teríamos que voltar a andar de quatro.

Rousseau é também um grande contratualista, ele escreve sobre a origem do Estado seguindo o mesmo caminho de Hobbes e Locke, mas diverge totalmente de ambos. Vejamos, então, como ele concebe a passagem do homem em estado de natureza para a sociedade política.

Estado de Natureza

Ele também escreve um história hipotética da origem da humanidade porque considerava impossível conhecê-la verdadeiramente, já que se tinha tão pouco conhecimento e vestígios dessa época.

Para Rousseau, em estado de natureza o homem era solitário, livre, e feliz. Agia seguindo apenas seus bons instintos naturais e em harmonia com o seu meio natural. Era um bom selvagem.

Mas então, toda a desgraça aconteceu quando alguém cercou um pedaço de terra e disse que era seu, e pior, ninguém disse nada e ainda consentiram, dando início à propriedade privada.

Com a propriedade privada surgiu o egoísmo, a ganância, a diferença entre ricos e pobres e todos os sentimentos ruins que levam ao estado de guerra descrito por Hobbes.

Para estabelecer a segurança, os ricos proporam um pacto para a criação da sociedade onde todos se beneficiariam. Era só balela, com o tempo eles colocaram as garras de fora e começaram a explorar os pobres.

Pacto social

Para sair dessa relação de ganância generalizada, Rousseau propõe um novo pacto, baseado na vontade geral, onde todos terão vez e voz.

Nesse pacto, cada um deixa de ser um indivíduo e passa a ser cidadão. O que isso significa? Que cada um passará a ser entendido a partir do todo, da coletividade, pois fará parte de um corpo político.

É desse corpo político que surgirá a Lei, como fruto de uma vontade geral, que não é a simples soma de todas as vontades particulares, mas uma vontade originada e guiada da busca pelo bem comum, que por sua vez é a expressão do interesse de todos e não de um, ou de poucos.

O que Rousseau está propondo é algo revolucionário demais até para outros iluministas, que restringiam a cidadania a uns poucos detentores de posses.

Para ele, a liberdade só pode existir dentro de um sistema em que todos participem na criação da lei, que é a expressão da vontade geral da qual fazem parte todos os cidadãos. Ele dizia que nenhum homem pode ser melhor representado do que por ele próprio.

Outro fator que caracteriza essa liberdade é a obediência à lei, que acontece justamente porque a lei é fruto da vontade geral da qual todos participam. Um povo só é livre quando tem o poder de atribuir-se leis.

A soberania em Rousseau, desse modo, advém do povo, pois somente assim, ela é legítima. E aqui devemos esclarecer que o soberano é esse corpo de leis criadas em vistas ao bem comum. É ele que deve guiar os atos de quem vai administrar o Estado.

A participação direta do povo é na criação das leis, ou seja, no legislativo, mas a administração, o executivo, poderá caber a um (monarquia), a poucos

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(aristocracia), ou a muitos (democracia) a depender das características do país em questão, como o tamanho de seu território, de sua população, etc.

Independente da forma de governo que o Estado venha a adotar, o importante é que ele governe para o soberano, que é a vontade geral do povo.

ENCICLOPÉDIA

O matemático D’Alembert e o escritor Diderot não eram filósofos, mas foram os responsáveis pela Enciclopédia, a grande obra que marcaria o movimento iluminista.

Ele é a reunião de escritos de mais de cem autores e foi a maior forma de propagação do pensamento iluminista, tanto é que eles ficaram conhecidos como enciclopedistas.

Ela é fruto da crença que eles compartilhavam de que a razão traria progresso tanto espiritual quanto material para os homens. Além disso, serviria como o grande livro a ser

usado nesse processo educacional de tirar as pessoas das trevas a que estavam submetidas.

A Enciclopédia foi a obra que reuniu a descrição das maiores invenções tecnológicas, e era um manual de como funcionavam as máquinas mais sofisticadas da época no campo do artesanato, manufatura, e indústria.

OS FISIOCRATAS

Na economia destacaram-se pensadores como Quesnay e Turgot. Eles defendiam que a verdadeira riqueza de um país advinha da natureza, ou seja, da agricultura.

O artesanato gerava pouca renda, e o comércio só fazia circular a riqueza. Somente a agricultura gerava os produtos, e por isso, somente ela produzia riqueza.

Eles eram fervorosos críticos do mercantilismo, pois acreditavam que assim como existem as leis naturais

que regem o universo, também há leis naturais na economia.

O Estado deveria parar de intervir na economia, porque isso não é de acordo com a natureza, e devia deixar ela correr solta. A competitividade selecionaria os melhores e enriqueceria quem merecia enriquecer.

O DESPOTISMO ESCLARECIDO

Apesar do iluministas serem contrário ao absolutismo, haviam reis que gostaram desse negócio de progresso material por meio da educação.

Esses reis aplicaram certos ideais iluministas em

seus governos e ficaram conhecidos como déspotas esclarecidos. Entre eles se destacaram Frederico II da Prússia, José II da Áustria, Catarina II da Rússia, e Dom José I de Portugal, motivado por seu ministro Pombal.

Os três primeiros ampliaram a liberdade de culto e investiram em educação, enquanto o último procurou implantar um governo mais racional em sua administração, e que melhor explorasse as riquezas do reino.

ILUMINISMO NA ALEMANHA

IMMANUEL KANT

Kant (1724-1804) nasceu na Prússia, na cidade de Koningsberg, onde levou uma vida extremamente regrada e simples. De origem protestante e humilde, nunca se casou, nem saiu de sua cidade natal. Dizem que quando alguém queria acertar o relógio, esperavam ele passar para saber a hora.

Apesar de seu estilo de vida simples, Kant foi um dos maiores filosóficos da história. Conheceu fama ainda em vida e suas obras sintetizaram o espírito de sua época, sendo ele o maior porta voz do modo de vida individualista liberal.

A sua doutrina filosófica moldou o modo de ver e pensar o mundo no alvorecer da contemporaneidade,

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influenciando diversas áreas do saber. Não há como entender qualquer filósofo que veio depois dele, sem estudá-lo à fundo, pois ele é leitura obrigatória para todo aspirante à intelectual.

Conheceu a física de Newton na universidade, reconheceu a contribuição de Hume sobre os limites da nossa capacidade de conhecimento, e estudou profundamente os filósofos iluministas franceses. Foi um pacifista e defensor do regime republicano, apoiando a independência norte-americana.

Ele escreveu as três grandes críticas das mais importantes áreas, quais sejam, a teoria do conhecimento, a moral, e a estética, além de ter formulados os princípios do direito, e ter escrito À paz perpétua (1795), texto que serviu de inspiração para criação da Organização das Nações Unidas (ONU).

É de se deixar claro que o termo crítica está sendo usado no sentido de análise, e não no sentido negativo de escrever coisas ruis sobre determinado assunto. O que ele estava fazendo era analisar o que os filósofos haviam escrito sobre a razão.

Crítica da razão pura

Na época de Kant a física newtoniana estava a todo vapor, os avanços obtidos pelas ciências eram indiscutíveis, máquinas eram construídas de acordo com suas leis e a humanidade começava a acordar para as possibilidades de um progresso material e domínio da natureza sem precedentes na história.

Em contra partida, no campo da metafísica a discussão não tinha fim, não havia consenso, muito menos progresso no debate, ninguém apresentava uma teoria que fosse universalmente aceita. Perguntas como o que era Deus e a alma, sempre tinham muitas respostas, mas nenhum consenso.

Então, o que Kant pretende responder nessa primeira crítica é porque a física e a matemática progrediram como ciência, enquanto a metafísica não. E para isso ele teria que passar pelo grande problema epistemológico sobre a possibilidade de conhecimento das coisas: como nós conhecemos, e quais os limites do conhecimento.

Nós já vimos que haviam duas correntes filosóficas opostas, que davam respostas antagônicas sobre como conhecemos. O racionalismo dizia que tudo que conhecemos já estava em nossa mente como ideias, e o empirismo defendia que o conhecimento só era possível pela experiência dos sentidos com os objetos exteriores a nós.

Kant fez a grande síntese entre essas duas teorias e ainda foi além. Este feito o tornou o grande filósofo da transição entre o mundo antigo e o moderno.

Ele dizia que ambos estavam certos, porque utilizamos a experiência e a razão para obtermos conhecimento, e ambos estavam errados, porque não utilizamos apenas uma ou outra.

Mas assim como Copérnico avançou na explicação do sistema solar ao colocar o sol no centro, contrariando a teoria geocêntrica, era preciso abordar a questão do conhecimento por um ponto de vista diferente, colocando o sujeito também no centro da questão.

O homem não tem que regular o seu entendimento pela análise dos objetos, mas os objetos é que tem que ser estudados a partir da capacidade de entendimento do homem. Essa é a revolução copernicana que Kant imprime na filosofia.

Para Kant, era necessário investigar o que existe em nós que nos permite conhecer. A essa investigação ele chamou de filosofia transcendental, não no sentido metafísico, mas no sentido imanente de conhecer. O que é característico do homem que o permite conhecer? Ele nos diz que é a sensibilidade e o entendimento. Mas como elas funcionam?

Os dados do conhecimento, o material, nos chega por meio dos sentidos, das experiências, no dizer dele, pela sensibilidade. Sempre percebemos algo situado no espaço e tempo, mas esses conceitos não estão fora de nós, são forma a priori de percepção das coisas exteriores. Ou seja, espaço e tempo estão em nós e não no mundo.

Depois que percebemos uma coisa em um determinado lugar e tempo, essas percepções vão para o nosso entendimento, que vai trabalhá-las por meio de categorias inerentes a nós, como por exemplo, a substância, a existência e a causalidade. Esta última, muito importante para o avanço da ciência.

Essas categorias são conceitos puros do entendimento que estão presentes em nós, mesmo antes de qualquer experiência. São elas que fazem a síntese dos dados percebidos para que possamos produzir conhecimento. Nós pensamos os objetos por meio delas.

Quando soltamos uma maçã, ela sempre cai no chão por causa da gravidade. Quando colocamos a mão no fogo ela queima porque o fogo é quente e causa a queimadura. Mas essa relação de causalidade de um evento x gerar um efeito y não está nas coisas, nem é uma crença proveniente do hábito (como afirmara Hume), ela

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é o produto de nosso entendimento do funcionamento do mundo. Quando procuramos entender um objeto, não conseguimos entendê-lo como ele é em si mesmo. O que nós entendemos é só o que podemos entender com nossa capacidade de conhecimento. Ou seja, entender um objeto é entendê-lo somente como ele aparece para nós, entendemos apenas seus fenômenos, suas manifestações. É por isso que a ciência (física newtoniana) conseguiu avançar, porque ela trata de estudar os fenômenos, e não o objeto/a coisa em si mesma. Mas dizer que os objetos devem ser entendidos a partir do sujeito não é cair em subjetivismo? Onde está a objetividade da ciência? Para Kant, a objetividade reside no sujeito, nas condições a priori da experiência. Não adianta tentar entender as coisas pelas leis do mundo porque as leis estão no sujeito. E como todo ser racional possui essa mesma estrutura de capacidade de conhecimento, conseguindo conhecer da mesma maneira, ela não é singular a um indivíduo A ou B, mas é universal à todo o gênero humano. Ser racional é possuir essa estrutura a priori que possibilita a nossa capacidade de conhecer. A razão é a grande legisladora que dita as leis pelas quais conhecemos as coisas, ou melhor, seus fenômenos. Mas sendo ela impotente para conhecer a coisa em si mesma, não pode falar, nem legislar nada sobre metafísica. Os conceitos de alma, Deus, liberdade, por exemplo, só podem no máximo ser pensados, mas nunca conhecidos efetivamente.

A metafísica ao se propor ser um estudo da essência das coisas (lembrem dos gregos) só pode cair em contradições. Por esse motivo é que não se consegue ter avanço na metafísica, como se tem na física e na matemática. Imagine alguém dizer que conheceu/entendeu o que seja Deus, que teve um conhecimento objetivo do que ele seja; Kant perguntaria, mas como se todo nosso conhecimento começa pela experiência? Qual foi o contato que você teve com Ele? Mas Newton disse que descobriu as leis que regem o funcionamento do universo, demonstrou e provou que estava certo, e todos tiveram que concordar com ele, por que através de suas experiências e cálculos matemáticos, ele usou a razão, o entendimento, para dizer quais seriam essas leis. Lembrem-se, ele não disse o que era a gravidade, apenas a descreveu como ela se manifesta para nós. Crítica da razão prática A Crítica da razão prática é a obra em que ele analisa os fundamentos do agir moral. O que fazer? Por que agir de tal maneira? São as perguntas que ele tentar responder nessa obra.

Kant rejeita todas as doutrinas morais anteriores porque, segundo ele, elas estão fundamentadas em concepções metafísicas, portanto, impossíveis de serem conhecidas pelo homem. Agir de maneira a conseguir um lugar no céu, ou de acordo com o bem comum, ou para buscar a felicidade, ou para evitar a dor, ou para alcançar um interesse; nada disso faz sentido para ele, porque todas essas concepções metafísicas não podem ser racionalmente sustentadas.

Quando ele fala que não podem ser racionalmente sustentadas, ele quer dizer que não podem servir de fundamento para um agir moral que seja universal. Kant está à procura de uma fundamentação que sirva para todo ser racional, independentemente de tempo e espaço, ou seja, não importa onde e quando ele esteja.

Todo ser racional vai agir de acordo com essa fundamentação. E qual é a única coisa que é inerente ao homem independente do lugar ou da época que ele esteja vivendo? A razão.

O homem tem que seguir apenas as leis universais que a razão ordena para o agir moral, nada de ficar buscando outros motivos.

Para Kant, a moral produz dois tipos de ordens, que ele chama de imperativos: os hipotéticos e os categóricos.

Quando o homem age visando algum interesse, ou seguindo alguma inclinação, ele age de acordo com os imperativos hipotéticos.

Já quando ele age sem pretender obter nada, totalmente desinteressado, sua ação está obedecendo um imperativo categórico. Somente esse tipo de ação é, para Kant, uma ação racional, porque é realizada somente por dever, e pelo dever.

Mas o homem não é um robô. Ele tem o livre arbítrio, a liberdade para decidir qual tipo de imperativo vai seguir. Desse modo, ele deve ter a vontade, independente das circunstâncias, de seguir a lei moral. Essa vontade desprovida de qualquer inclinação é a boa vontade. Para Kant, o homem só é racionalmente moral quando age por dever, sem nenhum tipo de interesse ou inclinação. Só esse tipo de ação pode ser universalizável, que é uma exigência da razão. Assim, a resposta que Kant dá para a pergunta “o que fazer”, é: “age de tal maneira que o motivo que te levou a agir possa se tornar lei universal”. Essa é a regra de ouro da moral kantiana, que serve para guiar o agir moral em qualquer lugar, tempo e circunstância. É uma regra universal. Assim, ele responde também à pergunta: “por que agir dessa maneira?”. O homem deve agir dessa forma porque essa é a maneira racional de agir. Seguir uma lei ditada pela razão.

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Kant estabelece dessa forma a deontologia moral, que é agir somente por dever. E essa doutrina moral é formalista porque não admite nenhum tipo de motivação que não seja o dever. A dignidade da pessoa humana Segundo Kant, o homem ao agir seguindo a regra de ouro estará, ao mesmo tampo, sendo racional, e portanto, autônomo, e ainda, respeitando a dignidade do outro, pois ao tratar o outro como gostaria de ser tratado, está respeitando a pessoa como um fim em si mesma e não como um meio para se chegar a algo. O esclarecimento Kant talvez seja o único filósofo a se perguntar o que foi esse movimento que estava acontecendo em sua época conhecido como Iluminismo. E o descreve como sendo a saída do homem da sua menor idade para começar uma época em que ele iria começar a pensar por si mesmo. Não iria mais estar preso a dogmatismos religiosos ou metafísicos, mas seguiria os preceitos da razão. “Ouse saber” era o lema que ele atribuía a esse movimento. QUESTÓES 13. (2012) É verdade que nas democracias o povo parece fazer o que quer; mas a liberdade política não consiste nisso. Deve-se ter sempre presente em mente o que é independência e o que é liberdade. A liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem; se um cidadão pudesse fazer tudo o que elas proíbem, não teria mais liberdade, porque os outros também teriam tal poder.

MONTESQUIEU. Do Espirito das Leis. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1997 (adaptado).

A característica de democracia ressaltada por Montesquieu diz respeito A) ao status de cidadania que o indivíduo adquire ao tomar as decisões por si mesmo. B) ao condicionamento da liberdade dos cidadãos à conformidade às leis. C) à possibilidade de o cidadão participar no poder e, nesse caso, livre da submissão às leis. D) ao livre-arbítrio do cidadão em relação àquilo que é proibido, desde que ciente das consequências. E) ao direito do cidadão exercer sua vontade de acordo com seus valores pessoais.

14. (2013) Para que não haja abuso, é preciso organizar as coisas de maneira que o poder seja contido pelo poder. Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo corpo dos principais, ou dos nobres, ou do povo, exercesse esses três poderes: o de fazer leis, o de executar as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as

divergências dos indivíduos. Assim, criam-se os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, atuando de forma independente para a efetivação da liberdade, sendo que esta não existe se uma mesma pessoa ou grupo exercer os referidos poderes concomitantemente.

MONTESQUIEU, B. Do espirito das leis. São Paulo Abril Cultural, 1979

(adaptado).

A divisão e a independência entre os poderes são condições necessárias para que possa haver liberdade em um Estado. Isso pode ocorrer apenas sob um modelo político em que haja a) exercício de tutela sobre atividades jurídicas e políticas. b) consagração do poder político pela autoridade religiosa. c) concentração do poder nas mãos de elites técnico-científicas. d) estabelecimento de limites aos atores públicos e às instituições do governo. e) reunião das funções de legislar, julgar e executar nas mãos de um governante eleito.

15. (2012) Esclarecimento é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a causa dela não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem. Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento. A preguiça e a covardia são as causas pelas quais uma tão grande parte dos homens, depois que a natureza de há muito os libertou de uma condição estranha, continuem, no entanto, de bom grado menores durante toda a vida.

KANT, I. Resposta à pergunta: o que é esclarecimento? Petrópolis: Vozes, 1985

(adaptado).

Kant destaca no texto o conceito de Esclarecimento, fundamental para a compreensão do contexto filosófico da Modernidade. Esclarecimento, no sentido empregado por Kant, representa: A) a reivindicação de autonomia da capacidade racional como expressão da maioridade. B) o exercício da racionalidade como pressuposto menor diante das verdades eternas. C) a imposição de verdades matemáticas, como caráter objetivo, de forma heterônoma. D) a compreensão de verdades religiosas que libertam o homem da falta de entendimento. E) a emancipação da subjetividade humana de ideologias produzidas pela própria razão.

16. (2012) Até hoje admitia-se que nosso conhecimento se devia regular pelos objetos; porém, todas as tentativas

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para descobrir, mediante conceitos, algo que ampliasse nosso conhecimento malogravam-se com esse pressuposto. Tentemos, pois, uma vez, experimentar se não se resolverão melhor as tarefas da metafísica, admitindo que os objetos se deveriam regular pelo nosso conhecimento.

KANT, I. Crítica da razão pura. Lisboa: Calouste-Guibenkian, 1994 (adaptado).

O trecho em questão é uma referência ao que ficou conhecido como revolução copernicana da filosofia. Nele, confrontam-se duas posições filosóficas que a) assumem pontos de vista opostos acerca da natureza do conhecimento. b) defendem que o conhecimento é impossível, restando-nos somente o ceticismo. c) revelam a relação de interdependência entre os dados da experiência e a reflexão filosófica. d) apostam, no que diz respeito às tarefas da filosofia, na primazia das ideias em relação aos objetos. e) refutam-se mutuamente quanto à natureza do nosso conhecimento e são ambas recusadas por Kant.

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GABARITO

UNIDADE 1 – FILOSOFIA ANTIGA

1. d

2. d

3. b

4. e

5. c

6. c

7. a

8. a

UNIDADE 2 – FILOSOFIA MEDIEVAL

Ainda não houveram questões.

UNIDADE 3 – FILOSOFIA MODERNA

1. b

2. e

2. c

4. c

5. c

6. e

7. a

8. b

9. c

10. b

11. d

12. e

13. b

14. d

15. a

16. a