dissertao claudio da costa

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE CENTRO DE HUMANIDADES HUNIDADE ACADEMICA DE HISTÓRIA E GEOGRAFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA (RE) INVENÇÃO DE IDENTIDADES: A CONSTRUÇÃO DAS IDENTIDADES DE JUDEUS E NAZISTAS NA OBRA “MAUS” DE ART SPIEGELMAN CLÁUDIO DA COSTA BARROSO NETO Campina Grande Dezembro de 2012

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Mestrado

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE CAMPINA GRANDE

    CENTRO DE HUMANIDADES

    HUNIDADE ACADEMICA DE HISTRIA E GEOGRAFIA

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM HISTRIA

    (RE) INVENO DE IDENTIDADES: A CONSTRUO DAS IDENTIDADES DE

    JUDEUS E NAZISTAS NA OBRA MAUS DE ART SPIEGELMAN

    CLUDIO DA COSTA BARROSO NETO

    Campina Grande

    Dezembro de 2012

  • (RE) INVENO DE IDENTIDADES: A CONSTRUO DAS IDENTIDADES DE

    JUDEUS E NAZISTAS NA OBRA MAUS DE ART SPIEGELMAN

    Cludio da Costa Barroso Neto

    Dissertao apresentada ao Programa

    de Ps-Graduao em Histria da

    Universidade Federal de Campina

    Grande, como requisito para obteno

    do ttulo de mestre em Histria, na

    rea de concentrao em Histria,

    Cultura e Sociedade, na linha de

    pesquisa: Cultura, poder e

    identidades.

    Orientadora: Profa.Dra.Marinalva Vilar de Lima

    Campina Grande

    Dezembro de 2012

  • RESUMO

    O advento da Nova Histria Cultural abriu um novo leque de possibilidades nas correntes

    histricas, nos campos de pesquisa e, principalmente, em uma multiplicidade de objetos, com o

    auxilio de diversas novas fontes, que, at ento no eram visualizadas pela histria. E so com

    essas novas possibilidades que nos debruaremos sobre a Histria em Quadrinhos MAUS

    (Spiegelman, 2005) e nos apropriaremos dela como nossa fonte, nosso objeto de pesquisa para

    perceber como se da a (re) construo das identidades de judeus e nazistas na obra. Nas tiras, os

    judeus so desenhados como ratos e os nazistas ganham feies de gatos, poloneses no judeus

    so porcos e estadunidenses cachorros. Buscar ver nela a partir de sua narrativa, e seus desenhos,

    como as identidades so constantemente refeitas a partir da viso que o autor, Art, tendo como

    fonte histrica o relato oral de seu pai, sendo este testemunha viva e sobrevivente do Shoah

    nazista na 2 Guerra Mundial. MAUS ("rato", em alemo) a histria de Vladek Spiegelman,

    judeu-polons que sobreviveu ao campo de concentrao de Auschwitz, narrada por ele prprio

    ao filho Art Spiegelman (2005). O livro considerado um clssico contemporneo das histrias

    em quadrinhos. Foi publicado em duas partes, a primeira em 1986 e a segunda em 1991, ganhou

    o Prmio Pulitzer de literatura.

    Palavras chaves: Histria em Quadrinhos; Identidade; Discurso; Memria.

  • 12

    ou relevncia histrica. No s o veiculo, mas as prprias caractersticas grficas da obra, os

    desenhos underground, a escolha de animais para representar as diferentes identidades polticas e ideolgicas dos personagens a tornam inovadora mesmo usando uma linguagem atraente a

    cultura pop juvenil que a Histria em Quadrinhos H QHVVH SRQWR 0DXV FRQVHJXH VHFRORFDUFRPRXPDGLVWLQWDSRVVLELOLGDGHGHUHSUHVHQWDomRGH$XVFKZLW]&85,S

    Logo aps uma pequena passagem sobre a sua infncia no incio da HQ, Spiegelman

    (2005) nos transporta para o seu tempo presente, onde ele j adulto est visitando o seu pai para

    fazer-lhe uma entrevista sobre a vida dele, entrevistas essas que ocorrem durante quase toda a

    dcada de 1970. Somos apresentados a a outro personagem do tempo presente do autor, a atual

    esposa de seu pai Mala. O autor j nos mostra as facetas de seu pai logo de cara quando o mostra ranzinza, po-duro, e muito preocupado com a sade. Seu pai fica muito feliz em rev-lo,

    sentimento no recproco do autor e que ele faz questo de expressar em sua escrita.

    Seus conflitos e angstias pessoais esto em toda a histria. Em nenhum momento o autor

    deixa de nos relatar onde teve mais dificuldade em conversar com seu pai; em se questionar

    sobre o que estava fazendo com a histria da vida de seu pai, se realmente falar do holocausto da

    forma que ele pretendia falar estava correto. Porm, ao mesmo tempo em que Maus se apresenta para contar uma histria real, um fato nico da vida de um indivduo, ela foi emoldurada em uma

    estrutura de Histria em Quadrinhos.

    O autor preferiu desenhar a histria em preto e branco e com desenhos simples, dando

    mais nfase ao seu roteiro. Spiegelman (2005) prefere fugir do padro esttico dos quadrinhos

    publicados pelas grandes editoras da poca e retratar sua histria seguindo a linha do quadrinho

    underground3, movimento criado no final dos anos 1960 com o intuito de fugir dos padres estticos como uma forma de contestao artstica.

    Em Maus, Spiegelman (2005) se utiliza das imagens para aumentar o impacto de sua obra sobre o leitor. Transformando judeus em ratos e alemes em gatos, a lendria perseguio que j

    tema de desenho animado, tambm reala todo o contexto da perseguio dos nazistas contra

    tambm j muito desgastada pelo cinema Holywoodiano. O termo Shoah significa devastao, catstrofe em

    hebraico, sendo de maneira mais especifica para se tratar do genocdio de judeus pelos alemes na 2 Guerra

    Mundial.

    3 A temtica social do underground comics girava em torno do movimento hippie, portanto, trazia para a cena

    cultural os questionamentos sobre a guerra do Vietnam, direitos humanos, anarquismo, socialismo, liberao das

    mulheres e outros aspectos comuns a contracultura presente na segunda metade da dcada de 1960. Apesar das

    inovaes grficas e de temtica, bem como o apelo ao pblico adulto, os undergrounds comics no obtinham maior visibilidade, tampouco conseguiam uma venda expressiva.

  • 15

    HQ e de ser o autor conhecedor do gnero que utiliza para conduzir o leitor na temtica

    abordada, como enfatiza Pontes:

    A narrativa de Spiegelman (2005) permeada por silncios, por no ditos que

    so convidativos para a imaginao do leitor, mas que se mostram

    simultaneamente vos e fecundos e fecundos. Aps cada quadrinho, o sentido se

    esvai e o leitor lanado mais adiante (PONTES, 2006. p. 09).

    Para podermos ter uma maior noo a respeito das fragmentaes, (re) construes,

    desconstrues e da variedade de lugares de fala do autor dentro de Maus, temos uma citao de La Capra, citado em Pontes (idem) que nos diz:

    La Capra define Spiegelman como artista, escritor, cartunista, romancista,

    historiador, biografo, autobigrafo, etngrafo, testemunha secundaria, memory-worker, modernista, ps-modernista, entrevistador e entrevistado, e Maus como arte documental, literatura pictrica, quadrinhos ou cartoon romanceado,

    graphic novel, histria oral, biografia, autobiografia, etnografia, veiculo de testemunho e modo de recordao (LACAPRA, 1998, apud PONTES, 2006, p.

    143-5).

    Em suma, nem a obra nem o autor podem ser observados dentro de lugares comuns de

    analises, ambos so nicos, complexos e especiais.

    No primeiro capitulo da dissertao discutimos a questo dos quadrinhos dentro da

    histria desde a colocao de sua (possvel) origem, seus recursos grficos, sua popularizao na

    mdia - graas ao fenmeno dos super - heris -, traando uma linha terica para buscar

    visualizar tambm o porqu de haver ainda, tanto na sociedade quanto na academia, um

    preconceito para com esta mdia.

    No segundo capitulo discutimos as questes tericas referentes a identidades,

    representaes e discurso, e de como estas se comportam e se apresentam dentro da obra,

    dialogando com Foucault (2007), Chartier (1990), Pesavento (2003) e Hall (2000).

    Por fim, no terceiro capitulo iremos discutir a questo da formao, construo e

    desconstruo das identidades de judeus e nazistas na HQ a partir das memrias de Vladek

    Spiegelman, representadas pela tica de seu filho Art Spiegelman, e com nosso aporte terico,

    busca trazer a luz da discusso como o autor retrata estes elementos, valendo salientar que, suas

    prprias identidades refletem suas opes e suas escolhas.

    Nas representaes da HQ o lugar do autor fundamental nas elaboraes identitrias dos

    personagens, pois se trata de uma histria narrada pelo seu pai. O autor destacado judeu, filho

    de um sobrevivente do holocausto e jornalista, estando por isso ainda mais afetado pela carga

  • 18

    ele cita tambm a tapearia Bayeux, pea de 70 metros que relata a conquista dos normandos em

    1066 com ilustraes demonstrando os fatos e textos explicativos na base de cada uma delas,

    sendo apontada por Alves (2003) como possvel primeira juno de imagem e texto da histria.

    As imagens passam a ter um papel significativo na Idade Mdia em que eram utilizadas

    para explicar aos populares e aos iletrados informaes variadas, sejam importantes como avisos

    e instrues religiosas, ou mais simples como uma narrativa de cantores ou contadores de

    historias. Neste perodo tambm temos a importncia dos vitrais nas igrejas como a Via Crucis de Cristo.

    Todas essas manifestaes denotam a importncia da imagem na trajetria

    comunicativa do homem, revelando que no h um sculo de imagem, simplesmente porque todos o foram, diferenciando-se apenas na questo do

    alcance de sua difuso; e mostra tambm que o germe da linguagem dos

    quadrinhos j se fazia presente (ALVES, 2003. p. 08).

    Alves (2003) aponta ainda que alguns autores assinalam a primeira histria em

    quadrinhos moderna como VHQGR 0 9LHX[-%RLV, obra escrita e desenhada pelo pedagogo, escritor e ilustrador suo Rudolph Topffer em 1827. Para outros estudiosos do assunto, este

    titulo atrib XtGR DR )UDQFHV *HRUJHV &ULVWRSKH &RORPE FULDGRU GH /D )DPLOH )HQRXLOODUGem 1889. Porem, corroborando com Alves (2003) concordamos que o talo-brasileiro ngelo

    Agostine, em 1867, no jornal O Cabrio ODQoD D VpULH LOXVWUDGD $V &REUDQoDV VHQGR HOHo precursor dos quadrinhos no pas e no mundo. O maior problema encontrado para a definio de

    TXHP p R SDL GRV TXDGULQKRV QR PXQGR VH Gi por que nenhum destes j citados at o momento possui o elemento maior que caracteriza os quadrinhos, o balo. Todas estas obras trazem figuras

    pictricas que buscam mostrar uma realidade ou um tema, mas as mensagens escritas esto no

    rodap das paginas, inseridos quase que como uma legenda para as imagens.

    Para Alves (2003), as referncias das obras acima s servem para mostrar que a obra The Yellow Kid (O Garoto Amarelo, 1896) s considerada como a primeira HQ para demonstrar o poder dos Estados Unidos. The Yellow Kid tem realmente os mritos de ser um dos predecessores no gnero das HQ, porm com qualquer pesquisa mais a fundo podemos perceber

    que ela tem importncia como grande difusora deste gnero literrio no mundo, mas muitos

    outros j caminhavam por estas trincheiras que levariam ao que conhecemos hoje como nona

    arte.

    A importncia deste personagem reside no fato do mesmo ter sido o primeiro com

    publicao regular e de ter aberto o caminho, com seu sucesso, para a consolidao da

  • 22

    conferiram maior GHQVLGDGH DUWtVWLFD VLPXOWDQHDPHQWH JUiILFD H OLWHUiULD DV VXDV REUDV(CORREIA, 2010, p. 01).

    O quadrinho uma criao que parte da experincia do autor, e sobre isso Eisner

    (1990) nos diz:

    $V KLVWRULDV HP TXDGULQKRV FRPXQLFDP XPD OLQJXDJHP TXH VH YDOH GDexperincia visual comum ao criador e ao pblico. Pode-se esperar dos leitores

    modernos uma compreenso fcil da mistura imagem-palavra e da tradicional

    GHFRGLILFDomR GH WH[WR $ KLVWyULD HP TXDGULQKRV SRGH VHU FKDPDGD OHLWXUDnum sentido mais amplo que o comumente aplicado ao termo (EISNER, 1990, p. 07).

    Nada mais certo do que pensar desta forma sobre MAUS. A escolha de Art Spiegelman (2005) em retratar judeus e nazistas como ratos e gatos para acentuar o sentimento de

    perseguio; a escolha da arte em preto e branco, tudo isto tem significao prpria para a

    relao autor/leitor. O jogo de gato e rato, acessvel a um nmero ainda maior de leitores,

    acentua a noo dentro deste jogo de quem persegue e quem perseguido. O preto e branco e o

    formato underground eram uma das grandes inovaes da poca, por que fazia parte de um movimento esquerdista de c RQWUD FXOWXUD (VVDV OLQJXDJHQV SRGHP H VmR WUDGX]LGDV WDQWR SHORfator esttico, quanto pelo fator cronolgico, pois, ambos so datveis e histricos. De acordo

    com Eisner: $ OHLWXUD GD UHYLVWD HP TXDGULQKRV p XP DWR GH SHUFHSomR HVWpWLFD H GH HVIRUoRLQWHOHFWXDO(,61(5 p. 08).

    Ou seja, o quadrinho no passa apenas pelo desenho e texto, mais uma intrnseca e

    complexa combinao de ambos. Eisner, em todas as suas obras, consegue combinar elementos

    grficos, estticos, gramaticais e fonticos, extraindo deles o mximo possvel, assim como

    Spiegelman (2005) faz em MAUS, onde a retrica, a arte e os enquadramentos estticos so fundamentais para a leitura da obra.

    O texto para Eisner (1990) deve ser lido como uma linguagem, ele pode tambm

    complementar o sentido da imagem, como em uma onomatopeia onde o tamanho das letras serve

    SDUD FRPSRU R FHQiULR SRU H[HPSOR XP WLUR %$1* RX XPD SRUWD IHFKDQGR %/$0 Dprpria esttica das letras, o local, as cores ou no podem servir para contar a histria, assim

    FRPR RV EDO}HV WDPEpP LQIOXHQFLDP QD HVWpWLFD H QD HPRomR TXH D FHQD GHVHMD SDVVDU 2 WH[WRtratado graficamente a servio da histria como uma extenso da linguagem. Neste contexto, ele

    fornece um clima emocional, uma ponte narrativa, e a sugest mRGRVRP (EISNER, 1990, p. 10).

  • 25

    diminuio de escala de produo fabrica algo de muito positivo, segundo os autores este

    movimento faz com que os editores e criadores sejam muito mais criativos, dando assim maior

    qualidade ao seu trabalho.

    H quem faa quadrinhos para quem os est vendo pela primeira vez e h quem

    os faa para o publico especializado. Isso faz com que se produzam quadrinhos

    para todas as idades e todas as culturas (dentro e fora delas), com toda a

    largueza que o conceito de cultura permite (Patati e Braga, 2006. p15).

    No perodo de The Yellow Kid, as aventuras em HQs eram acompanhadas pelos leitores nos jornais dirios, este fato se d, de acordo com os autores, por no existir ainda um nvel de

    industrializao e o consumo especifico de revistas, lbuns e livros de HQs. Com a evoluo das

    mdias e da prpria estrutura intelectual das HQs os contedos se adensaram, a narrativa verbal e

    os desenhos amadureceram ao longo do tempo, no havendo duvidas. H, por exemplo nos

    nossos dias, HQs feitas quase que totalmente por meios digitais, dando maior qualidade de

    LPDJHP jV REUDV WRGDYLD PHVPR FRP WRGDV DV LQRYDo}HV H DYDQoRV WHFQROyJLFRV D (5$ (2852 , segundo Patati e Braga (2006), foi aquela concernente as dcadas de 1930 e 1940 e, neste fato, tenho de concordar com os autores, a mais fecunda e criativa era para a Nona Arte.

    A histria das origens dos quadrinhos costumeiramente dividida em trs partes, ou trs

    ERAS, que so: a ERA DE OURO, ERA DE PRATA, e a ERA DE BRONZE. Maus surge dentro da ERA DE BRONZE dos quadrinhos, perodo este caracterizado pelo surgimento de novos heris, novos escritores, e muitas inovaes tcnicas, isso quanto a produo fsica

    (materiais, tiragem, formatos, etc.) bem como em relao s temticas, ou seja, o campo perfeito

    para o tipo de produto ao qual nosso autor pretendia lanar sua obra. A HQ foi produzida

    originalmente em dois fascculos, que foram iniciados na primeira metade da dcada de 1970, e

    concludos em 1991.

    A ERA DE BRONZE dos quadrinhos, segundo Guedes (2008), possui trs caractersticas

    fundamentais em relao s outras duas, que seriam, em primeiro lugar, a chegada da primeira

    gerao de fs ao campo profissional, e temos j ai Spiegelman que antes de produzir era mais

    um f entre milhes. A prxima caracterstica, segundo o autor, o nascimento do mercado

    direto de quadrinhos e a ascenso do movimento underground (de que tratamos a frente), as convenes de quadrinhos e a aproximao do pblico com a produo. E, por fim, o

    aparecimento das GRAPHIC NOVELS8 e das MINIS9 e MAX SRIES3.

    8 O termo GRAPHIC NOVELS, ou novelas grficas, se refere a produo de quadrinhos no final dos anos 70, em

    geral usado para se referir a uma publicao de quadrinhos voltada para m publico maduro, ou ainda aquelas

  • 28

    A ambiguidade da definio en WUH R TXH YHP D VHU XP TXDGULQKR LQIDQWLO RX XPTXDGULQKR GH KXPRU FRQWULEXL GHVGH R LQLFLR GD IRUPDomR GD PtGLD SDUD VXD ULTXH]Dexpressiva. [...] Os personagens Peanuts (e Charles Schulz) no Brasil Charlie Brown, Garfield (de Jim Davis), Calvin & Hobbes (de Bill Waterson) e Mafalda (de Quino) so mesmo s para crianas? Tal ambiguidade se ampliou at mesmo para o domnio das HQs de aventura. O norte-

    americano Capito Cesar [...], de Roy Crane, e o brasileiro Contra Ataque, do mineiro Lor, so exemplos. Trata-VH GH VHULHV GH +4V GH DYHQWXUD FDPXIODGDV HP GHVHQKRV DSDUHQWHPHQWHmuito simples ou humorsticos (PATATI BRAGA, 2006, p.24 ).

    inegvel que a tira foi a responsvel pela ascenso das HQs, tendo inicialmente sido

    levada apenas FRPR KXPRUtVWLFD HOD GHX I{OHJR D GLWD HUD GH RXUR GRV TXDGULQKRV DQWHVmesmo de qualquer era de ouro dos super heris.

    Em todo o perodo inicial dos quadrinhos como produto de massa, tanto nos EUA como

    no Brasil e pelo mundo a fora, as correntes de humor que dominaram as HQs foram infantil e a

    HVFUDFKDGD DGXOWD>@ 6y PDLV WDUGH p TXH R VXVSHQVH VHULD PHQFLRQDGD H PDLV DGLDQWHtornou-se necessrio (PATATI e BRAGA, 2006, p.24).

    Como vimos inicialmente o importante era rir. No importava do que fosse se ria de tudo,

    da situao social, do cotidiano, dos animais, das pessoas, o que importava no inicio das HQs era

    R KXPRU ( HQIDWL]DQGR LVVR 3DWDWL H %UDJD S QRV GL]HP TXH 7RGD D SULPHLUD IDVH GDhistria em quadrinhos na grande imprensa norte-americana se destinou efetivamente ao

    humorismo acerca da famlia e do status VRFLDO (QWmR IRL FRP HVVD DWPRVIHUD H FRP HVVDconjuntura cultural para os quadrinhos que a dcada de 1920 assistiu a fixao das caractersticas

    bsicas desta mdia e ao aumento contnuo do pblico leitor adulto e infantil.

    Maus est enquadrado dentro dos gneros de produo das Histrias em Quadrinhos, como um HQ ps-underground, pois surge j no inicio dos anos 1970 e d continuidade ao gnero que surgiu na segunda metade da dcada de 1960 e, de acordo com Patati e Braga (2006),

    teve como seu porta voz Robert Crumb. Com seu estilo cido e pouco convencional denominado

    de underground, Crumb conquistou um vasto pblico quando comeou a escrever e desenhar a revista Zap comics, isso em 25 de fevereiro de 1968. O contedo das histrias sempre voltado para a contracultura e a dcada de 1960, com o movimento hippie, a poltica americana, e brincavam tambm com os assuntos do cotidiano sexual dos americanos, dando nfase a pouca

    preocupao com a moral e os bons costumes da poca, e mais preocupados sim, com produzir

    historias mais sarcsticas e voltadas aos problemas do cotidiano dos americanos. Suas

  • 30

    no se trata obviamente de uma tentativa de representao fiel ou imparcial das

    vivencias de seu pai, mais de uma narrativa hibrida que agrega dados histricos,

    recordaes paternas, pesquisa etnogrfica e os comentrios do autor, o qual

    est implicado diretamente na narrativa, perfazendo uma multiplicidade de

    enredos (PONES, 2006. p. 03).

    DESVENDANDO MAUS

    Antes de tudo ser necessrio definir o que Maus, ou buscar chegar o mais prximo possvel. De acordo com Curi (2009, p.31):

    A maneira simplista seria dizer apenas que se trata de uma histria em

    quadrinhos sobre o Holocausto e seguir em frente, mas assim, de sada j

    ignoraramos sua complexidade e, fatalmente, cairamos em uma descrio

    superficial de seu contedo e negligente se seu significado.

    Curi (2009), em sua dissertao de mestrado, categoriza Maus como uma obra absolutamente inovadora, no apenas pelo seu carter testemunhal, mas tambm em virtude do

    modelo dos prprios quadrinhos.

    a composio de textos e desenhos feita por Spiegelman enfrenta as mesmas

    limitaes de outras obras de testemunhos diretos ou indiretos ao tentar narrar o

    que no se narra, mas trs elementos bastante interessantes na representao

    artstica da memria, como adequao dos relatos ao espao dos quadros, as

    feies antropomrficas dos personagens e toda a discusso sobre a obra dentro

    dela mesma (CURI, 2009, p. 09).

    Varias obras, fictcias ou no, j retrataram o Shoah (termo utilizado pelo autor para

    definir o Holocausto), e varias criticas e questes foram feitas a este respeito como, por exemplo,

    a explorao de mercado sobre o Shoah. Como seria possvel a arte conviver com a explorao

    comercial de tal fato. Sobre isso Curi (2009) nos diz que essa questo remete ao pensamento de

    Adorno, de que fala Gangnebin:

    D UHVSHLWR GD QHFHVVLGDGH GH SRQGHUDU GXDVH[LJrQFLDVSDUDGR[DLV DDUWH GHSRLVGH $XVFKZLW] $ VDEHU HYLWDU R HVTXHFLPHQWR H R UHFDOTXH UHSHWLomR SHODrememorao), mas no transformar essa lembrana em mais um produto

    cultural. Isso quer dizer que, ainda segundo a analise que a autora dos escritos

    GH $GRUQR VH GHYH OXWDU FRQWD XPD HVWLOL]DomR DUWtVWLFD GH $XVFKZLW] SDUDtorna-lo representvel, assimilvel e digervel (Gangnebin 2006, p. 79 apud

    CURI, 2009, p. 18).

    O que vem nos acometendo nas ltimas dcadas, e para onde Curi (2009) nos chama a

    ateno, a morte das testemunhas dos fatos como a ditadura no Brasil ou da 2 Guerra Mundial.

    Com a morte destes sobreviventes os acontecimentos que nestes eventos se desenrolaram, em

    especial o Shoah s podem ser transmitidos a partir de veculos miditicos como literatura,

  • 33

    Ento, escrever ou no? Concordo com a opinio de Curi (2009) quando ele se coloca sobre o

    tema dizendo:

    (...) ao mesmo tempo em que a Shoah explorado comercialmente, ela

    resgatada para que no se apague o debate e a educao em torno dela. As

    diferentes formas de representao do Shoah direcionadas para a transmisso

    podem renovar a percepo do publico sem necessariamente carem na

    banalizao e na saturao (p. 28).

    Devido a sua riqueza de elementos e das especificidades de ter como enredo uma histria

    pessoal, torna-se difcil, e at certo ponto inconclusivo categorizar a HQ. Maus mais comumente chamada de Graphic Novel, titulo que concede um carter de maior prestigio a algumas obras. Para Curi (2009), e tambm para ns, a nica definio possvel dizer que Maus Maus 2 IDWR p TXH D FRPELQDomR GH WHPD QDUUDWLYD H WpFQLFD ID] GH 0DXV XPDREUD VLQJXODUMaus Maus. Assim, no h um corpo por parte daqueles que estudam a obra sobre sua

    GHILQLomR&XULS .

    Mesmo assim ainda tentam rotular (no que isso seja ruim) Maus. Termos como narrativa grfico-literria, ou Graphic Narrative (CHUTE e DEVOKEM apud CURI, 2009. p. 34), que buscam caracterizar uma narrativa longa em que os quadros e desenhos do um ritmo

    leitura, embora que o texto se mantenha com mais destaque. Curi (2009) aponta um termo

    cunhado por La Capra (1998 apud Curi, idem, p. 34) que literatura pictrica.

    No h mensagem em Maus, assim como Spiegelman no substitui a voz do pai

    por sua prpria. H, lado a lado, olhares e narrativas que no se somam e a

    convocao para que o leitor construa sua prpria verso da trama (PONTES, 2006. p. 08)

    No meio deste turbilho temos o prprio autor, Art Spiegelman que, de acordo com Curi

    (2009), diz achar que o termo comic no cabe a obra, a engessa, ele prefere usar comics que seria mais abrangente. Nossa escolha particular de cham-la por quadrinho, ou mesmo HQ, isto para

    nos apoiarmos em um suporte nominal aceito no campo do estudo da arte referencial e que, a

    nosso ver diz bem o que Maus. Quadrinhos so quadrinhos e se uma obra tem especificidades ainda continua sendo um quadrinho, s que um quadrinho de que possvel falar os aspectos

    inovadores.

    O que Maus faz com os quadrinhos dar-lhe maior visibilidade e elevar os quadrinhos a

    RXWUR SDWDPDU VH KRMH H[LVWHP DXWRUHV FRPo Joe Sacco, Marjane Satrapi, Daniel Clowes, Charles Burns, alisson Bechedel e at uma retomada dos livros de Will Eisner na categoria de

    obras srias p SRU TXH WLYHUDP VHXV FDPLQKRV SDYLPHQWDGRV SRU 6SLHJHOPDQ &XUL S

  • 38

    Outro captulo que nos remeteu a Maus foi o nmero quatro, onde Maccloud (2005) busca mostrar como funcionam as molduras e o tempo nos quadrinhos. Mas, por que este

    captulo nos atraiu, nos seduziu e nos guiou de volta a Maus? Pelo fato de Spiegelman usar todo o tempo deste recurso para contar a histria de seu pai. Durante toda a trama ele faz diversas idas

    e vindas no tempo, mostrando seu presente com seu pai, e relacionando-o com o passado dele em

    Auschwitz. Porm, a funcionalidade do tempo nos quadrinhos muito mais complexa do que

    uma simples continuidade ou linearidade, este conceito nos quadrinhos muito mais abrangente.

    Sobre este conceito de molduras e quadros proposto pelo autor, ele nos diz:

    Nos quadrinhos, cada painel mostra um nico momento no tempo. E entre esses

    momentos congelados entre os quadros --, nossa mente preenche os

    momentos interpostos, criando a iluso de tempo e movimento. Como uma

    linha sendo desenhada entre dois pontos. Certo? Claro que no! O tempo nos

    quadrinhos muito mais complexo que isso! (MACCLOUD, 2005. p. 94).

    Isto acontece por que no se necessrio que o autor faa quadro a quadro todo o

    desenrolar da trama. Ele no precisa desenhar um personagem subindo uma escada degrau por

    degrau para percebermos que ele sobe a escada, um quadro com ele no p da escada e outro com

    ele no topo j suficiente para concluirmos sozinhos todo o restante do percurso. $ DOWHUQkQFLDentre passado e presente de Maus traz um elemento pouco visto na literatura do Shoah, sua herana num prazo mais longo &85, S Spiegelman no precisa fazer inmeros quadros mostrando toda a linha de tempo vivida por se pai at o momento em que ele narra a

    histria para o filho, o fato de o autor retratar o pai velho e logo aps, em outro quadro, o retrat-

    lo jovem imediatamente nos remete a uma passagem de tempo, onde somos transportados da

    guerra para o presente do autor, e vice-versa. Este tipo de linguagem s funciona graas a um

    cone, que, de acordo com Maccloud (2005), , muitas vezes, negligenciado nas HQs, o quadro.

    H DFRUGR FRP R DXWRU R TXDGUR >@ DJH FRPR XP LQGLFDGRU JHUDO GH TXH R WHPSR RX R HVSDoRHVWDVHQGRGLYLGLGR(MACCLOUD, 2005, p.99).

    Em seu captulo cinco, a respeito de linhas e traos, Maccloud (2005, p.118) vai nos

    H[SOLFDU D LPSRUWkQFLD GHVWH HOHPHQWR QRV TXDGULQKRV Mi GL]HQGR HP VXD SULPHLUD IUDVH DVHPRo}HV SRGHP VHUYLVtYHLV 2 DXWRUQRV WUaz uma enorme quantidade de imagens com diversos tipos de traos, mostrando como cada um pode reportar a um sentimento diferente, tudo isso

    dependendo do nosso olhar sobre a arte. De acordo com o autor, a ideia de que uma figura pode

    evocar uma resposta emocional ou sensual no espectador vital nas HQs. O autor nos lembra

    dos movimentos impressionistas acontecidos no final do sculo XIX e inicio do sculo XX, onde

    obras, por exemplo, de Van Gogh, ou de Edvard Munch, podem representar em seus traos toda

  • 41

    CAPITULO 2 IDENTIDADE E REPRESENTAO: CONCEITUANDO

    COM MAUS

    $ FKHJDGD GD 1RYD +LVWyULD &XOWXUDl abriu um leque de possibilidades para as abordagens histricas, os campos de pesquisa e, principalmente, uma multiplicidade de objetos

    de pesquisa, com o auxilio de uma infinidade de novas fontes, que, de acordo com Pesavento

    (2003), at ento no eram visualizadas pela histria. Ou ainda, o nascimento da Nova Histria

    Cultural, fez com que velhas fontes fossem iluminadas por novas perguntas, sendo, de acordo

    com Pesavento (2003, p. 48) DV UHODo}HV SRVVtYHLV HQWUH D UHSUHVHQWDomR QDUUDWLYD H VHXreferente, questes ce QWUDLV SDUD D 1RYD +LVWyULD &XOWXUDO. As mudanas dos paradigmas desembocaram em um novo campo, a Histria Cultural, para que essa mudana ocorresse foram

    necessrias mudanas em alguns campos epistemolgicos para que se pudesse lanar esse novo

    olhar.

    De acordo com Pesavento (2003), o primeiro desses conceitos que traria um novo rumo

    histria o de representao, que teria sido incorporado pelos historiadores a partir dos estudos

    de Marcel Mauss e mile Durkheim, isto no inicio de sculo XX, conceito este de fundamental

    importncia para podermos chegar ao cerne das questes de Maus a que pretendemos elucidar.

    De acordo com Mauss e Durkheim apontados por Pesavento (2003), a representao

    constitui a maneira como os grupos viram e se relacionaram com o mundo, a partir das regras

    criadas para as experincias vividas com as representaes de cada um sobre o mundo.

    As representaes construdas sobre o mundo no s se colocam no lugar deste

    mundo, como fazem com que os homens percebam a realidade e pautem a sua

    existncia. So matrizes geradoras de conduta e praticas sociais, dotadas de

    fora integradora e coesiva, bem como explicativa do real. Indivduos e grupos

    do sentido ao mundo por meio das representaes que constroem sobre a

    realidade (PESAVENTO, 2003, p.39).

    O conceito de representao depender de toda a carga de teoria, de representaes, de

    conceitos, que o individuo possua. Esta bagagem far com que crie o seu prprio conceito de

    representao sobre um determinado objeto, no nosso caso aqui, a HQ. Todo o contato que

    tivemos com a mesma durante a vida, fez com que construssemos para ns um conceito prprio,

    nossa prpria representao sobre a HQ. Dentro da HQ, as representaes antropomrficas de

    Spiegelman (2005) esto o tempo todo debatendo com conceitos histricos, pessoais (como a

    trajetria de seu pai e sua), e no pessoais como a escolha de judeus enquanto elementos a serem

    exterminados pelos nazistas.

  • 43

    mundo 3(6$9(172 S &DEH , ento, ao historiador escolher suas representaes e decidir como ir representar seu objeto. No nosso caso, o objeto a HQ que ser tratada como

    fonte histrica.

    Buscar a representao para interpretar o passado tornar uma narrativa a prpria

    representao deste passado, de acordo com Pesavento (2003, p.43): $ +LVWyULD &XOWXUDO VHtorna, assim, uma representao que resgata representaes, que se incumbe de construir uma

    UHSUHVHQWDomRVREUHRUHSUHVHQWDGR

    Sobre as representaes Chartier (1990, p.17 DLQGD QRV GL] TXH $V UHSUHVHQWDo}HV GRmundo social assim construdas, embora aspirem a universalidade de um diagnstico fundado na

    UD]mR VmR VHPSUH GHWHUPLQDGDV SHORV LQWHUHVVHV GH JUXSR TXH DV IRUPDP Dt SDUD FDGD FDVR pnecessrio relacionar os discursos proferidos com a posio de quem os utiliza. As percepes do

    social no so, de forma alguma, discursos neutros: produzem estratgias e prticas (sociais,

    escolares, polticas) que pretendem impor uma autoridade custa de outros, por elas

    menosprezados, a legitimar um projeto reformador ou justificar, para os prprios indivduos, as

    suas escolhas e condutas.

    Segundo Pesavento (2003), o historiador trabalha o texto, quase que artisticamente,

    usando e escolhendo as palavras, a linguagem, talhando seu discurso em que usa como

    ferramentas os discursos de outros, tentando assim formar uma verdade com o jogo de palavras

    e conceitos, buscando assim convencer seus pares. Em suas palavras: 2 QDUUDGRU p DTXHOH TXHse vale da retrica, que escolhe as palavras as palavras e constri os argumentos, que escolhe a

    linguagem e o tratamento dado ao texto, que fornece uma explicao e busc D FRQYHQFHU(PESAVENTO, 2003. p. 50). O que o historiador faz, ou se prope a fazer, reconstruir o

    passado para satisfazer o acordo de verdade que se estabelece com o seu leitor. Ento, o que

    mais correto e justo afirmar que, o historiador e a histria, estabelecem uma relao com os

    leitores de se construir regimes de verdade, e no certezas absolutas. isto que Spiegelman se

    prope a fazer, e consegue, pois, mais que um quadrinho Maus tambm uma obra que deve ser considerada historiogrfica e que se prope a expor discursos, verdades, e identidades mltiplas,

    de judeus e nazistas, usando como meio de comunicao a Histria em Quadrinhos.

    Ainda de acordo com Pesavento (2003), outra questo que ser tambm reconfigurada e

    revista com a Histria Cultural, o conceito de fico. A autora cita a obra de Koselleck, que

    prope que a histria no pode negar o uso da fico. Mas, de que forma usada essa fico a

    questo da Histria Cultural. O uso desta fico, sendo ela objeto da literatura, controlado,

  • 46

    DXWRUD SDODYUDV H LPDJHQV VmR IRUPDV GH UHpresentao do mund R TXH FRQVWLWXHP R LPDJLQiULR (PESAVENTO, 2003, p.86).

    Em Maus, Spiegelman se utiliza das imagens para aumentar o impacto de sua obra sobre o leitor. Transformando judeus em ratos, e alemes em gatos, a lendria perseguio que j

    tema de desenho animado tambm, reala todo o contexto da perseguio dos nazistas contra os

    judeus na 2 Guerra, criando dentro da histria uma nova representao do fato. As imagens

    dentro da histria em quadrinhos, ao mesmo tempo em que suavizam a tragdia, faz com que a

    tragdia se torne quase que animalesca, instintiva, uma reao de um animal diante de uma

    ameaa. As representaes dentro da histria so inmeras, e complexas, mas todas, carregadas

    de emoo, dor, angustia, coragem e beleza.

    Pesavento (2003 apud DUBY 1984,) nos diz ainda que a imagem possui um peso maior

    quanto ao seu grau de percepo, na relao da mesma com o texto escrito, pois, segundo a

    autora, o texto precisa de mais tempo para ser lido e absorvido pelo espectador, e precisa passar

    por todos os estgios das operaes lgicas da leitura, ao passo que a imagem possui um efeito

    quase que instantneo para quem a v.

    J com a imagem, se poderia dizer que o grau de percepo do conjunto, dada a

    exposio visual do todo, se da de maneira mais rpida, quase imediata, ao

    passo que o texto pressupe o tempo da leitura como todas as suas operaes

    lgicas de compreenso (IDEM. p.86).

    Mas, tambm no se pode esquecer que a imagem para ser lida possui cdigos especiais,

    cones, signos, que rem HWHP D XPD OyJLFD GH VLJQLILFDGRV SDUD XPDpSRFD GDGD >@DV LPDJHQVso dotadas de alto poder mobilizador, como verdadeiros cones prenhes de significado e que

    impulsionam a ao 3(6$9(172 p.87). Nos comentrios da autora:

    No plano das artes, alguns pensadores, como Ernst H. Gombrinch ou Erwin

    Panofsky, ensinaram, na primeira metade do sculo XX, a olhar as imagens

    pictricas de uma outra forma, vendo nelas a vida, os valores, os sentimentos, as

    razoes de um outro tempo (Ibid, p.26).

    A imagem tem um papel simblico, que utilizado pelo historiador para lhe dar acesso a

    um significado e a uma esttica que produz emoes no espectador, porm esse espectador

    tambm um historiador, que possui uma pergunta para essa imagem, que, por este fato vem

    tom-la como uma representao, uma fonte que est se propondo como sendo o lugar do

    passado. preciso ver nessa fonte como ela mostra e se pinta no j acontecido, dito passado, ver

    quais valores essa imagem carrega, seus sentimentos, e o que busca comu QLFDU $VVLP D

  • 49

    Spiegelman utiliza como fonte de pesquisa a memria de seu pai, resgatada em

    incessantes series de entrevistas, onde a utilizao de um gravador, papel e lpis do a tnica da

    discusso, ou seja, a recuperao a partir da oralidade daquele que viveu os acontecimentos, em

    histria traduzida como tcnica da histria oral.

    Spiegelman, aps mostrar como foi a separao de seu pai com a ltima noiva que teve

    antes do casamento dele com sua me, Anja Spiegelman, diz no 3 e 4 quadros que no quer

    que ele coloque este fato na sua histria por no perceber associao com Hitler ou com a guerra,

    H 6SLHJHOPDQ UHWUXFD 0DV SDL p XP yWLPR PDWHULDO SDUD R OLYUR HL[D WXGR PDLVreal, mais KXPDQR4XHURFRQWDUVXDKLVWyULDGRMHLWRTXHDFRQWHFHXSPIELGELMAN, 2005, p. 25). Doce iluso do autor, aprofundamento da histria, ou apenas uma forma de atrair ainda mais o leitor

    para o cerne de sua obra? A nosso ver, todas as trs opes esto corretas. A questo , nunca o

    DXWRU FRQVHJXLUD UHWUDWDU do jeito que aconteceu SRU TXH LVVR p LPSRVVtYHO Rque foi vivido j foi vivido e no ser vivido novamente, apenas rememorado. As lembranas de Vladek que

    guiam os traos de Spiegelman na obra, ou ser o contrario? Vejo a obra como uma troca mtua

    de Vladek com Spiegelman, porm, mesmo em se tratando do resgate de um histria temos ai as

    prprias barreiras histricas. Em Usos e Abusos da Histria Oral (2000) no capitulo 13, nomeado de A Iluso Biogrfica de Pierre Bourdieu ele nos diz (2000, p. 185):

    o relato autobiogrfico se baseia sempre, ou pelo menos em parte, na

    preocupao de dar sentido, de tornar razovel, de extrair uma lgica, ao mesmo

    tempo retrospectiva, uma consistncia e uma Constancia, estabelecendo

    relaes inteligveis, como a do efeito a causa eficiente ou o final, entre os

    estados sucessivos, assim constitudos em etapas de um desenvolvimento

    necessrio.

    Sendo assim colocado por Bourdieu (2000), logo a frente ele alega que talvez isso seja

    uma iluso terica, produzir uma histria de vida, ou tratar a vida como uma histria, ou seja,

    isso se refere s dificuldades de se resgatar a histria a partir de relatos orais ou consider-los

    mais verdicos que os outros documentos. nfase que vem a desconstruir os muitos credos sobre

    a historia oral e que remetem para o campo problemas recorrentes ao trabalho do historiador com

    a fonte, seja ela de que natureza for.

    Na obra Histria Oral: Como fazer, como pensar de Meihy (2007) define-se histria oral e fonte oral da seguinte forma:

    Entrevista em histria oral a manifestao do que se convencional chamar de

    documentao oral, ou seja, suporte material derivado de linguagem verbal

    expressa para esse fim. A documentao apreendida por meio de gravaes

    eletrnicas feitas como o propsito de registro tornar-se fonte oral.(p.14)

  • 52

    derruba as identidades fixas colocadas para os judeus pelos nazistas e sobreviventes do

    holocausto.

    As identidades so construdas dentro do discurso e, por isso, as histricas possuem uma

    origem, porm, no esse ponto no o que destacamos aqui. Nesse trabalho no buscamos

    determinar as origens epistemolgicas das identidades dos judeus ou de nazistas, nossa

    preocupao aqui mostrar como o processo identitrio de fazer e refazer constantemente as

    identidades mostrado de forma crua e pessoal por Spiegelman (2005) em Maus, com pessoas e eventos reais.

    Seguindo o pensamento de Hall (2000), no poderiam existir, assim como os

    conhecemos, nazistas sem judeus, dentro do contexto da 2 guerra claro, pois ai que estas

    identidades se sobressaem em suas diferenas. Durante a perseguio aos judeus as diferenas

    identitrias se acentuam ainda mais, pois so colocadas a luz, esto expostas as comparaes do

    que e no ser um ou e outro. Como Hall (2000) aponta, a identidade tem necessidade daquilo

    que lhe falta. Estas identidades so por ns escolhidas, mas tambm nos so impostas. As

    situaes nos fazem mudar, como que uma correnteza no mar, hora nadamos para um lado,

    porem se a correnteza muda, temos que nadar para o outro lado para podermos sobreviver.

    Situao que se apresenta o tempo todo em Auschwitz, como possvel depreender das

    memrias de Vladek traduzidas por Spiegelman. Hora Vladek um astuto judeu usando a

    inteligncia para subverter o discurso nazista, hora ele apenas mais um, apenas um nmero,

    uma estatstica, um trabalhador obediente e eficiente nos campos. Condio identitria

    sintetizada por Hall (2000, p.112): DVLGHQWLGDGHVVmRSRQWHVGHDSHJRWHPSRUiULRVVmRSRVLo}HVque o sujeito oEULJDGRDDVVXPLU

    Portanto, na perspectiva de Hall (idem) temos que quando vemos algo que no somos

    estabelecemos um confronto com aquilo que somos, pelo efeito inversor da condio identitria.

    1D GLIHUHQoD p TXH FRQVWUXtPRV QRVVDV LGHQWLGDGHV R UDWR VDEH TXH QmR p R JDWRs de olhar para ele, e vice-versa, porm, este conceito simples de identificar a identidade com um olhar se

    aplica a vida real? Em parte, sim. Sabemos quem so os homens e as mulheres, negros, e

    brancos, orientais e ocidentais, mas podemos realmente dizer que esses indivduos possuem, ou

    assumem tais identidades apenas com um simples olhar? No.

    Nosso olhar pode sim selecionar, categorizar, selecionar e at separar grupos de pessoas

    ou simples indivduos com um simples olhar, mas este olhar apenas indicativo de uma

    identificao pelo que se apresenta externamente aos indivduos ou coisas. Um homem nascido

  • 54

    Tadeu (2009, p.09) nos chama a ateno dizendo: 2 VXMHLWR YD]D SRU WRGRV RV ODGRV Na continuao Tomaz Tadeu acrescenta:

    Os estudos culturais sobre raa e etnia denunciam, de forma insistente, as

    relaes esprias entre, de um lado, o sujeito que privilegiado no discurso e

    nas instituies dominantes e, de outro, o homem branco de ascendncia

    europeia.(...) A analise ps-colonialista, por sua vez, flagra o sujeito racional e

    iluminado em suspeitas posies que denunciam as complexas tramas entre

    desejo, poder, aa, gnero e sexualidade em que ele se v, inevitvel e

    inequivocamente, evoludo (SILVA, 2009, p. 10).

    De acordo com esta afirmao no existiria sujeito ou subjetividade fora da histria e da

    OLQJXDJHP IRUDGDFXOWXUDHGDVUHODo}HVGHSRGHU 6REUDDOJXPDFRLVD" SILVA, 2009, p. 10). Para Tomaz Tadeu uma ironia o fato de que os processos que esto transformando, de forma

    UDGLFDORFRUSRTXHQRVREULJDDUHSHQVDUDDOPDKXPDQD

    Uma das mais importantes questes de nosso tempo, de acordo com Tomaz Tadeu (2009)

    : Onde termina o humano e onde termina a mquina? Ou esta ambiguidade no seria inversa?

    Onde comea a mquina e onde termina o homem? Para o autor, uma das caractersticas mais

    notveis desta era, chamada por ele de ps-moderna, o promscuo acoplamento

    desavergonhada conjuno entre o humano e a mquina. Estes ciborgues citados pelo autor

    nasceriam de um lado da mecanizao e eletrificao do humano, de outro a humanizao e a

    subjetivao da maquina. E que maquina essa? Que ciborgue esse de que Tomaz Tadeu

    (2009) nos fala? Para o autor esta mquina o corpo humano quando tratado como se fosse uma

    mquina de alta performance, sempre tendo de ser melhorada, aperfeioada e, para tal,

    constantemente construda e reconstruda em busca de resultados cada vez melhores. Nas

    palavras do aXWRU (VWDPRV FRQVWUXLQGR Qys prprios exatamente da mesma forma que FRQVWUXtPRVFLUFXLWRVLQWHJUDGRVRXVLVWHPDVSROtWLFRVIdem, 2009, p. 24).

    Nem Vladek nem Art esto por inteiro na obra, ambos esto se apresentando,ou sendo

    apresentados em partes, partes estas escolhidas por Art para serem desenhadas na obra, e por

    outras escolhidas por seu pai, que, assim como todos ns, lembra-se interessadamente do que

    aconteceu com ele. Mas mesmo sendo as escolhas do que dizer, o que fazer, o que retratar, onde

    retratar e como serem feitas por uma segunda pessoa no as deixam menos confiveis ou

    importantes, por que elas podem ser to falhas ou inverossmeis como se fossem feitas pelo

    SURSULHWiULR GDs memrias, que as subverte da maneira que achar melhor, se assim quiser, criando espaos e lacunas que, talvez no existam. Estas lacunas, estes vazios so e sero

    constantes, pois fazem parte do nosso prprio processo de fazer e refazer continuo, assim como

  • 57

    As margens de um livro jamais so ntidas nem rigorosamente determinadas:

    alem do titulo, das primeiras linhas e do ponto final, alem de sua configurao

    interna da forma que lhe d autonomia, ele est preso em um sistema de

    remisses a outros livros, outros textos, outras frases: n em uma rede. [...] por

    mais que o livro se apresente como um objeto que se tem na mo: por mais que

    ela se reduza ao pequeno paraleleppedo que o encerra: sua unidade varivel e

    relativa. Assim que a questionarmos, ela perde sua evidencia: no se indica a si

    mesmo, s se constri a partir de um campo complexo de discursos

    (FOUCAULT, 2007. p. 26).

    De acordo com seu pai, o primeiro contato que eles tiveram com o nazismo foi durante

    uma viajem que ele fazia para a Tchecoslovquia para poder internar sua esposa que se

    encontrava com depresso ps-parto. Nessa viagem, o seu trem passou por uma cidadezinha que,

    em seu centro tremulava uma bandeira nazista com sua sustica viva e assustadora no centro. De

    acordo com seu pai, todos os judeus do trem ficaram apavorados com este fato, que foi o

    suficiente para comearem uma roda de relatos entre os passageiros judeus do trem, onde cada

    um sabia de um fato envolvendo soldados nazistas, judeus, e morte.

    Lembro-me que quando nos quase passar por cidadezinha. Todo mundo, toda

    judeu do trem ficou muito agitado e assustado. Era o comeo de 1938, antes da

    guerra. Bem no meio da cidade tinha bandeira nazista. Foi primeira vez que vi,

    com meus prprios olhos a sustica (SPIEGELMAN, 2005. p.34).

    Apesar de ningum ter sido espancado, de ningum ter visto um soldado apontar uma

    arma para ningum, todos se assustaram. Por qu? Pelo discurso nazista que j estava implcito

    naquele smbolo, naquela bandeira no centro da cidade. No precisava de mais nada, o signo da

    sustica j remetia a todos a noo do perigo que estava por vir. O discurso no foi representado

    ai pela fala, mas pelo prprio smbolo que enunciava uma verdade para todos aqueles que no

    fossem nazistas, que era: CUIDADO. O enunciado da verdade nazista passou, a partir daquele

    momento, a fazer parte do cotidiano daqueles judeus do trem, e em especial ali seu pai. A origem

    deste enunciado nazista para seu pai teve inicio ali, com aquela viso que aterrorizou a ele, e aos

    demais. Naquele momento eles souberam que ascendia ali um discurso de verdade que, tinha por

    prioridade, fazer da verdade judia uma inverdade, e assim excluir da sociedade todos os

    discursos dos judeus, para produzir uma nova verdade, a verdade nazista. Assim, temos que os

    discursos se apresentam enquanto cdigos de verdade em meio a uma situao, um momento

    histrico, conforme coloca Foucault:

    A anlise do campo discursivo orientada de forma inteiramente diferente:

    trata-se de compreender o enunciado na estreiteza e singularidade de sua

    situao; de determinar as condies de sua existncia, de fixar seus limites da

    forma mais justa, de estabelecer suas correlaes com os outros enunciados a

  • 60

    O enunciado um ttulo, um chamado, um anunciamento de um assunto de que vamos

    tratar. O enunciado a maneira como chamamos, como tratamos o assunto. Ele a

    materializao do discurso sobre o objeto, a partir da YHUGDGH SURSRVWD SHOR GLVFXUVR Qys HQXQFLDPRVRWHPDRREMHWR6HPRHQXQFLDGRQmRKDYHULDGLVFXUVRHYLFH-versa.

    Na obra de Foucault (1970), A Ordem do discurso, o autor tenta nos mostrar como o discurso nos leva pela sua correnteza, como ns no o criamos do nada. No temos nossos

    discursos como sendo algo nosso, mas sim, somos guiados por ele, embarcamos na correnteza

    desses ditos e somos levados por eles, ns no os guiamos, mas sim somos guiados. E j no

    LQtFLR GHVWD REUD TXH R DXWRU QRV FKDPD D DWHQomR SDUD HVWH IDWR HP VL $R LQYpV GH WRPDU Dpalavra, gostaria de ser envolvido por ela e levado be P DOpP GH WRGR FRPHoR SRVVtYHO (FOUCAULT, 1970, p. 7).

    O autor aponta o quo seria bom o discurso deixar-se guiar por uma verdade, onde o

    discurso se deixa levar, e onde as prprias verdades do discurso surgiriam sozinhas, uma a uma.

    E, sendo assim, ele se deixaria levar, suavemente por essa correnteza como um destroo feliz

    sendo levado pela fora da gua. Mas lembremos que ns criamos discursos tambm.

    Foucault (1970) nos chama a ateno para o fato do discurso no possuir poder em si

    prprio, ele no se constituir como verdade e poder, mas sim ns constitumos o discurso como

    sendo assim, a fora do discurso , se no, dada por ns, e somente por ns. As leis e as

    instituies esto ai para imp-lo a ns, mas cabe a ns aceitarmos a verdade do discurso ou no.

    E a instituio responde: Voc no tem por que temer comear: estamos todos

    ai para lhe mostrar que o discurso esta na ordem das leis: que a muito tempo se

    cuida de sua apario: que lhe foi preparado um lugar que o honra mas o

    desarma: e que, se lhe ocorre ter algum poder de ns, s de ns que ele advm

    (FOUCAULT, 1970, p. 7).

    Ou seja, o discurso no existe por si s, somos ns que lhe empregamos significado, e

    significncias. Uma ordem que no obedecida, no passa apenas de palavras vazias, mas

    quando obedecida, executada, passa a ter um significado, uma verdade se instaura sobre o

    discurso que o torna verdade em seu raio de alcance. Em Maus temos, por exemplo, o discurso dos nazistas que pregam a supremacia racial, a raa ariana seria superior as demais, e os Judeus,

    Cigan RV *D\V H GLYHUVDV RXWUDV PLQRULDV VHULDP LQIHULRUHV H HVVH GLVFXUVR GH VXSHULRULGDGHtorna-se verdade para os alemes a partir do momento que todos, inclusive as minorias se

  • 63

    proposta por Foucault (1970), entre verdadeiro e falso no nos ser equivocada, ou mesmo falha,

    pois se tratar de uma conjectura sobre o discurso, no a verdade sobre o mesmo, porm, se ao

    mesmo tempo nos colocarmos em outro lugar, outra escala, lugar este que leve em considerao

    a descoberta destas verdades histricas que se perpassou durante os anos, esse tipo de separao

    feito, de acordo com o autor, por nossa vontade de saber, ento, esta nossa prpria busca pelo

    FRQKHFHU R IDWR ID] FRP TXH FULHPRV QRVVR SUySULR VLVWHPD GH H[FOXVmR TXDQGR Qs escolhemos qual posio tomar em relao ao discurso que nos est colocado, e como deveremos

    abord-lo. Ou seja, o discurso o que inclui e exclui, seja o nosso, ou o que nos imposto pela

    fora.

    Certamente, se nos situarmos no nvel de uma proposio, no interior de um

    discurso, a separao entre o verdadeiro e o falso no nem arbitrria, nem

    modificvel, nem institucional, nem violenta. Mas se nos situarmos em outra

    escala, se levantamos a questo de se saber qual foi, qual constantemente,

    atravs de nossos discursos, essa vontade de verdade que atravessou tantos

    sculos de nossa histria, ou qual , em sua forma muito geral, o tipo de

    separao que rege nossa vontade de saber, ento talvez algo como um sistema

    de excluso (sistema histrico, institucionalmente constrangedor) que vemos

    desenhar (FOUCAULT, 1970:14).

    Eis, ento, que temos mais tarde, segundo o autor, uma mudana na constante do

    GLVFXUVR DJRUD DYHUGDGHQmR HVWDYDPDLVQRTXHera o discurso, ou no mesmo no que ele fazia, mas residia no que ele dizia )28&$8/7 e D SDUWLUGDt TXH GH DFRUG o com o autor, h uma virada no conceito de verdade e enunciado, onde a verdade se desloca de seu ritual de

    enunciado para se tornar o prprio enunciado.

    A vontade de verdade, assim como os outros sistemas de excluso, apoia-se sobre um

    suporte institucional, e tambm por toda uma conjuntura de prticas sociais, como por exemplo,

    D SHGDJRJLD p FODUR FRPR R VLVWHPD GH OLYURV GD HGLomR GDV ELEOLRWHFDV FRPR DV VRFLHGDGHVdos sbios de RXWURUD RV ODERUDWyULRV KRMH )28&$8/7 S 3RUpm, como o autor mesmo cita, essa legitimao da vontade de verdade guiada, com muito mais fora sem duvida,

    pela maneira que o prprio saber aplicado dentro de uma sociedade, como ele estimado,

    disseminado, e compartilhado pela prpria sociedade. Em suma, essa vontade de verdade que, se

    apoia em um sustentculo e uma distribuio institucional, e tende a exercer sobre os demais

    discursos uma espcie de violncia, como sendo um poder de coero. Os diversos sistemas de

    excluso de discurso que existem em nossa sociedade, fazem com que o prprio sentido de lei

    no possa ser mais aprovado, essa aprovao s se daria a partir de outro discurso de verdade.

    FRPR VH D SUySULD SDODYUD GH OHL QmR SXGHVVH PDLV VHU DXWRUL]DGD HP QRVVD VRFLHGDGH Veno por um discurso de verdade )28&$8/7 3DUD R DXWRU GRV WUrV VLVWHPDV GH

  • 65

    Foucault (1970) nos mostra ainda a existncia de mais um procedimento de controle dos

    discursos. Segundo ele no se trataria apenas de dominar os poderes que eles tm, mas sim de

    definir as classes de seu funcionamento, que nada mais seria do que fixar aos seus indivduos que

    iro utilizar destes discursos uma determinada quantidade de preceitos, de normas a serem

    seguidas, e assim limitam o acesso a estes discursos.

    Desta vez, no se trata de dominar os poderes que eles tm, nem de conjurar os

    acasos de sua apario: trata-se de determinar as condies de seu

    funcionamento, de impor aos indivduos que os pronunciam certo numero de

    regras e assim de no permitir que tudo mundo tenha acesso a eles.

    (FOUCAULT, 1970, p.36).

    Neste caso, ningum entrar na ordem do discurso se no satisfizer certas exigncias, ou

    se no for de inicio qualificado para isso. Por isso que temos de sempre qualificar nosso discurso

    dentro da academia, precisamos nos enquadrar na ordem do discurso que est vigente na

    Instituio de que fazemos parte, ou nos adequar ao discurso de outra, caso pretendamos l

    ingressar. Para podermos legitimar nosso projeto precisaremos medir nossas palavras, escolher

    nossas frases. Teremos que selecionar nossos prprios conceitos, para que em nosso trabalho s

    apaream aqueles que esto enquadrados dentro das regras da comunidade acadmica se

    quisermos que assim sejamos aceitos na mesma.

    O autor tambm nos cham D DWHQomR SDUD R TXH HOH FKDPD GH VRFLHGDGHV GH GLVFXUVRcuja funo a de conservar ou produzir discursos, mas para faz-los circular em um espao

    fechado, distribu-los somente segundo regras restritas, sem que seus detentores sejam

    despossudos por essa distribuio )28&$8/7S 39).

    O discurso nos causa medo por que atravs dele que podemos questionar o lugar de

    verdade que as coisas ocupam, question-los, refut-los. atravs dos discursos que podemos

    questionar os lugares, que podemos perceber a trama de construo dos sujeitos histricos, e

    tambm dos objetos histricos, suas verdades, ditos, e no ditos, para esta analise s os discursos

    podem nos oferecer as respostas que nossas perguntas necessitam. Mas, por trs deste mesmo

    discurso encontramos o jogo da subjetividade, ou seja, o que est por trs destes discursos, isto

    implica em buscarmos conhecer nesta subjetividade do discurso o que est tentando se apresentar

    FRPR VHQGR D YHUGDGH SRU WUiV GH WXGR ,VWR Vy VHUi SRVVtYHO DSyV GHnsa analise e observao sobre o discurso apresentado. O autor classifica este principio por inverso.

    O discurso tambm possui, segundo o autor, um princpio de descontinuidade, que em GHWHUPLQDGRV PRPHQWR VH HQFRQWUD PDV TXH WDPEpP VH GHVFRQKHFHP 2V Giscursos devem ser

  • 68

    nossos vizinhos, ou mesmo de alguns familiares, e dizemos que isto ocorre por eles no serem

    SUy[LPRVGDtTXHVWLRQDPRVTXmRSUy[LPRQRVIRL$\UWRQ6HQQD"7LUDGHQWHV"

    Nossa memria age tanto por estmulos nossos (internos), quanto por estmulos externos

    do ambiente que nos cerca, porm, a reao quanto a estes estmulos nossa e varivel. Na obra

    de Ecla Bosi (1994) Memria e Sociedade: Lembranas dos velhos, ela cita C. Dikens (DIKENS,1957 apud idem. p. 14) e nos GL] 1D UHDOLGDGH QmR Ki SHUFHSomR TXH QmR HVWHMDLPSUHJQDGD GH OHPEUDQoDV &RP HVVD IUDVH DGHQVD-se e enriquece-se o que at ento parecia bastante simples: a percepo como o mero resultado de uma interao de ambiente com o

    VLVWHPDQHUYRVR %26, idem, p. 44)

    Cada individuo reage a um odor, uma msica, uma voz, de maneira diferente e faz

    destes elementos cones para preservar uma memria. Em Auschwitz cada pessoa passou a

    guardar em sua memria, seus arquivos de maneiras muito particulares, as ligando ao que seus

    instintos e impulsos as levaram. O que afetou Vladek de uma forma pode no ter afetado seus

    primos da mesma forma, ou mesmo no ter afetado Art da forma que seu pai imagina ter lhe

    marcado.

    A memria particular e selecionada pelo individuo de acordo com seus preceitos,

    fazendo cada arquivo, cada fragmento, um fragmento diferente do mesmo quebra cabea,

    fazendo cada individuo relatar o fato no como, muitas vezes, os documentos oficiais os trazem,

    PDV FRPR HX PH OHPEUR H HVVH OHPEUDU esse testemunho passa pela edio da memria, que seleciona, que edita, que emerge e submerge eventos, tornando, certas vezes detalhes em

    PRQWDQKDV H PRQWDQKDV HP GHWDOKHV LQVLJQLILFDQWHV $ PHPyULD GH XP LQGLYLGXR GHSHQGH GRseu relacionamento com a famlia, com a classe social, com a escola, com a igreja, com a

    profisso; enfim, com os grupos de convvio e os de refer QFLD SHFXOLDUHV D HVVH LQGLYLGXR(BOSI, 1994. p. 54)

    O testemunho nos d o contedo das coisas do passado, do j vivido. Ricoeur (2010)

    nos chama a ateno para que o testemunho apresenta uma cadeia de operaes. Para ele uma

    delas, e que para nos de mais importncia aqui a narrativa da cena que, consiste na afirmao

    da realidade factual do acontecimento relatado declarado pela experincia do autor e pressupe

    confiabilidade, ou seja, em nosso trabalho usaremos o testemunho de Vladek como ponto de

    discusso a despeito das criaes de identidades. Iremos, assim como o pai de Art compartilhar

    aqui nossas experincias sobre as experincias j vividas do autor.

  • 71

    A memria permite a relao do corpo presente com o passado e, ao mesmo

    WHPSR LQWHUIHUH QR SURFHVVR DWXDO GDV UHSUHVHQWDo}HV 3HOD PHPyULD, o passado no se vem a tona das guas presentes, misturando-se com as

    SHUFHSo}HV LPHGLDWDV FRPR WDPEpP HPSXUUD GHVORFD HVWD XOWLPDV RFXSDQGRespao todo da conscincia. A memria aparece como subjetiva ao mesmo

    tempo profunda e ativa, latente e penetrante, oculta e invasora. (BOSI, 1994. p.

    47)

    Na histria podemos citar estas passagens nas quais Vladek mostrar que as memrias do

    seu passado ainda assolam seu presente de maneira muito viva e forte.

    Imagem 1

    imagem 2

  • 74

    povo judeu, atravs de outras linguagens para alm do cinema e da literatura. Maus uma busca

    para reconstruir e revisitar lugares do passado, visando legitimar um lugar de memria e

    identidade dos judeus e, em especial as memrias e identidades de Art e Vladek, mas a forma

    como esses relatos chegaram at ns, como HQ, uma forma no to usual, as tornaram passiveis

    de mltiplas interpretaes, at certas vezes, como j citado antes, sendo interpretadas como

    sendo uma fico. Essa viso sobre a obra se d pela caracterizao dos personagens de gatos e

    ratos na histria.

    Na obra so mostradas vrias nacionalidades representadas atravs da figuras de

    animais: os judeus so ratos (Maus significa rato no idioma alemo, por isto o nome do livro), assim como os alemes so gatos, os poloneses porcos, os

    americanos ces, os franceses sapos e os ciganos como borboletas. (GALDINO,

    2009. P. 46)

    Como j mostrado anteriormente maus um hibrido, uma interseco entre gneros, a

    literatura e a HQ beirando as raias da fico pelos desenhos dos personagens, mas nem por isso

    menos importante. Ela permeia uma frgil linha entre fico e realidade, e que a nosso ver, s

    tem a contribuir. Neste ponto Galdino (2009) concorda conosco quando nos diz que

    A fronteira tnue entre fico e realidade torna complexa qualquer apreenso

    simples da histria e do passado, tanto individual quanto coletivo, neste sentido,

    a HQ se mostra como um meio termo que no renega sua esttica na arte mas

    nem por isso deixa de ser um veiculo para a construo da memria e da

    identidade do povo judeu. (p.7)

    Esta peculiaridade, este estilo diferente de apresentar sua histria com o

    antropomorfismo das figuras do rato e do gato, o preto e o branco, seu estilo de narrativa servem,

    de onde vemos, muito mais do que para mostrar escolhas artsticas, mas sim para mostrar,

    atravs da arte o que se sentia, mostrar como dura e IULD HUD D YLGD SDUD HOHV 6H VXD DUWH p FUXDdenotando muitas vezes um humor mrbido e negro, talvez seja por que o mundo o qual ele o

    UHSUHVHQWDRp(Galdino, 2009. p. 11).

    Sobre este carter controverso entre testemunho, fico e realidade encontramos

    Vasconcelos (2008) apontando que:

    A partir dessas consideraes poderamos ser tentados a estabelecer uma

    dicotomia, na qual de um lado se encontrariam as narrativas de memrias do

    Holocausto, fascinantes exatamente por que representam as experincias do

    passado de modo intenso, enquanto de outro lado restaria a Histria,

    desinteressante e enfadonha por que dela se esvaziou o contedo existencial. (p.

    07).

  • 76

    Art busca no resgate da histria vivida de seu pai para que no nos esqueamos do que

    aconteceu, para que o Shoah no fique apenas guardado na memria de quem viveu, mais sim,

    torne-se uma memria constante, uma lembrana do que aconteceu e para que no acontea

    mais. Trazer a tona tudo isso para que essas memrias de guerra, esses testemunhos do Shoah

    tomem forma e no sejam colocados futuramente como contos de sobreviventes, como fbulas

    de herosmo, mas como um retrato da crueldade do homem para com seu semelhante. Sobre isso

    Bosi QRV GL] 6H SRU DFDVR HVTXHFHPRV QmR EDVWD TXH RV RXWURV WHVWHPXQKHP R TXHvivemos. preciso mais: preciso estar sempre confrontando, comunicando recebendo

    LPSUHVV}HVSDUDTXHQRVVDVOHPEUDQoDVJDQKHPFRQVLVWrQFLDS

  • 80

    Imagem 6

    imagem 7

    imagem 8

  • 81

    imagem 9

    Em sequncia temos no quadro da imagem 5 um baile onde vemos Vladek e Anja

    danando em um salo rodeados de pessoas de diferentes nacionalidades. Temos atrs do casal

    de ratos uma dupla de porcos, frente da dupla um porco que toma sua bebida, a frente deste

    porco temos os contornos de dois coelhos, que no tm referncia de nacionalidade na histria, e

    na frente dos coelhos, em primeiro plano junto com Vladek e Anja, vemos um gato no canto da

    pgina sentado junto com um sapo, mostrando que antes da guerra, perodo que deste quadro da

    histria todos se relacionavam aparentemente bem, ou ao menos podiam frequentar os mesmos

    ambientes.

    No quadro 6 temos vrios porcos, que representam os poloneses no judeus. No quadro

    7 temos a apresentao de um estudo de imagens de Art para a obra, nele ele busca uma forma

    de desenhar sua noiva, Franoise, e a retrata como coelha, alce, sapa, cachorra, e rata, ele nos

    mostra esta busca por uma representao para ela mesmo j a apresentando, desde a primeira

    vez, como uma rata, escolha essa por que ela j havia se convertido para o judasmo.

    Na imagem 8 temos o gato, o soldado nazista e alemo, na figura do lado, nmero 9

    temos um cachorro que representa os estadunidenses que chegaram a Alemanha no fim da

    guerra, e logo abaixo, na imagem 10 somos apresentados a uma cigana, mstica, e que

    representada na figura de uma mariposa. Por fim temos a figura 11, um sapo, que so

    representados como franceses na obra. Essas caractersticas visuais atribudas aos personagens

    podem parecer estranhas, a principio, porm aps algumas paginas j absorvemos a proposta do

    autor que tornar mais visvel no to visveis assim. Sobre esses aspectos temos uma passagem

    onde Galdino (2009) cita Geertz (1989).

  • 82

    Esta escolha que a principio causa certo estranhamento por conferir aos povos

    caractersticas animalescas, foi alvo de inmeras criticas na poca de sua

    publicao que afirmavam que o autor queria minimizar os horrores e a tragdia

    do Holocausto h um mero jogo de gato contra rato. Para alm desta afirmao

    simplista, devemos buscar o que est HVFRQGLGR QDV HQWUHOLQKDV SRLV D PDLRUparte que precisamos para compreender um acontecimento particular, um ritual,

    um costume, uma idia, ou o que quer que seja esta insinuado como informao

    GH IXQGR DQWHV GD FRLVD HP VL PHVPD VHU H[DPLQDGD GLUHWDPHQWH(GERTZ, 1989. p.19 apud GALDINO, 2009, p. 47)

    Silva (1989) afirma que os elementos grficos que expressam a realidade social do

    individuo, apresentados nas cenas, devem ser tambm minuciosamente examinados, pois podem

    indicar desde o status social a uma mensagem ideolgica do autor. Isso pode se apresentar numa

    TV como smbolo de modernidade, ou numa cor, o vermelho, como smbolo poltico, no caso de

    Maus temos a dualidade rato/gato que busca representar a dualidade de presa/caador, por

    exemplo. O fato do autor representar os estadunidenses como cachorros, ditos inimigos naturais

    dos gatos, na nossa opinio, serve para ressaltar sua metfora sobre a relao de animais

    enquanto personalidade dos seres humanos.

    Para podermos entender essa perspectiva de outro ngulo usaremos, de maneira rpida e

    explicativa outro quadrinho que bebeu na mesma fonte antropomrfica que Maus, Blacksad

    Criado pelos espanhis Juan Daz Canales (texto) e Juanjo Guarnido (arte), ambos com

    H[SHULrQFLD DQWHULRU HP DQLPDomR SDUD D LVQH\ IDPRVD SHORV VHXV DQLPDLV %ODFNVDGarrancou elogios de artistas como Joe Kubert, grande nome da Marvel, Tim Sale que j trabalhou

    nas gigantes Marvel e DC, Stan Lee criador dos maiores heris dos quadrinhos como Homem-

    Aranha e Jim Steranko, figura tremenda nos quadrinhos mundiais.

    A histria se passa em um mundo imaginrio onde as pessoas tm suas personalidades

    diretamente ligadas as suas aparncias animalescas, assim como em Maus. Temos um gato

    detetive chamado Blacksad que investiga crimes neste mundo paralelo ao nosso. Nessa HQ

    pessoas de hbitos higinicos desleixados so porcos, lutadores de boxe so gorilas gigantes,

    assassinos sorrateiros so cobras prontas pra dar o bote, como vemos nas figuras abaixo.

  • 85

    Graas aos quadrinhos, e seu fcil acesso, esse tipo de associao homem/animal usados

    juntos para dar nfase a uma caracterstica torna-se um territrio frtil para ns historiadores nos

    debruarmos em busca de respostas, pois eles tornam visveis traos no to visveis assim, no a

    olho nu, afinal, as identidades no esto escritas no nosso rosto, no so to claras quanto ser um

    sapo, um cachorro, um gato ou um rato. As capacidades dos personagens afloram nos traos

    escolhidos pelo artista, Silva (1989) diz:

    Como j foi dito e salientado, esse desenhista (J. Carlos) dotou Z Povo de

    traos brancos (nariz afilado, lbios finos, cabelos lisos), marcante magreza e

    orelhas avantajadas. Alem de unio entre extrema pobreza e condio racial,

    vale salientar que esses desenhos trabalharam com novos significados do espao

    de ambiguidade sustentado pelo personagem, atribuindo-lhe maior capacidade

    para se misturar com o publico leitor ou ele se separar de forma sempre visvel

    racial, social e poltica. (p. 23)

    O trecho a cima relevante, pois mostra que a escolha pelo desenho fala tambm, ela

    nos mostra muito mais do que o que est colocado na superfcie do desenho, devemos mergulhar,

    escavar, procurar o que no est to visvel assim e trazer a tona. Buscaremos a frente mostrar

    como as identificaes construdas sobre Maus nos revelam discursos para alem das imagens da

    HQ, processo este j experimentado por Silva (1989) com o personagem Z Povo.

    A identificao que a definio racial plural trouxe para a identidade do

    personagem e essas extenses de seu padro social deram lugar a um malevel

    processo de identificao/diferenciao pelos leitores, onde degradaes ou

    elogios podiam ser remetidos a um outro social ou reivindicados para uma auto

    definio. (p. 25).

    IDENTIDADES (RE) FEITAS NO JOGO DA SOBREVIVNCIA

    No capitulo dois ns nos referimos a identidade a partir da obra de Hall (2000), obra

    essa que nos pergunta quem precisaria de identidades? Afirmamos que a identidade do sujeito

    criada a partir de seus discursos, e percebemos com as imagens da HQ como as identidades do

    sujeito so criadas, construdas, fabricadas nas prticas discursivas. E no s nestas prticas

    como meios tericos, mas sim prticos, vividos e vivenciados, principalmente quando a

    sobrevivncia do individuo est em jogo.

    A percepo deste fato o combustvel deste trabalho. Vimos que as construes

    identitrias em Maus possuem caractersticas nicas aqui, pelo fato de se tratar de uma obra em

    quadrinhos e ter pessoas com cabeas de animais que, por isso torna-se extremamente diferente

  • 90

    Os judeus tambm foram traados em Maus com identidades fixas, to fixas que at

    mesmo a noiva de Art, que francesa, e pela lgica de sua metfora deveria ser uma sapa, torna-

    se uma rata na histria pelo fato de ter se convertido ao judasmo, como vemos na pgina abaixo:

    Imagem 19

    Na pagina acima, a numero onze do segundo livro de Maus, Art faz esboos de como

    poder vir a desenhar sua noiva Franoise na histria, como coelha, sapa, alce, cachorra, mas

    mesmo antes de nos apresentar esta discusso ele nos j havia apresentado ela como uma rata,

    como vemos abaixo:

    Imagem 20

  • 93

    alemo para ajudar a esconder suas verdadeiras identidades, mas mesmo assim o temor de ser

    pego era constante.

    Imagem 25

    Vladek passava a fingir no ser judeu, buscando mostrar um comportamento que fosse

    condizente com a identidade que deseja que seja vista, e a mscara de porco passa a ser parte de

    seu personagem em Maus. No quadro abaixo vemos um destes momentos onde Vladek entra em

    um vago de oficiais alemes e senta-se no banco da frente.

  • 94

    Imagem 26

    Maus nos mostra o exemplo de como assumir outra identidade, de como negar a sua

    prpria identidade para que se possa sobreviver, e de como esta identidade esta ligada a

    elementos prprios de indivduos ou grupos com uma coisa comum, a identidade no fixa, ela

    se transforma e se reconfigura, mas elementos comuns, alguns at entendidos como fixos como,

    grias, roupas, e cores podem sempre se apresentar neste indivduos, fazendo com que, certas

    vezes configuremos estes elementos como sendo fixos de uma determinada identidade. Por

    exemplo, o ato de fazer a saudao a Hitler, isto era especifico dos nazistas, ento, o ao de

    OHYDQWDU D PmR H GL]HU +HLO +LWOHU DJUHJDYD YDORUHV DR LQGLYLGXR H HVVHV YDORUHV HUDP OLGRV Hinterpretados pelos indivduos a sua volta o fazendo ser visto com uma identidade, que, como

    vemos abaixo, no era a sua.

  • 95

    Imagem 27

    Devido ao forte clima de perseguio contra os judeus, simplesmente fingir no ser um

    no era to fcil ou cmodo, fazer uma saudao ou falar alemo, as vezes no se consegue

  • 96

    esconder inteiramente quem somos, um gesto, um olhar, um modo de falar, de caminhar, a

    maneira como se arruma um cabelo, qualquer elemento pode denunciar uma identidade que no

    queiramos que seja vista naquele momento, por que a consideramos fraca para a ocasio, ou por

    que ela no adequada, ou no caso se Vladek e Anja, em certos momentos no havia como no

    deixar transparecer certos aspectos de sua identidade de judeus, algo podia escapar, e Art mostra

    como este evento acometia seus pais na histria, desenhando um rabo de rato na sua me

    enquanto ela foge com seu pai.

    Imagem 28

    O ato de Anja poder ser vista como Judia colocado no fato de ela estar desenhado com

    uma cauda de rato deixada a mostra representando algo ligado a sua identidade de judia que

    estava transparecendo de alguma forma. Que elemento deixava a tona sua identidade no

    podemos relatar aqui, mas que a sensao de que podia ser ver apenas com um olhar que ela era

    judia est retratada na sua cauda a mostra.

    At ento as interpretaes das identidades esto a cargo de Art como autor da obra.

    Mostramos que gatos, ratos e porcos so identidades fixas construdas por ele para poder contar

    sua histria e de seu pai. O nico momento da obra em que Art, quase que apenas de relance,

    percebe a fluidez dos sujeitos e de suas identidades mostrado em um quadro, a nosso ver,

    brilhante do ponto de vista artstico e esttico dentro das infinitas possibilidades da Nona Arte,

  • 100

    A nosso ver a obra um grande achado historiogrfico, com inmeras novidades a

    serem abordadas, mas nossa questo central foi ver como a escolha do autor de usar gatos e ratos

    busca cristalizar a viso das identidades dos sujeitos da historia, afinal todos os alemes so

    gatos e nazistas, colocando todos o V DOHPmHV HP XP ~QLFR VDFR HP XP ~QLFR OXJDU QmRGHL[DQGR EUHFKDV SDUD RV YiULRV (8V SUHVHQWH HP FDGD XP 6DEHPRV TXH HVWH UHFXUVR IRLutilizado para facilitar a construo da narrativa dentro dos quadrinhos, e no poderemos aqui

    dizer qual seria a outra opo a ser utilizada que no fosse essa, buscamos apenas trazer a luz o

    fato de que esta opo impossibilita o transparecer das subjetividades dos indivduos.

    Um judeu ser sempre um rato, como podemos ver pela sua escolha em retratar

    Franoise como rata na historia apesar dela ser francesa, e os franceses serem sapos. O rato foge,

    sujo, e presa do gato, que por sua vez e o algoz, o perseguidor, o predador do rato.

    Percebemos que por este fato a fluidez das identidades foi comprometida, dificultando que os

    leitores enxerguem para alem dos arqutipos de gato e rato, de presa e predador. Art assim

    reconstri novos lugares, novas identidades, no s para os atores do Shoah, mas tambm para

    ele, que no fim de tudo, como mostra na obra, descobre que possui tantas perguntas e lugares

    sem resposta quanto seu pai.

  • 102

    CHARTIER, Roger. A histria cultural: entre prticas e representaes, Rio de Janeiro:

    Bertrand Brasil, 1990.

    CURI, Fabiano Andrade. Maus, de Art Spiegelman: Uma outra histria do Shoah Fabiano

    Andrade Curi. SP : [s.n.]. 2009.

    EISNER, Will. Quadrinhos e Arte Sequencial / Will Eisner [Traduo. Luiz Carlos Borges] .

    So Paulo ; Martins Fontes. 1990.

    FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber, traduo de Luiz Felipe Baeta Neves, 7 Ed.,

    Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2007.

    ______ A Ordem do Discurso / Michel Foucault; traduo Laura Fraga de Almeida Sampaio.

    5 ed. So Paulo: Editora Loyola, 1999.

    GUEDES, Roberto. A era de bronze dos super heris / Roberto Guedes. So Paulo : HQ

    Maniacs, 2008. 240 p. : Il. ;28 cm.

    HALL, Stuart. Quem precisa de identidade? In SILVA, Tomaz Tadeu da (org). Identidade e

    diferena: a perspectiva dos estudos culturais. Petrpolis: Vozes, 2000. P. 103-133.

    MAcCLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos / Scott MacCloud 2005 Sal Paulo

    M.Books do Brasil Editora Ltda. 1. Historia em Quadrinhos Desenho Criao Animao -

    Roteiro

    MEIHY, Jos Carlos Sebe Bom. Histria Oral : como fazer, como pensar / Jos Carlos Sebe

    Bom Meihy, Fabola Holanda. So Paulo : Contexto, 2007.

    NETO, Odilon Caldeira. Memria e HQ: a representao do anti-semitismo nas Histrias

    em Quadrinhos. Histria, imagem e narrativas, No 8, abril/2009 ISSN 1808-9895 -

    http://www.historiaimagem.com.br

    PATATI, Carlos. ; BRAGA, Flavio. Almanaque dos Quadrinhos : Cem Anos de Uma Mdia

    Popular / Carlos Patati e Flavio Braga. RJ :Ediouro, 2006.

    PESAVENTO, Sandra Jatay. Histria & Histria Cultural / Sandra Jatay Pesavento. Bolo

    Horizonte : Autntica, 2003

    PONTES, Suely Aires. Mauschwitz: Deslocamentos imaginrios. GT de Filosofia e

    Psicanlise da ANPOF. Grupo de Pesquisa SEMASOM, (IEL/UNICAMP). 2006.

  • 104

    VASCONCELOS. Jos Antonio. Memria Histrica e Discurso Literrio: a Questo do

    Holocausto. Texto integrante dos Anais do XIX Encontro Regional de Historia: Poder,

    Violncia e excluso. ANPUH/SP USP. 08 a 12 de setembro de 2008. Cd-rom.

  • 106

    RESUMO DE MAUS

    1 pgina.

    O inicio do quadrinho mostra em uma nica pgina uma passagem sobre a vida de

    Art quando criana. Na pagina ele de patins com dois amigos em no bairro de Rego Park, em

    Nova York no ano de 1958. Ele e seus amigos apostam uma corrida quando os patins de Art se

    quebram. Art grita para que o esperem, mas seus colegas respondem em tom de deboche: _Ovo

    podre !!! Ovo podre! R, r, r. Ele caminha at a sua casa chorando e encontra seu pai na

    varanda cortando madeira e pede, quando seu pai o v ele pede a ajuda de Art na tarefa. Quando

    o pai de Art percebe q ele esta chorando pergunta que aconteceu com ele. Art diz que caiu e que

    pediu que seus amigos o esperassem mas eles forma embora e o deixaram pra trs. Seu pai para

    pra pensar um pouco e responde a ele: _ Amigos? Seus amigos?... Se trancar elas num quarto

    sem comida por uma semana ai ver o que amigo...

    1 parte

    Meu pai sangra histria. Meados dos anos 30 at o inverno de 1944.

    Temos uma pagina com uma citao de Hitler antes de comear o capitulo que diz:

    6HPGXYLGDRVMXGHXVVmRXPDUDoDPDVQmRKXPDQRV

    Cap 1. O Sheik

    Art comea o capitulo dizendo que foi visitar o pai em Rego Park e que no o via j a

    algum tempo, e termina dizendo que no eram muito prximos.

    Art encontra com seu pai que se mostra muito feliz em receb-lo em sua casa. Ele

    nos apresenta tambm Mala a nova esposa de seu pai. Nesta pagina ele nos apresenta os

    problemas que tem: No se d com seu pai, o novo casamento de seu pai no anda muito bem, e

    nos temos mostrada uma das facetas que seu pai atribui a Vladek quando ele nos mostra a

    discusso de seu pai com Mala por causa da colocao de seu casaco em um cabide de arame,

    no de madeira como seu pai queira.

    Art, Vladek e Mala jantam juntos e depois os dois sobem at o antigo quarto de Art

    para que enquanto seu pai pedalar ele possa entrevist-lo. Durante a conversa temos um close

    nos braos de Vladek enquanto pedala e ai podemos ver a sua tatuagem com a numerao

    atribuda a ele em Auschwitz. Na conversa Art diz ao pai que esta com vontade de dar

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    FRPHoDYDP D DFRQWHFHU QR FHQWURGD FLGDGH RQGH SHVVRDV JULWDYDP IRUD MXGHXV H VHJXQGR HOHem um deste eventos dois jovens judeus foram mortos e a polcia no vez nada para impedir. A

    empregada da casa que ouvia a conversa diz que isso culpa dos nazistas que esto agitando o

    mundo.

    A vida de Vladek boa por quase um ano at que sua convocao para o exercito

    chega. Ele estava na reserva do exercito polons. Ao perceber a certeza da guerra Vladek manda

    Anja e seu filho para Sosnowiec, rea que ele considerava segura, e ele parte para a guerra junto

    com o exercito, indo para o fronte de batalha.

    Segundo Vladek a guerra chegou em 1 de setembro de 1939, e eles estavam no

    front, como ele dizia, era um dos primeiros. Dizendo isto Vladek derruba pela segunda vez seus

    remdios e diz que isto culpa de seus olhos que j no so mais os mesmo, no enxerga bem

    por que j teve glaucoma, uma hemorragia e tem catarata, ele deveria ter feito uma cirurgia com

    o melhor medico da polnia, mas ele sumiu pra fazer um programa de TV, por isto teve sua

    cirurgia feita as pressas por outro medico e que talvez por este fato tenha perdido o olho

    esquerdo, que de vidro agora.

    O capitulo termina com Vladek dizendo que por aquele dia tava bom, pois ainda teria

    de recontar seus comprimidos. Art diz ser uma boa ideia e que sua mo j esta doendo de tanto

    escrever.

    Cap 3. Prisioneiro de guerra.

    Art passa a visitar o pai com mais frequncia para poder ouvir sua histria. Em outro

    jantar Art relata a Mala um antigo costume de seu pai de quando ele era criana, que segundo ele

    no poderia deixar comida no prato, nunca, mesmo que no gostasse ele teria de comer por que

    segundo seu pai no se pode deixar comida no prato, porm, sua me sempre que podia trocava a

    comida que Art tinha no prato por algo que ele gostasse, Vladek diz que Anja sempre foi muito

    mole com Art.

    Art pede para que ele recomece de 1939 sobre como foi ir a guerra. Vladek diz que

    tiveram alguns dias de treinamento e logo aps foram enviados para o front em trincheiras perto

    de um rio, de um lado eles do outro alemes. Art questiona sobre o pouco treinamento que

    tiveram para ir a guerra, e Vladek diz que eles se alistam no exercito aos 21 anos e depois a cada

    quatro meses tem um treinamento, mas que o pai de Vladek fez de tudo para evitar que os filhos

    fossem para o exercito, ele mesmo teria arrancado quatorze dentes para fugir do exercito.

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    mais quente e limpo, isso o ajudou a sobreviver pois outros prisioneiros tinha feridas causadas

    pelo frio e muitos morreram por isso. Algumas semanas depois os alemes colocaram uma faixa

    no meio do campo dizendo que precisavam de voluntrios para trabalhos e que esses teriam casa

    e comida. Os prisioneiros questionam essa oferta to generosa dos alemes e o boato que corria

    era que isso seria uma armadilha, Vladek diz no ter medo do trabalho que no ira morrer ali,

    outros o seguem e aceitam o emprego. Ao chegarem no novo campo eles tem um quarto com

    camas, aquecimento e trs refeies no dia que chegam.

    Porem, o trabalho no era to fcil assim, o grupo dele encarregado de fazer a

    terraplanagem de vrios trechos de estrada, tendo que retirar morros de mais de quatro metros de

    altura para a passagem de veculos, muitos no aguentaram o servio pesado e morreram por l

    mesmo, ou foram enviados de volta as barracas perto do rio. Vladek diz que sempre que dormia

    exausto do trabalho sonhava com seu av dizendo que ele sairia dali vivo no dia de Parashah

    Truma.

    Art pergunta ao pai o que Parashah Tuma, seu pai diz que toda semana nos sbado

    eles leem uma seo do tor isso chamado de Parashah, e o Parashah Truma um sbado

    especifico que representa um trecho do tor, e esse sbado, de acordo com um rabino que estava

    com eles ali disse seria em trs meses. Muitas semanas de trabalho depois durante um dia de

    trabalho os prisioneiros percebem a chegada de caminhes com soldados e so forados a

    formarem filas rapidamente. Vladek fica entusiasmado com o esta situao e na fila pergunta ao

    rabino que dia era aquele, o rabino responde que era sbado, Parashah Truma. Quando na fila

    chega a vez de Vladek o oficial nazista pergunta a ele qual seu nome, portos e para onde

    deveria ser enviado, ele diz que quer ir para Sosnowiec, assinando um formulrio seu destino

    traado.

    Art pergunta se seu sonho havia realmente se concretizado, Vladek diz que esta data

    corresponde coincidentemente com a data do seu casamento com Anja, e que dali pra frete o

    Parashah Truma se tornou uma data muito importante em sua vida, com por exemplo foi o

    sbado em que Art nasceu, e depois o sbado de seu bar mitzva.

    Os refugiados entraram no trem que os levaria a seus destinos, porem nem todos

    conseguem chegar at eles. A polnia tinha sido dividida pela Alemanha em duas partes Reich:

    Anexado a Alemanha e Protetorado; Governo controlado por alemes. O trem passa direto por

    Sosnowiec e s para no protetorado a 500 quilmetros de seu destino, na cidade de Lublin, onde

    l todos descem. Chegando l eles so colocados em tendas e falam com as autoridades judias e

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    aponta a todos em casa que ainda existia algum inteligente na famlia. Vladek diz no ter

    entregado sempre todo o dinheiro que consegui caso contrairo eles no teriam guardado nada.

    Indo novamente a esta rua em bisca de comprar tecidos sem cupons Vladek

    surpreendido com uma vistoria da SS nos documentos de todos na rua, ele conseguiu se esconder

    em um prdio, porm, segundo ele cerca de 50% das pessoas da rua foram levadas neste dia. Ao

    chegar em casa ele questiona seu sogro dizendo que somente com o documento de seu amigo

    no estaria seguro, ento seu sogro o leva ate um amigo seu que possui uma funilaria, ao

    soburna-l eles conseguem um documento melhor para Vladek, e ele ainda aprende atividades na

    funilaria que, segundo ele, foram teis em Auschwitz.

    Eles viveram assim por quase um ano, e ficando cada dia um pouco pior. Seu sogro

    tinha um belo conjunto de mveis e os alemes estavam procurando mveis pela cidade pois,

    no se encontrava mais para vender. Eles esconderam parte dos moveis no poro deixando

    apenas uma boa cama para sua sogra que estava doente. Quando os alemes vieram disseram que

    precisavam da cama por que a senhora estava muito doente, eles no levaram a cama. Porem seu

    sogro conhecia um homem que tinha contato com alemes que queria comprar moveis, como os

    que estavam escondidos no estavam sendo usados resolveram vende. O oficial elogia a

    qualidade dos moveis de seu sogro, e antes de sair da casa pede para seus homens pegarem a

    cama, seu sogro questiona que isso no fazia parte do negocia, o soldado diz que ele j havia

    enganado uma vez e que se quisesse sair vivo disso entrasse em sua casa em silncio. Seu sogro

    ficou muito infeliz depois disso.

    Outro dia Vladek vai procurar seu amigo comprador de tecidos e ao chegar na rua

    onde so feitos os negcios um grande tumulto esta acontecendo l. Os soldados alemes esto

    prendendo judeus com ou sem documentos, Vladek no sabe o que fazer na hora, se correr

    atiram nele, se ficar preso, ai que v seu amigo de longe e que o ajuda a se esconder em sua

    casa, onde fica muitas horas ate que os trens saem levando um grande numero de pessoas. Neste

    tempo em que ficou escondido na casa de seu amigo ele v que ambos tem filhos na mesma

    idade. Seu amigo diz que conhece um homem em uma rea segura da Polnia para onde ira

    mandar seu filho e pergunta de Vladek se ele no queria fazer o mesmo.ao chegar em casa com a

    proposta Anja se recusa a se separar de seu filho. Vladek diz que seu amigo e esposa no

    sobreviveram a guerra, o filho deles sim. Richeu teve de ser entregue a uma famlia um ano

    depois e no sobreviveu a guerra.

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    onde ela se internou antes. Os avos de Anja tinha uns noventa anos, e no queria ser separados

    da famlia. Nesta data eles ainda no sabiam nada sobre Auschwitz e os fornos, mas mesmo

    assim acharam melhor esconder os dois em um bunker construdo no quintal da casa. Por varias

    vezes os oficias alemes vieram a casa de Vladek em busca do casal e no obtiveram sucesso,

    sempre diziam que eles haviam sumido a mais de um m