eterno retorno
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Matéria da revista MUITO sobre os lançamentos em vinil e o renascimento das vitrolas, cada vez mais high-techTRANSCRIPT
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ETERNORETORNO
A empresária Janaína Souza, da Tabacaria Corona, com a Crosley, que toca CD e vinil: aposta na venda de vitrolas modernas
Texto MARCEL [email protected] FERNANDO [email protected]
O disco em vinil ocupa ummercado cada vez mais refinado,com vitrolas hi-tech e lançamentosde artistas contemporâneos
«Sempre temalguma coisapreciosa em vinil,ali, esperando»A
agulha desliza sobre os sul-
cos do disco, captando as vi-
brações e convertendo-as
em música. Nada de chia-
dos. Os Long Plays e as vitro-
lasestãodevoltaàspratelei-
ras.Masnãosãoantigos.Acabaramdesair
dafábrica,têmcheirodenovo,eestãocada
vez mais hi-tech. Hoje, as pick ups tocam
CDs e mp3, têm saídas USB e se impõem
em qualquer ambiente.
Em meio às crises e revoluções, que vol-
ta e meia se abatem sobre a indústria do
disco,hásempreummovimentodepreser-
vação desse velho modo de consumo mu-
sical. A “morte” do vinil se deu em meados
dosanos1990,comapopularizaçãodoCD.
Mas uma legião de puristas agarrou-se ao
LP, testando a resistência à renite alérgica
em sebos e lojas de eletrônicos usados.
A ressurreição que está aí vai na contra-
mão da indústria, fazendo contraponto à
saturação do mp3 e à imaterialidade da
música. Afinal, o formato álbum, com co-
meço,meioefim,quasedesapareceue,ca-
davezmais,umpúblicoávidoporouvirdis-
cos inteiros (com arte de capa e qualidade
sonora) força o mercado a se adequar. Ou-
vir um vinil é uma experiência multissen-
sorial: auditiva, tátil e visual.
Para as os mais velhos e a nova geração,
esse novo velho modo de fruição tem des-
pertado, no Brasil, cada vez mais interesse,
levandoa indústriadodiscoaoferecer,ain-
da que para um público restrito, material
novíssimo e de alta qualidade. Um merca-
do que atrai não só audiófilos, mas tam-
bém um público novo, que se mantinha
afastado por conta da poeiras dos sebos.
MEMÓRIAAté onde a memória permite lembrar,
Lucas Lopes nunca consumiu música em vi-
nil. O interesse levou o pai a presenteá-lo
com uma vitrola Numark USB PT01, com-
prada em uma loja de instrumentos e que
permite, além da audição do disco, conver-
ter as faixas em mp3 e wav.
“Olha, eu já estava planejando comprar
uma vitrola e meu pai me deu essa de ani-
versário. Confesso que ainda tremo na ho-
ra de colocar a agulha sobre o disco. Ma-
nipular um LP é uma experiência diferente,
envolve mais toques. Não estou interessa-
do em coisas velhas, quero comprar discos
de bandas que estão produzindo agora”.
Alguns discos em vinil novinhos e álbuns reeditados: Jorge Ben, Chico Science e Nação Zumbi, Tom Zé, Pitty e Bob Dylan
Tom Zé, cantor e compositor
Essa redescoberta pelas novas gerações
surpreende, mas não espanta veteranos
como Tom Zé, que teve dois dos seus mais
emblemáticos discos relançados recente-
mentenoformatonoBrasil(TodososOlhos
e Estudando o Samba), além de um boxe
deluxo,ThestudiesofTomZé, comtrêsLPs,
lançado no mercado americano pela gra-
vadora Luaka Bop, de David Byrne.
“Toda geração precisa de alguma rebel-
dia para, depois de compreender seu tem-
po, realizar a antítese dele. Os jovens sem-
pre confrontam os pais com o modelo dos
avós”, diz o artista que, ao lado da mulher,
Neuza, é um confesso comprador de dis-
cos. “Sempre tem alguma coisa preciosa
em vinil, ali, nos esperando”.
GATILHO DIGITALAeradigital foi justamenteogatilhoque
disparou o interesse pelos LPs no Brasil.
“Mas o digital é uma radicalização muito
grande e algumas pessoas sentiram sau-
dades de lidar com o disco físico e a capa.
Quando as pessoas entram em contato
com o som, imediatamente, sentem o
quanto a música digital roubou deles em
qualidade”, diz João Augusto, presidente
da Polysom, única fábrica de vinil da Amé-
rica Latina (são 40 no mundo).
A empresária Janaína Souza resolveu
apostar na venda de vitrolas modernas na
tabacariaquecomandaemdoisshoppings
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da cidade, a partir da percepção de que muitas pessoas possuíam
discos, mas não tinham onde tocá-los. Hoje, ela vende entre cinco
e seis aparelhos por mês. “Há cerca de três anos, comecei a per-
ceberessademandaefuiatrásdequemfabrica.Quemcompratem
gosto diferenciado. Além de ouvir música, acha que o design retrô
agrega estilo. E se quiser fazer uma festa, o aparelho tem entrada
para alto-falantes mais potentes”.
O reaquecimento do mercado nacional se deve, em muito, à
reabertura, em 2009, da Polysom, situada em Belfort Roxo, Bai-
xada Fluminense. A fábrica produz material equiparável aos me-
lhores do mundo e tem capacidade produtiva de três mil unidades
pordia.Atualmenteproduzmetadedisso(incluindocompactos).A
série “Clássicos em Vinil” já relançou, em discos de 180 gramas,
álbuns de grandes artistas como Secos e Molhados, Tom Zé, Chico
Science e Nação Zumbi, Titãs e Novos Baianos.
O preço ainda é doloroso. Cada LP não sai por menos de R$ 70.
“Os impostos não deixam baratear. A carga é de 66%. Isso é cau-
sado por uma cadeia tributária que começa na aquisição das ma-
térias-primas. Mas nossa meta é popularizar”, diz João Augusto.
Mas dá para driblar a cascata de impostos e comprar discos im-
portados, inclusive de artistas brasileiros
como Mutantes, Caetano Veloso e Tom Zé,
ainda não relançados por aqui, em lojas
virtuais,porpreçosquechegamaumquar-
to do cobrado por encomenda. A nova-ior-
quina Insound (www.insound.com), por
exemplo, tem de tudo: lançamentos, pic-
ture discs, acessórios, itens de decoração, e
o envio custa menos que um Sedex. Outra
opçãoérecorreraossebos.OcentrodeSal-
vador está repleto deles.
SANTO DE CASAJoão Paulo Bueno, coordenador nacio-
naldosetordemusicaisdaLivrariaCultura,
tem 200 discos na sua coleção. Afinal, san-
to de casa também tem de fazer milagres.
ElevoltouavenderLPsem2007,apartirda
demanda dos clientes que encomenda-
vam importados. Atualmente, a venda de
LPs se sustenta sozinha e é responsável por 5% do faturamento do
setor. E Bueno aposta na estabilização do mercado.
“Devecresceraindaumpouco,masnãomuito.Nãodependesó
do consumidor de música, mas sobretudo, dos fabricantes de
players. O custo de produção dos nacionais chega a ser bem mais
alto que o dos importados”. Jorge Ben, Ultraje a Rigor e Chico
Science e Nação Zumbi vendem muito bem, obrigado.
E o primeiro estampido da agulha sobre o disco é considerado
parte sagrada da liturgia de quem compra, como explica a ven-
dedora da Cultura Clarissa Albergaria, também colencionadora de
vinis. “Na loja, não tem audição de LPs, como fazemos normal-
mente com os CDs. A primeira audição do vinil é única”.
A integraçãodos formatosviroutendêncianosEstadosUnidose
na Europa e já deu os primeiros passos por aqui. Os produtos vêm
“completos”, em um pacote composto por LPs, CDs e cupom para
download em mp3 de alta qualidade. “A Sony Music colocou no
mercado nacional, em 2009, a coleção Meu Primeiro Disco, que
relançou os álbuns de estreia de 30 grandes artistas, como João
Bosco, Vinícius Cantuária e Chico Science e Nação Zumbi e foi um
sucesso”, conta João Bueno.
Em 16 de maio, foi realizado nos EUA e na Europa o movimento
“Record Store Day”, com o objetivo de voltar os olhos do mundo
paraas lojasdediscos,emviasdeextinção,comaadesãodevários
artistas que gravaram faixas exclusivas. “No ano que vem, pen-
samos em aderir, com preços diferenciados, buscando engajar os
brasileiros”. É um movimento também antipirataria. “Como você
vai piratear um LP?”, desafia João Augusto.
OS ARTISTASAlém de Tom Zé, baianos como Pitty, que lançou seu último dis-
co, Chiaroscuro, em vinil, e a banda Vivendo do Ócio têm endos-
sado o formato. “Foi uma ideia do (produtor) Rafael Ramos. O
vinil, além de expandir o mercado fonográfico, traz uma facilidade
para as pessoas que têm esse fascínio pela coisa”, diz Jajá Cardoso,
vocalista e guitarrista.
“Mesmocomocustodeprodução,amúsicadelesganhouníveis
tão mais elevados em vinil que até um gasto a mais passa a valer
a pena. A repercussão tem sido tão grande que as gravadoras-par-
ceirasestãocadavezmaisabertasanoslicenciarseustítulos.Enote
que estamos falando de um catálogo infindável de discos inesque-
cíveis”, conta João Augusto. Mas o vinil não veio, claro, para subs-
tituir nenhum dos formatos. É uma opção a mais para a já com-
balida indústriadamúsica.Aagulhadeslizapelosulco finaldo lado
A. Talvez seja a hora de trocar de lado. «
DARYAN DORNELLES / DIVULGAÇÃO CLARIANA ZANUTTO / DIVULGAÇÃO
João Augusto, da
Polysom e João
Paulo Bueno, da
Livraria Cultura:
produção e
vendas
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