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FICHAMENTO BANDEIRA DE MELLO SERVIÇO PÚBLICO E OBRA PÚBLICA I CONCEITO DE SERVIÇO PÚBLICO Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público  – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais - , instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo. Com efeito, ao erigir-se algo em serviço público, bem relevantíssimo da coletividade, quer-se também impedir, de um lado, que terceiros os obstaculizem e; de outro; que o titular deles; ou quem lhe haja sido credenciado a prestá-los; procedam, por ação ou omissão, de modo abusivo, quer por desrespeitar direitos dos administrados em geral, quer por sacrificar direitos ou conveniências dos usuários do serviço. Só merece ser designado como serviço público aquele concernente à prestação de atividade e comodidade material fruível singularmente pelo administrado, desde que tal prestação se conforme a um determinado e específico regime: o regime de Direito Público, o regime jurídico-administrativo. Conclui-se, pois, espontaneamente, que a noção de serviço público há de se compor necessariamente de dois elementos: (a) um deles, que é o substrato material, consistente na prestação de utilidade ou comodidade fruível singularmente pelos administrados; o outro, (b) traço formal indispensável, que lhe dá justamente caráter de noção jurídica, consistente em um específico regime de Direito Público, isto é, numa “unidade normativa”. a) Substrato material da noção de serviço público

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FICHAMENTO BANDEIRA DE MELLO

SERVIO PBLICO E OBRA PBLICA

I CONCEITO DE SERVIO PBLICO

Servio pblico toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada satisfao da coletividade em geral, mas fruvel singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faa as vezes, sob um regime de Direito Pblico portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restries especiais - , institudo em favor dos interesses definidos como pblicos no sistema normativo.

Com efeito, ao erigir-se algo em servio pblico, bem relevantssimo da coletividade, quer-se tambm impedir, de um lado, que terceiros os obstaculizem e; de outro; que o titular deles; ou quem lhe haja sido credenciado a prest-los; procedam, por ao ou omisso, de modo abusivo, quer por desrespeitar direitos dos administrados em geral, quer por sacrificar direitos ou convenincias dos usurios do servio.

S merece ser designado como servio pblico aquele concernente prestao de atividade e comodidade material fruvel singularmente pelo administrado, desde que tal prestao se conforme a um determinado e especfico regime: o regime de Direito Pblico, o regime jurdico-administrativo.

Conclui-se, pois, espontaneamente, que a noo de servio pblico h de se compor necessariamente de dois elementos: (a) um deles, que o substrato material, consistente na prestao de utilidade ou comodidade fruvel singularmente pelos administrados; o outro, (b) trao formal indispensvel, que lhe d justamente carter de noo jurdica, consistente em um especfico regime de Direito Pblico, isto , numa unidade normativa.

a) Substrato material da noo de servio pblico

A atividade estatal denominada servio pblico a prestao consistente no oferecimento, aos administrados em geral, de utilidade ou comodidades materiais (como gua, luz, gs, telefone, transporte coletivo etc.) singularmente fruveis pelos administrados que o Estado assume como prprias, por serem reputadas imprescindveis, necessrias ou apenas correspondentes a convenincias bsicas da Sociedade, em dado tempo histrico. Alis, por isso que as presta sob regime de Direito Pblico, diretamente ou atravs de algum por ele qualificado para tanto.

As atividades em questo no pertencem esfera da livre iniciativa, sendo estranhas, ento, ao campo da explorao da atividade econmica.

b) Elemento formal caracterizador do servio pblico: seu regime jurdico

O segundo elemento formal, isto , a submisso a um regime de Direito Pblico, o regime jurdico-administrativo, que confere carter jurdico noo de servio pblico.

Convm, ento, enumerar princpios que inexoravelmente tero de comparecer quando se esteja perante uma atividade qualificvel como servio pblico.

Princpios do servio pblico

Leis de Rolland (administrativista francs): (a) mutabilidade, (b) continuidade e (c) igualdade.

Hely Lopes Meirelles: (a) permanncia, que o nome que se atribui ao princpio da continuidade; (b) generalidade, que corresponde ao princpio da igualdade; (c) eficincia, que exige a atualizao do servio, outra designao para a chamada mutabilidade; (d) modicidade, exigente de tarifas razoveis; e (e) cortesia.

No servio pblico, a figura estelar no seu titular nem o prestador dele, mas o usurio. Com efeito, em funo dele, para ele, em seu proveito e interesse que o servio existe. O artigo 175, inciso III, da Constituio Federal determina que a lei dispor sobre os direitos dos usurios.

No entender do Professor Celso Antnio Bandeira de Mello, os princpios do servio pblico que se constituem no aspecto formal do conceito e compem, portanto, seu regime jurdico so os seguintes:

1) Dever inescusvel do Estado de promover-lhe a prestao, seja diretamente, nos casos em que prevista a prestao direta, seja indiretamente, mediante autorizao, concesso ou permisso, nos casos em que permitida tal modalidade, que, de resto, a regra geral.

2) Princpio da supremacia do interesse pblico, em razo do que, tanto no concernente sua organizao quanto no relativo ao seu funcionamento, o norte obrigatrio de quaisquer decises atinentes ao servio sero as convenincias da coletividade; jamais os interesses secundrios do Estado ou dos que hajam sido investidos no direito de prest-los.

3) Princpio da adaptabilidade, ou seja, sua atuao e modernizao, conquanto, como lgico, dentro das possibilidades econmicas do Poder Pblico.

4) Princpio da universalidade, por fora do qual o servio indistintamente aberto generalidade do pblico.

5) Princpio da impessoalidade, do que decorre a inadmissibilidade de discriminaes entre usurios.

6) Princpio da continuidade, significando isto a impossibilidade de sua interrupo e o pleno direito dos administrados a que no seja suspenso ou interrompido.

7) Princpio da transparncia, impositivo da liberao a mais ampla possvel ao pblico em geral do conhecimento de tudo o que concerne ao servio e sua prestao.

8) Princpio da motivao, isto , o dever de fundamentar com largueza todas as decises atinentes ao servio.

9) Princpio da modicidade de tarifas; deveras, se o Estado atribui to assinalado relevo atividade a que conferiu tal qualificao, por consider-lo importante para o conjunto de membros do corpo social, seria rematado dislate que os integrantes desta coletividade a que se destinam devessem, para desfrut-lo, pagar importncias que os onerassem excessivamente e, pior que isto, que os marginalizassem.

10) Princpio do controle (interno e externo) sobre as condies de sua prestao.

Percebe-se, sem dificuldade, ento, que o primeiro elemento do servio pblico absolutamente insuficiente para configur-lo, de vez que se trata de simples suporte ftico, substrato material, sobre que se constri a noo jurdica propriamente dita. Por isso, tal substrato pode existir inmeras vezes sem que, entretanto, se possa falar em servio pblico. Isto , quando houver prestao de utilidade ou comodidade, oferecida pelo Estado e fruvel diretamente pelos administrados, haver servio governamental, mas no necessariamente servio pblico. Este s existir se o regime de sua prestao for o regime administrativo, ou seja, se a prestao em causa configurar atividade administrativa pblica, em uma palavra, atividade prestada sob o regime de Direito Pblico.

II TITULARIDADE DO SERVIO E TITULARIDADE DA PRESTAO

No se deve confundir a titularidade do servio com a titularidade da prestao do servio.

O fato de o Estado (Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios) ser titular de servios pblicos, ou seja, de ser o sujeito que detm senhoria sobre eles no significa que deva obrigatoriamente prest-los por si ou por criatura sua quando detenha a titularidade exclusiva do servio.

Na esmagadora maioria dos casos estar apenas obrigado a disciplin-los e a promover-lhes a prestao.

Assim, tanto poder prest-los por si mesmo como poder promover-lhes a prestao conferindo a entidades estranhas ao seu aparelho administrativo (particulares e outras pessoas de direito pblico interno ou da administrao indireta delas) titulao para que os desempenhem, isto , para que os prestem segundo os termos e condies que fixe e, ainda assim, enquanto o interesse pblico aconselhar tal soluo (sem prejuzo do devido respeito aos interesses econmicos destes terceiros que sejam afetados com a retomada do servio). Ou seja, poder conferir autorizao, permisso ou concesso de servios pblicos para que sejam efetuados por tais pessoas.

H certos servios que so pblicos quando prestados pelo Estado, mas que concernem a atividades em relao s quais no pretendeu deter exclusividade.

III SERVIOS PBLICOS E OUTRAS ATIVIDADES ESTATAIS

Servio pblico e obra pblica

Obra pblica a construo, reparao, edificao ou ampliao de um bem imvel pertencente ou incorporado ao domnio pblico. Obra pblica no servio pblico.

a) A obra , em si mesma, um produto esttico; o servio uma atividade, algo dinmico.

b) A obra uma coisa: o produto cristalizado de uma operao humana; o servio a prpria operao ensejadora do desfrute.

c) A fruio da obra, uma vez realizada, independe de uma prestao, captada diretamente, salvo quando apenas o suporte material para a prestao de um servio; a fruio do servio a fruio da prpria prestao; assim, depende sempre integralmente dela.

d) A obra, para ser executada, no presume a prvia existncia de um servio; o servio pblico, normalmente, para ser prestado, pressupe uma obra que lhe constitui suporte material.

Servio pblico e poder de polcia

Enquanto o servio pblico visa a ofertar ao administrado uma utilidade, ampliando, assim, seu desfrute de comodidades, mediante prestaes feitas em prol de cada qual, o poder de polcia, inversamente (conquanto para a proteo do interesse de todos), visa a restringir, limitar, condicionar, as possibilidades de sua atuao livre, exatamente para que seja possvel um bom convvio social.

Ento, a polcia administrativa constitui-se em uma atividade orientada para a conteno dos comportamentos dos administrados, ao passo que o servio pblico, muito ao contrrio, orienta-se para a atribuio aos administrados de comodidades e utilidades materiais.

Servio pblico e explorao estatal de atividade econmica

No se deve utilizar a expresso servios para nomear as atividades industriais ou comerciais que o Estado, a teor do artigo 173 e pargrafos da Constituio, desempenha basicamente sob regime de Direito Privado, por se constiturem em explorao de atividade econmica, isto , atividade prpria dos particulares; atividade privada, portanto, e, bem por isto, insuscetvel de ser qualificada como servio pblico.

IV SERVIOS PBLICOS POR DETERMINAO CONSTITUCIONAL

So obrigatoriamente servios pblicos (obviamente quando volvidos satisfao da coletividade geral) os arrolados como de competncia das entidades pblicas.

No que concerne esfera federal, o que se passa com o servio postal e o Correio Areo Nacional, com os servios de telecomunicaes, servios de radiodifuso sonora (rdio) e de sons e imagens (televiso), servios e instalaes de energia eltrica e aproveitamento energtico dos cursos dgua, navegao area, aeroespacial, infraestrutura aeroporturia, transporte ferrovirio e aquavirio entre portos brasileiros e fronteiras nacionais, ou que transponham os limites de mais de um Estado ou Territrio, transporte ferrovirio interestadual e internacional de passageiros, explorao dos portos martimos, fluviais e lacustres, seguridade social, servios de sade, assistncia social e educao.

O rol no exaustivo. Isso significa que dentro de certos limites, Unio, Estados, Distrito Federal e Municpios podero criar servios pblicos no mencionados na Constituio.

Com efeito, cumpre distinguir, de um lado, os servios pblicos privativos do Estado (que so os referidos no artigo 21, XI e XII, bem como quaisquer outros cujo exerccio suponha necessariamente a prtica de atos de imprio, os quais devem ser prestados pela Unio, diretamente ou mediante autorizao, concesso ou permisso) e, de outro lado, os servios pblicos no privativos do Estado.

Nesta ltima categoria ingressam os servios que o Estado deve desempenhar, imprimindo-lhes regime de Direito Pblico, sem, entretanto, proscrever a livre iniciativa do ramo em atividades em que se inserem.

De acordo com a Constituio, so quatro estas espcies de servios sobre os quais o Estado no detm titularidade exclusiva, ao contrrio do que ocorre com os demais servios pblicos nela previstos. A saber: servios de sade, de educao, de previdncia social e de assistncia social.

Sem embargo, ficam todos eles submetidos a um tratamento normativo mais estrito do que o aplicvel ao conjunto das atividades privadas. Assim, o Poder Pblico, dada a grande relevncia social que possuem, os disciplina com um rigor especial.

V IMPOSIES CONSTITUCIONAIS QUANTO AOS SERVIOS PBLICOS NO BRASIL

a) Servios de prestao obrigatria e exclusiva do Estado

H duas espcies de servios que s podem ser prestados pelo prprio Estado, isto , que no podem ser prestados por concesso, permisso ou autorizao. So eles os de servio postal e correio areo nacional (artigo 21, X, CF).

b) Servios que o Estado tem obrigao de prestar e obrigao de conceder

H uma espcie de servios pblicos que o Estado, conquanto obrigado a prestar por si ou por criatura sua, tambm obrigado a oferecer em concesso, permisso ou autorizao: so os servios de radiodifuso sonora (rdio) ou de sons e imagens (televiso). Isso porque o artigo 223 determina que, na matria, seja obervado o princpio da complementaridade dos sistemas privado, pblico e estatal.

c) Servios que o Estado tem obrigao de prestar, mas sem exclusividade

H cinco espcies de servio que o Estado no pode permitir que sejam prestados exclusivamente por terceiros, seja a ttulo de atividade privada livre, seja a ttulo de concesso, autorizao ou permisso. So os servios: 1) de educao, 2) de sade, 3) de previdncia social, 4) de assistncia social e 5) de radiodifuso sonora e de sons e imagens.

d) Servios que o Estado no obrigado a prestar, mas, no os prestando, ter de promover-lhes a prestao, mediante concesso ou permisso

Todos os demais servios pblicos, notadamente os arrolados no artigo 21, XI e XII, da Constituio, o Estado tanto pode prestar por si mesmo (mediante administrao direta ou indireta) como transferindo seu desempenho a entidade privada (mediante concesso ou permisso).

VI OS SERVIOS PBLICOS E A DUBIEDADE DA EXPRESSO AUTORIZAO NA CONSTITUIO

A concesso, no Brasil, mencionada como um contrato, tanto na legislao como no prprio Texto Constitucional; a permisso qualificada pela quase totalidade da doutrina brasileira como ato unilateral do Poder Pblico e que no garantiria ao permissionrio situao jurdica da mesma fora que a outorgada pela concesso.

J a expresso autorizao, que aparece no artigo 21, XI e XII, tem em mira duas espcies de situaes:

a) uma, que corresponde a hipteses em que efetivamente h servio de telecomunicao, como o de radioamador ou de interligao de empresas por cabos de fibras ticas, mas no propriamente servio pblico, mas servio de interesse privado delas prprias. A, ento, a palavra autorizao foi usada no sentido corrente em Direito Administrativo para exprimir o ato de polcia administrativa, que libera alguma conduta privada propriamente dita, mas cujo exerccio depende de manifestao administrativa aquiescente para verificao se com ela no haver gravames ao interesse pblico.

b) outra, a de abranger casos em que efetivamente est em pauta um servio pblico, mas se trata de resolver emergencialmente uma dada situao, at a adoo dos convenientes procedimentos por fora dos quais se outorga permisso ou concesso. Por isto mesmo, a palavra autorizao est utilizada tambm no artigo 223 da Constituio.

VII LIMITES CONSTITUCIONAIS PARA A CARACTERIZAO DE UM SERVIO COMO PBLICO

realmente o Estado, por meio do Poder Legislativo, que erige ou no em servio pblico tal ou qual atividade, desde que respeite os limites constitucionais. Afora os servios pblicos mencionados na Carta Constitucional, outros podem ser assim qualificados, contanto que no sejam ultrapassadas as fronteiras constitudas pelas normas relativas ordem econmica as quais so garantidoras da livre iniciativa. que a explorao da atividade econmica, o desempenho de servios pertinentes a esta esfera, assiste aos particulares e no ao Estado. Este apenas em carter excepcional poder desempenhar-se empresarialmente nesta rbita.

importante observar que, embora o Estado possa, em certos casos previstos na Constituio, atuar personalizadamente na esfera econmica, como protagonista empresarial, as atividades econmicas que destarte, desempenhe no so qualificveis como servios pblicos.

A separao entre dois campos (servio pblico, como setor pertencente ao Estado, e domnio econmico, como campo reservado aos particulares) induvidosa e tem sido objeto de ateno doutrinria, notadamente para fins de separar empresas estatais prestadoras de servio pblico das exploradoras da atividade econmica, ante a diversidade de seus regimes jurdicos.

VIII SERVIOS PBLICOS E SERVIOS GOVERNAMENTAIS

Existem indicaes constitucionais de que (a) certos servios que no podem ser pblicos e (b) certos servios que o so obrigatoriamente ou que (c) podem ser servios pblicos. Entre os dois extremos (a) e (b) que existe a margem legal para definir os restantes servios pblicos. Desde que no seja afrontada a orientao constitucional indicada, e o sentido corrente da locuo atividade econmica, o legislador ordinrio poder criar outros servios pblicos. Fica visto, pois, que existem certos servios que podem ser nominados de servios governamentais, isto , os que correspondam explorao de atividade econmica pelo Estado, em concorrncia com os particulares ou sob o regime de monoplio, mas que so perfeitamente inconfundveis com os servios pblicos.

PODER DE POLCIA

I INTRODUO

necessrio que o uso da liberdade e da propriedade esteja entrosado com a utilidade coletiva, de tal modo que no implique uma barreira capaz de obstar realizao dos objetivos pblicos.

As limitaes ao exerccio da liberdade e da propriedade correspondem configurao de sua rea de manifestao legtima, isto , da esfera jurdica da liberdade e da propriedade tuteladas pelo sistema. precisamente esta a razo pela qual as chamadas limitaes administrativas propriedade no so indenizveis. Posto que atravs de tais medidas de polcia h no h interferncia onerosa a um direito, mas to s a definio que giza suas fronteiras, inexiste o gravame que abriria ensanchas a uma obrigao pblica de reparar.

Para caracterizar este setor da atividade estatal, compreensivo tanto das leis que delineiam o mbito da liberdade e da propriedade (isto , leis que dimensionam tais direitos) quanto dos atos administrativos que lhes do execuo, usa-se a equvoca expresso poder de polcia.

Trata-se de designativo manifestamente infeliz. Engloba, sob um nico nome, coisas radicalmente distintas, submetidas a regimes de inconcilivel diversidade: leis e atos administrativos; isto , posies superiores e providncias subalternas. J isto seria, como , fonte das mais lamentveis e temveis confuses, pois leva, algumas vezes, a reconhecer Administrao poderes que seriam inconcebveis (no Estado de Direito), dando-lhe uma sobranceria que no possui, por ser imprpria de que nada mais pode fazer seno atuar com base em lei que lhe confira os poderes tais ou quais e a serem exercidos nos termos e forma por ela estabelecidos.

Alm disso, a expresso poder de polcia traz consigo a evocao de uma poca pretrita, a do Estado de Polcia, que precedeu ao Estado de Direito. Traz consigo a suposio de prerrogativas dantes existentes em prol do prncipe e que se faz comunicar inadvertidamente ao Poder Executivo. Em suma: raciona-se como se existisse uma natural titularidade de poderes em prol da Administrao e como se dela emanasse intrinsecamente, fruto de um abstrato poder de polcia.

II SENTIDO AMPLO E ESTRITO DA EXPRESSO PODER DE POLCIA

A atividade estatal de condicionar a liberdade e a propriedade ajustando-as aos interesses coletivos designa-se poder de polcia. A expresso, tomada neste sentido amplo, abrange tanto atos do Legislativo quanto do Executivo. Refere-se, pois, ao complexo de medidas do Estado que delineia a esfera juridicamente tutelada da liberdade e da propriedade dos cidados.

A expresso poder de polcia pode ser tomada em sentido mais restrito, relacionando-se unicamente com as intervenes, quer gerais e abstratas, como os regulamentos, quer concretas e especficas (tais as autorizaes, as licenas, a injunes), do Poder Executivo destinadas a alcanar o mesmo fim de prevenir e obstar ao desenvolvimento de atividades particulares contrastantes com os interesses sociais. Esta acepo mais limitada responde noo de polcia administrativa.

Polcia administrativa o conjunto de interveno da Administrao que tende a impor livre ao dos particulares a disciplina exigida pela vida em sociedade.

III FUNDAMENTO DA POLCIA ADMINISTRATIVA

O poder que a Administrao exerce ao desempenhar seus encargos de polcia administrativa repousa na chamada supremacia geral, que, no fundo, no seno a prpria supremacia das leis em geral, concretizadas atravs de atos da Administrao. Os doutrinadores italianos distinguem esta supremacia geral da supremacia especial, que s estar em causa quando existam vnculos especficos travados entre o Poder Pblico e determinados sujeitos.

Assim, esto fora do campo da polcia administrativa os atos que atingem os usurios de um servio pblico, a ele admitidos, quando concernentes quele especial relacionamento. Da mesma forma, excluem-se de seu campo, por igual razo, os relativos aos servidores pblicos ou aos concessionrios de servio pblico, tanto quanto os de tutela sobre as autarquias.

IV SUPREMACIA GERAL E SUPREMACIA ESPECIAL

A Administrao, com base em sua supremacia geral, como regra no possui poderes para agir seno extrados diretamente da lei. Diversamente, assistir-lhe-iam poderes outros, no sacveis diretamente da lei, quando estivesse assentada em relao especfica que os conferisse. Seria esta relao, portanto, que, em tais casos, forneceria o fundamento jurdico atributivo do poder de agir.

H uma pletora de situaes que revelam a necessidade de se reconhecer a figura da supremacia especial:

a) inequivocamente reconhecvel a existncia de relaes especficas intercorrendo entre o Estado e um crculo de pessoas que nelas se inserem, de maneira a compor a situao jurdica muito diversa da que atina generalidade das pessoas, e que demandam poderes especficos, exercitveis, dentro de certos limites, pela prpria Administrao. Exemplos: diferente a situao do servidor pblico, em relao ao Estado, da situao das demais pessoas que com ele no travaram tal vnculo; diferente, em relao determinada Escola ou Faculdade pblica, a situao dos que nela esto matriculados e o dos demais sujeitos que no entretm vnculo algum com as sobreditas instituies.

Em quaisquer destes casos apontados, os vnculos que se constituram so, para alm de qualquer dvida, exigentes de uma certa disciplina interna para o funcionamento dos estabelecimentos em apreo, a qual, de um lado, faz presumir certas regras, certas imposies restritivas, assim como, eventualmente, certas disposies benficas, isto , favorecedoras, umas e outras, tendo em vista regular a situao dos que se inserem no mbito de atuao das instituies em apreo e que no tm como deixar de ser parcialmente estabelecidas na prpria intimidade delas, como condio elementar de funcionamento das sobreditas atividades.

b) igualmente reconhecvel que nas situaes referidas, ou em muitas delas, seria impossvel, imprprio e inadequado que todas as convenientes disposies a serem expedidas devessem ou mesmo pudessem estar previamente assentadas em lei e unicamente em lei, com excluso de qualquer outra fonte normativa.

Assim, enquanto no construirmos categorias prprias para explicar detidamente as aludidas situaes, h que aceitar a categoria das relaes especiais de sujeio, de tal sorte que todas as discusses erigveis ao respeito delas, para se manterem dentro do campo de um impostergvel realismo, cifrar-se-o a indagar sobre as condies e limites do exerccio dos poderes que comportam.

Assim, pode-se entender como indispensvel, pelo menos, os seguintes condicionantes positivos de quaisquer destes poderes, a saber:

a) tenham que encontrar seu fundamento ltimo em lei que, explcita ou implicitamente, confira aos estabelecimentos e rgos pblicos em questo atribuies para expedir os ditos regramentos, os quais consistiro em especificaes daqueles comandos;

b) que os referidos poderes possam exibir seu fundamento imediato naquelas mesmas relaes de sujeio especial, tal como, por exemplo, poderes contratuais encontram fundamento no contrato;

c) restrinjam suas disposies ao que for instrumentalmente necessrio ao cumprimento das finalidades que presidem ditas relaes especiais;

d) mantenham-se rigorosamente afinadas com os princpios da razoabilidade e proporcionalidade, de sorte a que todo excesso se configure como invlido; e

e) conservem seu objeto atrelado ao que for relacionado tematicamente e, em geral, tecnicamente com a relao especial que esteja em causa.

Por outro lado, seriam seus condicionantes negativos:

a) no podem infirmar qualquer direito ou dever, ou seja, no podem contrariar ou restringir direitos, deveres ou obrigaes decorrentes de norma (princpio ou regra) de nvel constitucional ou legal, nem prevalecer contra a supervenincia destes;

b) no podem extravasar, em relao aos abrangidos pela supremacia especial (por suas repercusses), nada, absolutamente nada que supere a intimidade daquela especfica relao de supremacia especial;

c) no podem exceder em nada, absolutamente nada, o estritamente necessrio para o cumprimento dos fins da relao de supremacia especial;

d) no podem produzir, por si mesmas, consequncias que restrinjam ou elidam interesses de terceiros, ou os coloquem em situao de dever, pois, de tal supremacia, s resultam relaes circunscritas intimidade do vnculo entretido entre a Administrao e quem nele se encontre internado.

O que aqui se quer realar que os atos encartados no mbito das relaes de sujeio especial no se enquadram no campo do Poder de Polcia, isto , das limitaes administrativas liberdade e propriedade.

V ESSNCIA DO PODER DE POLCIA

A utilidade pblica , no mais das vezes, conseguida de modo indireto pelo poder de polcia, em contraposio obteno direta de tal utilidade, obtida atravs de servios pblicos.

O que os aparta, ento, , de um lado, o alcance direto ou indireto da utilidade coletiva, e, de outro lado, a circunstncia de que, enquanto os servios pblicos se traduzem em prestaes de utilidade ou comodidade oferecidas pelo Estado ou quem lhe faa as vezes, o poder de polcia corresponde atividade estatal que no almeja outra coisa seno uma absteno dos particulares.

Convm dizer, entretanto, que h uma ordem de casos em que se excepciona esta caracterstica do poder de polcia. a que respeita ao condicionamento do isso da propriedade imobiliria a fim de que se conforme ao atendimento de sua funo social. Enquadra-se na caracterizao de leis de polcia as que imponham ao proprietrio uma atuao em prol de ajustar o uso de sua propriedade funo social.

Traos caractersticos

So traos caractersticos da atividade de polcia: a) provir privativamente de autoridade pblica; b) ser imposta coercitivamente pela Administrao; c) abranger genericamente as atividades e propriedades.

Uma vez que o poder de polcia se caracteriza normalmente pela imposio de abstenes aos particulares, no h que imagin-lo existente em manifestaes da Administrao que, contrariamente, impe prestaes positivas aos administrados, sujeitando-os a obrigaes de dar, como nas requisies de bens, ou de fazer, como nas requisies de servios.

Enquanto no poder de polcia nas chamadas limitaes administrativas o dano social evitado (ou, reversamente, o interesse social obtido), pelo simples ajustamento do exerccio da propriedade ao bem comum, nas servides administrativas o bem particular colocado sob parcial senhoria da coletividade.

Na servido o bem contemplado como j sendo portador de uma utilidade que o Poder Pblico deseja captar em proveito da coletividade; atravs da limitao administrativa, a utilidade a ser oferecida pelo bem nasce, juridicamente, da vedao imposta ao administrado de atuar de maneira contrria ao que foi definido como interesse pblico.

Dado que o poder de polcia administrativa tem em mira cingir a livre atividade dos particulares, a fim de evitar uma consequncia antissocial que dela poderia derivar, o condicionamento que impe requer frequentemente a prvia demonstrao de sujeio do particular aos ditames legais. Assim, este pode se encontrar na obrigao de no fazer alguma coisa at que a Administrao verifique que a atividade por ele pretendida se realizar segundo padres legalmente permitidos.

VI POLCIA ADMINISTRATIVA E POLCIA JUDICIRIA

O que efetivamente aparta polcia administrativa de polcia judiciria que a primeira se predispe unicamente a impedir ou paralisar atividades antissociais enquanto a segunda se preordena responsabilizao dos violadores da ordem jurdica.

Poder de polcia administrativa a atividade administrativa preordenada proteo do todo social e de suas partes, mediante uma ao, ora de observao, ora de preveno, ora de represso contra os danos que a eles poderiam ocorrer em razo da atividade dos indivduos.

A importncia da distino entre polcia administrativa e polcia judiciria est em que a segunda rege-se na conformidade da legislao processual penal e a primeira pelas normas administrativas.

VII ATOS ATRAVS DOS QUAIS SE EXPRESSA A POLCIA ADMINISTRATIVA

A polcia administrativa manifesta-se tanto atravs de atos normativos e de alcance geral quanto de atos concretos e especficos.

VIII O PODER DE POLCIA DISCRICIONRIO?

Em rigor, no Estado de Direito inexiste um poder, propriamente dito, que seja discricionrio fruvel pela Administrao Pblica. H, isto sim, atos em que a Administrao Pblica pode manifestar competncia discricionria e atos a respeito dos quais a atuao administrativa totalmente vinculada. Poder discricionrio abrangendo toda uma classe ou ramo de atuao administrativa coisa que no existe.

No caso especfico da polcia administrativa fcil demonstr-lo. Basta considerar que, enquanto as autorizaes, atos tpicos da polcia administrativa, so expedidas no uso de competncia exercitvel discricionariamente, as licenas, igualmente expresses tpicas dela, so atos vinculados, consoante pacfico entendimento da doutrina. Basta a considerao de tal fato para se perceber que inexato o afirmar-se que o poder de polcia administrativo discricionrio. Pode-se, com propriedade, asseverar, isto sim, que a polcia administrativa se expressa ora atravs de atos no exerccio de competncia discricionria, ora atravs de atos vinculados.

IX DEFINIO DE POLCIA ADMINISTRATIVA

Pode-se definir a polcia administrativa como a atividade da Administrao Pblica, expressa em atos normativos ou concretos, de condicionar, com fundamento em sua supremacia geral e na forma da lei, a liberdade e a propriedade dos indivduos, mediante ao ora fiscalizadora, ora preventiva, ora repressiva, impondo coercitivamente aos particulares um dever de absteno (non facere) a fim de conformar-lhes os comportamentos aos interesses sociais consagrados no sistema normativo.

X POLCIA GERAL E POLCIA ESPECIAL

XI DELEGAO DE ATOS DE POLCIA ADMINISTRATIVA

Salvo hipteses excepcionalssimas (caso dos poderes outorgados aos comandantes de navio), no h delegao de ato jurdico de polcia a particular e nem a possibilidade de que este o exera a ttulo contratual. Pode haver, entretanto, habilitao do particular prtica de ato material preparatrio ou sucessivo a ato jurdico desta espcie (obedecendo a alguns termos e limitaes).

XII EXECUTORIEDADE DAS MEDIDAS DE POLCIA ADMINISTRATIVA

As medidas de polcia administrativa frequentemente so autoexecutrias: isto , pode a Administrao Pblica promover, por si mesma, independentemente de remeter-se ao Poder Judicirio, a conformao do comportamento do particular s injunes dela emanadas, sem necessidade de um prvio juzo de cognio e ulterior juzo de execuo processado perante as autoridades judicirias.

Essas providncias tm lugar em trs diferentes hipteses:

a) quando a lei expressamente autorizar;

b) quando a adoo da medida for urgente para a defesa do interesse pblico e no comportar as delongas naturais do pronunciamento judicial sem sacrifcio ou risco para a coletividade;

c) quando inexistir outra via de direito capaz de assegurar a satisfao do interesse pblico que a Administrao est obrigada a defender em cumprimento medida de polcia.

Ao se indicar a possibilidade de a Administrao obter compulsria obedincia aos seus ditames de polcia, sups-se, evidentemente, a atuao regular desta, e no o uso desmedido ou, de qualquer modo, afrontoso legalidade. O habeas corpus e o mandado de segurana so meios especialmente eficazes para defesa do particular em tais casos.

XIII POLCIA ADMINISTRATIVA E O PRINCPIO DA PROPORCIONALIDADE CONTRA ABUSOS DA ADMINISTRAO

A via da coao s aberta ao Poder Pblico quando no h outro meio eficaz para o cumprimento da pretenso jurdica e s se legitima na medida em que no s compatvel como proporcional ao resultado pretendido e tutelado pela ordem normativa. Toda coao que exceda ao estritamente necessrio obteno do efeito jurdico licitamente desejado pelo Poder Pblico injurdica.

Este eventual excesso pode apresentar-se de dois modos:

a) a intensidade da medida maior que a necessria para a compulso do obrigado;

b) a extenso da medida maior que a necessria para a obteno dos resultados licitamente perseguveis.

XIV SETORES DA POLCIA ADMINISTRATIVA

Resumidamente, pode-se dizer que a polcia administrativa prope a salvaguardar os seguintes valores: a) de segurana pblica; b) de ordem pblica; c) de tranquilidade pblica; d) de higiene e sade pblicas; e) estticos e artsticos; f) histricos e paisagsticos; g) riquezas naturais; h) de moralidade pblica; i) economia popular.

XV POLCIA ADMINISTRATIVA DA UNIO, ESTADOS E MUNICPIOS

competente para dada medida de polcia administrativa quem for competente para legislar sobre a matria.

Deve-se, todavia, ficar claro que a competncia legislativa da Unio sobre os assuntos relacionados no artigo 22 da CF no exclui a competncia municipal ou estadual, e, portanto, no exclui o poder de polcia destes, quanto aos aspectos externos essncia da mesma matria referida Unio.

Haver competncia concorrente quando o interesse de pessoas se justape.

INTERVENO DO ESTADO NO DOMNIO ECONMICO E NO DOMNIO SOCIAL

II INTERVENO DO ESTADO NO DOMNIO ECONMICO

Conceito de atividade econmica em nossa Constituio

Considerando-se panoramicamente a interferncia do Estado na ordem econmica, percebe-se que esta pode ocorrer de trs modos; a saber: (a) ora dar-se- atravs de seu poder de polcia, isto , mediante leis e atos administrativos expedidos para execut-las, como agente normativo e regulador da atividade econmica caso no qual exercer funes de fiscalizao e em que o planejamento que conceber ser meramente indicativo para o setor privado e determinante para o setor pblico, tudo conforme prev o artigo 174; (b) ora ele prprio, em casos excepcionais, como foi dito, atuar empresarialmente, mediante pessoas que cria com tal objetivo; e (c) ora o far mediante incentivos iniciativa privada (tambm supostos no artigo 174), estimulando-a com favores fiscais ou financiamentos, at mesmo a fundo perdido.

Em todos os casos, necessariamente, a interferncia estatal ter que estar voltada satisfao dos fins dantes aludidos como sendo os caracterizadores do Estado Brasileiro; e jamais sob pena de nulidade poder expressar tendncia ou diretriz antinmica ou gravosa queles valores

Valorizao do trabalho humano

Liberdade de iniciativa

Atividades privadas sob regime especial

Funo social da propriedade

Livre concorrncia e represso ao abuso do poder econmico

CADE: organizaes e funes

Infraes ordem econmica

Penas por infraes ordem econmica

Acordo de lenincia

Defesa do consumidor

Monoplio

A Constituio previu o monoplio de certas atividades. So unicamente aquelas previstas no artigo 177:

Tais atividades monopolizadas no se confundem com servios pblicos. Constituem-se, tambm elas, em servios governamentais, sujeitos, pois, s regras do Direito Privado. Correspondem, pura e simplesmente, a atividades econmicas subtradas do mbito da livre iniciativa.

Portanto, as pessoas que o Estado cria para desenvolver essas atividades no sero prestadoras de servio pblico.

ATOS ADMINISTRATIVOS

I CONSIDERAES INTRODUTRIAS

a) Distino entre fatos jurdicos e atos jurdicos

O ato administrativo um ato jurdico, pois se trata de uma declarao que produz efeitos jurdicos. uma espcie de ato jurdico, marcado por caractersticas que o individualizam no conjunto de atos jurdicos.

O que particulariza o ato administrativo e justifica que se formule um conceito que o isole entre os demais atos jurdicos, a circunstncia de que ele tem peculiaridades (a) no que concerne s condies de sua vlida produo e (b) no que atina eficcia que lhe prpria.

Sendo ato jurdico, aloca-se dentro do gnero fato jurdico. Este se define como: qualquer acontecimento a que o Direito imputa e enquanto imputa efeitos jurdicos. O fato jurdico, portanto, pode ser um evento material ou uma conduta humana, voluntria ou involuntria, preordenada ou no a interferir na ordem jurdica. Basta que o sistema normativo lhe atribua efeitos de direito para qualificar-se como um fato jurdico.

Atos jurdicos so declaraes, vale dizer, so enunciados; so falas prescritivas. O ato jurdico uma pronncia sobre certa coisa ou situao, dizendo como ela dever ser. Fatos jurdicos no so declaraes; portanto, no so prescries. No so falas, no pronunciam coisa alguma. O fato no diz nada. Apenas ocorre. A lei que fala sobre ele.

Toda vez que se estiver perante uma dico prescritiva de direito (seja ela oral, escrita, expressada por mmica ou sinais convencionais) estar-se- perante um ato jurdico; ou seja, perante um comando jurdico. Quando, diversamente, se esteja ante um evento no prescritivo ao qual o Direito atribua consequncias jurdicas, estar-se- perante um fato jurdico.

b) O problema da conceituao do ato administrativo

c) Os conceitos jurdicos

d) Historicidade dos conceitos jurdicos

e) Funcionalidade e no verdade dos conceitos

f) Critrio bsico para a conceituao do ato administrativo

II ATOS DA ADMINISTRAO E ATOS ADMINISTRATIVOS

No se deve confundir atos da Administrao com atos administrativos porque:

a) A Administrao pratica inmeros atos que no interessa considerar como atos administrativos, tais:

Atos regidos pelo Direito Privado. O Direito Administrativo s lhes regula as condies de emanao, mas no lhes disciplina o contedo e correspondentes efeitos. Atos materiais. Por no serem sequer atos jurdicos, tambm no h interesse em qualific-los como atos administrativos. Estes comportamentos puramente materiais da Administrao denominam-se fatos administrativos. Atos polticos ou de governo, praticados com margem de discrio e diretamente em obedincia Constituio, no exerccio de funo puramente poltica.

b) De outro lado, h atos que no so praticados pelo Administrao Pblica, mas que devem ser includos entre os atos administrativos, porquanto se submetem mesma disciplina jurdica aplicvel aos demais atos da Administrao, habitualmente reputados como atos administrativos.

Em face do exposto, verifica-se que a noo de ato administrativo no deve depender, isto , no deve ser tributria, da noo de Administrao Pblica (conjunto dos rgos do Poder Executivo, autarquias e demais sujeitos da Administrao indireta), porque, de um lado, nem todo ato da Administrao ato administrativo e, de outro lado, nem todo ato administrativo provm da Administrao Pblica.

III CONCEITO DE ATO ADMINISTRATIVO

possvel conceituar ato administrativo como: declarao do Estado (ou de quem lhe faa as vezes como, por exemplo, um concessionrio de servio pblico), no exerccio de prerrogativas pblicas, manifestada mediante providncias jurdicas complementares da lei a ttulo de lhe dar cumprimento, e sujeitas a controle de legitimidade por rgo jurisdicional.

Ressaltam-se as seguintes caractersticas contidas no conceito:

a) trata-se de declarao jurdica, ou seja, de manifestao que produz efeitos de direito, como sejam: certificar, criar, extinguir, transferir, declarar ou de qualquer modo modificar direitos ou obrigaes;

b) provm do Estado, ou de quem esteja investido em prerrogativas estatais;

c) exercida no uso de prerrogativas pblicas, portanto, de autoridade, sob regncia de Direito Pblico. Nisto se aparta dos atos de Direito Privado;

d) consiste em providncias jurdicas complementares da lei ou excepcionalmente da prpria Constituio, sendo a estritamente vinculadas, a ttulo de lhe dar cumprimento;

e) sujeita-se a exame de legitimidade por rgo jurisdicional.

O conceito que se acaba de dar corresponde a uma noo de ato administrativo em sentido amplo, pois abrange atos gerais e abstratos.

Em acepo estrita pode-se conceituar ato administrativo com os mesmos termos utilizados, acrescendo as caractersticas: concreo e unilateralidade. Da a seguinte noo: declarao unilateral do Estado no exerccio de prerrogativas pblicas, manifestada mediante comandos concretos complementares da lei (ou, excepcionalmente, da prpria Constituio, a de modo plenamente vinculado) expedidos a ttulo de lhe dar cumprimento e sujeitos a controle de legitimidade por rgo jurisdicional.

IV PERFEIO, VALIDADE E EFICCIA

O ato administrativo perfeito quando esgotadas as fases necessrias sua produo. Portanto, ato perfeito o que completou o ciclo necessrio sua formao. Perfeio, pois, a situao do ato cujo processo de formao est concludo.

O ato administrativo vlido quando foi expedido em absoluta conformidade com as exigncias do sistema normativo. Vale dizer, quando se encontra adequado aos requisitos estabelecidos pela ordem jurdica. Validade, por isto, a adequao do atos s exigncias normativas.

O ato administrativo eficaz quando est disponvel para a produo de seus efeitos prprios; ou seja, quando o desencadear de seus efeitos tpicos no se encontra dependente de qualquer evento posterior, como uma condio suspensiva, termo inicial ou ato controlador a cargo de outra autoridade.

Eficcia, ento, a situao atual de disponibilidade para produo de efeitos tpicos, prprios, do ato.

Distinguem-se os efeitos tpicos, ou prprios, dos efeitos atpicos. Os primeiros so efeitos correspondentes tipologia especfica do ato, sua funo jurdica. Os efeitos atpicos, decorrentes, embora, da produo do ato, no resultam de seu contedo especfico.

Os efeitos atpicos podem ser de dupla ordem: efeitos preliminares ou prodrmicos e efeitos reflexos. Os preliminares existem enquanto perdura a situao de pendncia do ato, isto , durante o perodo que intercorre desde a produo do ato at o desencadeamento de seus efeitos tpicos.

Efeitos reflexos so aqueles que refluem sobre outra relao jurdica, ou seja, que atingem terceiros no objetivados pelo ato. Quer-se dizer: ao incidir sobre uma dada situao, o ato atinge outra relao jurdica que no era seu objeto prprio. Os efeitos reflexos, portanto, so aqueles que alcanam terceiros, pessoas que no fazem parte da relao jurdica travada entre a Administrao e o sujeito passivo do ato.

Nota-se, por conseguinte, que um ato pode ser:

a) perfeito, vlido e eficaz quando, concludo o seu ciclo de formao, encontra-se plenamente ajustado s exigncias legais e est disponvel para deflagrao dos efeitos que lhes so tpicos;

b) perfeito, invlido e eficaz quando, concludo seu ciclo de formao e apesar de no se achar conformado s exigncias normativas, encontra-se produzindo efeitos que lhe seriam inerentes;

c) perfeito, vlido e ineficaz quando, concludo seu ciclo de formao e estando adequado aos requisitos de legitimidade, ainda no se encontra disponvel para ecloso de seus efeitos tpicos, por depender de um termo inicial ou de uma condio suspensiva, ou autorizao, aprovao ou homologao, a serem manifestados por uma autoridade controladora;

d) perfeito, invlido e ineficaz quando, esgotado seu ciclo de formao, sobre encontrar-se em desconformidade com a ordem jurdica, seus efeitos ainda no podem fluir, por se encontrarem na dependncia de algum acontecimento previsto como necessrio para a produo dos efeitos (condio suspensiva ou termo inicial, ou aprovao ou homologao dependentes de outro rgo).

V REQUISITOS DO ATO ADMINISTRATIVO

Poder-se-ia relacionar como elementos habitualmente referidos os seguintes: sujeito, forma, objeto, motivo e finalidade.

Sujeito o autor do ato; que detm os poderes jurdico-administrativos necessrios para produzi-lo; forma o revestimento externo do ato: sua exteriorizao; objeto a disposio jurdica expressada pelo ato: o que estabelece. A expresso, com este sentido, infeliz. Seria melhor denomin-la contedo. Motivo a situao objetiva que autoriza ou exige a prtica do ato; finalidade o bem jurdico a que o ato deve atender. Vontade a disposio anmica de produzir o ato, ou, alm disto, de atribuir-lhe um dado contedo.

Dois desses so, realmente, elementos, ou seja, realidades intrnsecas do ato. Em uma palavra, componentes dele, a saber: o contedo e a forma. No, porm, os outros. Da separarmos os elementos do ato e os pressupostos do ato. Estes ltimos, de seu turno, distinguem-se em pressupostos de existncia, ou seja, condicionantes de sua existncia, e pressupostos de validade, ou seja, condicionantes de sua lisura jurdica.

So pressupostos de existncia o objeto e a pertinncia do ato ao exerccio da funo administrativa. Os pressupostos de validade so: 1) pressuposto subjetivo (sujeito); 2) pressupostos objetivos (motivo e requisitos procedimentais); 3) pressuposto teleolgico (finalidade); 4) pressuposto lgico (causa); e 5) pressupostos formalsticos (formalizao). Quanto vontade, no a inclumos nem entre os elementos, nem entres os pressupostos, por se tratar de uma realidade psicolgica, e no jurdica.

Sem os elementos no h ato algum, administrativo ou no. Ou seja, inexistir o prprio ser que se designa pelo nome de ato jurdico.

Sem os pressupostos de validade no haver ato administrativo vlido.

VI ELEMENTOS DO ATO

Contedo

Contedo normalmente designado objeto, por muitos doutrinadores aquilo que o ato dispe, isto , o que o ato decide, enuncia, certifica, opina ou modifica na ordem jurdica. , em suma, a prpria medida que produz a alterao na ordem jurdica. Em ltima instncia, o prprio ato, em sua essncia.

Forma

Forma o revestimento exterior do ato; portanto, o modo pelo qual este aparece e revela sua existncia. A forma pode, eventualmente, no ser obrigatria, isto , ocorrer, por vezes, ausncia de prescrio legal sobre uma forma determinada, exigida para a prtica do ato. Contudo, no pode haver ato sem forma, porquanto o Direito no se ocupa de pensamentos ou intenes enquanto no traduzidos exteriormente. Ora, como a forma o meio de exteriorizao do ato, sem forma no pode haver ato.

No se deve confundir forma, na acepo enunciada, com formalizao, que um modo especfico de apresentao da forma, ou seja, uma dada solenizao requerida para o ato. Esta ltima um pressuposto formalstico.

VII PRESSUPOSTOS DO ATO

1) Pressupostos de existncia

O objeto aquilo sobre que o ato dispe. No pode haver ato sem que exista algo a que ele esteja reportado. certo que, se contedo do ato fala sobre algo, porque este algo constitui-se em realidade que com ele no se confunde e, de outro lado, que o objeto no um elemento do ato, pois no o integra.

Sem objeto material e juridicamente possvel no pode surgir ato jurdico algum, seja ele administrativo ou de qualquer outra tipologia. Um ato, isto , um contedo exteriorizado, que incida sobre um objeto inexistente um ato inexistente, um no ato. Vale dizer: pode ter existncia material, apenas, ou, ento, apresentar-se como mero fato. Juridicamente relevante, mas ato jurdico no ser. Logo, no poder ser ato administrativo.

Pertinncia da funo administrativa. Se o ato no for imputvel ao Estado, no exerccio da funo administrativa, poder haver ato jurdico, mas no haver ato administrativo. Ainda aqui, no uma questo de validade, mas de existncia de um ato tipologicamente qualificvel como administrativo.

2) Pressupostos de validade

a) Sujeito (pressuposto subjetivo)

Sujeito o produtor do ato. Evidentemente, quem produz um dado ser no se confunde nem total nem parcialmente com o ser produzido; logo, no pode ser designado, com propriedade, como elemento dele. Verifica-se, pois, que o sujeito exterior ao ato.

Sob este tpico atinente ao sujeito deve-se estudar a capacidade da pessoa jurdica que o praticou, a quantidade de atribuies do rgo que o produziu, a competncia do agente emanador e a existncia ou inexistncia de bices sua atuao no caso concreto.

Claro est que o vcio no pressuposto subjetivo acarretaria invalidade do ato.

b) Motivo (pressuposto objetivo)

Motivo o pressuposto de fato que autoriza ou exige a prtica do ato. , pois, a situao do mundo emprico que deve ser tomada em conta para a prtica do ato. Logo, externo ao ato. Inclusive o antecede. Por isso no pode ser considerado como parte, como elemento do ato.

O motivo pode ser previsto em lei ou no. Quando previsto em lei, o agente s pode praticar o ato se houver ocorrido a situao prevista. Quando no h previso legal, o agente tem liberdade de escolha da situao (motivo) em vista da qual editar o ato. que, mesmo se a lei no alude expressamente aos motivos propiciatrios ou exigentes de um ato, nem por isto haver liberdade para expedi-lo sem motivo ou perante um motivo qualquer.

Alm disto, em todo e qualquer caso, se o agente se embasar na ocorrncia de um dado motivo, a existncia do ato depender da existncia do motivo que houver sido enunciado. Isto , se o motivo que invocou o ato for inexistente, o ato ser invlido. esta vinculao do administrador ao motivo que houver alegado que se conhece doutrinariamente como teoria dos motivos determinantes.

Motivo do ato e motivo legal

Cumpre distinguir motivo do ato de motivo legal. Enquanto este ltimo a previso abstrata de uma situao ftica, emprica, o motivo do ato a prpria situao material, emprica, que efetivamente serviu de suporte real e objetivo para a prtica do ato. evidente que o ato ser viciado toda vez que o motivo de fato for descoincidente com o motivo legal.

Para fins da anlise da legalidade do ato, necessrio, por ocasio do exame dos motivos, verificar:

a) a materialidade do ato, isto , verificar se realmente ocorreu o motivo em funo do qual foi praticado o ato;

b) a correspondncia do motivo existente (e que embasou o ato) com o motivo previsto na lei.Motivo e mvel

No se deve confundir motivo, situao objetiva, real, emprica, com mvel, isto , inteno, propsito do agente que praticou o ato.

Motivo a realidade objetiva e externa ao agente. um antecedente, exterior ao ato, que transcorre na realidade emprica, servindo de suporte expedio do ato.

Mvel a representao subjetiva, psicolgica, interna do agente e correspondente quilo que suscita a vontade do agente (inteno).

O papel da vontade no ato administrativo

A vontade e, portanto, o mvel do agente s relevante nos atos administrativos praticados no exerccio de competncia discricionria; isto , naqueles atos cuja prtica exige do administrador, por fora da maneira como a lei regulou a matria, que sopese as circunstncias concretas do caso, de tal modo que seja inevitvel uma apreciao subjetiva sua quanto melhor maneira de proceder para dar correto atendimento finalidade legal.

Reversamente, o exame da vontade e, portanto, o mvel do agente absolutamente irrelevante quando o ato for completamente vinculado, ou seja: quando a lei predetermina antecipadamente, de modo objetivo e completo, o nico possvel comportamento administrativo perante motivo por ela j caracterizado em termos que inadmitem qualquer subjetivismo quando ao reconhecimento de sua existncia.

Motivo e motivao

No se confunde o motivo do ato administrativo com a motivao feita pela autoridade administrativa. A motivao integra a formalizao do ato, sendo um requisito formalstico dele. a exposio dos motivos, a fundamentao na qual so enunciados (a) a regra de Direito habilitante, (b) os fatos em que o agente se estribou para decidir e, muitas vezes, obrigatoriamente, (c) a enunciao da relao de pertinncia lgica entre os fatos ocorridos e o ato praticado. No basta, pois, em uma imensa variedade de hipteses, apenas aludir ao dispositivo legal que o agente tomou como base para editar o ato.

O dever de motivar e as consequncias de sua violao

Teoria dos motivos determinantes

De acordo com esta teoria, os motivos que determinaram a vontade do agente, isto , os fatos que serviram de suporte sua deciso, integram a validade do ato. Sendo assim, a invocao de motivos de fato falsos, inexistentes ou incorretamente qualificados vicia o ato mesmo quando, conforme j se disse, a lei no haja estabelecido, antecipadamente, os motivos que ensejariam a prtica do ato. Uma vez enunciados pelo agente os motivos em que se calou, ainda quando a lei no haja expressamente imposto a obrigao de enunci-los, o ato s ser vlido se estes realmente ocorreram e o justificavam.

c) Requisitos procedimentais (pressuposto objetivo)

Requisitos procedimentais so os atos que devem, por imposio normativa, preceder a um determinado ato. Consistem em outros atos jurdicos, produzidos pela prpria Administrao ou por um particular, sem os quais um certo ato no pode ser praticado.

Tanto o motivo como os requisitos procedimentais so condies para a prtica de um certo ato. Mas diferem porque o motivo um fato jurdico, ao passo que o pressuposto procedimental um ato jurdico.

d) Finalidade (pressuposto teleolgico)

Finalidade o bem jurdico objetivado pelo ato. Vale dizer, o resultado previsto legalmente como o correspondente tipologia do ato administrativo, consistindo no alcance dos objetivos por ele comportados. Em outras palavras: o objetivo inerente categoria do ato. Para cada finalidade que a Administrao pretende alcanar existe um ato definido em lei, pois o ato administrativo caracteriza-se por sua tipicidade, que o atributo pelo qual o ato administrativo deve corresponder s figuras definidas previamente em lei como aptas a produzir determinado resultado.

No se deve buscar atravs de um dado ato a proteo de bem jurdico cuja satisfao deveria ser, em face da lei, obtida por outro tipo ou categoria de ato. Ou seja: cada ato tem a finalidade em vista da qual a lei o concebeu. Por isso, por via dele s se pode buscar a finalidade que lhe correspondente, segundo o modelo legal.

Teoria do desvio de poder

Ocorre desvio de poder, e, portanto, invalidade, quando o agente se serve de um ato para satisfazer finalidade alheia natureza do ato utilizado.

De dois modos pode manifestar-se o desvio de poder:

a) quando o agente busca uma finalidade alheia ao interesse pblico. Isto sucede ao pretender usar de seus poderes para prejudicar um inimigo ou para beneficiar a si prprio ou amigo;

b) quando o agente busca uma finalidade ainda que de interesse pblico alheia categoria do ato que utilizou.

d) Causa (pressuposto lgico)

Causa: uma relao de adequao entre os pressupostos do ato e seu objeto, ou seja, o vnculo de pertinncia entre o motivo e contedo do ato. Pode-se defini-la, de maneira mais correta como a correlao lgica entre o pressuposto (motivo) e o contedo do ato em funo da finalidade tipolgica do ato. Com efeito: tal correlao s reconhecvel e s faz sentido em vista da finalidade legal correspondente ao ato.

Ento, a falta de causa, na acepo adotada, invalida o ato administrativo, isto , se o agente se baseia em motivos que no mantm congruncia, pertinncia, com o ato que praticou, este estar viciado. A ausncia de adequao lgica entre o pressuposto em que o agente se fundou e o ato que praticou compromete irremissivelmente a conduta.

A noo de causa acima exposta importante porque graas a ela o Judicirio pode controlar a validade do comportamento da Administrao mesmo quando a lei no enuncia os motivos que legitimam a prtica de um ato. Portanto, ainda quando o agente pode escolher os motivos, cumpre que estes guardem relao de pertinncia com o ato praticado. Causa no se confunde com motivo.

Atravs da causa vai-se examinar se os motivos em que se calou o agente, ainda que no previstos em lei, guardam nexo lgico de pertinncia com a deciso tomada, em face da finalidade que, de direito, cumpre atender.

, pois, no mbito da causa que se examinam dois tpicos extremamente importantes para a validade do ato, a saber: a) sua razoabilidade e b) sua proporcionalidade.

f) Formalizao (pressuposto formalstico)

Formalizao a especfica maneira pela qual o ato deve ser externado. Com efeito: ademais de exteriorizado, cumpre que o seja de um dado modo, isto , segundo uma certa aparncia externa. Enquanto a forma significa exteriorizao, formalizao significa o modo especfico, o modo prprio, desta exteriorizao.

A formalizao, evidentemente, deve obedecer s exigncias legais, de maneira que o ato seja expressado tal como a lei impunha que o fosse. Assim, como j se deixou dito, a motivao do ato importante requisito de sua formalizao.

A funo nica e especfica da formalizao prevista, em hipteses que tais, apenas a de uniformizar, ou seja, padronizar o instrumento de veiculao dos distintos atos administrativos. Cumpre, portanto, um objetivo meramente organizatrio interno, sem qualquer relevo externo. Trata-se, em rigor, de uma simples metodizao das frmulas de veiculao dos atos.

Da que a violao destas normas de mera padronizao acarretar apenas sano para o agente faltoso que descumpriu o dever normativo de atender a uniformizao til para boa organizao das formalidades de rotina de atuao do aparelho administrativo, mas nenhuma interferncia ter quanto validade do ato.

VIII O SILNCIO NO DIREITO ADMINISTRATIVO

Na verdade o silncio no ato jurdico. Por isto, evidentemente, no pode ser ato administrativo. Este uma declarao jurdica. Quem se absteve de declarar, pois, silenciou, no declarou nada e por isto no praticou ato administrativo algum. Tal omisso um fato jurdico e, in casu, um fato jurdico administrativo.

Visto que o silncio um fato e no um ato, importa saber quais sero suas consequncias (a) em relao ao sujeito administrativo que se omitiu e (b) em relao ao administrado que peticionou e no obteve resposta.

Se o administrado tem o direito de que o Poder Pblico se pronuncie em relao a suas peties, a Administrao tem o dever de faz-lo. Se se omite, viola o Direito e se expe s sanes administrativas pertinentes.

Alm disso, se a omisso da Administrao resultar em dano jurdico ao administrado, tal omisso pode ensejar, se for o caso, responsabilidade patrimonial do Estado, de fora parte a do prprio servidor, nos casos de dolo ou culpa.

Decorrido o prazo legal previsto para a manifestao administrativa, se houver prazo normativamente estabelecido, ou, no havendo, se j tiver decorrido tempo razovel, o administrado poder, conforme a hiptese, demandar judicialmente:

a) que o juiz supra a ausncia de manifestao administrativa e determine a concesso do que fora postulado, se o administrado tinha direito ao que pedira, isto , se a Administrao estava vinculada quanto ao contedo do ato e era obrigatrio o deferimento da postulao;

b) que o juiz assine prazo para que a Administrao se manifeste, sob cominao de multa diria, se a Administrao dispunha de discrio administrativa no caso, pois a administrado fazia jus a um pronunciamento motivado, mas to somente a isto.

IX ATRIBUTOS DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

Salientem-se entre os atributos dos atos administrativos os seguintes:

a) Presuno de legitimidade a qualidade, que reveste tais atos, de se presumirem verdadeiros e conformes ao Direito, at prova em contrrio. Isto : milita em favor deles uma presuno de legitimidade; salvo expressa disposio legal, dita presuno s existe at serem questionados em juzo. Esta, sim, uma caracterstica comum aos atos administrativos em geral; as subsequentemente referidas no se aplicam aos atos ampliativos da esfera jurdica dos administrados.

b) Imperatividade qualidade pela qual os atos administrativos se impem a terceiros, independentemente de sua concordncia. Decorre do poder extroverso, que permite ao Poder Pblico editar provimentos que vo alm da esfera jurdica do sujeito emitente, ou seja, que interferem na esfera jurdica de outras pessoas, constituindo-as unilateralmente em obrigaes.

c) Exigibilidade a qualidade em virtude da qual o Estado, no exerccio da funo administrativa, pode exigir de terceiros o cumprimento, a observncia das obrigaes que imps. No se confunde com a simples imperatividade, pois, atravs dela, apenas se constitui uma dada situao, se impe uma obrigao. A exigibilidade o atributo do ato pelo qual se impele obedincia, ao atendimento da obrigao j imposta, sem necessidade de recorrer ao Poder Judicirio para induzir o administrado a observ-la.

d) Executoriedade a qualidade pela qual o Poder Pblico pode compelir materialmente o administrado, sem preciso de buscar previamente as vias judiciais, ao cumprimento da obrigao que imps e exigiu.

A executoriedade no se confunde com a exigibilidade, pois esta no garante, s por si, a possibilidade de coao material, de execuo do ato.

Em suma: a executoriedade um plus em relao exigibilidade, de tal modo que nem todos os atos exigveis so executrios.

Sintetizando: graas exigibilidade, a Administrao pode valer-se de meios indiretos que induziro o administrado a atender ao comando imperativo. Graas executoriedade, quando esta exista, a Administrao pode ir alm, isto , pode satisfazer diretamente sua pretenso jurdica compelindo materialmente o administrado por meios prprios e sem necessidade de ordem judicial para proceder a esta compulso. Quer-se dizer: pela exigibilidade pode-se induzir obedincia, pela executoriedade pode-se compelir, constranger fisicamente.

Se compararmos estes diferentes atributos mencionados, vamos verificar que, pela presuno de legitimidade, o ato administrativo, quer seja impositivo de uma obrigao, quer seja atributivo de uma vantagem, presumido como legtimo; pela imperatividade, o ato cria para terceiro, independentemente de sua aquiescncia, uma obrigao; pela exigibilidade, o ato sujeita o administrado observncia de uma dada situao, sem recorrer ao Judicirio; pela executoriedade, o ato subjuga o administrado obedincia por meio de coao direta aplicada pela Administrao, independentemente de ordem judicial.

Casos em que cabe a executoriedade

A executoriedade existe nas seguintes hipteses:

a) quando a lei prev expressamente;

b) quando a executoriedade condio indispensvel eficaz garantia do interesse pblico confiado pela lei Administrao; isto , nas situaes em que, se no for utilizada, haver grave comprometimento do interesse que incumbe Administrao assegurar. Isso acontece nos casos em que a medida urgente e no h via jurdica de igual eficcia disposio da Administrao para atingir o fim tutelado pelo Direito, sendo impossvel, pena de frustrao dele, aguardar a tramitao de uma medida judicial. Nestes casos entende-se que a autorizao para a executoriedade est implcita no sistema legal, pois em decorrncia dele que a Administrao deve garantir a proteo ao bem jurdico posto em risco.

Defesas contra a executoriedade

A executoriedade no deixa o administrado ao desabrigo de proteo judiciria, pois pode-se sempre recorrer ao Poder Judicirio tanto para impedir preventivamente sua utilizao quanto para sustar a medida executria aplicada, sempre que o uso desta providncia administrativa fira direitos dos ameaados ou atingidos. As medidas judiciais especialmente eficazes para defesa do administrado em hipteses destas so o mandado de segurana preventivo ou repressivo e o habeas corpus, que tambm pode ser impetrado preventiva ou repressivamente. Finalmente, o dano que houver resultado para o particular em decorrncia de legtima ou abusiva utilizao da auto executoriedade acarreta responsabilidade do Estado, isto , constitui o Poder Pblico na obrigao de indenizar o lesado.

X CLASSIFICAO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

a) Quanto natureza da atividade

Atos de administrao ativa os que visam a criar, produzir, uma utilidade pblica, constituindo situaes jurdicas. Exemplo: autorizaes, licenas, nomeaes, declaraes de utilidade pblica, concesses etc.

Atos de administrao consultiva os que visam a informar, elucidar, sugerir providncias administrativas a serem estabelecidas nos atos de administrao ativa. Exemplo: pareceres, informes etc.

Atos de administrao controladora ou atos de controle os que visam a impedir ou permitir a produo ou a eficcia de atos de administrao ativa mediante exame prvio ou posterior da convenincia ou da legalidade deles. Exemplo: aprovaes prvias ou posteriores, homologaes etc.

Atos de administrao verificadora os que visam a apurar ou documentar a preexistncia de uma situao de fato ou de direito. Exemplo: os atos de acertamento / verificao, bem como os atos de inscrio, registro e certificao, pelos quais se documenta uma certa situao.

Atos de administrao contenciosa os que visam a julgar, em um procedimento contraditrio, certas situaes. Exemplo: o julgamento de funcionrios em processos administrativos, decises do Conselho de Contribuintes etc. So atos administrativos porque no tm fora de coisa julgada. Podem ser revistos pelo Judicirio.

b) Quanto estrutura do ato

Atos concretos os que dispem para um nico e especfico caso, esgotando-se nesta nica aplicao. Exemplo: a exonerao de um funcionrio.

Atos abstratos os que preveem reiteradas e infindas aplicaes, as quais se repetem cada vez que ocorra a reproduo da hiptese neles prevista, alcanando um nmero indeterminado e indeterminvel de destinatrios. Exemplo: o regulamento (que ato administrativo em sentido amplo) cujas disposies colhero sempre novos casos tipificveis em seu modelo abstrato.

c) Quando aos destinatrios do ato

Atos individuais os que tm por destinatrio sujeito ou sujeitos especificamente determinados.O ato individual pode ser singular ou plrimo. Singular se o destinatrio o nico especificado. Exemplo: a nomeao de um dado funcionrio. Plrimo se os destinatrios so mltiplos sujeitos especificados. Exemplo: a nomeao, em uma nica lista de mltiplos sujeitos especificados.

Atos gerais os que tm por destinatrio uma categoria de sujeitos inespecificados, porque colhidos em razo de se inclurem em uma situao determinada ou em uma classe de pessoas. exemplo: um edital de concurso pblico, uma ordem para dissoluo de passeata, a concesso de frias coletivas aos funcionrios de uma dada repartio. Em todos estes exemplos, o ato geral e concreto, pois esgota-se com uma nica aplicao. J, um regulamento de promoo de funcionrios expedido para vigorar continuamente ato geral e abstrato, porque a hiptese se renova iterativamente.

d) Quanto ao grau de liberdade da Administrao em sua prtica

Atos discricionrios (e que melhor se denominariam atos praticados no exerccio de competncia discricionria) os que a Administrao pratica dispondo de certa margem de liberdade para decidir-se, pois a lei regulou matria de modo a deixar campo para uma apreciao que comporta certo subjetivismo. Exemplo: autorizao de porte de arma.

Atos vinculados os que a Administrao pratica sem margem de liberdade para decidir-se, pois a lei previamente tipificou o nico possvel comportamento diante de hiptese prefigurada em termos objetivos. Exemplo: licena para edificar; aposentadoria, a pedido, por completar-se o tempo de contribuio do requerente.

e) Quanto funo da vontade administrativa

Atos negociais ou negcios jurdicos os em que a vontade administrativa , de direito, preordenada obteno de um resultado jurdico, sendo ela que cria imediatamente os efeitos jurdicos, embora dentro dos quadros legais. Exemplo: a admisso de algum ao gozo de um servio pblico.

Atos puros ou meros atos administrativos os que correspondem a simples manifestaes de conhecimento (como uma certido) ou de desejo (como um voto em rgo colegial), nos quais os efeitos jurdicos descendem diretamente da lei, de tal sorte que o ato nada mais faz que implementar uma condio legal para a deflagrao deles.

f) Quanto aos efeitos

Atos constitutivos os que fazem nascer uma situao jurdica, seja produzindo-a originariamente, seja extinguindo ou modificando situao anterior. Exemplo: uma autorizao para explorao de jazida; a demisso de um funcionrio.

Atos declaratrios os que afirmam a preexistncia de uma situao de fato ou de direito. Exemplo: a concluso de vistoria em edificao afirmando que est ou no em condies habitveis; uma certido de que algum matriculado em escola pblica.

g) Quanto aos resultados sobre a esfera jurdica dos administrados

Atos ampliativos os que aumentam a esfera de ao jurdica do destinatrio. Exemplo: concesses em geral, permisses, autorizaes, admisses, licenas.

Atos restritivos os que diminuem a esfera jurdica do destinatrio ou lhe impem novas obrigaes, deveres ou nus. Exemplo: os atos que extinguem os atos ampliativos, as sanes administrativas em geral, as ordens, as proibies etc.

h) Quanto situao de terceiros

Atos internos os que produzem seus efeitos apenas no interior da Administrao. Exemplo: propostas, pareceres, informaes etc.

Atos externos os que produzem efeitos sobre terceiros. Exemplo: admisso, licena etc.

i) Quanto composio da vontade produtora do ato

Atos simples os que so produzidos pela declarao jurdica de um nico rgo. Exemplo: uma licena de habilitao para dirigir automvel.Os atos simples podem ser simples singulares e simples colegiais.

Atos complexos os que resultam da conjugao de vontade de rgos diferentes. Exemplo: a nomeao, procedida por autoridade de um dado rgo, que deve recair sobre pessoa cujo nome consta em lista trplice elaborada por outro rgo.

j) Quanto formao do ato

Atos unilaterais os que so formados pela declarao jurdica de uma s parte. Exemplo: demisso de um funcionrio, multas, autorizaes etc.No afeta a unilateralidade a circunstncia de o ato depender, para sua produo ou para seus efeitos, do concurso da vontade do particular, seja solicitando-lhe a prtica, seja aceitando seus efeitos. Exemplo: um pedido de alvar de licena para edificar ou de autorizao para porte de arma ou de aceitao da outorga de um prmio, de uma encomenda etc.

Atos bilaterais os que so formados por um acordo de vontades entre as partes. So os atos convencionais. Exemplo: um contrato, uma concesso de servio pblico (que so atos administrativos em sentido amplo).

k) Quanto natureza das situaes jurdicas que criam

Atos regra is que criam situaes gerais, abstratas e impessoais e por isso mesmo a qualquer tempo modificveis pela vontade de quem os produziu, sem que se possa opor direito adquirido persistncia destas regras. Exemplo: o regulamento.

Atos subjetivos os que criam situaes particulares, concretas e pessoais, produzidas quanto formao e efeitos pela vontade das partes, sendo imodificveis pela vontade de uma si delas e gerando, ento, direitos assegurados persistncia do que dispuseram. Exemplo: o contrato.

Atos-condio os que algum pratica incluindo-se, isoladamente ou mediante acordo com outrem, debaixo de situaes criadas pelos atos-regra, pelo que sujeitam-se s eventuais alteraes unilaterais delas. Exemplo: o ato de aceitao de cargo pblico; o acordo na concesso de servio pblico.

l) Quanto posio jurdica da Administrao

Atos de imprio os que a Administrao praticava no gozo de prerrogativas de autoridade. Exemplo: a ordem de interdio de um estabelecimento.

Atos de gesto os que a Administrao praticava sem o uso de poderes comandantes. Exemplo: venda de um bem; os relativos gesto de um servio pblico.

XI VINCULAO E DISCRICIONARIEDADE

Atos vinculados seriam aquelas que, por existir prvia e objetiva tipificao legal do nico possvel comportamento da Administrao em face de situao igualmente prevista em termos de objetividade absoluta, a Administrao, ao expedi-los, no interfere com apreciao subjetiva alguma.

Atos discricionrios (atos praticados no exerccio da competncia discricionria), pelo contrrio, seriam os que a Administrao pratica com certa margem de liberdade de avaliao ou deciso segundo critrios de convenincia e oportunidade formulados por ela mesma, ainda que adstrita lei reguladora da expedio deles.

Em suma: discricionariedade liberdade dentro da lei, nos limites da norma legal, e pode ser definida como: A margem de liberdade conferida pela lei ao administrador a fim de que este cumpra o dever de integrar com sua vontade ou juzo a norma jurdica, diante do caso concreto, segundo critrios subjetivos prprios, a fim de dar satisfao aos objetivos consagrados no sistema legal.

No se confunde discricionariedade e arbitrariedade. Ao agir arbitrariamente o agente estar agredindo a ordem jurdica, pois ter se comportado fora do que lhe permite a lei. Seu ato, em consequncia, ilcito e por isso mesmo corrigvel judicialmente. Ao agir discricionariamente o agente estar quando a lei lhe outorga tal faculdade (que simultaneamente um dever), cumprindo a determinao normativa de ajuizar sobre o melhor meio de dar satisfao ao interesse pblico por fora da indeterminao legal quanto ao comportamento adequado satisfao do interesse pblico no caso concreto.

XII ATOS ADMINISTRATIVOS IN SPECIE

Em funo do contedo

Admisso o ato unilateral pelo qual a Administrao vinculadamente faculta a algum a incluso em estabelecimento governamental para o gozo de um servio pblico, o qual no pode ser negado aos que preencherem as condies normativas requeridas para seu desfrute.

Concesso a designao genrica de frmula pela qual so expedidos atos ampliativos da esfera jurdica de algum.

Permisso o ato unilateral pelo qual a Administrao faculta precariamente a algum prestao de um servio pblico ou defere a utilizao especial de um bem pblico.

Autorizao o ato unilateral pelo qual a Administrao, discricionariamente, faculta o exerccio de atividade material, tendo, como regra, carter precrio.

Aprovao o ato unilateral pelo qual a Administrao, discricionariamente, faculta a prtica de ato jurdico ou manifesta sua concordncia com ato jurdico j praticado, a fim de lhe dar eficcia. De conseguinte, admite, conforme exposto, dupla modalidade, a saber: aprovao prvia, quando aprecia a convenincia e oportunidade relativas a ato ainda no editado, liberando sua prtica; aprovao a posteriori, quando manifesta concordncia discricionria com ato praticado e dela dependente a fim de se tornar eficaz.

Licena o ato vinculado, unilateral, pelo qual a Administrao faculta a algum o exerccio de uma atividade, uma vez demonstrado pelo interessado o preenchimento dos requisitos legais exigidos. Uma vez cumpridas as exigncias legais, a Administrao no pode neg-la. Da seu carter vinculado, distinguindo-se, assim, da autorizao.

Homologao o ato vinculado pelo qual a Administrao concorda com ato jurdico j praticado, uma vez verificada a consonncia dele com os requisitos legais condicionadores de sua vlida emisso. Percebe-se que se diferencia da aprovao a posteriori em que a aprovao envolve apreciao discricionria ao passo que a homologao plenamente vinculada.

Parecer a manifestao opinativa de um rgo consultivo em que este expende sua apreciao sobre o que lhe submetido.

Como forma de manifestao de outros atos

Decreto a frmula pela qual o Chefe do Poder Executivo (federal, estadual, distrital e municipal) expede atos de sua competncia privativa (artigo 84 da CF). Assim, por meio de decreto so expedidas quer normas gerais, como os regulamentos, quer normas individuais, isto , atos concretos, da alada dos Chefes do Executivo.

Portaria a frmula pela qual autoridades de nvel inferior ao de Chefe do Executivo, sejam de qualquer escalo de comandos que forem, dirigem-se a seus subordinados, transmitindo decises de efeito interno, quer com relao ao andamento das atividades que lhes so afetas, quer com relao vida funcional de servidores, ou, at mesmo, por via delas, abrem-se inquritos, sindicncias, processos administrativos. Como se v, trata-se de ato formal de contedo muito fluido e amplo.

Alvar frmula utilizada para expedio de autorizaes e licenas.

Instruo frmula de expedio de normas gerais de orientao interna das reparties, emanadas de seus chefes, a fim de prescreverem o modo pelo qual seus subordinados devero dar andamento aos seus servios.

Aviso usado quase que s nos Ministrios Militares.

Circular frmula pela qual autoridades superiores transmitem ordens uniformes a funcionrios subordinados. No veicula regras de carter abstrato como as instrues, mas concreto, ainda que geral, por abranger uma categoria de subalternos encarregados de determinadas atividades.

Ordem de servio frmula usada para transmitir determinao aos subordinados quanto maneira de conduzir determinado servio. Ao invs desta frmula, as ordens por vezes so veiculadas por via circular.

Resoluo frmula pela qual se exprimem as deliberaes dos rgos colegais.

Parecer a manifestao opinativa de um rgo consultivo expendendo sua apreciao tcnica sobre o que lhe submetido.

Ofcio a frmula pela qual os agentes administrativos se comunicam formalmente. So, por assim dizer, as cartas oficiais. Por meios delas expedem-se convites, agradecimentos e encaminham-se papis, documentos e informaes em geral.

XIV PANORAMA DA EXTINO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

As vrias formas de extino so:

a) Ato eficaz (ou relao dele nascida):

I Cumprimento dos efeitos:

a) esgotamento do contedo jurdico da relao;b) execuo material;c) termo final ou condio resolutiva.

II Dispario de elemento infungvel da relao:

a) sujeito;b) objeto.

III Retirada

a) revogao;b) invalidao;c) cassao;d) caducidade;e) contraposio.

IV Renncia

b) Ato ineficaz

a) mera retirada;b) recusa.

IX REVOGAO

Revogao a extino de um ato administrativo ou de seus efeitos por outro ato administrativo, efetuada por razes de convenincia e oportunidade, respeitando-se os efeitos precedentes.

Portanto: a) o sujeito ativo da revogao uma autoridade no exerccio de funo administrativa; b) seu objeto um ato ou uma relao jurdica vlidos; c) seu fundamento uma competncia discricionria para incidir sobre situao dantes regulada; d) seu motivo a inconvenincia ou inoportunidade da mantena da situao precedente; e) seus efeitos, em relao ao disposto anteriormente, so os de extinguir o que fora provido, sem ofender os efeitos passados; f) sua natureza de ato da administrao ativa, constitutivo (no apenas declaratrio), e expressa um podre positivo; g) seus limites so os que resultam destas caractersticas.

XIV COISA JULGADA ADMINISTRATIVA

A coisa julgada administrativa implica, para ela (Administrao), a definitividade dos efeitos de uma deciso que haja tomado.

O tema diz respeito exclusivamente aos atos ampliativos da esfera jurdica dos administrados. O fenmeno aludido s ocorre em relao a esse gnero de atos. Trata-se, portanto, de instituto que cumpre uma funo de garantia dos administrados e que concerne ao tema da segurana jurdica estratificada na prpria rbita da Administrao.

Toda vez que a Administrao decidir um dado assunto em ltima instncia, de modo contencioso, ocorrer a chamada coisa julgada administrativa.

XVII INVALIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS

Invalidao a supresso de um ato administrativo ou da relao jurdica dele nascida, por haverem sido produzidos em desconformidade com a ordem jurdica.

Sujeito ativo

Podem ser sujeitos ativos da invalidao tanto a Administrao quanto o Poder Judicirio.

Portanto, diferentemente da revogao, que privativa de autoridade no exerccio de funo administrativa, a invalidao tanto pode resultar de um ato administrativo quanto de um ato jurisdicional.

Objeto da invalidao

O objeto da invalidao ora ser um ato ainda ineficaz, ora ser uma relao jurdica, ora um ato e as relaes jurdicas que produziu.

Em sntese: a invalidao quando referida aos atos ineficazes tem por objeto o prprio ato; quando referida aos atos eficazes abstratos tem por objeto o ato e seus efeitos; e quando referida a atos eficazes e concretos tem por objeto apenas os efeitos deles.

Fundamento da invalidao

Para a Administrao, o que fundamenta o ato invalidador o dever de obedincia legalidade, o que implica obrigao de restaur-la quando violada. Para o Judicirio o exerccio mesmo de sua funo de determinar o Direito aplicvel no caso concreto.

Motivo da invalidao

O motivo da invalidao a ilegitimidade do ato, ou da relao por ele gerada, que se tem de eliminar. Enquanto na revogao a inconvenincia que suscita a reao administrativa, na invalidao a ofensa ao direito.

Forma da invalidao

No deve a Administrao proceder, de imediato, invalidao do ato. Com efeito, entre a constatao do vcio e a invalidao do ato deve transcorrer o chamado procedimento administrativo invalidador, ao fim do qual poder ser emitido o ato invalidador. Quer-se com isto dizer que a invalidao de atos administrativos, mesmo quando pronunciada pela prpria Administrao Pblica, deve observar o devido processo legal, sob pena de ofensa frontal ao sistema constitucional brasileiro.

Efeitos da invalidao

Os efeitos da invalidao consistem em fulminar o ato viciado e seus efeitos, inmeras vezes atingindo-o ab initio, portanto retroativamente. Vale dizer: a anulao, com frequncia, mas no sempre, opera ex tunc, isto desde ento.

De todo modo, percebe-se, neste passo, uma diferena ntida entre os efeitos da invalidao e os da revogao. Enquanto a invalidao muitas vezes suprime seu objeto retroativamente, eliminando as situaes passadas, a revogao as respeita, pois apenas lhes tolhe o seguimento para o futuro.

Classificao da invalidade segundo a doutrina brasileira

Em nosso entender so categorizveis como invlidos (a) os atos inexistentes, (b) os atos nulos e (c) os atos anulveis.

Existem ainda, embora no como atos invlidos, os atos irregulares. Estes no so invlidos.

Atos irregulares

Atos irregulares so aqueles padecentes de vcios materiais irrelevantes, reconhecveis de plano, ou incursos em formalizao defeituosa consistente em transgresso de normas cujo real alcance meramente o de impor a padronizao interna dos instrumentos pelos quais se veiculam os atos administrativos.

Tais regras cumprem meramente funes internas de uniformizao; no tm, pois, qualquer relevncia em relao segurana e ao contedo do ato, publicidade dele ou s garantias do administrado. Servem apenas metodizao dos instrumentos pelos quais se veiculam os atos administrativos, isto , qualificao das diversas frmulas expressivas dos distintos atos administrativos. Assim, as regras atinentes a tal aspecto no tm relevncia jurdica externa, mas puramente interna, razo pela qual a violao delas s pode acarretar sanes administrativas para os agentes que as desatenderam, mas em nada interfere com a validade do ato.

bem de ver que s se estar perante ato meramente irregular se a substituio de uma frmula por outra em nada afetar a publicidade do ato, os prazo de impugnao ou quaisquer aspectos interferentes com a garantia de direitos dos administrados.

Convalidao

A convalidao o suprimento da invalidade de um ato com efeitos retroativos. Este suprimento pode derivar de um ato da Administrao ou de um ato do particular afetado pelo provimento viciado.

No se deve confundir convalidao com a converso de atos nulos. Pela converso, quando possvel, o Poder Pblico trespassa, tambm com efeitos retroativos, um ato de uma categoria na qual seria invlido para outra categoria, na qual seria vlido. De conseguinte, ao contrrio da convalidao, em que o ato invlido tem salvaguardados os mesmos efeitos, na converso o ato produz, retroativamente, efeitos prprios de outro ato: aquele que seria possvel.

Convalidao e invalidao: poder ou dever?

Perante atos invlidos, a Administrao Pblica no tem discrio administrativa que lhe permita escolher com liberdade se convalida um ato viciado ou se deixa de faz-lo. Tambm no tem liberdade para optar se o invalida ou se deixa de invalid-lo. Finalmente, no pode, outrossim, eleger livremente entre as alternativas de convalidar ou invalidar, ressalvada uma nica hiptese: tratar-se de um vcio de competncia em ato de contedo discricionrio. Neste ltimo caso, cabe ao superior hierrquico, a quem competiria expedi-lo, decidir se confirma o ato ou se reputa inconveniente faz-lo, quando, ento, ser obrigado a invalid-lo.

Identificao dos atos inexistentes, dos nulos e dos anulveis

So inexistentes os atos que assistem no campo do impossvel jurdico, como tal entendida a esfera abrangente dos comportamentos que o Direito radicalmente inadmite, isto , dos crimes que atentem contra a dignidade humana.

So nulos:

Os atos que a lei assim os declare. Os atos em que racionalmente impossvel a convalidao, pois, se o mesmo contedo ( dizer, o mesmo ato) fosse novamente produzido, seria reproduzida a invalidade anterior

So anulveis:

Os que a lei assim os declare. Os que podem ser repraticados sem vcio.

Regime dos atos invlidos

Efetivamente, nos atos unilaterais restritivos da esfera jurdica dos administrados, se eram invlidos, todas as razes concorrem para que sua fulminao produza efeitos ex tunc, exonerando por inteiro quem fora indevidamente agravado pelo Poder Pblico das consequncias onerosas. Pelo contrrio, nos atos unilaterais ampliativos da esfera jurdica do administrado, se este no concorreu para o vcio do ato, estando de boa-f, sua fulminao s deve produzir efeitos ex nunc, ou seja, depois de pronunciada.

XVIII REGIME JURDICO DOS ATOS INEXISTENTES, DOS NULOS E ANULVEIS: COMPARAO

Os atos inexistentes:

So imprescritveis; Jamais podem ser convalidados, ao contrrio dos anulveis, e jamais podem ser objeto de converso, ao contrrio dos atos nulos, pois estes ltimos, em algumas hipteses, podem ser convertidos em outros atos; cabvel direito de resistncia, inclusive manu militari, contra eles, diferentemente do que ocorre com os atos nulos e anulveis; Uma vez proclamado o vcio em que incorreram, em nenhuma hiptese so ressalvados efeitos pretritos que hajam produzido.

Os atos nulos e anulveis sujeitam-se a regime igual quanto:

persistncia dos efeitos em relao a terceiros de boa-f, bem como de efeitos patrimoniais pretritos concernentes ao administrado que foi parte na relao jurdica, quando forem necessrios para evitar enriquecimento sem causa da Administrao e dano injusto ao administrado, se estava de boa-f e no concorreu para o vcio do ato; resistncia que os administrados lhes oponham; eliminao de seus efeitos, uma vez declarada a invalidade, a qual opera do mesmo modo. A saber: se o ato fulminado era restritivo de direitos, a eliminao retroativa; se o ato fulminado era ampliativo de direitos, a eliminao produz efeitos ex nunc, isto , desde agora, salvo se demonstrvel a m-f do beneficirio do ato ilegal, com ou sem conluio com o agente pblico que o praticou.

Atos nulos e anulveis apresentam regime jurdico diferente quanto a:

Possibilidade de convalidao. S os anulveis podem ser convalidados; os nulos no; estes podem, apenas e quando a hiptese comportar -, ser convertidos em outros atos; Arguio do vcio que possuem. No curso de uma lide o juiz pode pronunciar de ofcio ou sob provocao do Ministrio Pblico (quando a este caiba intervir no feito) a nulidade de ato gravado deste vcio mesmo que o interessado no argua. O vcio do ato anulvel s pode ser conhecido se o interessado arguir.