diabetes mellitus em pequenos animais ... - ufrgs.br · pdf filediabetes mellitus em pequenos...

Download DIABETES MELLITUS EM PEQUENOS ANIMAIS ... - ufrgs.br · PDF fileDIABETES MELLITUS EM PEQUENOS ANIMAIS: ESTRATÉGIAS DE TRATAMENTO E MONITORIZAÇÃO* 1. INTRODUÇÃO A Diabetes Mellitus

If you can't read please download the document

Upload: trinhnhi

Post on 04-Feb-2018

223 views

Category:

Documents


5 download

TRANSCRIPT

  • DIABETES MELLITUS EM PEQUENOS ANIMAIS:

    ESTRATGIAS DE TRATAMENTO E MONITORIZAO*

    1. INTRODUO

    A Diabetes Mellitus um distrbio complexo que resulta da incapacidade das

    ilhotas pancreticas secretar insulina e/ou de ao deficiente da insulina nos tecidos.

    Esta uma endocrinopatia muito comum dos ces e gatos e pode ser fatal se for

    incorretamente diagnosticada ou inadequadamente tratada.

    A insulina produzida nas clulas beta das ilhotas de Langerhans do pncreas e

    armazenada em vesculas do Aparelho de Golgi em uma forma inativa (pr-insulina).

    Nessas clulas existem receptores celulares que detectam nveis de glicose plasmtica

    (hiperglicemia) aps uma alimentao rica em carboidratos. A insulina ativada e

    liberada na circulao sangnea.

    A captao de glicose pela clula se d pelo encaixe da insulina com um

    receptor especfico existente na membrana celular. Esse complexo sofre endocitose,

    permitindo a entrada de glicose, eletrlitos e gua para a clula. A glicose ento

    metabolizada (atravs da gliclise e do ciclo de Krebs). A insulina sofre degradao

    pelas enzimas intracelulares e o receptor regenerado, reiniciando-se o processo.

    Quanto mais o complexo insulina/receptor endocitado, mais glicose entra na

    clula, at que o plasma fique hipoglicmico. Essa hipoglicemia, entretanto, no

    imediata, pois a regenerao do receptor limitante da entrada de glicose na clula, de

    forma a possibilitar somente a quantidade de glicose necessria, evitando, assim, o

    excesso de glicose intracelular.

    Como resultado dessas aes, ocorre a queda gradual da glicemia (hipoglicemia)

    que estimula as clulas alfa-pancreticas a liberar glucagon, hormnio que possui ao

    antagnica insulina.

    Os hormnios pancreticos, insulina e glucagon, possuem ao regulatria sobre

    a glicemia plasmtica. No so os nicos envolvidos no metabolismo dos carboidratos.

    * Seminrio apresentado na disciplina Bioqumica do Tecido Animal no Programa de Ps-Graduao em Cincias Veterinrias da UFRGS pela aluna IZAMARA APARECIDA DE OLIVEIRA no semestre 2003/1. Professor da disciplina: Flix H. D. Gonzlez.

  • 2

    Os hormnios sexuais, a adrenalina, os glicocorticides e os hormnios tireoidianos

    tambm tm influncia na glicemia.

    A grande maioria das clulas do organismo dependente da insulina para captar

    glicose (o neurnio e os hepatcitos so excees, pois no tm receptores especficos

    para insulina, sendo a glicose absorvida por difuso).

    A deficincia na produo ou ausncia total de insulina ou dos receptores

    caracteriza uma das doenas metablicas mais comuns, a Diabetes Mellitus.

    2. ETIOLOGIA

    2.1 Diabetes Mellitus Insulino-Dependente (DMID)

    Tambm chamada de Diabetes Tipo I a forma mais comumente encontrada no

    co e no gato. Caracteriza-se por hipoinsulinemia e elevao mnima ou inexistente na

    insulina endgena aps a administrao de um secretagogo de insulina, por exemplo,

    glicose.

    Dentre os fatores que podem estimular esta enfermidade, podemos encontrar

    ilete, pancreatite, amiloidose ilhota-especfica nos gatos, doenas e drogas antagonistas

    da insulina (hiperadrenocorticismo, aumento do hormnio do crescimento,

    progesterona).

    A perda da funo das clulas beta irreversvel e torna obrigatria a terapia de

    insulina a longo prazo para manter o controle glicmico do estado diabtico.

    2.2 Diabetes Mellitus No Insulino-Dependente (DMNID)

    Tambm chamada de Diabetes Tipo II, uma forma raramente encontrada nos

    ces, mas aproximadamente 20% dos gatos apresentam este tipo de diabetes. Neste caso

    a destruio das clulas beta no constitui a alterao patolgica predominante, mas sim

    ocorre prejuzo da secreo de insulina por parte das clulas beta, resistncia insulina

    nos tecidos responsivos insulina e/ou acelerao da produo de glicose heptica.

    Dentre os fatores que podem estimular esta enfermidade podemos encontrar a

    obesidade e a deposio de amilide ilhota especfica nos felinos.

  • 3

    Como as clulas beta mantm um pouco da funo secretora de insulina, a

    hiperglicemia tende a ser suave, a cetoacidose torna-se incomum e a necessidade de

    insulinoterapia torna-se varivel.

    3. SINAIS CLNICOS

    Os sinais clnicos no se desenvolvem at que a hiperglicemia resulte em

    glicosria e sempre iro depender da gravidade da cetoacidose.

    Devido hiperglicemia, os rins no conseguem mais reabsorver toda a glicose ,

    ento o excesso excretado pela urina. Uma vez que a perda de glicose pela urina

    envolve necessariamente a perda de gua e de eletrlitos; ocorre poliria, desidratao e

    hemoconcentrao.

    A deficincia de insulina tem efeito marcado sobre o metabolismo de gordura. A

    gordura usada pelo animal normal como meio de armazenar energia alimentar. O

    fgado e o tecido adiposo convertem carboidratos em gordura para armazenagem. No

    animal privado de insulina, a utilizao de glicose deprimida e o animal forado a

    mobilizar gordura dos depsitos corporais para fornecer energia para a funo celular.

    O tecido adiposo catabolizado e os cidos graxos resultantes so oxidados,

    primariamente no fgado, em dois carbonos da acetil coenzima A e esta, quando

    acumulada, convertida em cido acetoactico, beta-hidroxibutrico e acetona,

    constituindo os corpos cetnicos. A cetonemia e a cetonria resultante, contribuem para

    a perda urinria de sdio, aumentando a desidratao, e causando o odor cetnico.

    Devido intensa desidratao o animal apresentar polidipsia e devido falta de

    energia, apresentar polifagia.

    A diminuio da glicose resultante da deficincia de insulina causa um aumento

    marcante na gliconeognese, o que deve envolver um aumento significante no

    catabolismo das protenas. A degradao de aminocidos levar ao quadro de azotemia,

    e ento ao desencadeamento do vmito.

    A catarata um sinal que aparecer muito rapidamente, isto porque o cristalino

    permevel a glicose, convertendo-a em fructose e sorbitol, que permanecem nas clulas

  • 4

    levando a um acmulo osmtico de gua, intumescncia e agregao de protenas,

    causando ento a opacidade que caracteriza a catarata.

    Para tentar reverter o quadro de acidose metablica, o organismo produzir uma

    alcalose respiratria, fazendo uma taquipnia. A Tabela 1 ilusra as principais

    complicaes decorrentes da diabetes.

    Tabela 1: Complicaes que podem ocorrer na Diabetes Mellitus.

    Complicao Manifestao clnica

    cetoacidose vmito, depresso, colapso, respirao de Kussmaul (taquipnia)

    catarata cegueira

    retinopatia leses oftalmoscpicas

    neuropatia fraqueza

    pancreatite vmito, dor abdominal

    insuficincia pancretica excrina diarria, perda de peso

    lipidose heptica hepatomegalia

    glomerulonefropatia insuficincia renal oligrica

    infeces bacterianas urinrias cistite, pielonefrite

    infeces bacterianas respiratrias pneumonia (tosse, dispnia e febre)

    infeces bacterianas cutneas piodermite

    4. DIAGNSTICO

    O diagnstico da Diabetes Mellitus requer um registro dos sinais clnicos

    apropriados (poliria, polidipsia, polifagia, perda de peso, entre outros) em associao

    com hiperglicemia de jejum e glicosria. Alm disso, podem se verificar alteraes no

    hemograma, de acordo com a causa primria, bem como alterao nas enzimas

    pancreticas. A cetonria ocorrer somente em casos de cetoacidose muito avanada.

    Para o diagnstico da diabetes em felinos, pode-se recorrer dosagem de

    frutosamina. Esta uma protena srica que em casos de hiperglicemia persistente sofre

    glicosilao. Portanto sua dosagem no sofre alterao devido hiperglicemia do

    estresse, muito comum nos felinos.

  • 5

    Para se estabelecer o diagnstico da Diabetes Mellitus, deve-se obter uma

    avaliao laboratorial completa, incluindo contagem sangunea completa, quadro

    bioqumico srico, ensaio srico de lpase e urinlise com cultura bacteriana.

    Alteraes clnico-patolgicas comuns associadas Diabetes Mellitus:

    Hemograma: leucocitose neutroflica;

    Perfil bioqumico: hiperglicemia, hipercolesterolemia, elevao da ALT,

    elevao da FAS, hiperamilasemia, hiperlipasemia;

    Urinlise: glicosria, cetonria, proteinria, bacteriria, hematria, piria,

    densidade especfica geralmente < 1,020.

    5.TRATAMENTO DA DIABETES MELLITUS

    Os objetivos principais da terapia inicial na diabetes so proporcionar uma

    quantidade adequada de insulina para normalizar o metabolismo intermedirio,

    restaurar as perdas hdricas e eletrolticas, corrigir a acidose e identificar os fatores

    precipitantes. O importante no forar o retorno normalidade muito rapidamente,

    sendo que este o processo deve levar de 36-48 horas.

    5.1 Fluidoterapia

    Deve-se corrigir a desidratao usando, preferencialmente soluo de

    NaCl 0,9%, evitando o Ringer Lactato, visto que o lactato precursor de glicose.

    Na cetoacidose tambm ocorre uma hipercalemia, isto porque o potssio que

    normalmente est presente em maior quantidade dentro das clulas, est sendo trocado

    pelo hidrognio, que estar muito abundante no espao extracelular. Durante a

    fluidoterapia a concentrao srica do potssio cair devido a reidratao (diluio),

    correo da acidemia, consumo celular insulina-mediado de potssio e perdas urinrias

    contnuas, tornando necessrio sua suplementao. Deve-se considerar que a velocidade

    de administrao no deve exceder 1 mEq/kg de peso cor