anarquismo portugal 1934

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80 anos do 18 de Janeiro de 1934 TEXTOS

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  • 80 anos do 18 de Janeiro de 1934

    TEXTOS

  • Esto aqui reunidos alguns textos-base que circulam na Internet

    e que ajudam a compreender o que esteve na origem, como se

    desenrolou e quais as consequncias e os debates em torno do

    18 de Janeiro de 1934, uma greve geral insurreccional convo-

    cada, em conjunto, pela CGT anarco-sindicalista, os sindicatos

    socialistas, a tendncia comunista e alguns sindicatos indepen-

    dentes. Por diversas razes a greve no teve a adeso pretendi-

    da e foi alvo de uma brutal represso, o que fez com que esta

    data marcasse tambm o declnio do movimento sindical aut-

    nomo e anarco-sindicalista em Portugal.

    Alguns destes textos so de reputados investigadores, outros tm

    um carcter mais jornalstico, outros ainda mais militantes, mas

    todos ajudam a conhecer melhor e a enquadrar duma forma

    mais global o que efectivamente foi o 18 de Janeiro de 1934,

    para alm da mera propaganda.

    Um grupo de anarco-sindicalistas

  • 18 de Janeiro de 1934: muito mais do que a Marinha Grande

    Colectivo Libertrio de vora

    18 de Janeiro de 1934

    Irene Pimentel

    Como a verdade ressalta

    Texto Colectivo (O 18 de Janeiro de 1934 e alguns antecedentes)

    A C.G.T., os chefes bolchevistas e o movimento de 18 de Janeiro

    Redaco de A Batalha (Abril de 1934)

    O 18 de Janeiro: uma proposta de releitura

    Maria de Ftima Patriarca

    Cercados e Perseguidos: a Confederao Geral do Trabalho (CGT) nos ltimos anos

    do sindicalismo revolucionrio em Portugal (1926-1938)

    Paulo Guimares

    O 18 de Janeiro de 1934 em Coimbra

    Irene Pimentel

    O 18 de Janeiro em Silves

    Alfredo Canana

    O 18 de Janeiro em Almada

    Lus Alves Milheiro.

    18 de Janeiro de 1934; 80 anos da Greve Insurreccional contra o Fascismo

    AIT/SP

  • Com o fascismo j implantado em Portugal, a publicao do Estatuto do Trabalho Nacional e Organi-

    zao dos Sindicatos Nacionais#, em Setembro de 1933 (com efeitos a partir de Janeiro de 1934) foi a go-

    ta que fez transbordar o movimento sindical.

    Com a nova legislao acabavam os sindicatos livres, colocando-os sob a tutela do Estado. A CGT

    anarco-sindicalista prope uma greve geral revolucionria aos outros sectores oposicionistas que se movi-

    mentavam no meio sindical Federao das Associaes Operrias de Lisboa (socialista), Comisso

    Intersindical (comunista) e aos sindicatos autnomos.

    Grande parte da direco do movimento e do fornecimento de bombas e outro material ficou nas mos

    da CGT.

    Nas vspera de 18 de Janeiro um elemento do PCP (na altura, um partido claramente putchista e com

    pouca influncia entre os trabalhadores) fez explodir uma bomba na estrada de Chelas, sem objectivo apa-

    rente e, mais tarde, nessa madrugada, um levantamento da linha frrea perto de Santa Iria da Azia provo-

    cou o descarrilamento de um comboio. (1)

    Dias antes, a 15 de Janeiro, tinha sido preso Mrio Castelhano, coordenador da CGT, profundamente

    empenhado na direco da greve, devido a uma denncia de algum que nunca se conseguiu identificar(1).

    Custdio da Costa, do Sindicato dos Manipuladores de Po, que ficara encarregue de fazer explo-

    dir uma bomba na Senhora do Monte (Graa) em Lisboa, para anunciar o incio do movimento aos vrios

    grupos sediados na capital, suspende a aco, agendada para a madrugada do dia 18, numa altura em que

    o Governo e a polcia j estavam de sobreaviso e na posse de informaes sobre a ecloso do movimento.

    Em Lisboa, no entanto, h vrios grupos de trabalhadores que avanam para as tarefas que lhes compe-

    tiam, mas a polcia j est na rua e, em termos gerais, a greve geral tem pouca adeso na cidade, ao mes-

    mo tempo que, durante todo o dia so presos centenas de activistas e militantes.

    A greve geral que inicialmente devia atingir todo o pas , a pouco e pouco, desmobilizada, ainda que,

    na manh do dia 18, registam-se sabotagens das comunicaes telefnicas, nas mquinas da Fbrica de

    Material de Brao de Prata, paralisaes de trabalho em vrias reas industriais e aglomeraes de traba-

    lhadores que comearam a ser dispersas pelas foras armadas. Em Coimbra, s 4,30 h. da manh a cidade

    ficava sem luz e energia. Os transformadores e os compressores da central elctrica foram inutilizados.

    18 DE JANEIRO DE 1934: MUITO

    MAIS DO QUE A MARINHA GRANDE

    Comemora-se este ano o 80 aniversrio do 18 de Janeiro de 1934, um movimento gre-

    vista, de carcter insurreccional, convocado pelo movimento sindical para protestar con-

    tra a fascizao dos sindicatos e tendo em vista o derrube do regime fascista. O movi-

    mento fracassou e no teve a adeso esperada, apesar de em diversas localidades os tra-

    balhadores terem feito ouvir a sua voz e o seu protesto. Marinha Grande, Almada, Sil-

    ves foram alguns desses locais que ficaram simbolicamente no imaginrio revolucio-

    nrio portugus.

  • Na Marinha Grande, os trabalhadores dominam a povoao e submetem a fora local da GNR para depois

    ainda resistirem ao ataque de fortes contingentes militares que foram sitiar e atacar. Em Almada, Setbal,

    Cova da Piedade, Barreiro, Montijo e Vendas Novas (). Em Leiria as comunicaes so cortadas a sul e

    a norte da cidade. No Porto e em muitas localidades do pas houve paralisaes (1)

    Na imprensa fascista, de todos estes acontecimentos, no dia 19 de Janeiro, o mais relatado o da Mari-

    nha Grande, onde o movimento insurreccional, limitado a pequenos grupos de militantes, durou um par de

    horas, servindo s maravilhas a propaganda do regime autoritrio, mas poucas foram as notcias relativa-

    mente, por exemplo, a Almada, Barreiro ou Cacilhas, onde o movimento foi secundado por milhares de

    trabalhadores, o mesmo acontecendo em Silves onde a povoao esteve a sim durante vrios dias em

    p-de-guerra.

    Poucas semanas depois da ecloso do movimento o PCP publica uma nota onde refere que nos locais

    onde o movimento teve expresso ele tinha seguido as orientaes do partido, a que a CGT responde

    com uma violenta nota na primeira edio da Batalha clandestina ps 18 de Janeiro (em Abril). Posteri-

    ormente, o PCP viria a desvalorizar o movimento grevista e insurreccional do 18 de Janeiro de 1934

    (tendo mesmo Bento Gonalves, na altura secretrio-geral, considerado que foi uma anarqueirada) para

    depois o vir reivindicar, sobretudo devido ao facto de na Marinha Grande os comunistas terem na altura

    alguma implantao.

    Esquecem, no entanto, que foi ali que o movimento teve caractersticas mais claramente putchistas e

    que, ao contrrio de outras zonas do pas, onde os anarco-sindicalistas eram quase hegemnicos, foi muito

    restrita a mobilizao de trabalhadores e a sua adeso greve geral.

    Ao longo dos ltimos anos diversos estudos tm ajudado a desmistificar a propaganda do PCP que

    sempre visou combater e diminuir a aco anarco-sindicalista para se arrogar como nico defensor das

    classes trabalhadores.

    Apesar disso outros estudos embarcam na verso oficialista do PCP (como o caso de uma tese divul-

    gada por estes dias no Esquerda.Net em que apenas valorizada no 18 de Janeiro a participao do PCP e,

    nomeadamente, os acontecimentos da Marinha Grande).

    Polmicas parte, o 18 de Janeiro assinala, no entanto, de forma clara, a ltima grande machadada so-

    bre o movimento sindicalista revolucionrio e autnomo, com a priso de centenas de militantes, a sua de-

    portao e a desarticulao da maioria das estruturas organizativas. A partir daqui fica o caminho aberto

    para a fascizao dos sindicatos e o seu controlo pelo Estado Novo, mas tambm ao trabalho que dentro

    deles os comunistas comearam desde logo a fazer, praticando o entrismo, que levou posteriormente

    criao da Intersindical Nacional, a actual CGTP, reformista e, muitas vezes, um mero apndice da estra-

    tgia comunista.

    a.

    1) O 18 de Janeiro de 1934 e alguns antecedentes depoimento colectivo de intervenientes no movi-

    mento Regra do Jogo, 1978

    Aqui: http://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2014/01/13/18-de-janeiro-de-1934-muito-mais-do-

    que-a-marinha-grande/

  • Logo que chegou chefia do poder, em 5 de Julho de 1932, Antnio de Oliveira Salazar comeou a ela-

    borar a Constituio sobre a qual assentaria o seu novo regime, o Estado Novo. Aps ser plebiscitado, o

    texto constitucional foi promulgado em Abril de 1933, no ano em que o novo regime salazarista criou a

    polcia poltica (PVDE) e o Secretariado de Propaganda Nacional (SPN) e lanou as bases da legislao

    corporativa, que assentaria, depois da proibio das associaes operrias, em Sindicatos Nacionais (SN)

    nicos e Grmios patronais todo-poderosos. Na luta contra o processo da chamada fascizao dos sindi-

    catos e num movimento de recusa de dissoluo das organizaes operrias nos SN e de formao de comi-

    ts de base de luta por reivindicaes econmicas e liberdades polticas, ergueram-se os anarco-

    sindicalistas, os comunistas e alguns socialistas, respectivamente organizados na Confederao Geral do

    Trabalho (CGT), na Comisso Inter-Sindical (CIS) e na Federao das Associaes Operrias (FAO), bem

    como elementos do Comit das Organizaes Sindicais Autnomas (COSA).

    No PCP, a linha de Bento Gonalves e da direco foi inicialmente de aproveitamento das assembleias-

    gerais que deveriam realizar-se para decidir da aprovao dos novos estatutos sindicais e aprovar moes

    de repdio da nova legislao e dos sindicatos nacionais, gerando um movimento de massas que poderia

    vir a desembocar numa greve geral contra a fascizao dos sindicatos. O certo que a tctica do PCP

    teve pouca aceitao na prpria CIS, dirigida por Jos de Sousa, que aderiu tctica da greve geral insur-

    reccional e a partir de ento os sindicalistas comunistas concentraram-se nos preparativos desta.

    No processo de organizao do movimento de resistncia aos decretos sindicais do Estado Novo, revelar

    -se-ia assim dominante um projecto insurreccional, programado inicialmente pelos comunistas e anarquis-

    tas, organizados em Comits Sindicalistas Revolucionrios (CSR), em conjuno com foras reviralhistas.

    Mas logo em Novembro de 1933, a PVDE conseguiu prender e deportar Sarmento de Beires e outros revi-

    ralhistas, participantes numa tentativa falhada de intentona que deveria coincidir com a greve geral revo-

    lucionria, que aps conhecer sucessivos adiamentos devido represso, foi marcada para 18 de Janeiro

    de 1934.

    A polcia e o governo comportaram-se como se desejassem que o movimento deflagrasse para, em se-

    guida, desmantel-lo e reprimir os envolvidos. Parecendo estar ao corrente dos preparativos da greve geral

    revolucionria de 18 de Janeiro de 1934, a PVDE prendeu, na vspera, alguns dos principais dirigentes

    sindicalistas, entre os quais se contaram os anarco-sindicalistas Mrio Castelhano e Accio Toms de

    Aquino e o reviralhista Carlos Vilhena, detido na madrugada desse dia. Em Lisboa, na noite de 17 para 18

    de Janeiro, Salazar abandonou a sua residncia, acolhendo-se, primeiro no Governo Civil e, em seguida, ao

    quartel de Caadores 5, em Campolide, enquanto os pontos nevrlgicos da capital eram de imediato ocupa-

    dos pelo Exrcito. As adeses greve geral de dia 18 acabaram por se revelar reduzidas, registando-se

    paralisaes e aces diversas em Lisboa, Coimbra, Leiria, Barreiro, Almada, Martingana, Silves, Sines,

    Vila Boim (Elvas), Algoz-Tunes-Funcheira e na Marinha Grande.

    Na noite de dia 17, em Lisboa, rebentou uma bomba no Poo do Bispo e foi cortado o caminho-de-ferro

    em Xabregas, ao mesmo tempo que explodiam duas bombas na central elctrica de Coimbra, colocada por

    anarquistas. S na Marinha Grande, onde as lutas anteriores dos vidreiros tinham criado um ambiente pro-

    pcio, se foi mais longe: sob o impulso do sindicato (onde predominavam os comunistas), grupos de oper-

    rios ocuparam o posto da GNR, o edifcio da Cmara Municipal e os CTT, proclamando o soviete da Ma-

    18 de Janeiro de 1934

    Irene Pimentel (*)

  • rinha Grande. Tropas vindas de Leiria tomariam conta da vila poucas horas depois, ficando-se greve ge-

    ral insurreccional por a, com o governo a aproveitar para intensificar a caa aos libertrios e comunistas.

    Aps a PVDE ter desmantelado as movimentaes operrias, Salazar props, ao Conselho de Ministros,

    no dia 19, diversas medidas repressivas e sanes para os envolvidos nas aces da vspera. Considerados

    como participantes num acto revolucionrio, todos os dirigentes mas tambm qualquer mero aderente do

    movimento foram sujeitos aos tribunais especiais. Numa nota oficiosa, o governo avisou tambm que

    iria reprimir eficazmente a propaganda e as ideias dissolventes e atentatrias da moral pblica e da or-

    dem, bem como promover a demisso de funcionrios pblicos civis e militares envolvidos. Dos aconte-

    cimentos de 18 de Janeiro, resultou tambm a deciso de o governo criar, no sul de Angola, junto foz do

    Cunene, um campo para os responsveis revolucionrios, e a vontade de erguer uma colnia penal em Ca-

    bo Verde. Esta viria a ser criada em 1936 no Tarrafal, para onde seriam enviados, logo em Setembro desse

    ano, os principais dirigentes detidos nos acontecimentos de 18 de Janeiro de 1934[1].

    Nos dias subsequentes a 18 de Janeiro, houve porm um afrouxamento da censura e o governo no co-

    locou limites divulgao dos acontecimentos violentos da vspera. Pelo contrrio, tudo fez para dar conta

    de um pretenso clima insurreccional, potenciando o impacto das aces violentas, em detrimento das gre-

    ves, com o objectivo de assustar a populao e apelar ao seu repdio pelos acontecimentos. Alm disso, o

    governo foi atribuindo crescentemente a autoria dos acontecimentos ao PCP, omitindo a participao dos

    elementos dos antigos partidos, dos reviralhistas e dos anarco-sindicalistas. Por exemplo, depois de ter re-

    ferido estes ltimos como os organizadores da greve revolucionria, o ministro do Interior Gomes Perei-

    ra j quase no os nomeou, na conferncia de imprensa realizada por ele no dia 19 de Janeiro.

    O 18 de Janeiro marcaria uma ruptura histrica no movimento operrio portugus e o fim de uma

    poca. Em primeiro lugar, foi o fim de mais de meio sculo de um sindicalismo sempre perseguido mas

    livre. O fracasso dos acontecimentos de 18 de Janeiro de 1934 levaria tambm ao fim da hegemonia do

    anarco-sindicalismo no movimento operrio e sindical portugus, devido violenta represso que desabou

    sobre a CGT e o movimento libertrio, que revelaram grandes dificuldades de sobrevivncia na clandesti-

    nidade. Mais apto em actuar nessas condies adversas e passando a partir de ento a hegemonizar a oposi-

    o ao regime, o PCP tambm viria a sofrer uma mudana, abandonando gradualmente o seu carcter ainda

    pr-leninista, muito marcado pela herana anarco-sindicalista e pela colagem ao reviralhismo.

    Finalmente, a partir de ento, a nvel do regime salazarista, derrotados os anarco-sindicalistas e os revi-

    ralhistas sua esquerda, e os nacionais-sindicalistas sua direita, o Estado Novo erigiria os comunistas

    como seus principais inimigos. Efectivamente, aps o desmantelamento do movimento revolucionrio de

    18 de Janeiro de 1934, Salazar introduziu, pela primeira vez no seu discurso, um novo elemento o comu-

    nismo e o perigo comunista. Foi Franco Nogueira que o disse, ao acrescentar que, atravs desse discurso, o

    Pas compreendia que estava perante uma nova opo: a ordem social existente ou uma ordem social que

    a destrusse por inteiro. O certo que esse novo tema foi lanado por Salazar, no final do prprio ms de

    Janeiro de 1934, numa sesso de apresentao da nova organizao de juventude estatal, a Aco Escolar

    Vanguarda (AEV). Depois de avisar que o Estado Novo no reconhecia as liberdade contra a Nao, con-

    tra o bem comum, contra a famlia contra a moral, afirmou, aos jovens, que constituiriam a gerao do

    resgate de que haveria de nascer o mundo novo, que o comunismo se havia convertido na grande he-

    resia da nossa idade.

    [1] Entre os participantes no 18 de Janeiro de 1934, morreriam no campo de concentrao do Tarra-fal, Pedro Matos Filipe e Augusto Costa, em 1937, Arnaldo Simes Janurio, em 1938, Casimiro Ferreira e Ernesto Jos Ribeiro, em 1941, Joaquim Montes, em 1943, Mrio dos Santos Castelhano e Manuel Augus-to da Costa, em 1945, bem como Antnio Guerra, em 1948.

    (*) Aqui: http://caminhosdamemoria.wordpress.com/2009/01/18/18-de-janeiro-de-1934/

  • Com a priso, julgamentos e deportao para o Tarrafal dos elementos que participaram no 18 de Janei-

    ro e o perodo de intensa represso que se seguiu e veio a agravar-se com a ecloso da guerra civil de Es-

    panha, o acontecimento cobriu-se de esquecimento que se prolongou por quarenta anos.

    Na altura o 18 de Janeiro veio a pblico apenas na verso dos comunicados oficiais e com os ataques da

    Imprensa. A verdade dos acontecimentos, dos seus objectivos e da sua organizao e preparao ficou

    oculta.

    Algum tempo mais tarde, de vez em quando, o partido comunista foi insinuando as suas verses do 18

    de Janeiro, apropriando-as com a sua tcnica stalinista de histria controlada e pr-fabricada ao modo con-

    veniente, formao da aurola de partido da resistncia que foram criando, at muito especialmente

    coma ajuda da propaganda reaccionria, do seu papo comunista, ou na costumada expresso de Salazar

    insistindo no perigo do comunismo internacional.

    Necessariamente, para criar credibilidade e como base tcnica da sua habitual propaganda, teriam de

    eliminar, denegrindo e insultando com o seu indispensvel apodo de traidores, os homens e as organiza-

    es no comunistas que na verdade organizaram e sustentaram a luta, cujos mritos e feitos ainda no fo-

    ram devidamente apreciados.

    Bento Gonalves, que nessa altura era o secretrio-geral do partido comunista, construiu esse processo

    de adulterao histrica, anos depois e j na deportao, escrevendo um folheto intitulado Duas Pala-

    vras, partindo dum ataque demolidor dos objectivos e aces do movimento, mistificando os factos e dis-

    farando uma aco reformista por certo calculada, embora numa aparncia perfeitamente infantil, termi-

    nando por demegrir o movimento classificando-o de pura anarqueirada.

    O partido comunista sob a sua chefia opunha-se ao 18 de Janeiro como movimento de greve geral revo-

    lucionria, como aco personalizada da organizao sindical, porque afinal queriam converter todas as

    manifestaes ao domnio do partido. Todavia, nessa altura, o partido no estava apto a exercer esse lide-

    rismo pois atravessava uma crise interna bastante profunda e confessa.

    Bento Gonalves que nos diz:No Partido o ambiente geral era de fuga para as aces isoladas. A

    maior parte dos camaradas de base do Partido, alis cheios de denodo revolucionrio e cuja sinceridade

    proletariana ningum ainda ps em dvida, eram novos e desprovidos da mnima experincia sobre a acti-

    vidade sindical e sobre os mtodos sos da tctica do movimento operrio. No Comit Regional de Lisboa

    se criou a tendncia geral para a aco directa. Em quase todos os outros stios a situao era idntica ()

    E entretanto era absolutamente necessrio vir a pblico para resolver a questo no interior do Partido, to-

    das em quase todos os escales pro essa duplicidade de tctica.

    Ao escrever as Duas Palavras Bento Gonalves teria de fazer derivar o imperativo da luta para hip-

    teses diferentes da greve geral que cobrissem a debilidade que estavam sofrendo, mas no s, para apro-

    veitarem uma passagem suave a um sindicalismo corporativista no qual se instalassem sem dificuldades

    introduzindo a influncia do partido. E define a posio:Colocmo-nos no terreno da utilizao das con-

    Como a verdade ressalta

    Texto Colectivo (*)

  • dies legais. Qualquer forma de luta ilegal ainda a nem sequer era frisada, nem mesmo subentendida-

    mente. Dizamos, em substncia, que os sindicatos ainda se regiam pelo velho alvar (1). Era portanto ne-

    cessrio lutar sobre essa base. Convocar reunies de assembleias gerais com o fim de levar os trabalhado-

    res a votar contra o Estatuto do Trabalho Nacional. O que era preciso patentear bem alto e bem publica-

    mente que os trabalhadores estavam contra a fascizao dos Sindicatos, que continuavam a dispor do direi-

    to de organizao independente`.

    At ao 18 de Janeiro ningum teve a idiotia de propor a realizao de assembleias para impedir a fasci-

    zao dos sindicatos; a ideia divulgada mais tarde para dar a justificao da tal utilizao das condies

    legais. Tal inteno seria simplesmente inexequvel, porque seria para a polcia a melhor forma de poder

    identificar quem se opunha legislao fascista e de poder conhecer a movimentao em preparao.

    Ao partido interessava a esterilizao dos sindicatos enraizados nas tradies de luta dos trabalhadores

    e experimentados na sua autonomia em relao ao Estado, aos partidos e ao jogo parlamentarista. O es-

    trangulamento e a subalternizao dos sindicatos permitiria, como veio a permitir depois do 25 de Abril,

    que qualquer partido marxista ou similar pudesse liderar as classes trabalhadoras e integr-las no sistema

    poltico e econmico.

    Noutro passo podemos ainda ler: Dum modo geral, desde Setembro de 1933 at data da ecloso do

    movimento, os militantes sindicais cristalizam-se em volta da preparao do movimento grevstico e sedi-

    cioso, mandando ao diabo a questo das assembleias e das formas de protesto pblico de massas contra as

    medidas eminentes.

    Conclui-se que na cpula do partido se optava por uma forma de protesto simblica abrindo passagem

    adaptao sindical. E prossegue: Entre os trabalhadores do Estado parece que s o Sindicato do Pessoal

    do Arsenal de Marinha efectuou uma assembleia, alis largamente assistida de reprovao do ENT. Porm,

    mesmo neste sindicato, ainda nos recordamos do trabalho e das imposies a militantes que foi necessrio

    fazer para conseguir a convocao da tal assembleia.

    Bento Gonalves foi operrio do Arsenal da Marinha; estranho que diga parece que s o Sindicato do

    Pessoal da Marinha (o sublinhado nosso) e por outro lado recorde das imposies a militantes (o subli-

    nhado nosso) para conseguir a convocao. O que no de crer que a assembleia fosse para reprovar o

    ENT. A polcia estava pronta para reprimir manifestaes desse gnero, e o pessoal no arrostaria a desen-

    cadear ordens cominatrias da direco militar do arsenal. Tentaria a direco do sindicato evitar que lhe

    fosse aplicada a supresso do direito de sindicalizao prevista para os funcionrios do Estado?

    Deduz-se das declaraes de Bento Gonalves:

    a) Que o partido estava na altura desorganizado e que nas bases se optava de preferncia por uma aco

    revolucionria que a chfia condenava;

    b) Que a cpula do partido optava por uma aco legal que seria, naturalmente, pela aceitao da estati-

    zao dos sindicatos onde os quadros do partido se infiltrariam, facilmente acomodados ao estilo burocr-

    tico e centralista das direces sindicais;

    c) Que o partido estava em oposio a toda e qualquer aco revolucionria, preparando-se para a infil-

    trao.

    Confirma o que noutro passo escreveu: Sobre a base desta dupla apreciao ns trazamos todas as

    condies para empreender uma viragem de harmonia com o VII Congresso (2): a) os efectivos dos sindi-

    catos ilegais deviam ser incorporados no partido; b)o centro do trabalho sindical devia deslocar-se para

    dentro dos sindicatos nacionais c) a unidade sindical () sobre a base da utilizao de todas as possibili-

    dades legais, interiores e exteriores ao sindicato nacional.

    Confrontando as declaraes de Jos Gregrio num relatrio tantas vezes evocado pelas vrias seitas

    marxistas com as declaraes de Bento Gonalves, torna-se evidente a contradio.

    Escreve Jos Gregrio: O Partido nomeou um comit para preparar e dirigir o movimento debaixo da

  • seguinte orientao: Para que os operrios pudessem alcanar a satisfao das suas aspiraes precisavam

    de se apoderar das armas que estavam na posse duma fora da GNR ().

    O que vigorava no partido. a aco legalista ou a aco revolucionria? Como que o partido nuns lados

    optava por uma aco de infiltrao e na Marinha Grande o partido nomeava um comit para dirigir uma

    aco que depois viria a ser considerada putschista?

    Se o partido, segundo a afirmao de Jos Gregrio, nomeou um comit para preparar e dirigir o movi-

    mento, pode concluir-se que o 18 de Janeiro foi exclusivamente da sua iniciativa? Mas Bento Gonalves,

    secretrio-geral do partido, nessa altura, escreveu (3): Esta questo (o 18 de Janeiro) no pode dizer-se

    que tenha entre ns uma anlise completamente virgem. No Avante!, logo aps a ecloso deste movi-

    mento, conduzimos uma crtica ao caminho terrorista que, em vrios stios (por certo incluindo a Marinha

    Grande), se constatou nessa jornada e tctica dominante, por vezes, no movimento sindical portugus que

    consistia em elaborar as aces muito para alm das condies concretas e do estado das foras da organi-

    zao operria.

    Se em vrios aspectos, essa crtica foi deficiente, isso deve-se, em primeiro lugar, deficincia dos

    nossos meios de informao. Por exemplo, o caso da Marinha Grande foi apresentado como um modelo

    de boa tctica. S em Angra viemos a verificar que o feito ali, tambm, nem por isso tinha sido menos put-

    chista.

    No se compreende que tendo o partido nomeado o comit do movimento na Marinha Grande, segundo

    Jos Gregrio, Bento Gonalves venha considerar o movimento terrorista, negando-lhe a qualidade de

    modelo de boa tctica, e, o que pior ainda, s se tivesse dado conta disso depois, j em Angra, e

    por deficincia de meios de informao. Esta deficincia s se pode aceitar em duas condies: ou estar

    afastado dos acontecimentos ou se se tivesse dado o caso de nomear o comit e t-lo deixado desamparado.

    De resto Bento Gonalves acentua que aces daquele gnero (o 18 de Janeiro) de caminho terroris-

    ta era tctica dominante, por vezes, no movimento sindical portugus, assinalando deste modo qual era na

    verdade a autntica origem do movimento e que o partido, pela boca autorizada de Bento Gonalves, recu-

    sava e condenava.

    Jos Gregrio, presidente do Sindicato dos Vidreiros e pelo que entrou na preparao e conduo do

    movimento na Marinha Grande, veio depois com o seu relatrio dar uma contribuio falsa para a histria

    pr-fabricada atribuindo ao partido o que fora iniciativa do sindicato. E Bento Gonalves que o desmente,

    mas por outro lado o pode acusar de pior.

    Ouamos ainda Bento Gonalves, referindo-se Marinha Grande: No estamos em presena duma ac-

    o do proletariado local, dum movimento grevista de protesto contra o Estatuto do Trabalho Nacional, que

    as massas alargam, em virtude da sua efervescncia revolucionria, mas sim ante uma aco estruturalmen-

    te de vanguarda de membros do Partido e de comunistas sem partido, convencidos de que uma greve geral

    eclodiria em todo o pas, qual se junatria o reviralho (o sublinhado nosso).

    Se Jos Gregrio actuou como membro do partido, a sua aco, segundo Bento Gonalves, foi uma ac-

    o estruturalmente de vanguarda e espera do reviralho, e no escapou acusao de anarqueirada.

    Se Bento desmente o Gregrio, este desmente ainda aquele. Se o movimento foi organizado pelo parti-

    do, segundo Jos Gregrio, o Bento reconhece a origem sindical do movimento, que a greve geral preconi-

    zada pela CGT fora aceite, contrariamente ao que pensava o partido, que preconizava um movimento de

    massas atravs de assembleias gerais e pela utilizao das condies legais, isto , pela disfarada aceita-

    o dos sindicatos nacionais para neles se introduzirem, atribuindo a derrota do 18 de Janeiro

    ao provincianismo anarco-sindicalista.

    Todavia, apesar destas contradies, existe um nexo notvel que interessa analisar.

    Duas Palavras de Bento Gonalves foi escrito em 1941 quando se encontrava deportado no Tarrafal,

    um ano antes da sua morte; o relatrio Alberto, de Jos Gregrio, est datado de Agosto de 1955.

  • Em 1941 tinham decorrido j 15 anos de regime ditatorial, a panplia do partido estava vazia de qual-

    quer aco contra o regime, pois at o 29 de Fevereiro de 1932, de que nunca se fala, se cifrou num fracas-

    so como organizao e dos seus objectivos, pois uma das suas reivindicaes, o subsdio de desemprego,

    foi aproveitada pelo governo para impor um desconto de 2% que nem o 25 de Abril nem a Intersindical

    contestaram. Era necessrio adaptar a histria, distorcer a verdade do 18 de Janeiro e preg-los com alfine-

    tes na panplia vazia. O seu autor lanava assim as bases do seu culto de personalidade.

    Em 1955, Jos Gregrio, depois de ter em 1942 aparelhado com Cunhal no secretariado do partido, teria

    de ajudar a mistificar a histria do 18 de Janeiro, aproveitando o seu ttulo de presidente do Sindicato dos

    Vidreiros nessa altura para depr com autoridade.

    Como toda a mistificao deixa sempre qualquer coisa de fora, que pode vir desmentir, assistiremos ago-

    ra a Jos Gregrio desmentir-se a si prprio.

    No relatrio Alberto, Jos Gregrio afirmou que o partido nomeou um comit para preparar e dirigir

    o movimento faltando todavia esclarecer se isso foi a nvel local ou nacional.

    No mesmo relatrio, referindo-se organizao e actuao do partido, faz certas anlises das experin-

    cias recolhidas e tira algumas concluses.

    Analisemo-las tal como nos diz Jos Gregrio.

    1- A organizao do Partido que foi montada em 1932 s passou a funcionar de um modo um pouco

    mais regular em princpios de 1933. Na prtica no havia mais que um ncleo de camaradas a que se pode-

    ria dar o nome de organizao local. Nas fbricas no havia organismos. Por outro lado o contacto com a

    direco do Partido fazia-se muito raramente. Nestas condies os camaradas do Partido no reuniam numa

    base de Partido, no actuavam dentro das normas de disciplina de Partido, no se sentiam obrigados a pres-

    tar-lhe contas da sua aco. Por outro lado no era utilizada a crtica nem a autocrtica. Criou-se o hbito

    de ver as coisas no sob o ponto de vista do Partido, mas sim na base individual, na base da legalidade sin-

    dical, crendo-se no poucas vezes na burocracia sindicalista (4). Tudo isso se tornou muito inconveniente

    para a formao e desenvolvimento dos quadros do Partido. Tudo isso contribuiu para que no fossem re-

    crutados para o Partido bons operrios de vanguarda homens e mulheres cheios de qualidade e de possibili-

    dades para virem a ser um precioso material do Partido.

    Com este quadro do partido como crer que ele fosse o organizador do 18 de Janeiro, que teve a extenso

    que teve. Quase temos vontade de dizer: que grande anarquia havia ento dentro do Partido!

    Esta desconformidade entre a organizao interna do partido na ocasio e as propores do 18 de Janei-

    ro, confirma que este decorreu margem daquele, embora elementos comunistas tivessem actuado, mas por

    via sindical. De resto, no mesmo relatrio e ao terminar, Jos Gregrio confessa:O movimento de 18 de

    Janeiro tambm teve a participao dos anarquistas locais e de operrios que influenciavam (certamente,

    dizemos ns, no orientados pelo partido). Deste modo se pode afirmar haver nesta data a mesma caracte-

    rstica de unidade que sempre existiu na nossa organizao sindical desde 1931 at ento. (O sublinhado

    nosso).

    1 concluso: Ao elaborar o plano de aco para o 18 de Janeiro o Partido e o Comit Revolucionrio,

    deixaram-se levar pela ideia feita de que a vitria era certa, que o fascismo seria derrubado sucedendo-lhe

    um regime de tipo proletrio. Partindo-se deste princpio no se considerou a necessidade de encarar uma

    retirada de modo ordenado. Esta orientao errada de nem sequer admitir revezes parciais.

    Deve prestar-se justia ao Jos Gregrio. Se ele se apropriou da organizao do 18 de Janeiro para o Par-

    tido justo que reivindique para ele os insucessos e os erros. A mesma coerncia no a teve Bento Gonal-

    ves quando apelidou o 18 de Janeiro de pura anarqueirada.No sabemos se Jos Gregrio reivindicou

    para si e para o seu partido o insulto soez de Bento Gonalves que por essa altura deportado no Tarrafal, l

    mesmo no campo de concentrao se prestou a fundir em bronze dois escudos evocativos da passagem do

    Carmona, manequim do regime fascista, por Cabo Verde na sua viagem a frica, e ao deflagrar a guerra,

  • ele em pessoa, foi apresentar ao director do acampamento, o sinistro capito Joo Silva, a colaborao do

    PC na defesa da ptria contra o imperialismo.

    Conhecemos sempre o partido comunista como o modelo e o manual do perfeito oportunismo, do impu-

    dor das afirmaes e das acusaes torpes, alm do exerccio do mais completo reformismo embora besun-

    tado de revolucionarismo, mas tambm o reconhecemos camalenico, dizendo hoje o que ontem ter nega-

    do.

    Se a CGT e os anarco-sindicalistas traram o 18 de Janeiro, como tambm afirmam os trabalhadores,

    porqu o seu rgo O Avante de Maio de 1937, portanto 3 anos depois, com o Bento Gonalves vivo e

    frente do partido, publicava uma notcia, alis falsa e simplesmente arquitectada, na primeira pgina e inti-

    tulada Viva a Frente nica Proletria aplaudindo a unidade com a CGT?

    Comea a notcia assim redigida: Pede-nos a CIS a publicao do documento que a seguir inserimos.

    Fazemo-lo com a mxima alegria por este documento dar notcia de um acontecimento importante da

    vida do movimento operrio portugus. Por ele se v que a Frente nica Proletria est em via da sua ime-

    diata realizao. E a CIS (a clebre Comisso Intersindical) d a seguir a notcia de a CGT ter acedido s

    suas propostas para a constituio de um Comit de Frente nica Proletria, acrescentando: No que se

    refere aos problemas de orientao da CGT ns pensamos que s a neutralidade em questes de tendncia

    pode permitir a Unificao.

    Uma CGT comunista no contaria, com certeza com o apoio dos camaradas anarquistas, da mesma

    maneira uma CGT anarquista dificilmente encontraria apoio nos partidrios da Ditadura do Proletaria-

    do (5)

    Alm desta notcia ser totalmente desprovida de qualquer resqucio de verdade de pr em evidncia o

    impudor de afirmar a mxima alegria em quererem fazer uma unio com aqueles que acusaram de trai-

    dores, de admitirem em emparceirar com os que tm denegrido.

    Nunca a CGT teve qualquer contacto com o partido comunista e com a Comisso Inter-Sindical, apenas

    estabeleceu os contactos para o 18 de Janeiro cuja experincia e resultados deixmos j descritos.

    O comportamento da CIS, toda a campanha posterior, tornaram evidente que no possvel qualquer

    colaborao com os comunistas como partido ou como qualquer agrupao, mesmo sindical, em que pre-

    ponderem. O amoralismo dos seus processos, o desrespeito pelos compromissos assumidos produz-se logo

    que lhes seja oportuno.

    A experincia do 18 de Janeiro no poderia voltar a permitir qualquer acercamento. Apertam a mo que

    no podem cortar e os acordos que estabelecerem ho-de resultar em seu benefcio. Se no colherem o re-

    sultado total acusaro os outros de traidores.

    (Como a verdade ressalta, captulo do livro O 18 de Janeiro de 1934 e alguns antecedentes, um de-

    poimento colectivo de Accio Tomaz de Aquino, Amrico Martins, Custdio da Costa, Jos Francisco,

    Marcelino Mesquista e Emdio Santana, que coligiu. Regra do Jogo, 1978.)

    Notas

    (1) O itlico nosso para assinalar a declarada posio reformista. No se compreende a relao entendida entre o alvar e a

    forma de actuao dos sindicatos de ento. O alvar era o certificado do governo civil que reconhecia a legalidade dos sindicatos

    mas que no tinha qualquer relao com a sua orgnica e orientao.

    (2) Ver SEARA NOVA n 1513 Maro 1975, Movimento das Ideias; de Fernando Guerreiro.

    (3) Duas Palavras, de que vimos fazendo citaes. O sublinhado nosso.

    (4) surpreendente que, sendo Jos Gregrio Presidente do Sindicato, ele no se queira responsabilizar pela burocracia

    sindicalista.

    (5) O Avante, Srie II 35 da 3 semana de Maio de 1937

    Aqui: : http://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2013/01/17/18-de-janeiro-de-1934-depoimento-colectivo-de-diversos-

    militantes-confederais-ligados-a-sua-organizacao/

  • Os processos de actuao dos chefes bolchevistas so conhecidos: todos os meios so bons para alcan-

    arem os fins, Desde a mentira confuso, desde a intriga calnia.

    Temos nossa frente um Boletim assinado pelo Secretariado do Partido Comunista. por consequncia

    um documento oficial. Trata do movimento de 18 de Janeiro. O seu contedo no eleva quem o redigiu;

    revela apenas uma falta de honestidade moral que nunca pode triunfar no seio do proletariado.

    A audcia das suas afirmaes, o descaramento com que se pretende demonstrar uma grande prepara-

    o revolucionria comunista para o citado movimento, no consegue iludir a prpria massa operria, fora,

    ou desviada, do mbito destas lutas.

    nestes momentos que os chefes bolchevistas pretendem ganhar terreno. Para isso confundem, bara-

    lham, sofismam, porque sempre produzir algum resultado

    Conhecemos, porm, esses processos. Andamos por c h alguns anos e sabemos perfeitamente como a

    sua aco tem sido conduzida. Mas vamos ao documento em questo. O que diz ele, em resumo? Diz isto:

    O 18 de Janeiro caracterizou-se precisamente pela expresso do desejo das massas de seguirem as pa-

    lavras de ordem do Partido Comunista.

    J audcia! Como se o referido movimento fosse obra sua! Mais ainda, para que se observe at onde

    vai o arrojo:

    Na margem Sul do Tejo, em Almada, Cacilhas, Porto Brando, Alfeite, Cova da Piedade a greve foi

    geral. No Algarve, houve greves e manifestaes de massas, sobretudo em Silves, alguns pontos do Alen-

    tejo seguiram, tambm, as palavras de ordem do nosso Partido.

    Querem melhor?

    Ento, toda a aco desenvolvida pela classe trabalhadora na margem Sul do Tejo no foi orientada pela

    C.G.T.?

    Que influncia exerce nesses locais, ou melhor, nas respectivas classes, o partido bolchevista?

    A organizao de Silves no retintamente cegtista?

    Para qu tanta mentira?

    Vila Boim, Terrugem, Campo Maior e outros pontos do Alentejo no agiram sob a influncia da

    C.G.T.? Que organizao tinham l os bolchevistas?

    E Coimbra, no agiu sob a influncia da C.G.T.?

    Se assim que procuram arranjar adeptos, contem connosco para esclarecer o proletariado.

    Temos ento Marinha Grande. Sim senhor agiu bem e toda a sua aco est dentro da Circular Confi-

    dencial que a C.G.T. enviou aos vrios pontos do pas. Absolutamente dentro dessa Circular.

    Em Marinha Grande existiam dois rgos que se entenderam para a ecloso do movimento. Aceitando,

    honestamente, que a influncia bolchevista fosse ali maior do que a cegtista, pergunta-se: mesmo assim,

    quem proporcionou organizao da Marinha Grande os elementos materiais para ela poder desenvolver

    tal raio de aco? E no foram com esses elementos materiais que o proletariado da Marinha Grande pde

    A C.G.T., os chefes bolchevistas

    e o movimento de 18 de Janeiro

    Redaco de A Batalha

  • tomar conta do posto da guarda, fazer a respectiva apreenso de 12 espingardas, munies e uma metralha-

    dora ligeira, e em seguida ficar de posse da vila durante algumas horas?

    Repetimos: quem forneceu esses elementos materiais?

    A C.G.T. ou os bolchevistas?

    Lrias temos lido muitas; obras que no as vemos.

    Um dia, a histria dir como agiram os chefes comunistas para o movimento de 18 de Janeiro. De

    longe, por causa da cheia

    E tambm havemos de saber com que elementos materiais contavam; elementos que noutras ocasies

    tm sido defendidos por eles com calor.

    Teria certa graa at se fossemos descobrir que a maioria desses chefes haviam trabalhado no dia do

    aludido movimento e trado, por consequncia, a greve e as palavras de ordem do seu partido

    Infelizmente o movimento no correspondeu ao que se pretendia. Motivos? Vrios. Alguns podero so-

    frer a necessria rectificao, outros ainda por errada mentalidade dalgumas classes e ainda outras por cul-

    pa exclusiva dos chefes bolchevistas que tm a mania de anunciar os movimentos com tal antecedncia

    que as autoridades tomam logo posies Dizem eles: necessrio demonstrar a organizao revolucion-

    ria da classe trabalhadora; que de qualquer forma sabe agir.

    ptimo. Ns tambm assim pensamos, mas o que reconhecemos que em Portugal isso no possvel,

    por enquanto. E o exemplo no de hoje. No chamado 29 de Fevereiro os bolchevistas tiveram um

    exemplo frisante Fizeram uma revoluo de papis.

    De facto nunca se escreveu tanto.

    Chegou o momento prprio e, nada. Precisamente pelas medidas tomadas pelo Governo. Ora, o que ns

    queramos que os chefes comunistas compreendessem era isso.

    Em conjunto, h de facto organizaes revolucionrias que o podem fazer. Por exemplo, em Espanha, a

    C.N.T.. Ali sim que um governo, informado devidamente de que ia estalar uma revoluo e tendo a ousa-

    dia de dizer que a sufocaria em 20 minutos, teve de a enfrentar durante duas semanas, sob uma violncia

    desusada e onde os trabalhadores se bateram como lees.

    Em Portugal, possvel podermos citar alguns exemplos, isolados, como o da greve de Setembro de

    1920 dos ferrovirios do Sul e Sueste e alguns dos antigos movimentos da construo civil.

    Resta acrescentar que os citados movimentos da organizao espanhola so orientados pela corrente

    anarco-sindicalista, que no passou a fazer parte das velharias do sculo passado como o referido bo-

    letim diz. Bem pelo contrrio

    Quem queria levar o proletariado at possvel transformao social, numa obcecao de pasmar,

    eram os chefes bolchevistas. Esses sim, que so homens que aparecem sempre onde a massa se encontra,

    frente das suas brigadas de choque!...

    Para se avaliar bem da mentira de tal boletim; para se poder apreciar com serenidade e bom humor a

    sua prosa, basta dizer que Setbal data da proclamao da greve geral j no possua material algum, pois

    lhe havia sido apreendido dias antes e, por isso, como podia fazer anunciar com 12 horas de antecedncia, -

    com o estampido das bombas a greve em perspectiva?

    No vem os chefes bolchevistas que assim caiem no ridculo?

    No h o direito de se querer conquistar partidrios com essa forma de proceder.

    Depois, se foi a C.G.T. a culpada do fracasso do movimento, porque no puseram os chefes bolche-

    vistas, em p de guerra, toda a sua organizao? Porque que nos raros pontos da provncia onde a sua in-

    fluncia maior, no se observou a aco grevista? Assim que era: fazer vincular nitidamente a sua orga-

    nizao revolucionria!

    Porque (que) ainda essa aco se no observou em relao s classes que em Lisboa so por si agita-

    das?

  • Que fenmeno especial se teria produzido para no englobar, nas mesmas causas, a falta de aco de v-

    rias classes, quer as que se orientam bolchevisticamente?

    Bolas para tais processos de propaganda.

    Assim no vale snrs. chefes bolchevistas. Assim, onde est a lealdade?

    Se ela existisse, seria possvel afirmarem que Silves, a margem Sul do Tejo e Marinha Grande represen-

    tam a grande jornada do vosso partido? Seria possvel?

    A maioria revolucionria, quer de Silves, como da margem Sul do Tejo, como dos pontos do Alentejo

    que se manifestaram, cegtista. E toda a organizao operria consciente o sabe. S os bolchevistas di-

    zem o contrrio.

    Consequentemente, pois, ainda foi a C.G.T. que influi no maior nmero de pontos do pas onde a greve

    se levou a efeito.

    Isto incontestvel. E no podia deixar de ser assim, no s porque a C.G.T. quem mantem o maior

    raio de aco revolucionria, como foi de facto ela que trabalhou para o referido movimento com uma per-

    sistncia digna de nota.

    Os chefes bolchevistas no conseguem destruir esta verdade, por mais que se esforcem por

    empalmarem o movimento operrio, com os processos que atrs se citam.

    A C.G.T. continuar organizando o proletariado para novas lutas contra a legislao-fascista. O que se

    perdeu na luta passada, reorganizar-se-, e toda a restante organizao entrar em aco no momento prop-

    cio, rectificadas as causas que deram lugar a uma aco de massas menos intensa em 18 de Janeiro.

    O resto so cantatas dos chefes bolchevistas, que no conseguem embalar as massas proletrias.

    Em A Batalha (clandestina), srie III, n 1, de Abril de 1934. (A grafia do texto foi actualizada).

    Aqui: http://colectivolibertarioevora.files.wordpress.com/2013/01/batalha-abril-de-1934.pdf

  • Dois homens, dois operrios corticeiros participantes nessa luta, deram-nos o ensejo de concretizar tal objectivo e, mesmo distncia de 46 anos, dar a notcia.

    So eles: Francisco Nicolau, que na altura foi julgado e condenado revelia, mas teve a felicidade e a inteligncia de poder fugir s masmorras do fascismo e viver em liberdade a poca do salazarismo; e Manuel Pessanha, que cumpriu 12 anos de priso em Angra do Herosmo e Tarrafal. Para alm da partici-pao activa no dia 18 de Janeiro, algo de comum uniu estes dois homens: ambos conseguiram fugir para a serra. Por l andar uns dias e refugiar-se em Espanha algum tempo.

    Depois de regressar de Espanha andei de terra em terra, mas nunca permanecendo muito tempo em qualquer delas. A localidade onde estive mais tempo foi Ponte de Sor. Fixei-me alguns anos e constitui fa-mlia. Depois, morei em Sacavm, Lisboa, Barreiro, Grndola e, por ltimo, definitivamente na Cova da Piedade.

    Quanto ao Manuel Pessanha acabou por ser apanhado numa vila do Alentejo, onde se tornou popular e facilmente a polcia o localizou. Foi julgado e enviado, com outros camaradas, para o Tarrafal onde conse-guiu sobreviver. Reside, actualmente, em Silves.

    Comunistas e anarquistas a mesma luta No movimento do 18 de Janeiro, em Silves, os anarquistas estavam organizados por um lado e os comu-

    nistas por outro lado mas, apesar dessa diviso, ambas as partes colaboravam e procediam mesmo distri-buio conjunta de panfletos. Existia um comit de ligao com Lisboa e os dois grupos mantinham os contactos atravs desse comit, que integrava, entre outros: Domingos Passarinho, Manuel Pessanha e Aba-tino Lus da Rocha.

    Na noite de 17 de Janeiro reunimo-nos, comunistas e anarquistas, no campo, debaixo das rvores para acertarmos definitivamente os nossos planos de aco. Nessa mesma noite foram cortadas as ligaes com o exterior. Como o grupo encarregado dessa tarefa se tivesse esquecido de cortar alguns fios, eu, o Pessa-nha e outro camarada fomos incumbidos de tal misso.

    Completando as palavras de Chico Nicolau, o Manuel Pessanha recorda: J era dia quando cortmos os ltimos fios. Subi a uma alfarrobeira e com um cinto cortei a ligao.

    Lembro-me como se fosse hoje. Isolada a cidade, os trabalhadores puseram o plano em marcha. A no chegada do comboio correio, s 7 horas, estao de Silves constitua o sinal verde para o

    comeo da luta. Era o indicativo de que a revoluo estava na rua, em Lisboa, que os ferrovirios tinham aderido e que os trabalhadores poderiam tomar a cidade.

    A propsito de uma efemride que se aproxima

    O 18 de Janeiro em Silves

    Alfredo Canana (*)

    Acerca da organizao da greve revolucionria de 18 de Janeiro de 1934, em Silves, e das razes porque se gorou a tomada da cidade pelos trabalhadores, tal como acontecera na Marinha Grande, pouco se sabe. Apenas os que viveram os acontecimentos conservam na memria os factos, enquanto os mais curiosos os conhecem por relatos parciais e at mistificadores sados na imprensa burguesa da poca..

    H, no entanto, motivos que merecem notcia mais circunstanciada, de modo a per-mitir a correco de certas verdades ditas oficiais, sobre o que na realidade se passou em Silves no dia 18 de Janeiro.

  • E o comboio no chegou. Os operrios assaltaram o edifcio da Associao de Classe dos Operrios Cor-ticeiros, encerrada pelos fascistas e convidaram a populao a ocup-la. Seguidamente dirigiram-se para o quartel da GNR, disposto a tom-lo de assalto, quando chegou a notcia de que o comboio estava na estao. Tinha chegado com enorme atraso. Masi alguns minutos bastariam para que os trabalhadores concretizassem a ocupao do quartel da GNR, onde os soldados daquela corporao se tinham barricado. Existiam bombas suficientes para os assustar e lev-los a render-se.

    Nas palavras de Manuel Pessanha, os ferrovirios traram, naquela poca, o movimento operrio ao con-dicionar a sua adeso greve revolucionria participao dos homens do reviralho (conspiradores que tinham como nico objectivo o simples retorno s instituies da democracia burguesa), os quais promete-ram um apoio que no chegou a aparecer.

    O traidor Fernando Boi escapou e denunciou Na jornada de luta do 18 de Janeiro houve apenas um traidor em Silves; um nico operrio que foi traba-

    lhar nesse dia. Chamava-se Fernando Francisco da Silva, mas era mais conhecido por Fernando Boi. Francisco Nicolau conta-nos como reagiram os trabalhadores em luta quando souberam que esse trnsfu-

    ga, ao servio do salazarismo, estava na fbrica do Pinheirinho, a trabalhar: Fomos todos l para correr com o tipo, este apercebeu-se e tentou fugir por uma janela, mas depressa foi

    apanhado. O Manuel Pessanha tentou intimid-lo, com uma pistola. Houve tiros. O fulano estava armado, tentou disparar, mas a pistola encravou-se. O Pessanha ainda disparou um tiro, mas no lhe acertou, foi ento que pularam sobre ele alguns camaradas e lhe demos uma valente sova. Pensmos, ainda, liquid-lo, mas ou por falta de coragem ou medo das consequncias, o tipo safou-se e acabou por denunciar muitos camaradas.

    Passadas algumas dezenas de anos, Manuel Pessanha acha que o tipo deveria ser liquidado: Se o tipo morresse ali aos meus ps ningum tinha visto, era muita a gente que nos rodeava. O gajo tinha

    ficado ali e no fazia falta a ningum. Um traidor que leva os camaradas priso, no olhando pelos filhos de cada um, um indivduo que no tem o direito de viver em sociedade.

    Espalhada a notcia da chegada do comboio, o calor revolucionrio arrefeceu um pouco, mas o esprito de luta proletria manteve-se vivo. A GNR ao tomar conhecimento de que a revoluo falhara passou logo ao ataque a bater e a prender a torto e a direito. Foram muitos os indivduos presos, mas apesar disso ningum retomou o trabalho. Nem com medidas repressivas. Durante 21 dias as fbricas mantiveram-se encerradas por ordem do ditador Salazar e seus lacaios. S depois da priso de Verglio Barroso, devido a denncia, foi dada ordem aos industriais para reabrirem as portas das fbricas.

    Foram 21 dias de luta clandestina, de perseguies, e de sofrimento, sofrimento que para muitos deles se estendeu at s prises atlnticas de Angra do Herosmo e do Tarrafal.

    Em alternativa ao fracasso do movimento revolucionrio, os operrios tinham acordado transformar os acontecimentos numa greve para protestar contra o assalto dos sindicatos pelo salazarismo, mostrando assim o seu descontentamento pela fascizao das organizaes dos trabalhadores.

    Isso aconteceu em Silves, durante 21 dias. Primeiro pelo no dos trabalhadores em pegar ao trabalho, depois pelo lock-out imposto aos industriais pelo governo fascista.

    O Sculo aludia na sua edio de 21 de Janeiro que as autoridades administrativas, em oficio-circular comunicaram aos industriais que, por ordem superior, no lhes era permitido admitir ao trabalho os operrios que no compareceram ao servio no dia da greve revolucionria.

    Como a adeso foi total (excluindo o j citado Fernando Boi), toda a populao operria corticeira sofreu os efeitos da paralisao das fbricas durante trs semanas.

    Algumas questes a corrigir em defesa da verdade Para os estudiosos ou mesmo os curiosos da histria, algumas questes urge corrigir, na defesa da verda-

    de dos factos, sobre o que se passou em Silves. A primeira verdade a corrigir prende-se com a maneira como os acontecimentos surgem na imprensa

    burguesa da poca, nomeadamente O Sculo, ento dominado pela famlia Pereira da Rosa, o jornal que mais espao ocupou sobre o 18 de Janeiro e mais dio vomitou contra os trabalhadores em luta.

    Assim, no nos admiremos encontrar na edio de 19 de Janeiro algumas dessas verdades salazarentas que O Sculo noticiou:

  • Hoje, de manh (18 de Janeiro) apareceram nos lugares mais frequentes, alguns grupos de operrios corticeiros que tinham abandonado o trabalho.

    A GNR estabeleceu, porm, um servio de patrulhas, nas ruas e locais mais concorridos e a cavalaria e infantaria postaram-se, principalmente, nas embocaduras das ruas, que davam acesso aos respectivos quar-tis e dissolveram os ajuntamentos.

    No houve manifestaes. A autoridade administrativa afixou um edital a convidar os proprietrios dos estabelecimentos que, com

    receio de qualquer acontecimento grave, os tinham encerrado, a reabrirem as portas, o que foi, prontamen-te, feito.

    De resto, poucos estabelecimentos tinham as suas portas fechadas. O mesmo edital estabelece que no permitido o trnsito, nas ruas, depois das 21 horas a no ser em casos especiais.

    A realidade, porm, desmentiu algumas dessas verdades, como tambm a do jornal citar que tm sido feitas prises de alguns elementos considerados agitadores ou ligados aos extremistas. Quando se sabia que o nmero de prises, somente em Silves, atingia mais de uma centena de trabalhadores, alcunha-dos pelo Sculo como agitadores e ligados aos extremistas.

    A outra verdade que me parece oportuno corrigir prende-se com o comportamento dos comunistas de Silves antes e depois dos acontecimentos e tem origem em afirmaes de Verglio Barroso, contidas numa carta que escreveu a Jos Antnio Machado, includa no livro 18 de Janeiro de 1934 e alguns anteceden-tes

    Textualmente pode ler-se: E se os comunistas no metessem no seu seio alguns tarados no estariam aqui (priso de Angra do

    Herosmo) cinco deles, condenados entre 10 a 12 anos. Afirmo-o com conhecimento de causa. Estas palavras escritas em 1934 e vindas a lume em 1976 enxovalham a memria de alguns comunistas

    j falecidos (entre eles o meu prprio pai) ao mesmo tempo insultam camaradas ainda vivos, que por pudor se recusaram a revelar as razes porque os comunistas de Silves foram presos, nomeadamente Antnio Es-trela, um dos cinco da carta.

    Mas eu posso revelar, mesmo traindo o compromisso para quem me contou os factos e eles so claros, de quem denunciou os comunistas ou os comprometem, dando pistas s autoridades.

    Em 18 de Fevereiro O Sculo dava notcia da priso de Verglio Barroso e da apreenso de oito bom-bas e sete cartuchos de dinamite. Nesse mesmo dia Antnio Estrela avisado para comparecer no quartel da GNR. Como nada o ligasse ao Barroso foi confiante, mas a surpresa acolheu-o: ficou detido, Verglio Barroso tinha-o denunciado como possuidor de bombas, como se apurou depois.

    Manuel Pessanha tinha pedido a Antnio Estrela para lhe guardar, por pouco tempo, umas bombas na casa do cunhado e inadvertidamente ou opara assegurar que as bombas estavam em lugar seguro comuni-cou o caso ao Barroso e este no teve relutncia em denunciar Polcia onde estas se encontravam e o no-me do camarada comunista que as guardara. Isso valeu a Antnio Estrela 12 anos de priso. Mas, mesmo sentindo-se trado o ento jovem revolucionrio de Silves, no quis criar, quele que o traiu, problemas ain-da maiores no seu cativeiro.

    Mais se poderia evocar, mas o que aqui fica dito ilustra bem o que se passou em Silves, no dia 18 de Ja-neiro de 1934. Um acontecimento que a histria do movimento operrio nem sempre relata com o rigor que ele merece. Fala-se muito da Marinha Grande, mas tem-se esquecido evocar outras localidades, como Bar-reiro, Almada e Silves, onde o operariado teve igualmente altura do momento antifascista e alguns me-lhores filhos da classe operria, sofreram e morreram no Tarrafal, por participao na greve revolucionria.

    tempo de prestar homenagem a todos esses homens que lutaram e deram a vida pela defesa dos seus ideais e de os colocar no lugar exacto que merecem na histria.

    (1)Edio Regra do Jogo - 1978.

    (*)Texto publicado na edio do Dirio de Lisboa de 6 de Janeiro de 1980, pg. 9)

  • Segundo Ftima Patriarca, no faz sentido referir o 18 de Janeiro exclusivamente na Marinha Grande,

    como o fizeram ao longo dos anos, tanto a verso oficial do governo como a verso do PCP, ao destacarem

    quase unicamente o que se passou nessa vila, os vidreiros e a liderana comunista. Ao considerar que se

    deve recolocar o 18 de Janeiro na sua dimenso histrica exacta enquanto movimento operrio insur-

    reccional, que visava a reconquista das liberdades sindicais, a par do derrube do regime do Estado Novo,

    esta autora mostra que o movimento operrio insurreccional tambm teve expresso noutras localidades

    para alm da Marinha Grande em particular, em Lisboa, Coimbra, Leiria, Barreiro, Almada, Martingan-

    a, Silves, Sines, Vila Boim (Elvas), Algoz-Tunes-Funcheira.

    Por outro lado, o movimento gerou-se e desenvolveu-se com o concurso das duas principais correntes

    sindicais a anarquista e a comunista e com o envolvimento dos sindicalistas socialistas (Federao das

    Associaes Operrias) e da corrente sindical autnoma (Comit das Organizaes Sindicais Autnomas).

    Alm disso, demonstrou que a greve geral se deveria desencadear em paralelo e em simultneo com uma

    revolta militar e poltica reviralhista que no chegou a sair rua, devido represso policial que se de-

    sencadeou logo em Novembro de 1933.

    Faz assim sentido referir, entre outros casos, o que aconteceu em Coimbra, onde rebentaram duas bom-

    bas na Central Elctrica dos Servios Municipalizados, colocadas por indivduos ligados CGT anarquista,

    englobados no Comit Sindicalista Revolucionrio (CSR), na noite de 17 para 18 de Janeiro de 1934. Em

    Coimbra, o plano envolveria a destruio da linha-frrea do Choupal e a demolio de um posto de trans-

    formao de energia elctrica no Lindoso, em Anadia, atravs de seis bombas, enviadas para Coimbra e

    escondidas na carvoaria de Manuel dos Santos.

    Para a aco de Anadia, Raul Ferreira Galinha deslocou-se a Coimbra para receber duas bombas de Ab-

    lio da Encarnao Pereira, manipulador de massas da Fbrica Triunfo de Coimbra e membro da comisso

    administrativa do Sindicato dos Operrios de Massas e Bolachas, que tinha guardado em sua casa o materi-

    al explosivo. De regresso quela vila, Raul Galinha entregara as bombas a Augusto Duarte Reis, mas, ao

    deslocar-se de novo a Coimbra, no dia 17 de Janeiro, foi preso, denunciado por telefone PSP dessa cidade

    pelo administrador do Concelho de Anadia. Este informara a polcia da deteno de um motorista de praa,

    Edmundo, que disse ter conduzido um indivduo a uma rua prxima do Palcio de Justia de Coimbra, on-

    de este tinha recebido dois embrulhos de Ablio da Encarnao Pereira.

    Entretanto, duas horas antes da priso de Raul Galinha, Ablio da Encarnao Pereira tinha ido buscar ao

    estabelecimento de Manuel dos Santos, em Coimbra, as bombas de rastilho destinadas sabotagem da

    Central Elctrica dessa cidade. Pelas 22 horas desse dia, teria havido uma concentrao de grevistas ligados

    ao CSR no Alto de Santa Clara para distribuio de proclamaes de greve e, pela meia-noite, alguns des-

    tes, entre os quais se contou o barbeiro Arnaldo Simes Janurio que anteriormente tinha ido buscar a Lis-

    boa dez bombas de choque, deslocaram-se a casa de Joo Gomes Jacinto. Este entregou um revolver a Ber-

    nardo Casaleiro Pratas, operrio dos Servios Municipalizados de Coimbra que, juntamente com o carpin-

    teiro Jos Alexandre e o pedreiro Jos Ventura Paixo, sabotaram os transformadores de corrente da Unio

    Elctrica Portuguesa, colocando duas bombas com cerca de nove quilos, que rebentaram s 4,30 horas da

    madrugada de dia 18 de Janeiro, deixando Coimbra s escuras.

    O 18 de Janeiro de 1934 em Coimbra

    Irene Pimentel (*)

  • A PSP de Coimbra acabaria por deter cerca de 80 pessoas, entre as quais se contaram 18 indivduos do

    Comit Sindicalista Revolucionrio (CSR), na sua maioria ligados (CGT) anarquista, por participao

    directa no movimento de 18 de Janeiro de 1934. Entre os presos, contaram-se todos os participantes j re-

    feridos, bem como, de Anadia, Pedro Ferrer Catarino, e de Coimbra, o padeiro Manuel Rodrigues da Cu-

    nha Maia, presidente do Sindicato dos Manipuladores de Po de Coimbra, bem como os militantes da CGT

    Joaquim Roque, Joaquim, Duarte e Jlio Ferreira, Jos Librio do Nascimento, Manuel dos Santos, Jos

    Fernandes Ferreira, e os sapateiros Antnio Ferreira, Armando Nogueira de Figueiredo e Jos de Almeida.

    Em 18 de Dezembro de 1933, tinham entretanto sido detidos Cunha Melo, ligado aos anarquistas, bem co-

    mo Jos Augusto Frutuoso e lvaro Pinto Teixeira, do PCP.

    As penas a que seriam sentenciados os principais implicados nos acontecimentos em Coimbra, pelo

    TMT instalado no forte da Trafaria, sob a presidncia do coronel Costa Macedo, assessorado pelo coronel

    Mouzinho de Albuquerque, seriam pesadssimas. Condenado a 10 anos, Raul Galinha cumpriria a pena no

    forte de Angra do Herosmo, at ser libertado em 1944, embora ficando em residncia fixa nessa cidade

    aoriana, enquanto Ablio da Encarnao Pereira apenas seria solto em Abril de 1949. Jos Alexandre foi

    condenado a 18 anos, enquanto Bernardo Pratas e Arnaldo Janurio foram sentenciados a 20 anos. Enviado

    para o Tarrafal, este ltimo morreria nesse campo de concentrao em 27 de Maro de 1938.

    Fonte e bibliografia:

    - Arquivo Histrico Militar, proc 441/74, Fernando Arajo Gouveia, volume II, fls. 553-555.

    - Ftima Patriarca, Sindicatos contra Salazar, A Revolta do 18 de Janeiro de 1934, Lisboa, Imprensa de

    Cincias Sociais, 2000, pp. 275-303.

    Aqui: http://irenepimentel.blogspot.pt/2010/04/o-18-de-janeiro-de-1934-em-coimbra.html

  • Almada quase parou no dia 18 de Janeiro de 1934, devido grande aderncia dos trabalhadores do con-

    celho greve revolucionria, organizada pela Confederao Geral do Trabalho e pela Comisso Intersindi-

    cal, as duas foras sindicais mais importantes na poca junto dos trabalhadores.

    A greve revolucionria deu-se devido tentativa fascista de liquidar as Associaes de Classe e os Sindi-

    catos Livres, para quebrar a fora e a unio dos operrios.

    Almada na poca era um concelho razoavelmente industrializado, possuindo uma classe operria bastante

    esclarecida e aguerrida na defesa dos seus direitos. Os anarco-sindicalistas (CGT) eram a fora poltica do-

    minante junto dos trabalhadores da Margem Sul que operavam nas fbricas de cortia e nos estaleiros na-

    vais.

    Na manh de 18 de Janeiro as fbricas de cortia Henry Bucknall, Rankins & Sons, Armstrong &

    Cook, de Almada, tal como a empresa moageira Aliana, do Caramujo, e os estaleiros navais na Mutela

    em Cacilhas, tiveram de encerrar devido ausncia dos seus assalariados. Solidrios com o movimento, os

    motoristas de autocarros e de automveis de aluguer, interromperam as suas funes das 10.30 s 14 horas.

    Como se no bastasse, no trabalharem, os operrios invadiram as ruas de Cacilhas, Cova da Piedade e Al-

    mada, provocando alguma agitao que seria reprimida pelas foras da ordem.

    Fracassada a greve revolucionria, a represso no se fez esperar. Cerca de vinte trabalhadores foram apon-

    tados como os grandes causadores da paralisao, sendo presos e conduzidos para Lisboa, sob forte escolta

    policial.

    A maioria dos presos pertenciam aos movimentos anarquistas, afectos CGT.

    Uma das consequncias desse movimento, foi a suspenso do semanrio O Almadense, e a priso do seu

    director, Felizardo Artur, o qual seria libertado trs semanas depois, do Forte da Trafaria, depois de se pro-

    var que no estava envolvido no movimento.

    Mas o ttulo O Almadense continuou proibido por largos anos.

    A grande contribuio dos trabalhadores almadenses nesta jornada de luta operria, ficou registada atravs

    do fabrico de engenhos explosivos e sua distribuio um pouco por todo o pas. A Fbrica de Bombas si-

    tuava-se na Cova da Piedade, num barraco alugado. Os principais responsveis da CGT por este sector

    eram, Manuel Augusto da Costa e Romano Duarte.

    As maiores vitimas do movimento foram Manuel Augusto da Costa, natural do concelho do Seixal e os al-

    madenses, Pedro Matos Filipe e Joaquim Montes, condenados a 14 anos de degredo.

    Comearam a cumprir as suas penas na Fortaleza de Angra do Herosmo, mas com o aparecimento do Cam-

    po do Tarrafal, a jia da coroa das foras repressivas, foram transferidos para a malfadada Ilha de Santiago,

    fazendo parte da primeira leva de prisioneiros que foram estrear o presidio.

    Texto extrado do livro "Almada e a Resistncia Antifascista", da autoria de Lus Alves Milheiro.

    Aqui: http://largodamemoria.blogspot.pt/2007/01/o-18-de-janeiro-em-almada.html

    O 18 de Janeiro em Almada