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 50  50 WELFARE CABOCLO INTELIGÊNCIA I N S I G H T FABIANO SANTOS CIENTIST A POLÍTICO DEMOCRACIA SOCIAL

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Ciencia Política

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  • 5050 welfare caboclo

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    FABIANO SANTOSCIENTISTA POLTICO

    DemOcrAcIA SOcIAl &

  • 51abrilmaiojunho 2013

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    51abrilmaiojunho 2013

    cOAlIzeS gOverNISTAS, AquI e l FOrA &

  • INTELIGNCIAI N S I G H T

    5252 welfare caboclo

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    indiscutvel que os princpios da legalidade e da

    transparncia, como balizadores do comportamento dos

    agentes polticos, confundem-se com a prpria noo de

    Estado democrtico. indiscutvel, da mesma forma, que

    a corrupo poltica aquela que envolve representantes

    eleitos seja no Executivo, seja no Legislativo geralmente

    se associa, embora difcil precisar em qual medida,

    a distores importantes em nossa vida econmica.

    Superfaturamento e licitaes dirigidas, em princpio,

    aumentam os custos de atividades governamentais e

    desviam recursos da economia para o puro e simples

    enriquecimento de autoridades mal-intencionadas.

    No se pode negar, contudo, que a bandeira da tica na

    poltica, do moralismo e da faxina tem servido a propsitos

    politicamente antidemocrticos, para dizer o mnimo.

    Os iniciados em histria brasileira recente conhecem

    muito bem o escopo de movimentos pela depurao dos

    costumes polticos, movimentos, em ltima instncia, de

    legitimao social de intervenes golpistas. Na Europa

    contempornea, os novos partidos de direita crescem

    nas urnas e insuflam sua retrica aproveitando-se de

    um sentimento difuso de repulsa do cidado comum

    quilo que denominado de sistema, o sistema e seus

    acumpliciados, a saber, os partidos polticos tradicionais e

    seus representantes.

    Parece incrvel, mas nunca ocorreu aos analistas do dia

    a dia de nossa poltica a hiptese de que a revelao de

    casos e mais casos de corrupo envolvendo autoridades

    polticas seja efeito do bom funcionamento das instituies

    do Estado, e no o seu contrrio. Levantar a hiptese e

    discuti-la seriamente no so tarefas ldicas ou mero

    exerccio de especulao. O argumento contrrio, segundo

    o qual vivemos quadro de decadncia institucional, por

    conta de repetidos episdios de roubalheira, dissemina

    sentimento de desconforto com a poltica democrtica,

    baseada no voto e nas eleies. Dissemina o desnimo

    e a apatia. Justifica, ademais, a permanncia do tema da

    reforma de nosso presidencialismo de coalizo na agenda

    de pontos relevantes a serem tratados pelo Congresso.

    Mas se a primeira hiptese for a que melhor retrata a

    evoluo da realidade histrica, ento, nada mais distante

    das prioridades da vida social brasileira do que reformar

    nossas instituies representativas.

    O tema do presidencialismo de coalizo aparece como

    crucial nesse contexto. O termo, utilizado pela primeira vez

    em clssico artigo de Srgio Abranches, designa a juno

    do sistema de separao de poderes com a formao de

    coalizes para a montagem de ministrios, alm de apoio

    no Legislativo s polticas oriundas do Executivo, prtica

    comum nos pases nos quais o multipartidarismo a

    regra. Ou seja, em ltima instncia, resulta da juno do

    sistema presidencial com a representao proporcional.

    Nada alm disso. Nada, em suas condies fundamentais,

    permite a ilao de que possuiria poderes mgicos,

    como se fosse capaz de contaminar com o germe da

    corrupo qualquer pessoa que dele faa parte. Em outras

    palavras, identificar neste sistema a origem causal de um

    suposto processo de decadncia institucional ou da baixa

    performance democrtica incorrer em enorme falcia da

    induo. O raciocnio falacioso, no caso, seria do seguinte

    tipo: 1) casos de corrupo proliferam (premissa 1); 2)

    praticamos o presidencialismo de coalizo (premissa 2);

    3) o presidencialismo de coalizo causa da proliferao

    da corrupo (concluso).

    No preciso muita reflexo para se notar o quo tosca

    a tese. Muitos argumentariam que o problema no

    com o conceito de presidencialismo de coalizo, mas

    com sua prtica no Brasil, associada montagem de

    acordos polticos baseados na troca de favores. Trocas

    que nada mais seriam do que barganhas com benefcios

    auferidos unicamente pelos participantes, ademais de

    suas clientelas, pouco cabendo ao pblico mais amplo,

    a sociedade civil e seus representantes mais dignos.

    Deixemos de lado o paroquialismo muitas vezes presente

    no argumento, como se troca de favores no existisse

    acima da linha do Equador. Olhemos unicamente para o

    Brasil.

  • INTELIGNCIAI N S I G H T

    53abrilmaiojunho 2013

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    53abrilmaiojunho 2013

    A montagem de grandes coalizes de apoio ao governo

    no Legislativo e formao dos ministrios tem sido o

    cenrio mais frequente. Supostamente, isto tem levado

    criao ou sobrevivncia de legendas especializadas na

    ocupao de cargos no Executivo, sem maiores vnculos

    com interesses e preferncias enraizadas na vida social,

    muito menos assentadas em uma agenda bem definida

    de polticas pblicas. Deixemos mais uma vez de lado

    o risco de paroquialismo que tal viso encerra, como se

    partidos clientelistas no existissem nos sistemas polticos

    europeus (sejam os nrdicos ou os mediterrneos). O

    exemplo paradigmtico desse perfil de legenda seria

    o PMDB. Diz-se que a realizao mais profunda da

    democracia no Brasil, uma democracia

    que transcenda o momento eleitoral e

    de negociaes legislativas, esbarraria

    na constante presena no governo deste

    partido, controlado, em larga medida, por

    polticos clientelistas, tradicionais, representantes de velhas

    oligarquias estaduais.

    Ora, o PMDB chamado para participar de coalizes,

    sobretudo, para compor maiorias no Legislativo e viabilizar

    vitrias eleitorais. Nada existe no presidencialismo

    de coalizo que obrigue o governo a formar maiorias

    congressuais ou obter apoio quase consensual junto ao

    eleitorado. Em muitos pases europeus, a prtica recorrente

    a de governos minoritrios, o gabinete sendo apenas

    tolerado, isto , no derrubado, pela maioria oposicionista

    no parlamento. Grande parte da histria recente norte-

    americana a de governos divididos, nos quais o partido

    que controla a presidncia no o mesmo

    que controla a maioria nas duas Casas

    do Congresso. Qual a condio para

    que governos minoritrios funcionem?

    Uma condio est sempre presente:

    Nada existe No preSIDeNcIAlISmO De cOAlIzO que obrigue o goverNo a formar maiorias coNgressuais ou obter apoio quase coNseNsual juNto ao eleitorado

  • INTELIGNCIAI N S I G H T

    5454 welfare caboclo

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    a fora institucional do Legislativo. no interior de

    rgos deste Poder, especialmente em suas comisses

    permanentes, que ocorrem as grandes negociaes em

    torno de polticas propostas pelo Executivo. Nelas, nas

    comisses, as propostas so discutidas com um mnimo

    de publicidade, com a participao de grupos de interesse

    e opinies aquilatadas da sociedade organizada. Para o

    plenrio, chegam projetos amadurecidos pela discusso

    e pelo acordo democrtico, to perfeito quanto permite a

    imperfeio do processo deliberativo humano. Mas nunca

    pelos corredores opacos da burocracia do Executivo e

    privilegiados que a eles tem acesso.

    Assim, parece relevante sugerir foco

    distinto para o entendimento dos dilemas

    da democracia representativa no cenrio

    contemporneo. Vejamos o que tem

    ocorrido, por exemplo, nas democracias

    da Europa. Nas ltimas eleies desse continente,

    independentemente da tendncia ideolgica do partido

    vitorioso, se liberal ou social-democrata, de esquerda ou de

    direita, trouxeram sempre o mesmo veredicto: a oposio

    ganha e, por bvio, o governo perde. Na Dinamarca, na

    Frana, a esquerda desbancou governos de inclinao

    conservadora. Em Portugal, na Espanha, na Grcia e na

    Inglaterra o contrrio ocorreu, a saber, partidos de direita

    derrotaram governos socialistas, social-democratas ou

    trabalhistas, retornando ao poder, em alguns casos, depois

    de longo perodo na oposio. Alm disso, na Itlia, aps

    a queda do inacreditvel Berlusconi e um governo tcnico

    emergencial, a esquerda volta a fazer o

    primeiro-ministro, embora em coalizo

    com foras da centro-direita.

    Qual o grande aprendizado a ser extrado

    do cenrio europeu contemporneo?

    Na itlia, aps A queDA DO INAcreDITvel BerluScONI e um goverNo tcNico emergeNcial, a esquerda volta a fazer o primeiro-miNistro

  • INTELIGNCIAI N S I G H T

    55abrilmaiojunho 2013

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    55abrilmaiojunho 2013

    Existem de fato alguns aspectos positivos a serem

    ressaltados, aspectos, contudo, incapazes de fazer frente

    ao grande drama poltico vivido pelo Velho Continente.

    Entre os aspectos positivos, podemos elencar os seguintes:

    o fato de estarem os pases enfrentando profunda crise

    econmica e seus governos, incapazes de ensejar polticas

    de elevao do desempenho de indicadores bsicos,

    supostamente aumentam a probabilidade de derrota de

    tais governantes e a alternncia de poder. Nada mais

    democrtico e racional. de se admirar tambm o fato de

    tais mudanas estarem ocorrendo dentro dos marcos do

    sistema partidrio vigente. At o momento, no h notcia

    de vitria de partidos radicais, propagandistas de paixes

    nacionalistas ou xenfobas, com a provvel exceo da

    Hungria e o espectro nebuloso de Pepe Grilo na Itlia.

    Ademais, onde ocorre realinhamento mais significativo,

    como, por exemplo, na Grcia, com a apario da Syriza, a

    mudana caminha na direo da rearticulao das foras

    de esquerda, politicamente organizadas, com sua clientela

    eleitoral por excelncia, vale dizer, dos assalariados,

    desempregados e vtimas em geral do funcionamento

    do mercado. O velho partido socialista, Pasok, parece a

    esta altura fadado marginalizao ou pura e simples

    extino.

    Por sua vez, na Espanha, em Portugal, na Alemanha e na

    Inglaterra, os grandes partidos de esquerda passam por

    profunda reavaliao do legado da terceira via. Esta linha

    poltica, adotada inicialmente pelos trabalhistas ingleses

    sob a liderana de Tony Blair, acabou sendo emulada, logo

    em seguida, por vrios partidos de esquerda no continente.

    Sua tese fundamental consistia na necessidade de

    renovao do discurso e da prtica da social-democracia

    clssica, necessidade decorrente das alteraes na

    morfologia do capitalismo introduzidas pela globalizao.

    Renovao no caso significava a aceitao da premissa

    bsica de funcionamento da ordem social propugnada

    pelo liberalismo, a saber, que o dinamismo econmico de

    um pas decorreria naturalmente da liberdade e segurana

    fornecidas pelo governo s empresas e aos investidores,

    nacionais e multinacionais, para uma eficiente alocao

    de seus recursos e capacidades. Tamanha guinada no

    discurso, todavia, no se limitou ao campo da retrica

    eleitoral, pois no mbito econmico, sobretudo, polticas

    nas dimenses macro e micro seguiram a linha da rigidez

    monetria, desregulamentao financeira e alvio das

    contas nacionais atravs da reduo dos benefcios do

    Welfare.

    Difcil dizer se a estratgia da terceira via resultou de uma

    genuna alterao de crenas ou do mais desavergonhado

    e puro clculo eleitoral, com partidos esquerda

    buscando o eleitor de centro, eleitor que cada vez mais

    se deslocava para o campo liberal. Provavelmente um

    mix das duas motivaes. A verdade que hoje surge

    a questo de se saber at que ponto o excesso de

    moderao no acabou em capitulao e alienao de

    boa parte de seu eleitorado tradicional. A pergunta ainda

    mais relevante quando se nota que tanto a unificao

    monetria (vlida para os casos de Grcia, Itlia, Espanha

    e Portugal) quanto a desregulamentao dos mercados

    financeiros vm conduzindo a economia desses pases ao

    desastre.

    O grande problema poltico atual da Europa, portanto,

    e cuja gravidade alternncia nenhuma no poder ser

    capaz de equacionar isoladamente, pode ser formulado

    da seguinte maneira: a Unio Europeia, dado seu modo

    de operar, gera claro vis contrrio vigncia de polticas

    de cunho social-democrata no mbito interno dos

    pases. Isto porque a unificao monetria foi feita sem

    legislao comum de controle dos fluxos financeiros,

    sem compensaes aos pases menos competitivos no

    comrcio internacional e, sobretudo, sem que tenha sido

    criada uma base comum de arrecadao fiscal. Ora, no

    se trata exatamente de novidade a noo de que sem

    tributo no h governo, e sem governo no h controle

    poltico do mercado mas no residiria justamente a o

    fundamento da social-democracia?

  • INTELIGNCIAI N S I G H T

    5656 welfare caboclo

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    A estratgia do recm-eleito presidente da Frana, o

    socialista Franois Hollande, agora na boa companhia

    de Enrico Letta, na Itlia, , por conseguinte, mais do que

    acertada. No h possibilidade de alterao significativa

    no status quo das polticas seguidas pelos principais

    pases da zona do euro, priorizando o crescimento e o

    emprego, sem que haja uma articulao e coordenao

    envolvendo vrios governos nacionais. Crucial saber,

    neste sentido, o resultado das prximas eleies italianas

    e o poder de resistncia dos conservadores na Alemanha

    frente presso por mudanas de pases to influentes

    como Frana e Itlia. Seja como for, a lio que fica para a

    esquerda de que extremo cuidado deve cercar decises

    envolvendo o tema da integrao regional. O problema

    nacional, assim como a possibilidade de ativismo estatal

    no campo econmico, so paradigmas essenciais tanto

    para o discurso quanto para as polticas de quem se

    define como alternativa aos partidrios do livre mercado.

    Abrir mo destes paradigmas pode significar mais do que

    simplesmente assistir queda da social-democracia.

    Pode significar a impossibilidade de efetiva alternncia

    democrtica no poder.

    O que se pode apreender deste rpido mergulho no cenrio

    europeu, tendo em vista o jogo poltico no Brasil para

    2014? Vale a pena separar os elementos mais atinentes

    aos enfrentados pelo governo daqueles que dizem respeito

    s estratgias possveis para a oposio em um cenrio

    de adeso da maioria da populao s polticas pblicas

    fundamentais do governo, baseadas na redistribuio da

    riqueza.

    Para o governo, instrutivo observar, por exemplo, a

    tradio escandinava de governos com minoria ou

    maiorias mnimas. Neste sentido, curioso perceber

    semelhanas entre algumas escolhas feitas pela

    presidente Dilma Rousseff e determinados traos

    da histria poltica recente na Noruega. Gro Harlem

    Brundtland, do PT noruegus, uma das principais

    expoentes da esquerda europeia do sculo XX, foi a

    primeira mulher a ocupar o cargo de primeira-ministra

    na Noruega, nos anos 1980. Fez isso escolhendo grande

    contingente de mulheres para o gabinete. O modelo

    regulatrio escolhido para a explorao de petrleo

    em guas profundas serviu de inspirao para Dilma

    Rousseff, quando ainda era ministra chefe da Casa Civil

    de Lula. Contudo, para alm das vrias diferenas que

    marcam a sociedade, a geografia e a evoluo histrica

    de Brasil e Noruega, existe uma mais especfica que

    talvez no fosse to inevitvel: a primeira mulher a

    governar o pas nrdico escolheu no montar um governo

    majoritrio, pois no quis distorcer a vocao esquerdista

    e trabalhista de seu governo e da agenda a ser proposta

    para o pas.

    provvel que o processo poltico brasileiro recente

    esteja na iminncia de experimentar inflexo semelhante,

    sobretudo se o atual cenrio de favoritismo da presidente

    nas eleies de 2014 se confirmar. Uma mulher,

    determinada, lder de uma coalizo de centro-esquerda,

    procura conferir mais nitidez conduo de seu governo

    dispensando a colaborao de partidos de centro,

    ideologicamente pouco definidos, contudo, no Executivo.

    Para que isso ocorra, no entanto, duas condies so

    necessrias: 1) curar a obsesso de boa parte da elite

    poltica brasileira em reformar o presidencialismo de

    coalizo; 2) fortalecer regimentalmente as comisses

    permanentes do Congresso. O desafio histrico

    est posto. Ou a poltica brasileira aprofunda seu

    mergulho democrtico, prestigiando suas instituies

    representativas, em associao, claro, com os

    elementos participativos e deliberativos presentes em

    seu cenrio, ou se aposta, em nome da moralidade e do

    combate corrupo, numa reforma de efeitos incertos,

    decididamente ao reverso daquilo que a cidadania

    precisaria para seu fortalecimento.

    Do lado da oposio, um caso em tela parece ser

    o da Sucia, embora as manifestaes recentes de

    insatisfao e frustrao por parte de imigrantes estejam

  • INTELIGNCIAI N S I G H T

    57abrilmaiojunho 2013

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    57abrilmaiojunho 2013

    exercendo grande presso sobre o sistema poltico em

    seu conjunto. No faz muito tempo, o Brasil recebeu a

    visita do primeiro-ministro da Sucia, Fredrik Reinfeldt,

    lder do Partido Moderado, direita em seu pas, o qual

    tem no governo se caracterizado de fato, como o nome

    indica, pela moderao tanto em suas aes quanto em

    sua retrica. Em vrias entrevistas, Reinfeldt descreveu

    os pontos bsicos sob os quais se assenta a estratgia

    poltica de sua gesto: aceitar a tradio igualitria que

    moldou a evoluo do capitalismo escandinavo, procurando

    estimular a competitividade de setores selecionados

    da economia atravs de polticas de

    inovao e desonerao fiscal. Os

    efeitos da adoo de tal estratgia

    so significativos e tangveis. Mesmo

    em tempos de globalizao, a carga

    tributria relativamente alta, assim

    como a despesa em itens como educao,

    sade, previdncia, habitao, alm de investimentos

    na infraestrutura fsica necessria para o dinamismo e

    sustentabilidade das indstrias de bens e servios.

    Comparar tal caso com o dos Estados Unidos pode ser

    ilustrativo, pois bastante diferente tem sido a postura da

    oposio de direita ao governo de Barack Obama. Antes

    da atual administrao democrata, quando no governo,

    dominando a Casa Branca, assim como as duas Casas

    legislativas, os republicanos promoveram o mais amplo

    e radical programa de reduo da carga tributria jamais

    vista na histria do capitalismo. O objetivo

    confesso sempre foi o de desmontar o

    tmido, para padres do norte europeu,

    welfare state norte-americano. Ronald

    Reagan j anunciava o inconformismo dos

    conservadores com o que chamavam de

    excessos de gastos sociais e participao

    ou a poltica brasileira aprofuNda Seu mergulhO DemOcrTIcO, prestigiaNdo suas iNstituies represeNtativas, ou se aposta Numa reforma de efeitos iNcertos

  • INTELIGNCIAI N S I G H T

    5858 welfare caboclo

    INTELIGNCIAI N S I G H T

    do Estado nas decises econmicas das famlias e dos

    indivduos. Contudo, em sua presidncia, os democratas

    sempre mantiveram a maioria na Casa dos Representantes

    e, durante quase todo o tempo, tambm no Senado,

    obstaculizando assim o projeto minimalista dos radicais

    direita.

    O atual impasse entre republicanos e democratas quanto

    elevao do teto de endividamento do governo pode

    ser visto ento como resultado de anos de confrontao

    poltica e, principalmente, da postura da direita americana

    de a qualquer custo solapar as bases de sustentao

    do gasto pblico na rea social. Obama pede hoje mais

    impostos, sem os quais impossvel manter alguma

    chance de reequilibrar as finanas do governo. A oposio

    pede aquilo que vem pedindo desde os anos 1980 zerar

    o gasto do Estado com os pobres. E agora, Obama? O

    que fazer? Aumentar impostos? Os republicanos, maioria

    na Cmara, dificilmente concordaro. Cortar gastos

    e dramatizar a situao de pobreza e desigualdade

    cuja tendncia tem sido apenas a de se agravar a cada

    ano? A resposta ser politicamente intolervel para os

    democratas.

    O problema da oposio de centro-direita no Brasil a

    de saber qual paradigma de oposio pretende-se adotar

    face ao papel assumido pelo Estado no atual estgio de

    desenvolvimento capitalista em nosso pas. Ao contrrio

    do diagnstico que muitos intelectuais, polticos e

    jornalistas especializados fizeram no calor da hora dos

    anos de ouro do neoliberalismo, mais exatamente nas

    dcadas de 1980 e 1990, a presena do setor pblico

    foi ampliada em alguns casos e sua ausncia foi muito

    sentida nas ocasies em que os riscos da competio

    tornavam-se maiores. Isto , a clientela eleitoral do

    welfare state e em favor de polticas protecionistas nunca

    deixou de existir. Proteger as pessoas garantindo amparo

    aos que sofrem com o dinamismo de economias muito

    expostas ao mercado externo foi o modelo seguido por

    vrios pases na virada do sculo XX para o XXI. Talvez o

    voto facultativo combinado ao sistema eleitoral para as

    eleies legislativas baseadas em maiorias simples em

    distritos uninominais, instituies altamente excludentes

    em seus efeitos, seja uma boa explicao, mas o fato

    que a frmula de enfrentamento dos americanos

    aos desafios da globalizao, em especial da direita

    americana, foi radicalmente diferente: aprofundar ainda

    mais a flexibilidade das instituies que organizam o

    mercado de trabalho com o consequente aumento na

    capacidade das firmas de se ajustarem a condies

    econmicas em constante mutao.

    Os ltimos governos no Brasil tm se caracterizado,

    isto inegvel, pelo combate aos seculares problemas

    da pobreza e da desigualdade. A estratgia, desde

    sempre, a mesma e uma s: organizar as instituies

    do setor pblico para o atendimento eficiente das

    populaes marginalizadas, tendo em vista inseri-las

    na vida produtiva com mnimas condies de sucesso.

    Programas como o Bolsa Famlia, a priorizao do ensino

    tcnico, assim como o recente projeto de erradicao

    da misria, caminham na mesma direo, a saber,

    investimento pblico em capital humano, reduzindo a

    exposio dos indivduos s vicissitudes da economia

    capitalista.

    O problema do potencial eleitor de oposio no Brasil,

    por conseguinte, no saber se os polticos com tal

    inclinao sairo ou no do armrio. O problema saber

    qual a estratgia poltica que um eventual governo

    controlado pela atual oposio conservadora seguir:

    far como a direita tem feito na Sucia, aprofundando

    os elementos do novo pacto poltico no Brasil, que tem

    na pobreza um inimigo a ser combatido com todas as

    foras? Ou adotar uma estratgia de confrontao e

    desmonte das ainda frgeis instituies do welfare state

    brasileiro?

    O autor professor do Instituto de Estudos Sociais e Polticos da UERJ (IESP-UERJ).

    [email protected]