a vós confio - rosacruz amorc (rev)

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ARQUIVO TIBETANO Lama ou abade principal, com um pergaminho antigo, no interior de uma lamaseria da fronteira tibetana. (Foto da Expedio Fotogrfica da AMORC) 2

A VS CONFIO

Traduo: Ceslawa M. Nycz, F.R.C. Capa: Vilmar Lopes

COORDENAO E SUPERVISO Charles Vega Parucker, F.R.C. Grande Mestre

BIBLIOTECA ROSACRUZ ORDEM ROSACRUZ - AMORC GRANDE LOJA DO BRASIL

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Ttulo Original:

UNTO THEE I GRANTRevisada por Sri Ramatherio

3 Edio - Junho, 1988

Todos os Direitos Reservados pela ORDEM ROSACRUZ - AMORC GRANDE LOJA DO BRASIL Proibida a reproduo em parte ou no todo. Composto, revisado e impresso na Grande Loja do Brasil Rua Nicargua, 2620- Bacacheri Caixa Postal 307 - Tel. (041) 256-6644 80001 - Curitiba Paran

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SumrioPREFCIO....................................................................................................................7 A ESTRANHA HISTORIA DESTE LIVRO.................................................................7 AUTORIA.............................................................................................................14 INSTRUES PRELIMINARES.................................................................................18 LIVRO I........................................................................................................................20 DAS OBRIGAES RELATIVAS AO HOMEM COMO INDIVDUO..........................20 CAPITULO I: Da Ponderao.....................................................................................20 CAPTULO II: Da Modstia.........................................................................................21 CAPTULO III: Da Aplicao.......................................................................................23 CAPTULO IV: Da Emulao......................................................................................25 CAPITULO V: Da Prudncia.......................................................................................27 CAPITULO VI: Da Fortaleza.......................................................................................30 CAPITULO VII: Do Contentamento.............................................................................32 CAPITULO VIII: Da Temperana................................................................................34 LIVRO II.......................................................................................................................37 DAS PAIXES............................................................................................................37 CAPTULO I: Da Esperana e do Temor....................................................................37 CAPITULO II: Da Alegria e da Tristeza.......................................................................39 CAPTULO III: Da Clera............................................................................................41 CAPITULO IV: Da Piedade.........................................................................................43 CAPITULO V: Do Desejo e do Amor..........................................................................45 LIVRO III......................................................................................................................47 DA MULHER..............................................................................................................47 LIVRO IV......................................................................................................................50 DA CONSANGINIDADE OU DAS RELAES NATURAIS....................................50 CAPITULO I: O Esposo...............................................................................................50 CAPITULO II: O Pai.....................................................................................................52 CAPITULO III: O Filho.................................................................................................54 CAPTULO IV: Os Irmos...........................................................................................55 LIVRO V.......................................................................................................................56 DA PROVIDNCIA, OU DAS DIFERENAS ACIDENTAIS ENTRE OS HOMENS. .56 CAPITULO I: Sbios e Ignorantes..............................................................................56 CAPTULO II: Ricos e Pobres.....................................................................................58 CAPTULO III: Senhores e Serviais..........................................................................61 CAPTULO IV: Reis e Sditos.....................................................................................62 LIVRO VI .....................................................................................................................65 DOS DEVERES SOCIAIS...........................................................................................65 CAPITULO I: Da Benevolncia...................................................................................65 CAPITULO II: Da Justia.............................................................................................67 CAPTULO III: Da Caridade........................................................................................69 CAPTULO IV: Da Gratido.........................................................................................70 CAPTULO V: Da Sinceridade....................................................................................71 LIVRO VII.....................................................................................................................73 DA RELIGIO..............................................................................................................73 LIVRO VIII....................................................................................................................77 CONSIDERAES GERAIS SOBRE O HOMEM......................................................77 CAPITULO I: Da Estrutura do Corpo Humano............................................................77 5

CAPITULO II: Do Uso dos Sentidos...........................................................................79 CAPITULO III: Da AIma do Homem, sua Origem e seus Afetos................................81 CAPITULO IV: Do Perodo e Utilizao da Vida Humana..........................................85 LIVRO IX......................................................................................................................90 DO HOMEM CONSIDERADO EM RELAO A SUAS DEBILIDADES E SEUS EFEITOS.....................................................................................................................90 CAPITULO I: Da Vaidade............................................................................................90 CAPTULO II: Da Inconstncia....................................................................................93 CAPITULO III: Da Fraqueza........................................................................................97 CAPITULO IV: Da Insuficincia do Conhecimento...................................................100 CAPTULO V: Do Infortnio......................................................................................104 CAPITULO VI: Da Capacidade de Julgar.................................................................107 CAPTULO VII: Da Presuno..................................................................................111 LIVRO X.....................................................................................................................115 DAS AFEIES DO HOMEM, QUE SO PREJUDICIAIS PARA ELE E OS DEMAIS ...................................................................................................................................115 CAPITULO I: Da Cobia............................................................................................115 CAPITULO II: Da Prodigalidade................................................................................118 CAPTULO III: Da Vingana......................................................................................120 CAPTULO IV: Da Crueldade, do dio e da Inveja..................................................124 CAPITULO V: Da Opresso Interior.........................................................................127 LIVRO XI...................................................................................................................132 DAS VANTAGENS QUE O HOMEM PODE ADQUIRIR SOBRE O SEU SEMELHANTE..........................................................................................................132 CAPITULO I: Da Nobreza e da Honra......................................................................132 CAPTULO II: Da Cincia e da Cultura.....................................................................136 LIVRO XI...................................................................................................................139 DAS MANIFESTAES DO CARMA.......................................................................139 CAPTULO I: Da Prosperidade e da Adversidade....................................................139 CAPTULO II: Da Dor e da Enfermidade..................................................................142 ALGUMAS OBSERVAES SOBRE TERMOS USADOS NESTE MANUSCRITO ...................................................................................................................................143

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PREFCIOA ESTRANHA HISTORIA DESTE LIVRO

O prefcio e a introduo do texto original deste livro nos oferecem a seguinte e estranha histria sobre a origem, descoberta e traduo desta rara obra mstica. Um cavalheiro ingls que mantinha associao com pessoas de alto nvel visitou a China no perodo compreendido entre 1740 e 1750. H indcios de que ele fora encarregado pelo Duque de Derby, e outros interessados em exploraes histricas e geogrficas, de reunir dados e informaes especiais que no eram do conhecimento geral na poca. Este senhor ingls, evidentemente um brilhante erudito, lingista e cientista, conseguiu a amizade de vrios oficiais importantes. Enviou cartas semanais e bastante extensas, em forma de relatrios, ao grupo de homens da Inglaterra que o haviam encarregado da misso e, em vrias ocasies, enviou extensas cartas de carter pessoal ao Duque de Derby. Muitos desses documentos tornaram-se marcos de interesse histrico e geogrfico; alguns deles foram publicados em forma de livro em 1760, segundo revelam os registros de Londres. A carta mais importante enviada ao Duque de Derby poderia servir de prefcio para a presente obra, caso o leitor tivesse conhecimento das ocorrncias que a precederam. Esta missiva especial foi enviada ao Duque de Derby com o seguinte cabealho: "Pequim, 12 de maio de 1749." Nessa missiva, o cavalheiro ingls diz que havia tomado conhecimento de um incidente extremamente interessante e bem recente. Parte da carta dizia o seguinte: 7

Ao Conde de.. . Pequim, 12 de maio de 1749. "Na ltima carta que tive a honra de escrever a V. Excelncia, com data de 23 de dezembro de 1748, penso ter encerrado aquilo que tinha a dizer sobre a topografia e a histria natural deste grande imprio. Meu propsito era de descrever, nesta carta e em outras anotaes posteriores, as observaes que tive oportunidade de fazer sobre as leis, o tipo de governo, religio e costumes do povo. Mas houve uma ocorrncia notvel que passou a fazer parte das conversas dos literatos daqui e que poder fornecer um tema de especulaes para os eruditos da Europa... "Ligando-se China no Oeste, h o grande pas do Tibete, que alguns chamam de Barantola. Numa provncia desse pas, chamada Lassa, reside o grande Lama ou Sumo Sacerdote, que reverenciado e at adorado como um deus pela maioria das naes vizinhas. O grande prestgio atribudo a esta sagrada personalidade induz prodigiosos nmeros de pessoas religiosas a se deslocarem para Lassa, a fim de lhe prestarem homenagens e lhe oferecerem presentes, com o objetivo de receberem sua bno. Sua residncia um pagode ou templo de grande magnificncia, construdo no topo da montanha Poutala. O sop da montanha, com todo o distrito de Lassa, habitado por um incrvel nmero de Lamas de diferentes categorias e ordens, vrios dos quais tm grandes pagodes erigidos em sua honra. . . Todo o pas, como ocorre na Itlia, tem um grande nmero de sacerdotes; eles subsistem inteiramente por fora da abundncia de ricos presentes que lhes so enviados das mais remotas regies da Tartria, do imprio do Gro-Mogol e de todas as partes das ndias. Quando o Grande Lama recebe a 8

adorao do povo, elevado num altar magnfico, no qual se assenta com as pernas cruzadas numa almofada esplndida. Seus adoradores se prostram diante dele da maneira mais humilde e abjeta, mas ele no retribui com o menor sinal de respeito, nem mesmo aos maiores prncipes; apenas coloca a mo sobre suas cabeas e eles ficam inteiramente convencidos de que assim recebem o pleno perdo por seus pecados. O povo tem tambm a extravagncia de acreditar que o Grande Lama conhece todas as coisas, inclusive os segredos do corao; seus discpulos particulares, um nmero selecionado de aproximadamente duzentos, fazem o povo acreditar que ele imortal; que sempre que ele aparentemente morre, apenas muda de morada e passa a animar um novo corpo. "Os eruditos da China h muito defendem a opinio de que, nos arquivos deste grande templo, alguns livros muito antigos permaneceram ocultos por muitas eras; e o atual Imperador, que extremamente interessado na busca dos escritos da antigidade, ficou finalmente to convencido da probabilidade desta hiptese que decidiu tentar saber se poderia ser feita alguma descoberta neste campo. Com este objetivo, seu primeiro passo foi procurar uma pessoa eminentemente hbil em lnguas antigas. Finalmente, soube de um dos Hanlins, ou Doutores da primeira Ordem, cujo nome era Cao-Tsou, um homem de cerca de cinqenta anos de idade, de aspecto nobre e grave e grande eloqncia e que, devido amizade acidental com um certo Lama muito culto que residira em Pequim por alguns anos, tinha dominado completamente a lngua usada pelos Lamas do Tibete em suas conversas particulares. "Com estas qualificaes, o Hanlin partiu em sua jornada; e, para emprestar maior peso sua misso, o Imperador honrou-o com o ttulo de

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Cosao, ou Primeiro-Ministro. A isto ele acrescentou uma magnfica equipagem e um squito, com presentes para o Grande Lama e outros Lamas importantes, de imenso valor; enviou tambm uma carta escrita por suas prprias mos, com o seguinte Teor: (Segue-se aqui a carta escrita pelo Imperador da China em 1747, para o Grande Lama do Tibete, hoje conhecido como Dalai Lama, cuja sede governamental continua a ser Lasa, atualmente Lassa. Podemos facilmente visualizar a cena do mensageiro ou Primeiro-Ministro da corte do Imperador chegando em Lassa. Naturalmente vem nossa mente a histria da visita da Rainha de Sab ao Rei Salomo, com seus muitos escravos carregando centenas de preciosos presentes. difcil concebermos que tipos de presentes o Imperador da China poderia ter mandado ao rico e poderoso Grande Lama e que fossem capazes de interess-lo, pois o Grande Lama estava cercado de riquezas e luxos esplndidos, vindos de todas as partes do mundo. A carta endereada ao Grande Lama, entretanto, interessante. Seu teor, aqui publicado, provm dos registros oficiais.) "Ao Grande Representante de Deus. "O Grande Lama em Lassa. "Altssimo, Santssimo e Digno de adorao! "Ns, Imperador da China, Soberano de todos os Soberanos da terra, na pessoa de nosso mui respeitado Primeiro-Ministro Cao-Tsou, com toda a reverncia e humildade nos prostramos aos vossos sagrados ps, e imploramos para ns, nossos amigos e nosso imprio, vossa mui poderosa e misericordiosa bno.

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"Sentindo um forte desejo de pesquisar os registros da antigidade para aprender e resgatar a sabedoria das eras passadas; e tendo sido bem informados de que nos sagrados repositrios de vossa antiga e venervel hierarquia existem alguns livros valiosos, que por sua grande antigidade se tornaram para o povo em geral, e at mesmo para os estudiosos, quase que totalmente ininteligveis; para impedir, tanto quanto seja possvel e esteja em nosso poder, que eles sejam totalmente perdidos, julgamos apropriado autorizar e designar nosso Mui Sbio e respeitado Primeiro-Ministro Cao-Tsou para que ele leve a termo essa misso junto a Vossa Sublime Santidade. O objetivo e desejo de que lhe seja permitido ler e examinar os citados escritos; esperamos, por sua grande e rara capacidade, que ele possa interpretar tudo aquilo que possa encontrar, ainda que seja da mais obscura antigidade. Ns lhe havemos ordenado que se prostre a vossos ps, e que vos apresente os testemunhos de nosso respeito que possam conceder-lhe a recepo que desejamos." (Assinada pelo Imperador da China.) "No fatigarei V. Excelncia com os detalhes de sua jornada, embora ele tenha publicado uma extensa narrativa da mesma, em que abundam os mais surpreendentes relatos... Creio ser suficiente no momento dizer que, ao chegar naqueles sagrados territrios, a magnificncia de sua presena e a riqueza de seus presentes no deixaram de lhe propiciar sua imediata admisso. Foram-lhe concedidos aposentos no sagrado colgio, e ele foi assistido em suas pesquisas por um dos mais eruditos Lamas. Permaneceu ali perto de seis meses, durante os quais teve a satisfao de encontrar muitas peas valiosas da antigidade; de algumas delas ele retirou excertos muito curiosos...

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"Mas a pea mais valiosa que ele descobriu e que nenhum dos Lamas pudera interpretar ou compreender desde muitas eras, um completo sistema de instruo mstica escrita na lngua e nos caracteres dos antigos gimnosofistas ou brmanes. Ele traduziu esta pea em sua totalidade, embora, como ele mesmo confessou, no conseguisse transpor para o idioma chins a fora e sublimidade do original. Os critrios e opinies dos bonzos e dos sbios doutores esto muito divididos a este respeito. Aqueles que a admiram com maior intensidade gostam de atribu-la a Confcio, seu grande filsofo... Outros a tomam como obra de LaoKium, da seita Tao-ssee... H outros que, por alguns indcios e sentimentos que nela encontram, supem que tenha sido escrita pelo brmane Dandamis, cuja famosa carta a Alexandre o Grande foi registrada pelos escritores europeus. O prprio Cao-Tsou parece inclinado a concordar com estes, pelo menos ao ponto de pensar que se trata, realmente, da obra de algum brmane antigo; ele est totalmente persuadido, pelo esprito com que a pea foi escrita, de que no se trata de uma traduo. "Mas seja quem for o autor, o grande xito que tem a obra nesta cidade e em todo o imprio, a avidez com que ela lida por todos os tipos de pessoas, e os altos encmios que lhe so tributados, finalmente me levaram a tentar traduzi-la para o ingls, especialmente porque estou convencido de que seria um presente gratificante para V. Excelncia. Mas por uma coisa, entretanto, pode ser necessrio pedir desculpas, ou ao menos explicar; falo do estilo e forma em que fiz a traduo. Posso assegurar a V. Excia. que, quando comecei o trabalho, no tinha a menor inteno de faz-lo na forma em que o fiz; mas o sublime modo de pensar que se percebe na introduo, a grande energia de expresso e a conciso das sentenas, levaram-me naturalmente a esse tipo de estilo. 12

"Se assim como est, a obra vier a oferecer a V. Excia. algum ensinamento, considerar-me-ei extremamente feliz;em minha prxima carta continuarei meu relato sobre este povo e seu imprio." "Sou, etc. (Assinado por um eminente erudito ingls.) O privilgio de traduzir o antigo manuscrito foi concedido pelo Grande Lama ao Primeiro-Ministro, que passou seis meses no sagrado colgio traduzindo este e outros manuscritos que provavelmente viro luz em breve. Muitos professores e Altos Iniciados de grande sabedoria auxiliaram o Primeiro-Ministro; quando a tarefa foi completada, o manuscrito traduzido foi levado para o Imperador da China pelo Primeiro-Ministro. Ali, o cavalheiro ingls e seus associados de misso o examinaram e, com a permisso do Imperador da China e dos lingistas da corte, foi feita uma outra traduo, desta vez para o ingls, com o nico propsito de entregar a verso inglesa ao Conde de Derby, como explica a carta que apresentamos. To notvel foi essa traduo, e to incomuns as doutrinas e os ensinamentos nela contidos, que o Conde de Derby autorizou ou permitiu uma reproduo da traduo, em nmero limitado de exemplares. Estes foram bem encadernados e protegidos, sendo finalmente distribudos aos altos oficiais e dirigentes de vrias organizaes msticas secretas que ento existiam na Europa. Uma das cpias foi preservada nos arquivos de uma dessas Fraternidades desde ento, e foi usada como base de seus elevados e profundos ensinamentos. O mais alto dignitrio dessa Fraternidade percebeu, no faz muito 13

tempo, que o volume no poderia ser preservado seno por mais alguns anos, pois o antigo papel feito mo estava ficando amarelecido e quebradio. Acreditando que existiam centenas de estudantes sinceros das verdadeiras doutrinas do Tibete que gostariam de estudar esta obra rara, ele finalmente deu permisso oficial aos presentes editores para que reproduzissem o livro em sua forma moderna, sem exigir qualquer pagamento ou direitos autorais para si, na posio de proprietrio da obra, desde que a mesma fosse reproduzida em sua totalidade, sem modificaes de ortografia que pudessem alterar o verdadeiro significado de qualquer sentena ou pensamento. Foi assim que esta obra rara passou s mos de seus presentes editores e ora entregue aos leitores em sua forma moderna.

AUTORIAO leitor notar, na carta do cavalheiro ingls ao Conde de Derby, que h especulaes quanto ao autor do manuscrito original. O Grande Lama e seus associados afirmaram que o manuscrito estivera em seu poder e fora usado como base de seus ensinamentos desde 732 A.D. Eles quiseram dizer que os registros indicavam sua existncia naquela poca, mas que poderia ter estado na posse de alguns de seus Adeptos e Mestres, fora do Tibete, por muitos anos antes daquela data. Era natural que os tibetanos atribussem o manuscrito a um de seus grandes escritores, como Confcio ou Lao-Tse, mas luz da moderna pesquisa e, especialmente, luz de revelaes feitas em escavaes no Egito e em Jerusalm nos ltimos cem anos, e depois de 1749, quando o exemplar tibetano foi traduzido

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para o ingls, podemos perceber claramente que o manuscrito original no foi escrito por Confcio ou outro autor de seu tempo, de sua nao ou de suas crenas. Por exemplo: uma pessoa nascida no Tibete ou no interior montanhoso da sia no estaria familiarizada com rochas na praia e ondas em rebentao (Livro Primeiro, Cap. VI, Pargrafo 6) nem mencionaria criaturas como o crocodilo, que existe no Egito e no no Tibete. Existem mltiplas indicaes na obra, tal como apresentada nas pginas que se seguem, de que a maior parte foi escrita por Amenhotep IV, Fara do Egito, no perodo de 1360 a 1350 a.C, ou mais tarde, por algum de seus sucessores na grande escola de misticismo por ele fundada no Egito. A consulta a qualquer enciclopdia revelar o fato de que este Fara contrariou os ensinamentos dos sacerdotes e a adorao de dolos ao estabelecer uma religio mstica monotesta; todas as autoridades de histria da religio apontam para ele como o primeiro homem do mundo civilizado a proclamar a crena em um s Deus; com justia, ele foi considerado "o maior modernista de todos os tempos". Fundou um culto ou uma Fraternidade Secreta baseada nesta religio mstica, na cidade que mandou construir e denominou Aquetaton. Recentes tradues de escritos descobertos em paredes e colunas de seu templo mstico no Egito mostram, por exemplo, que ele foi o autor das belas passagens incorporadas Bblia Crist com o ttulo de "Salmo cento e quatro"; muitos escritos sagrados do Oriente foram definitivamente comprovados como provenientes de sua escola e Fraternidade. No h dvida de que cpias de suas doutrinas e ensinamentos usados no Egito daquele tempo chegaram a Jerusalm e outras partes do mundo pelo 15

xodo dos judeus; muitas provas foram encontradas demonstrando que os elevados ensinamentos msticos deste Fara do Egito e seus seguidores serviram de base para cultos e escolas como a dos Essnios, qual pertenceu o Mestre Jesus e que mais tarde evoluiu para uma fraternidade conhecida pelo nome de "Irmos da RosaCruz" ou os Rosacruzes citados por Lord Bulwer-Lytton em seu livro "Zanoni", e por muitos outros que se dedicaram a este tipo de pesquisa, como Francis Bacon, que foi o chefe da Ordem dos Rosacruzes em toda a Europa continental. A probabilidade desta autoria torna esta obra uma das mais importantes contribuies literatura sacra e uma das mais interessantes publicaes no campo dos ensinamentos msticos, que apareceu nos ltimos sculos. Reproduzimos a seguir a concesso e privilgio oficial para a publicao deste livro em forma moderna, pela organizao secreta cujo dirigente possui o nico exemplar completo que se conhece. Solicitamos a ateno dos leitores para as notas do tradutor a respeito de termos e frases usados neste trabalho, no final do ltimo captulo. Os editores desejam expressar seus permanentes agradecimentos e sua apreciao ao Sr. e Sra. J.B.C., de Vancouver, Canad, por sua valiosa ajuda na preparao desta obra. OS EDITORES San Francisco, Califrnia, U.S.A. Vinte de maio, mil novecentos e vinte e cinco.

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TAMB

OR CERIMONIAL Em um recesso do santurio interior, este Lama bate ritmicamente num tambor ornamentado, para convocar orao. (Foto da Expedio Fotogrfica da AMORC)

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INSTRUES PRELIMINARES

CURVAI vossa cabea ao p, habitantes da Terra! Permanecei silentes e recebei com reverncia estas instrues do alto. Onde quer que o Sol brilhe, onde quer que sopre o vento, onde quer que haja ouvidos para ouvir e mente para conceber, que se dem a conhecer os preceitos da vida, que as mximas da verdade sejam honradas e obedecidas. Todas as coisas provm de Deus. Seu poder no tem limites. Sua sabedoria para a eternidade, Sua bondade perdura para sempre. Ele est sentado em Seu trono no centro do universo e o hausto de Sua boca d vida ao mundo. Ele toca as estrelas com Seus dedos, e elas prosseguem jubilosamente em seu curso. Nas asas do vento Ele caminha e cumpre Sua vontade em todas as regies do ilimitado espao. Ordem, graa e beleza emanam de Suas mos. A voz da sabedoria fala em todas as Suas obras; mas a mente mortal no a compreende. A sombra do conhecimento mortal perpassa o crebro do homem como um sonho; ele v como se estivesse nas trevas; raciocina e se engana.

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Mas a sabedoria de Deus como a Luz do Cu; no requer a razo; Sua mente a fonte da verdade. Justia e misericrdia esperam diante de Seu trono; benevolncia e amor iluminam Suas feies para sempre. Quem se iguala a Deus em glria? Quem pode rivalizar com o TodoPoderoso em poder? Ter Ele algum igual em sabedoria? Poder algum ser comparado a Ele em bondade? No h nenhum outro diante Dele! Foi Ele, homem! quem te criou; tua presente situao na Terra foi estabelecida por Suas Leis; os poderes de tua mente so ddivas de Sua Bondade e as maravilhas de tua constituio so obra de Sua mo; tua Alma Sua Alma; tua conscincia, Sua conscincia. Ouve portanto Sua voz, pois cheia de graa; aquele que obedecer estabelecer em sua mente a Paz Profunda, e levar perene crescimento Alma que em seu corpo habita, estado aps estado, nesta Terra. Com estas instrues, portanto, A VS CONFIO A ECONOMIA DA VIDA O MESTRE

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LIVRO I DAS OBRIGAES RELATIVAS AO HOMEM COMO INDIVDUO

CAPITULO I: Da Ponderao

COMUNGA contigo mesmo, homem! e considera por que foste criado. Contempla teus poderes, contempla tuas necessidades e tuas relaes; desta forma descobrirs os deveres da vida e sers orientado em todos os teus caminhos No comeces a falar ou agir antes que tenhas pesado tuas palavras e examinado a direo de cada passo que pretendes dar; assim, a desgraa fugir de ti, e em tua casa a vergonha ser desconhecida; o arrependimento no te visitar, nem a tristeza pousar em tua face nesta vida e em muitas outras vidas futuras. O homem irrefletido no refreia sua lngua; fala a esmo e se embaraa na insensatez de suas prprias palavras. Assim como aquele que corre apressadamente e salta por cima de uma cerca pode cair num fosso que talvez haja do outro lado e ele no tenha visto, assim ocorre com o homem que se lana bruscamente ao sem ter considerado suas conseqncias e a compensao que a Lei exige. Escuta, portanto, a voz da Ponderao; suas so as palavras da sabedoria, e seus caminhos te conduzem segurana e verdade.

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CAPTULO II: Da Modstia

Quem s tu, homem! que te orgulhas de tua prpria sabedoria? Por que te gabas daquilo que adquiriste? O primeiro passo para a sabedoria saber que nasceste mortalmente ignorante; para que no sejas julgado insensato na opinio dos demais, rejeita o desatino de te julgares sbio em tua prpria mortalidade. Assim como um vesturio simples adorna melhor uma mulher formosa, tambm o comportamento modesto o maior ornamento da sabedoria interior. A fala do homem modesto d lustro verdade, a modstia de suas palavras absorve seu erro. Ele no confia em sua mortal sabedoria; pesa bem os conselhos de um amigo e deles colhe benefcio. Afasta seus ouvidos do louvor a si mesmo e nele no cr; o ltimo a descobrir suas prprias perfeies. Contudo, como o vu que reala a formosura, suas virtudes so destacadas contra a sombra que sua modstia sobre elas projeta. Mas contempla o homem vaidoso, observa o arrogante; ele se cobre com ricos atavios, caminha pela via pblica, lana os olhos ao redor e corteja a observao dos demais.

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Ele ergue orgulhosamente a cabea e menospreza os pobres; trata seus inferiores com insolncia e seus superiores, por outro lado, riem de seu orgulho e sua insensatez. Ele despreza o julgamento dos outros; confia em sua prpria opinio e se confunde. Est cheio da vaidade de sua imaginao; seu deleite est em falar e ouvir falar de sua pessoa o dia inteiro. Engole com avidez os louvores e o adulador por sua vez o devora.

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CAPTULO III: Da Aplicao

Como os dias que passaram se foram para sempre, e os dias futuros podero no chegar a ti no estado presente de teu ser, cabe a ti, homem! fazer uso do estado presente sem lamentar a perda do que j passou e sem depender demais do que ainda vir; pois nada podes saber de teus futuros estados, exceto o que tuas aes de agora disponham para eles. Este momento teu; o momento seguinte encontra-se no ventre do futuro e no sabes o que te pode trazer; a maturidade do que no nasceu est na observncia da Lei. Cada estado futuro aquilo que crias no presente. Tudo que decidires fazer, realiza-o imediatamente. No deixes para a tarde o que puderes realizar pela manh. A indolncia a me da carncia e da dor; mas o trabalho pelo Bem gera prazer. A mo da diligncia derrota a necessidade;a prosperidade e o sucesso acompanham o homem industrioso. Quem aquele que adquiriu riqueza, que elevou-se ao poder, ataviou-se com honras, de quem toda a cidade fala com louvor e que se coloca diante do rei em seu Conselho? Somente aquele que expulsou a indolncia de sua casa e disse: "Ociosidade, s minha inimiga."

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Ele cedo deixa o leito e tarde se recolhe; exercita a mente pela contemplao, o corpo pela ao e preserva a sade de ambos. O homem ocioso uma carga para si prprio, as horas lhe pesam na cabea; ele perambula e no sabe o que fazer. Seus dias passam como a sombra de uma nuvem; ele no deixa nenhum sinal que o recorde. Seu corpo adoece por falta de exerccio e, embora deseje agir, no tem poder para mover-se; sua mente est obscurecida; seus pensamentos, confusos; ele aspira pelo conhecimento mas no tem diligncia. Gostaria de comer a amndoa mas detesta o trabalho de quebrar sua casca. Sua casa est em desordem, seus servos desperdiam e tumultuam, e ele caminha para a runa; v tudo isto com seus olhos, ouve com seus ouvidos, sacode a cabea e deseja, mas no tem resoluo; e assim a runa cair sobre ele como um turbilho, e a vergonha e o arrependimento descero com ele ao tmulo. Contudo, chegar o dia em que tua Alma retornar dos Cus, juntar o p e o animar.

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CAPTULO IV: Da Emulao

Se teu corao tem sede de honradas, se teus ouvidos sentem prazer na voz do louvor, eleva teu Eu mortal do p de que foste feito; e eleva teu propsito a alguma coisa digna de encmios. O carvalho que ora estende seus ramos para o cu j foi apenas uma semente nas entranhas da terra. Esfora-te para ser o primeiro no teu ofcio, seja ele qual for;no permitas que nenhum outro te suplante no bom procedimento; contudo, no invejes os mritos alheios e aperfeioa teus prprios talentos. Abstm-te tambm de depreciar teu competidor por qualquer mtodo desonesto ou indigno; antes, esfora-te para te elevares acima dele unicamente tornando a ti mesmo superior; assim, tua luta pela superioridade ser coroada com honra, ainda que no o seja pelo triunfo. Pela emulao virtuosa o esprito do homem exaltado; ele anseia pela fama e se rejubila como o cavalo que se apresta para a corrida. Ele se ergue como a palmeira, a despeito da opresso; como a guia no Armamento celeste, voa nas alturas e fixa o olhar nas glrias do Sol. Os exemplos de homens eminentes povoam sua viso noite ; seu deleite segui-los durante todo o dia. Ele concebe grandes projetos, rejubila-se em sua execuo, seu nome alcana os confins do mundo.

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Mas o corao do homem invejoso fel e amargura; sua lngua cospe veneno; o sucesso de seu vizinho destri seu repouso. Ele senta-se aflito em sua alcova; o bem que a um outro ocorre para ele representa um malefcio. O dio e a malevolncia se alimentam de seu corao e ele no tem descanso. No sente no peito o amor pelo bem e por isto julga que seu semelhante assim tambm. Empenha-se em rebaixar os que so melhores que ele, e a tudo que fazem empresta uma interpretao maldosa. Fica em viglia e medita sobre maldades; mas a repulsa dos homens o persegue e ele esmagado como a aranha em sua prpria teia.

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CAPITULO V: Da PrudnciaOuve as palavras da prudncia, atenta para seus conselhos e guarda-os em teu corao; suas mximas so universais e todas as virtudes nela se apiam; ela guia e senhora da vida humana. Pe um freio em tua lngua; pe uma guarda diante de teus lbios, para que as palavras de tua boca no destruam tua paz. Que aquele que zomba do coxo no venha tambm a coxear; aquele que fale com prazer das faltas alheias ouvir falar de suas prprias faltas com amargura no corao. Da fala excessiva vem o arrependimento, mas no silncio existe segurana. O homem tagarela um incmodo para a sociedade; os ouvidos esto fartos de sua loquacidade, a torrente de suas palavras inunda a conversao. No te gabes de ti mesmo, porque isto lanar desprezo sobre ti; nem zombes de outros, pois isto perigoso. A pilhria mordaz o veneno da amizade, e aquele que no refrear a lngua ter dificuldades. Encontra para ti as acomodaes adequadas tua condio; contudo, no gastes o mximo que possas; que a previdncia de tua juventude seja um conforto em tua velhice.

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Que teus prprios afazeres ocupem tua ateno; deixa os cuidados do Estado a quem o governa. Que tuas recreaes no sejam caras, para que o esforo de adquiri-las no exceda o prazer de sua fruio. No deixes que a prosperidade arranque os olhos da circunspeco, nem que a abundncia corte as mos da frugalidade; aquele que se entregar por demais s superfluidades da vida viver para lamentar a falta do que necessrio. Da experincia dos demais adquire sabedoria e de seus sentimentos aprende a corrigir tuas prprias falhas. No confies em homem algum antes de o teres testado; contudo, no desconfies sem razo, pois isto seria intolerncia. Mas quando tiveres provas de que um homem honesto, guarda-o em teu corao como um tesouro; considera-o como uma jia de inestimvel valor. Recusa os favores do homem mercenrio ;eles sero uma armadilha para ti; jamais te verias livre de obrigao. No utilizes hoje o que possas necessitar amanh; nem deixes ao acaso aquilo que a previdncia possa te dar ou que o cuidado possa evitar. Mas no esperes nem mesmo da prudncia um triunfo infalvel; pois o homem no sabe o que a noite pode trazer.

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Nem sempre o tolo desafortunado e nem sempre o homem sbio infalvel; contudo, nunca o tolo teve o deleite completo, nem o sbio foi inteiramente infeliz.

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CAPITULO VI: Da Fortaleza

Perigos, infortnios, necessidades, dores e padecimentos, isto o que, a mais ou a menos, aguarda com certeza todo homem que vem ao mundo. Cabe a ti, portanto, filho da calamidade! fortalecer desde cedo tua mente, com coragem e pacincia, para que possas suportar com a devida resoluo a parte dos males humanos que te espera. Assim como o camelo suporta o labor, a cancula, a fome e a sede pelos desertos de areia, e no sucumbe, assim a fortaleza do homem o sustenta atravs de todos os perigos. O esprito nobre desdenha as adversidades da fortuna; sua grandeza de alma est em no desfalecer. Ele no deixa que sua felicidade dependa dos sorrisos da sorte e, por isto, no desanima quando ela lhe franze o cenho. Como a rocha na praia, ele se mantm firme, e a rebentao das ondas no o perturba. Ele ergue a cabea como uma torre sobre a colina, e as flechas da fortuna caem a seus ps. No momento do perigo, a coragem de seu corao o sustenta e a firmeza de sua mente o mantm inclume. Ele enfrenta os males da vida como o homem que vai para uma batalha e retorna com a vitria nas mos. 30

Diante da presso das desgraas, sua calma alivia seu peso e sua constncia as sobrepuja. Mas o esprito pusilnime do homem timorato o atraioa, entregando-o vergonha. Encolhendo-se diante da pobreza, curva-se at a mesquinhez; e, ao suportar documente os insultos, abre caminho injria. Assim como os juncos que so sacudidos pela brisa, a sombra do mal o faz tremer. Em horas de perigo ele fica embaraado e confuso; em dias de infortnio cai e sua Alma arrebatada pelo desespero.

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CAPITULO VII: Do Contentamento

No esqueas, homem! que tua presente estadia na Terra foi decretada pela sabedoria do Eterno que conhece teu corao, v a futilidade de todos os teus desejos e, muitas vezes, por misericrdia nega tuas splicas. Contudo, para todos os desejos razoveis, para todos os esforos honestos, Sua benevolncia estabeleceu uma probabilidade de sucesso na natureza das coisas. Na inquietude que sentes, nos infortnios que deploras, busca a raiz de onde brotam tua prpria insensatez, teu prprio orgulho, tua prpria fantasia desvairada. No murmures, portanto, contra o que Deus dispe, mas corrige, isto sim, teu prprio corao; nem digas para ti mesmo: se eu tivesse riqueza, ou poder, ou lazer, seria feliz; porque deves saber que todas estas coisas levam a seu possuidor suas inconvenincias peculiares. O homem pobre no enxerga os aborrecimentos e ansiedades dos ricos, no sente as dificuldades e perplexidades do poder, nem conhece o fastio do cio; por isto lamenta sua prpria sorte. No invejes a aparncia de felicidade de qualquer homem, pois no conheces suas mgoas secretas.

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Estar satisfeito com pouco, eis a grande sabedoria; aquele que aumenta suas riquezas aumenta seus cuidados; mas a mente satisfeita um tesouro oculto que no atingido pelas calamidades. No entanto, se no consentes que as sedues da fortuna te roubem a justia, a temperana, a caridade e a modstia, nem as riquezas te faro infeliz. Disto podes aprender que a taa da felicidade, pura e sem misturas, no de modo algum uma bebida destinada ao homem mortal. O Bem o caminho que Deus lhe ordenou que percorresse, com a felicidade como prmio, ao qual ningum pode chegar antes de terminar seu percurso para receber sua coroa nas manses da eternidade.

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CAPITULO VIII: Da Temperana

A aproximao maior que podes ter da felicidade gozar o dom celestial da compreenso e da sade. Se possuis estas bnos e desejas preserv-las at a velhice, evita as sedues da Volpia e foge de suas tentaes. Quando a Volpia expe seus manjares sobre a mesa, quando seu vinho cintila na taa, quando ela sorri para ti e te persuade a seres alegre e feliz, esta a hora do perigo; que tua Razo esteja firme e vigilante. Porque se escutas as palavras da Adversria, s enganado e trado. A alegria que ela te promete se transforma em loucura, e seus prazeres levam a enfermidades e morte. Lana os olhos sobre sua mesa, examina seus convivas e observa os que foram seduzidos por seus sorrisos e ouviram suas tentaes. No esto empobrecidos? No esto enfermios? No esto sem nimo? Suas breves horas de jocosidade e excessos so seguidas de tediosos dias de dor e desencanto. A Volpia corrompeu e estragou seus apetites e eles agora no podem gozar de seus mais encantadores atrativos; seus partidrios converteram-se em suas vtimas; so estas as conseqncias justas e naturais que Deus ordenou, na constituio das coisas, como punio para aqueles que abusam de Seus dons.

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Mas quem aquela que com graciosos passos e com atitude airosa caminha pela plancie? A rosa ps seu rubor em sua face, a doura da manh est em seu hlito; a alegria, temperada de inocncia e modstia, brilha em seus olhos e ela canta o jbilo de seu corao enquanto caminha. Seu nome Sade. Ela filha da disciplina, que a gerou na Temperana, cujos filhos habitam nas montanhas que se estendem pelas regies setentrionais de San Ton Hoe. Eles so bravos, ativos e vivazes; compartilham de todas as belezas e virtudes de sua irm. O vigor circula por seus nervos, a fortaleza est em seus ossos, o trabalho o seu prazer durante todo o dia. As atividades de seu pai excitam seus apetites, e os re-pastos de sua me os retemperam. O combate s paixes seu deleite; dominar hbitos nocivos sua glria. Seus prazeres so moderados e por isto duradouros; seu repouso breve, porm, profundo e sem perturbaes. Seu sangue puro, sua mente serena, e o mdico no conhece o caminho de sua casa. Mas a segurana no habita com os filhos do homem, nem se pode encontrar segurana dentro de seus portais.

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Observa como eles so expostos a novos perigos do exterior, enquanto um traidor interno procura entreg-los. Sua sade, fora, beleza e atividade despertaram o desejo no seio do Amor lascivo. A paixo libidinosa posta-se em sua alcova, corteja os seus olhares e espalha suas tentaes. Seus membros so macios e delicados, sua roupagem solta e convidativa, a devassido fala por seus olhos e em seu seio aconchega-se a Tentao. Ela lhes acena com as mos, procura seduzi-los com sua aparncia e, pela suavidade de sua lngua, empenha-se em iludi-los. Ah! foge de suas sedues, fecha os ouvidos a suas palavras de encantamento. Se acatares a languidez de seu olhar, se ouvires a suavidade de sua voz, se ela te enredar em seus braos, h de te prender com suas correntes para sempre. A ela se seguiro a vergonha, a doena, a penria, a preocupao e o arrependimento. Debilitada pelos folguedos, mimada pela luxria, esgotada pela preguia, a fortaleza abandonar teus membros e a sade deixar teu corpo. Teus dias sero poucos e sem glria; teus sofrimentos sero muitos e no encontraro compaixo.

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LIVRO II DAS PAIXES

CAPTULO I: Da Esperana e do TemorAS promessas da Esperana so mais doces que a rosa em boto, e muito mais sedutoras em sua expectativa, mas as ameaas do Medo so uma cruz sobre a qual sacrificada a rosa. Entretanto, no deixes que a Esperana te enfeitice, nem o Medo te impea de fazer o que correto; assim estars preparado para enfrentar todos os acontecimentos com a mente equilibrada. Os terrores, inclusive da morte, no trazem proveito; aquele que no comete o mal nada tem a temer. Em todos os teus empreendimentos, permite que uma certeza razovel anime teus esforos; se desesperares do sucesso, no triunfars. No aterrorizes tua Alma com vos temores, nem deixes que teu corao sucumba por causa dos fantasmas da imaginao. Do Medo provm a desgraa; aquele que tem esperana, ajuda a si mesmo. Assim como o avestruz enterra a cabea quando perseguido, mas esquece o corpo, assim os temores do covarde o expem ao perigo.

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Se acreditas que uma coisa impossvel, teu desnimo assim a faz; mas aquele que persevera predomina sobre todas as dificuldades. A esperana v agrada ao corao do insensato; mas aquele que sbio no a persegue. Em todos os teus desejos, permite que a razo te acompanhe, e no fixes tuas esperanas alm dos limites da probabilidade; desta forma, o triunfo acompanhar tua empresa, teu corao no ser humilhado pelas decepes.

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CAPITULO II: Da Alegria e da Tristeza

No deixes que teu contentamento seja extravagante a ponto de embriagar tua mente, nem que tua tristeza seja pesada a ponto de deprimir teu corao. Este mundo no comporta um bem to arrebatador, nem inflige um mal to grave, que possa te elevar demasiado acima ou te fazer afundar demasiado abaixo do equilbrio da moderao. Olha! ali adiante encontra-se a Casa da Alegria. Ela est pintada por fora e parece divertida; podes perceber isto pelo contnuo rudo de risos e exultao que dela se faz ouvir. Sua proprietria est porta e chama em voz alta todos os transeuntes; ela canta e clama, e ri sem cessar. Ela os convida a entrar e provar os prazeres da vida, dizendo-lhes que em nenhum outro lugar seno ali podem eles ser encontrados. Mas no cruzes sua porta sem cuidado; no te associes com os que freqentam essa casa, indevida e imoralmente. Eles chamam a si mesmos filhos da Alegria, riem e parecem cheios de prazer; mas a loucura e a insensatez marcam todos os seus atos. Esto de mos dadas com a iniqidade e seus passos conduzem ao mal. Os perigos os cercam e o poo da destruio se escancara sob seus ps. Olha agora para o outro lado e contempla, naquele vale ensombrecido pelas rvores, oculta dos olhos humanos, a Casa da Tristeza. 39

Seu seio se agita com suspiros, sua boca est cheia de lamentaes; ela se deleita com o tema da misria humana. Observa os incidentes comuns da vida e chora; a fraqueza e maldade do homem o tema de sua fala. Para ela, toda a natureza est cheia do mal, cada objeto que contempla est tingido pelo desalento de sua prpria mente, e a voz do queixume entristece sua morada dia e noite. No te aproximes de sua cela; seu hlito contagioso; ela destruir os frutos e far murchar as flores que adoam e adornam o jardim da vida. Ao evitares a casa da Alegria, no deixes que teus ps te traiam e te levem s cercanias desta outra manso funesta; mas segue com cuidado o caminho do meio, que te levar por uma subida suave prgula da Tranqilidade. Com esta vive a paz, com ela habitam a segurana e o contentamento. Ela alegre mas no desregrada; sria, porm, no sisuda; v as alegrias e tristezas da vida com olhar firme e equilibrado. De seu lugar, como de uma elevao, vers a insensatez e o infortnio daqueles que, levados pela devassido de seu corao, adotaram a morada dos companheiros do gozo e da licenciosa alegria; ou dos que, contagiados pelo desnimo e pela melancolia, passam os dias lamentando as desgraas e aflies da vida humana. Deves olhar para eles de modo compreensivo, e o erro de sua trilha evitar que teus ps percam a direo.

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CAPTULO III: Da Clera

Assim como a ventania arranca rvores, em sua fria, e deforma a face da natureza; assim como o terremoto destri cidades inteiras com suas convulses, assim a clera de um homem enfurecido causa danos ao seu redor. O perigo e a destruio esto em suas mos. Mas reflete, sem esqueceres tua prpria fraqueza; assim, perdoars as falhas alheias. No te entregues paixo da Clera; isto como afiares a espada para ferir teu prprio peito ou para matar teu amigo. Se suportares provocaes leves, isto te ser creditado como sabedoria; se as apagares de tua mente, teu corao no te reprovar. No vs que o homem colrico perde a compreenso? Enquanto estiveres ainda em teu juzo, deixa que a fria de outro te sirva de lio. Nada faas quando estiveres exaltado. Por que te lanadas ao mar na violncia de uma tempestade? Se difcil controlar tua ira, sbio ser evit-la; foge, portanto, de todas as ocasies de sentir clera, ou guarda-te contra elas sempre que ocorrerem. O tolo provocado por palavras insolentes, mas o homem sbio delas ri com desprezo.

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No abrigues a vingana em teu peito; ela atormentar teu corao e desbotar tuas melhores tendncias. Estejas sempre mais pronto a perdoar que a retribuir uma ofensa; aquele que fica espreita de uma oportunidade de vingana, espreita a si mesmo, e atrai o mal sobre sua prpria cabea. A resposta suave para um homem irado abate seu ardor, como a gua lanada sobre o fogo; de inimigo, ele passar a ser teu amigo. Reflete sobre quo poucas coisas merecem tua clera e ficars assombrado de que se entregue clera quem no seja louco. A clera comea sempre com uma insensatez ou fraqueza; mas lembra bem e guarda esta certeza: a clera raramente acaba sem arrependimento. A vergonha persegue os passos da insensatez; atrs da clera est sempre o remorso.

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CAPITULO IV: Da Piedade

Assim como as flores so espargidas sobre a terra pela mo da primavera, assim como a generosidade do vero produz com perfeio a abundncia das colheitas; assim tambm o sorriso da piedade derrama bnos sobre os filhos da desgraa. Aquele que tem compaixo do outro recomenda-se a si mesmo; aquele que destitudo de piedade no a merece. O carniceiro no se detm ante o balido da ovelha, nem o corao do homem cruel se comove com o sofrimento. Mas as lgrimas compassivas so mais doces que as gotas de orvalho que caem das rosas no seio da primavera. No tapes teus ouvidos contra os lamentos dos pobres, portanto; nem endureas teu corao contra os flagelos dos inocentes. Quando o rfo clamar por ti, quando o corao da viva estiver cheio de amargura e ela implorar teu auxlio com lgrimas de tristeza, tem piedade de sua aflio e estende tua mo aos que no tm quem os ampare. Quando avistares o maltrapilho que vaga pelas ruas, trmulo de frio, sem teto que o abrigue, deixa que a generosidade abra teu corao, deixa que as asas da caridade o salvem da morte, para que tua prpria Alma possa viver. Quando o pobre geme em seu leito de enfermo, quando o infeliz se estiola nos horrores do crcere, ou a cabea encanecida do velho eleva um olhar 43

dbil em busca de piedade; oh, como podes desfrutar de suprfluos deleites, indiferente a seus apelos, insensvel a seus infortnios?

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CAPITULO V: Do Desejo e do Amor

Cuida-te, jovem, cuida-te das sedues da lascvia, e no permitas que a meretriz te induza aos excessos de seus prazeres. A loucura do desejo frustrar seus prprios objetivos; da cegueira de seu mpeto sers lanado destruio. Portanto, no entregues teu corao a suas doces instigaes; nem deixes que teu corao seja escravizado por suas encantadoras iluses. A fonte da sade, que de onde procede a torrente do prazer, em breve secar, e toda a fonte de alegria ficar exaurida. No auge de tua vida, a velhice te alcanar; teu sol declinar na manha"de teus dias. Mas quando a virtude e a modstia iluminam seus encantos, o brilho de uma bela mulher mais radioso que as estrelas do cu; intil resistir influncia de seu poder. A alvura de seu peito transcende a do lrio; seu sorriso tem mais delcias que um jardim de rosas. A inocncia de seu olhar como a da pombinha, a simplicidade e a verdade habitam em seu corao. Os beijos de sua boca so mais doces que o mel; os perfumes da Arbia exalam de seus lbios.

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No feches teu peito ternura do amor; a pureza de sua chama enobrecer teu corao e o suavizar para receber as mais formosas impresses.

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LIVRO III DA MULHER

ESCUTA, formosa filha do amor, as instrues da prudncia, e deixa que os preceitos da verdade penetrem bem fundo em teu corao; assim, os encantos de tua mente daro mais lustro elegncia de tuas formas; tua beleza, tal como a rosa, guardar sua doura mesmo depois de ter murchado. Na primavera de tua juventude, na manh de teus dias, quando os homens te olham com deleite, e a natureza murmura em teus ouvidos o significado de seus olhares, ah! ouve com cautela suas palavras sedutoras, guarda bem teu corao e no ouve sua voz suave e persuasiva. Lembra que s a companheira razovel do homem, no a escrava de sua paixo; a finalidade de teu ser no de simplesmente gratificar seu licencioso desejo, e sim de ajud-lo nas lutas da vida, acalm-lo com tua ternura e recompensar suas atenes com doce solicitude. Quem aquela que conquista o corao do homem, que o subjuga ao amor e reina em seu peito? Olha! Ali vai ela com virginal doura, com a inocncia em sua mente e o pudor em sua face. Suas mos buscam ocupao, seus ps no se comprazem no perambular ocioso.

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Veste-se com bem cuidada simplicidade, alimenta-se com temperana; humildade e mansido so como uma coroa de glria cingindo sua cabea. Sua voz msica, a doura do mel flui de seus lbios. O recato est em todas as suas palavras; em suas respostas h brandura e verdade. Submisso e obedincia so as lies de sua vida; paz e felicidade so sua recompensa. Adiante de seus passos caminha a prudncia; a virtude guarda sua mo direita. Seu olhar revela suavidade e amor; mas a discrio, com seu cetro, repousa em sua fronte. A lngua do licencioso se cala em sua presena; o respeito sua virtude o mantm calado. Quando grassa o escndalo e a fama de sua vizinha corre de boca em boca, se a caridade e a boa ndole no falam por sua boca, o dedo do silncio lhe sela os lbios. Seu peito a manso da bondade e por isto ela no suspeita de que haja maldade nos outros. Feliz ser o homem que a tome por esposa; feliz a criana que a chamar de me. Ela preside a casa e nela h paz; comanda com critrio e obedecida. 48

Levanta-se pela manh, reflete sobre seus assuntos e indica a cada um seus deveres. O cuidado de sua famlia todo o seu deleite e somente a isto ela aplica seu empenho; a elegncia mesclada frugalidade est presente em sua casa. A prudncia de sua administrao uma honra para seu marido, e ela ouve os louvores com secreta alegria. Ela infunde sabedoria na mente de seus filhos; molda seu comportamento pelo exemplo de sua prpria bondade. A palavra de sua boca a lei de seus filhos, o movimento de seus olhos leva-os obedincia. Ela fala e seus serviais voam; ela aponta e a tarefa cumprida; pois a lei do amor est em seus coraes, sua bondade empresta asas a seus ps. Na prosperidade no se envaidece, na adversidade cura os ferimentos do destino com pacincia. As dificuldades de seu esposo so aliviadas por seus conselhos e suavizadas por suas carcias;ele descansa o corao em seu regao e recebe conforto. Feliz o homem que a tornou sua esposa; feliz a criana que a chama de me.

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LIVRO IV DA CONSANGINIDADE OU DAS RELAES NATURAIS

CAPITULO I: O Esposo

ACEITA para ti uma esposa e obedece os decretos de Deus; toma para ti uma esposa e torna-te um fiel membro da sociedade. Mas examina com cuidado e no te resolvas bruscamente. De tua presente escolha depende tua felicidade futura. Se ela perde muito tempo com trajes e adornos; se est enamorada da prpria beleza e se delicia com louvores; se ri muito e fala alto; se seus ps no permanecem na casa de seu pai e seus olhos ousadamente passeiam pelo rosto dos homens; ainda que sua beleza seja como o Sol no Armamento do cu, desvia os olhos de seus encantos, desvia os ps de seu caminho e no permitas que tua mente caia na armadilha das sedues da imaginao. Mas quando tiveres encontrado um corao sensvel aliado suavidade de modos, uma mente educada e uma forma agradvel ao teu gosto, leva-a para habitar em tua casa; ela digna de ser tua amiga, tua companheira na vida, a esposa de teu corao. Oh, d-lhe valor, considera-a uma bno que o Cu te enviou; que a bondade de tua conduta te faa querido ao seu corao.

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Ela a senhora de tua casa; portanto, trata-a com respeito, para que teus servos a obedeam. No te oponhas a seus desejos sem motivo; ela partilha de teus cuidados, faz dela tambm a companheira de teus prazeres. Reprova suas faltas com brandura, no exijas sua obedincia com rigor. Confia teus segredos a seu corao; seus conselhos so sinceros, no sers iludido. S fiel a seu leito; pois ela a me de teus filhos. Quando a dor e a enfermidade a assaltarem, que tua ternura suavize sua aflio; um teu olhar de compaixo e amor aliviar seu sofrimento ou mitigar sua dor, e ser mais valioso que dez mdicos. Considera a fragilidade de seu sexo, a delicadeza de sua constituio; no sejas severo com sua fraqueza e lembra-te de tuas prprias imperfeies.

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CAPITULO II: O PaiTu que s pai, reflete na importncia do que te foi confiado; tens o dever de sustentar o que produziste. De ti tambm depende se a criana de teu peito ser uma bno ou uma maldio para ti; um membro til, ou sem valor algum na comunidade. Prepara-o desde cedo com a instruo e tempera sua mente com as mximas da verdade. Observa suas inclinaes, mostra-lhe o caminho certo desde a juventude; no permitas que hbitos maus ganhem fora com o correr de seus anos. Assim, ele crescer como o cedro na montanha; sua cabea poder ser vista acima das rvores da floresta. Um mau filho uma censura a seu pai; mas aquele que age bem honra seus cabelos brancos. O solo teu, no deixes que fique sem cultivo; a semente que plantares, esta tambm colhers. Ensina-lhe a obedincia e ele te abenoar; ensina-lhe a modstia, e ele no se envergonhar. Ensina-lhe a gratido e ele receber benefcios; ensina-lhe a caridade e ele ganhar amor. Ensina-lhe a temperana e ele ter sade; ensina-lhe a prudncia, e a fortuna lhe advir. 52

Ensina-lhe a justia e ele ser honrado pelo mundo; ensina-lhe sinceridade e seu corao no te reprovar. Ensina-lhe a diligncia e suas riquezas aumentaro; ensina-lhe a benevolncia e sua mente ser enaltecida. Ensina-lhe a cincia e sua vida ser til; ensina-lhe a religio e sua morte ser feliz.

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CAPITULO III: O Filho

Que o homem aprenda a sabedoria com as criaturas de Deus, e aplique a si mesmo as instrues que delas provm. Vai ao deserto, meu filho; observa o filhote da cegonha e deixa que fale ao teu corao; ele carrega nas asas seu pai envelhecido, acomoda-o em lugar seguro e lhe traz alimento. A piedade de um filho mais doce que o incenso da Prsia que se oferece ao Sol; sim, mais delicioso que os olores que se evolam de um campo de especiarias rabes por fora do vento soprado do oeste. S, pois, grato a teu pai, pois ele te deu a vida; e tambm a tua me, pois ela te deu sustento. Ouve as palavras de sua boca, pois so para teu bem; d ouvidos a seus conselhos, pois eles procedem do amor. Ele velou pelo teu bem-estar, trabalhou para teu conforto; honra portanto seus anos, e no permitas que seus cabelos brancos sejam tratados com irreverncia. No esqueas de tua infncia e seu desamparo, nem da petulncia de tua juventude, e s indulgente para com as enfermidades de teus pais envelhecidos; ajuda-os e sustenta-os no declnio da vida. Assim, suas cabeas encanecidas iro para o tmulo em paz; e teus prprios filhos, reverenciando teu exemplo, retribuiro tua piedade com amor filial. 54

CAPTULO IV: Os Irmos

Sois filhos do mesmo pai, sustentados por seus cuidados; o peito da mesma me vos nutriu. Permite que os laos do afeto, portanto, te unam a teus irmos, para que a paz e a felicidade habitem na casa de teu pai. E quando vos separardes neste mundo, lembra o elo que vos une em amor e unidade; no concedas maior preferncia a um estranho que a teu prprio sangue. Se teu irmo est na adversidade, socorre-o; se tua irm est em dificuldades, no a abandones. Assim a fortuna de teu pai contribuir para sustentar toda a tua raa; e seus cuidados se perpetuaro entre vs, em vosso mtuo amor.

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LIVRO V DA PROVIDNCIA, OU DAS DIFERENAS ACIDENTAIS ENTRE OS HOMENS

CAPITULO I: Sbios e Ignorantes

AS alegrias da compreenso so os tesouros de Deus; Ele assinala a cada um sua parte, na medida que Lhe parea melhor. Dotou-te Ele de sabedoria? Iluminou tua mente com o conhecimento da verdade? Transmite-a ao ignorante, para sua instruo; comunica-a ao sbio, para teu prprio progresso. A verdadeira sabedoria presume menos que a insensatez. O homem sbio freqentemente duvida e muda de idia; o tolo obstinado e no duvida; ele conhece todas as coisas menos sua prpria ignorncia. O orgulho da mente vazia uma abominao; a tagarelice a insensatez do desatino; entretanto, uma parte da sabedoria est em suportar com pacincia estas impertinncias e ter piedade de seus disparates. No entanto, no fiques cheio de tua prpria vaidade, nem te vanglories de tua compreenso superior; o mais lmpido conhecimento humano no passa de cegueira e loucura. O homem sbio sente suas imperfeies e humilde; em vo se esfora por obter sua prpria aprovao; mas o tolo olha o raso regato de sua prpria mente 56

e se compraz nos seixos que v ao fundo; ele os apanha e os exibe como se fossem prolas; deleita-se com o aplauso de seus semelhantes. Ele se vangloria de feitos que no tm valor, mas daquilo que uma vergonha ignorar ele nada sabe. Mesmo nas sendas da sabedoria ele persegue a insensatez; vergonha e desapontamento so a recompensa de seu esforo. Mas o homem sbio cultiva sua mente com os conhecimentos; seu prazer o progresso das artes, e sua utilidade para a sociedade coroa-o de honrarias. No obstante, alcanar a virtude o que ele considera a mais elevada sabedoria, e a cincia da felicidade o estudo de sua prpria vida.

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CAPTULO II: Ricos e Pobres

O homem a quem Deus concedeu riquezas e outorgou uma inteligncia que as empregue corretamente um ser especialmente favorecido e de elevada distino. Ele contempla sua riqueza com prazer, porque esta lhe oferece meios de fazer o bem. Protege os pobres desamparados; no permite que os poderosos oprimam os fracos. Procura quem possa merecer sua compaixo, informa-se sobre suas necessidades, e as alivia com critrio e sem ostentao. Ele ajuda e recompensa o mrito; estimula o talento e liberalmente promove todo empenho til. Realiza grandes obras, seu pas enriquece, o trabalhador encontra emprego; ele forja novos planos e as artes se desenvolvem. Considera que o suprfluo em sua mesa pertence aos pobres da vizinhana, e no os defrauda. A benevolncia de sua mente no encontra obstculo em sua fortuna; por isto ele se regozija com suas riquezas e sua alegria inocente. Mas desgraado daquele que acumula riquezas em abundncia e sozinho se rejubila por sua posse; que faz crispar-se o rosto do pobre sem considerar o suor de seu rosto. 58

Ele viceja na opresso sem qualquer sentimento; a runa de seu prximo no o perturba. Ele bebe as lgrimas do rfo como se fossem leite; os gritos lamentosos da viva so msica para seus ouvidos. Seu corao est endurecido pelo amor da riqueza; nenhuma dor ou pena lhe causa impresso. Mas a maldio da iniqidade o persegue; ele vive em contnuo temor; a ansiedade de sua mente, e os desejos gananciosos de sua prpria Alma nele se vingam, pelas calamidades que levou aos demais. Ah, que so os sofrimentos da pobreza comparados com o que ri o corao deste homem! Que o homem pobre se conforte, sim, que se rejubile; pois tem muitos motivos. Ele senta-se para comer seu bocado em paz, sua mesa no est apinhada de aduladores e devoradores. No embaraado por uma multido de dependentes, nem perturbado pelos clamores das solicitaes. Carecendo dos petiscos dos ricos, ele escapa de seus desassossegos. No saboroso o po que ele come? No agradvel sua sede a gua que bebe? Sim, mais deliciosa esta gua que as mais caras poes dos luxuriosos.

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Seu trabalho conserva-o saudvel e lhe proporciona um repouso que no conhece o leito macio do indolente. Ele restringe seus desejos com humildade; a calma do contentamento mais doce para sua Alma que todas as aquisies da riqueza e da pompa. Que o rico, portanto, no se vanglorie de suas posses, nem o pobre se entregue depresso por sua pobreza;pois a providncia de Deus concede a ambos a felicidade.

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CAPTULO III: Senhores e Serviais

No te aflijas, homem, por teu estado de servial; ele da vontade de Deus e oferece muitas vantagens; afasta de ti os cuidados e exigncias da vida. A honra de um servidor sua fidelidade; suas maiores virtudes so a submisso e a obedincia. S paciente, portanto, com as queixas de teu senhor; quando te repreender, no lhe retruques; o silncio de tua resignao no ser esquecido. S um estudioso dos interesses dele, diligente em seus assuntos e fiel confiana que deposita em ti. Teu tempo e teu trabalho lhe pertencem; no o defraudes, pois ele te paga por ambos. E tu, que s o amo, s justo com teu servidor, se dele esperas fidelidade; e s razovel em tuas ordens, se desejas pronta obedincia. O esprito do homem est nele; a severidade e o rigor podem suscitar o medo, mas jamais inspiraro seu amor. Combina a bondade com a censura e argumenta com autoridade. Assim, tuas admoestaes encontraro eco em seu corao e seu dever se tornar um prazer. Ele te servir fielmente por causa da gratido; ele te obedecer alegremente pelo princpio do amor; e tu, em troca, no deixes de dar diligncia e fidelidade a devida recompensa. 61

CAPTULO IV: Reis e Sditos

tu! favorito do Cu, a quem os filhos dos homens, teus iguais, concordaram em elevar ao poder soberano e te colocaram acima deles como governante; considera as finalidades e a importncia do que te confiaram, muito mais que a dignidade e a altura de tua posio. Teus atavios so de prpura e ests sentado num trono; a coroa da majestade cinge tuas tmporas, o cetro do poder est em tuas mos; mas estas insgnias no foram dadas para ti mesmo, e sim para o bem de teu reino. A glria de um rei a felicidade de seu povo; seu poder e domnio repousam no corao de seus sditos. A mente de um grande prncipe enaltecida pela grandiosidade de sua posio; ele resolve assuntos elevados e busca o que seja digno de seu poder. Rene os sbios de seu reino, consulta-os com liberdade e ouve a opinio de todos. Encara seu povo com discernimento, descobre as capacidades dos homens e os emprega de acordo com seus mritos. Seus magistrados so justos, seus ministros sbios e o favorito de seu corao no o ilude. Ele aprova as artes e estas florescem; as cincias progridem com o cultivo de suas mos.

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Ele se deleita com os sditos cultos e os criativos; desperta em seu peito a emulao e a glria de seu reino enaltecida por seus labores. O esprito do mercador que amplia seu comrcio; a habilidade do fazendeiro que enriquece suas terras; a criatividade do artista, o progresso do sbio; a todos estes ele honra com seu favor ou recompensa com sua generosidade. Ele implanta novas colnias, constri embarcaes slidas, abre os rios para maior convenincia, estabelece portos para maior segurana; seu povo abunda em riquezas e a fora de seu reino aumenta. Ele estabelece seus estatutos com eqidade e sabedoria, seus sditos usufruem dos frutos de seu trabalho, com segurana; e sua felicidade consiste na observncia da lei. Ele fundamenta seus julgamentos nos princpios da misericrdia; mas estrito e imparcial na punio dos culpados. Seus ouvidos esto abertos s reclamaes de seus sditos; ele segura a mo de seus opressores e os livra da tirania. Seu povo, portanto, nele v um pai, com reverncia e amor; o povo o considera o guardio de tudo o que desfruta. Sua afeio por ele gera em seu peito o amor pelo que pblico; a segurana da felicidade de todos o objeto de seus cuidados. Nenhum murmrio contra ele surge no corao dos sditos; as maquinaes de seus inimigos no pem o Estado em perigo.

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Seus sditos so fiis e firmes na defesa de sua causa; postam-se em atitude de defesa como um muro de bronze; o exrcito dos tiranos foge deles como palha ao vento. Paz e segurana pairam como uma bno sobre as casas dos cidados; glria e poder cercam seu trono para sempre.

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LIVRO VI DOS DEVERES SOCIAIS

CAPITULO I: Da Benevolncia

QUANDO considerares tuas necessidades, quando contemplares tuas imperfeies, reconhece a Sua bondade, filho da humanidade! Ele te honrou com a razo, concedeu-te o dom da fala, colocou-te na sociedade para receber e dar ajuda, mutuamente, e cumprir recprocas obrigaes. Teu alimento, tuas roupas, a comodidade de tua moradia; a proteo contra os danos, o gozo dos confortos e prazeres da vida; tudo isto deves ajuda de outros e no pode-rias usufruir disto seno nos laos da sociedade. teu dever, portanto, ser amigo da humanidade, como de teu interesse que o homem seja teu amigo. Assim como a rosa exala a doura de sua prpria natureza, assim o corao do homem benevolente produz boas obras. Ele se deleita com a paz e tranqilidade de seu prprio corao e se regozija com a felicidade e prosperidade de seu prximo. No d ouvidos calnia; as fraquezas e os erros dos homens provocam dor em seu corao. Seu desejo fazer o bem, e busca as ocasies para faz-lo; ao remover a opresso de um outro, ele alivia a si mesmo. 65

Na amplido de sua mente ele abrange, com sua sabedoria, a felicidade de todos os homens; na generosidade de seu corao ele se esfora em promovla.

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CAPITULO II: Da Justia

A paz social depende da justia; a felicidade do indivduo depende da certeza de gozar em paz as suas posses. Conserva os desejos de teu corao, portanto, nos limites da moderao; deixa que a mo da justia os mantenha na direo certa. No lances olhos invejosos aos bens de teu vizinho; que tudo que lhe pertence seja sagrado para tua mo. No permitas que a tentao te seduza, que qualquer provocao te incite a levantar a mo causando risco de vida. No difames o carter do teu prximo; no levantes falso testemunho contra ele. No corrompas seu servo para que o engane ou abandone e, quanto esposa de seu corao, no a tentes ao pecado! Isto seria uma dor em seu corao que no poderias aliviar; um dano em sua vida que nenhuma compensao poderia reparar. Em teus negcios com os homens, s justo e imparcial, e age com eles como gostarias que agissem contigo. S leal sua confiana, no enganes o homem que confiou em ti; estejas certo de que, aos olhos de Deus, menos malfico roubar que trair. No oprimas os pobres, nem roubes do trabalhador o seu emprego. 67

Quando venderes algo com a inteno de lucro, ouve os sussurros de tua conscincia e fica satisfeito com moderao; nem tires da ignorncia do comprador qualquer vantagem. Paga as tuas dvidas, pois aquele que te deu crdito confiou em tua honra; tirar dele o que lhe cabe mesquinho e injusto. Finalmente, filho da sociedade! examina teu corao, pede o auxlio da memria; se em qualquer destas transaes perceberes que cometeste uma transgresso, que a tristeza e a vergonha te advenham e faas a reparao imediata, ao mximo que estiver ao teu alcance.

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CAPTULO III: Da Caridade

Feliz o homem que plantou em seu peito as sementes da benevolncia; pois elas produziro caridade e amor. Da fonte de seu corao fluiro rios de bondade, que transbordaro para o benefcio da humanidade. Ele socorre os pobres em suas dificuldades e se regozija em incrementar a prosperidade de todos. No censura seu vizinho, no cr em histrias de inveja e maledicncia, nem repete suas calnias. Perdoa as injrias dos homens, apaga-as de sua lembrana; vingana e malcia no encontram abrigo em seu corao. Ele no paga o mal com o mal; no odeia sequer seus inimigos, mas perdoa sua injustia com amistosa advertncia. As dores e ansiedades dos homens suscitam sua compaixo; ele se esfora para aliviar o peso de suas desgraas, e o prazer de ser bem-sucedido recompensa seu labor. Ele acalma a fria, apazigua as querelas de homens irados, e impede os estragos da luta e da animosidade. Promove em sua vizinhana a paz e a boa vontade; seu nome repetido com bnos e louvores.

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CAPTULO IV: Da Gratido

Assim como os ramos da rvore devolvem a seiva raiz de onde ela proveio; como o rio derrama sua corrente no mar de onde proveio sua fonte, assim o corao do homem agradecido se deleita em retribuir o benefcio recebido. Ele reconhece sua obrigao com alegria; olha seu benfeitor com amor e estima. Se a retribuio no est em seu poder, ele nutre a lembrana do benefcio em seu peito, com bondade, e no o esquece por toda a sua vida. A mo do homem generoso como as nuvens do cu, que, regando a terra, produzem frutos, ervas e flores; mas o corao do ingrato como o deserto cuja areia engole com avidez as flores que caem e as enterra em seu seio sem nada produzir. No invejes teu benfeitor, nem te esforces por ocultar o benefcio que te prestou; pois embora seja melhor dar que receber, embora a generosidade desperte admirao, a humildade da gratido toca o corao e agradvel tanto aos olhos de Deus como dos homens. Mas guarda-te de receber um favor das mos do orgulhoso; no devas coisa alguma ao egosta e ao avaro; a vaidade do orgulho te expor vergonha, a cobia do usurrio jamais ser satisfeita.

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CAPTULO V: Da Sinceridade

tu que ests enamorado das belezas da Verdade, e fixaste teu corao na simplicidade de seus encantos, apega-te a tua fidelidade e no a abandones; a constncia de tua virtude te coroar de glria. A lngua do homem sincero tem razes em seu corao; a hipocrisia e a falsidade no encontram lugar em suas palavras. Ele se ruboriza ante a mentira e se confunde; mas, ao falar a verdade, seu olhar se mantm firme. Ele porta como homem a dignidade de seu carter e se recusa a curvarse s artes da hipocrisia. Tem confiana em si mesmo; nunca se embaraa; tem coragem suficiente para dizer a verdade, mas a mentira lhe causa temor. Coloca-se acima da mesquinha dissimulao; estuda o que correto e fala com discrio. Aconselha com amizade; reprova com liberdade, e tudo que promete certamente ser cumprido. Mas o corao do hipcrita fica oculto em seu peito; ele disfara suas palavras com a aparncia da verdade, enquanto o propsito de sua vida iludir. Ele ri na dor, chora na alegria; as palavras de sua boca no tm interpretao.

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Age na escurido como a toupeira e imagina estar seguro; mas sai por engano para a luz e fica exposto, com a lama sobre sua cabea. Ele passa os dias em perptuo tormento; sua lngua e seu corao vivem em contradio. Procura a aparncia de homem correto e se envolve nos pensamentos de sua astcia. insensato, insensato! Os esforos que fazes para ocultar o que s so muito mais penosos do que os esforos que terias de fazer para seres o que desejas aparentar; os filhos da sabedoria escarnecero de tua astcia quando, certo de estares seguro, teu disfarce for desfeito e o dedo do ridculo te apontar com desprezo.

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LIVRO VII DA RELIGIO

S existe um Deus, autor, criador e dirigente do mundo, todo-poderoso, eterno e incompreensvel. O Sol no Deus, embora seja Sua imagem mais nobre; ele ilumina o mundo com sua radiosidade, seu calor d vida aos produtos da terra; admira-o como criatura e instrumento de Deus, mas no o reverencies. quele que supremo, infinitamente sbio e benvolo, e s a Ele, pertencem a adorao, a reverncia, a ao de graas e os louvores. Ele estendeu o cu com Suas mos e inscreveu com Seu dedo o curso das estrelas. Imps limites ao oceano, que este no pode transgredir; e disse aos ventos tempestuosos: acalmai-vos. Ele sacode a Terra e as naes tremem; lana Seus raios e os maus se apavoram. Convoca mundos com a palavra de Sua boca. A providncia de Deus vista em todas as Suas obras; Ele rege e dirige com infinita sabedoria.

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Ele instituiu leis para governar o mundo; variou-as de maneira maravilhosa em todos os aspectos e cada uma, por sua natureza, conforma-se Sua vontade. Nas profundezas de Sua mente, Ele trabalha com perfeito Conhecimento; os segredos do futuro esto abertos diante Dele. Os pensamentos de teu corao esto desnudos diante de Sua vista; Ele conhece tuas resolues antes de serem tomadas. Com respeito Sua prescincia, nada incerto; com respeito Sua providncia, nada acidental. Maravilhoso Ele em todos os Seus caminhos; Seus propsitos so inescrutveis; a natureza de Seu conhecimento transcende a tua concepo. Presta Sua sabedoria, portanto, toda honra e venerao; curva-te em humilde e submissa obedincia Sua suprema vontade. Deus benigno e cheio de misericrdia; Ele criou o mundo com bondade e amor. Sua bondade se evidencia em todas as Suas obras; Ele a fonte da excelncia, o centro da perfeio. As criaturas que Sua mo criou declaram Sua bondade, e seu regozijo canta em Seu louvor; Ele as veste de beleza, sustenta-as com alimento, preserva-as com prazer de gerao em gerao.

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Se elevamos os olhos ao cu, Sua glria brilha diante de ns; se voltamos os olhos para a terra, ela est cheia de Sua benignidade; as colinas e os vales se rejubilam e cantam; campos, rios e florestas ressoam em louvor a Ele. Mas tu, homem! foste distinguido com especial favor; Ele te enalteceu acima de todas as criaturas. Concedeu-te a razo, para manteres teu domnio; dotou-te de linguagem, para aperfeioar tua sociedade; e elevou tua mente com os poderes da meditao, para que possas contemplar e adorar Suas inimitveis perfeies. Nas leis que Ele ordenou para regular tua vida, to amorosamente combinou teu dever com tua natureza que a obedincia a Seus preceitos tua felicidade. Louva Sua bondade com cnticos de agradecimento e medita em silncio sobre as maravilhas de Seu amor; que teu corao transborde de gratido e reconhecimento, que as palavras de tua boca falem de louvor e adorao, que as aes de tua vida mostrem teu amor por Sua lei. Deus justo e certo e julgar a Terra com eqidade e verdade. Tendo estabelecido Suas leis com bondade e misericrdia, no punir Ele seus transgressores? No penses, homem atrevido, que por demorar-se teu castigo tenha se enfraquecido o brao de Deus; nem te iludas com a esperana de que Ele deixar passar tuas aes.

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Seu olhar penetra os segredos de cada corao e Ele os registra para sempre; a Ele no importam as pessoas ou a posio dos homens. Os importantes e os humildes, os ricos e os pobres, os sbios e os ignorantes, quando suas Almas tiverem se livrado dos incmodos grilhes desta vida mortal, logo recebero da Grande Lei de Deus a justa e eterna compensao, segundo suas obras. Ento o mau aprender e far compensao no decurso do tempo; mas o corao do justo se rejubilar em Suas recompensas. Em todos os dias de tua vida, portanto, respeita teu Deus, e palmilha os caminhos que Ele abriu diante de ti. Deixa que a prudncia te aconselhe, que a temperana te refreie, que a justia guie tua mo, que a benevolncia aquea teu corao e a gratido ao cu te inspire com devoo. Isto te dar felicidade em teu estado presente e futuro e te conduzir s manses da eterna felicidade no paraso de Deus. Essa a verdadeira Economia da Vida Humana.

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Fim da Primeira Parte

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LIVRO VIII CONSIDERAES GERAIS SOBRE O HOMEM

CAPITULO I: Da Estrutura do Corpo Humano

IGNORANTE e inferior que s, homem! Humilde como deverias ser, filho do p! queres elevar teus pensamentos at a infinita sabedoria? Desejas ver a onipotncia estendida tua frente? Contempla tua prpria estrutura. Admirvel e maravilhosamente foste feito; louva pois teu Criador com admirao e regozija-te diante Dele com reverncia. Por que motivo serias tu a nica criatura ereta entre as demais, seno para contemplar Suas obras! Por que deverias contempl-las, seno para mostrar tua admirao? Por que deverias admir-las, seno para que reverenciasses Aquele que as criou e tambm a ti? Por que motivo em ti repousa a conscincia? E de onde vem ela a ti? No est na carne o pensar, no est nos ossos o raciocnio. O leo ignora que os vermes o devoraro; o boi no percebe que alimentado para ser levado ao matadouro. Existe algo que acrescentado a ti, diferente daquilo que podes ver; algo anima o barro de teu corpo e superior a tudo o que afeta teus sentidos. Que algo este?

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Teu corpo continua a ser matria perfeita aps ter este ALGO partido; portanto, isso no faz parte do corpo; imaterial e, logo, eterno; livre para agir e, portanto, responsvel por suas aes. Conhece o asno a utilidade do alimento s porque seus dentes mastigam as ervas? Anda o crocodilo ereto por ter a espinha to reta quanto a tua? Deus te formou, assim como formou essas criaturas; Ele te formou depois delas; superioridade e domnio sobre todas elas te foram concedidos, e com Seu prprio alento Ele te comunicou tua essncia consciente. Conhece-te a ti mesmo; s o orgulho de Sua criao, o elo entre divindade e matria; contempla uma parte do prprio Deus em teu interior; lembra tua prpria dignidade e no ouses descer at o mal e a baixeza. Quem implantou o terror nos dentes da serpente? Quem concedeu ao cavalo o mpeto do trovo? Foi Ele quem o fez e te instruiu a esmagar a serpente com os ps e domar o cavalo para teus propsitos.

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CAPITULO II: Do Uso dos Sentidos

No te vanglories de teu corpo porque foi formado primeiro; nem de tua mente porque nela reside tua Alma. No ser o dono da casa mais honorvel que suas paredes? O solo deve ser trabalhado antes que nele se semeie o gro; o oleiro deve construir seu forno antes que possa fabricar sua loua. Assim como o alento do cu diz s guas do oceano: "desta forma rolaro tuas vagas, e de nenhuma outra; at esta altura e a nenhuma outra elevaro elas sua fria", deixa que tua Alma, homem, impulsione e dirija tua carne; deixa, pois, que ela reprima teus mpetos. Tua Alma a rainha de teu corpo; no permitas que seus sditos se rebelem contra ela. Teu corpo como o orbe da terra; teus ossos, os pilares que o sustentam em sua base. Assim como o oceano faz nascer as fontes, cujas guas de novo retornam ao seu seio atravs dos rios, assim flui tua fora vital do corao para o exterior, e de novo retorna ao seu lugar. No mantm ambos o seu curso eternamente? Eis que o mesmo Deus os criou e ordenou. No constitui teu nariz um canal para os perfumes? No tua boca o caminho para as iguarias delicadas? Aprende, entretanto, que os perfumes exalados 79

por muito tempo se tornam ofensivos, e que os manjares arrunam o apetite a que agradam. No so teus olhos as sentinelas avanadas que vigiam por ti? Contudo, com que freqncia no sabem distinguir a verdade do erro? Deixa que tua Alma predomine, ensina teu esprito a estar atento sua obra; assim, esses ministros sero sempre transmissores de vida para ti. No tua mo um milagre? Encontras na criao algo que lhe seja semelhante? Por que te seria concedida, seno para que pudesses estend-la para amparar teu irmo? Por que, entre todos os seres vivos, s o nico dotado da capacidade de ruborizar-se? o mundo poder ler tua vergonha em tua face; portanto, nada faas que seja vergonhoso. Temor e consternao, por que roubam de tuas feies seu rseo esplendor? Evita a culpa, e sabers que o medo est abaixo de ti, e que a consternao indigna de um varo. Por que somente a ti falam sombras, nas vises de tua mente? Prestalhes reverncia; deves saber que elas procedem do alto. Somente tu, homem, s capaz de falar. Maravilha-te ante esta gloriosa prerrogativa; retribui a Ele que a concedeu o louvor racional e agradvel, ensinando a teus filhos a sabedoria, instruindo na piedade o fruto de tuas entranhas.

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CAPITULO III: Da AIma do Homem, sua Origem e seus Afetos

homem! as bnos de tua parte exterior so a sade, o vigor e a proporo. A maior delas a sade. A sade para o corpo o que a honestidade para a Alma. O fato de que tens uma Alma, entre todos os conhecimentos o mais certo, de todas as verdades a mais lmpida. S humilde e agradecido por ela. No tentes senti-la perfeitamente, mas comunga com ela. Pensamento, compreenso, raciocnio, vontade;no chames de Alma a tais coisas! Elas so aes da Alma, mas no sua essncia. Busca a Alma atravs de suas faculdades, conhece-a por suas virtudes, pois so mais numerosas que os cabelos em tua cabea; por elas no podem ser contadas as estrelas do cu. Por acaso no endurece o Sol o barro e tambm amolece a cera? Assim como o mesmo Sol causa as duas coisas, a mesma Alma pode desejar coisas contrrias. Assim como a Lua conserva sua natureza ainda que as trevas se estendam sobre sua face como uma cortina, tambm a Alma permanece perfeita, mesmo encerrada no peito de um insensato.

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Ela imortal; imutvel; uma no todo. A sade chama-a para que mostre seus encantos, a diligncia unge-a com o leo da sabedoria. Ela viver depois de ti; no deves pensar que nasceu contigo. Foi instituda para tua carne e formada junto com tua mente. A justia no permitiu que ela te fosse dada cheia de exaltadas virtudes; a misericrdia no permitiu que ela te fosse entregue deformada pelos vcios. Isto cabe a ti e deves responder por isto com tua conscincia exterior. No deves supor que a morte possa te salvar da compensao; no penses que a corrupo possa te esconder de inquisies. Aquele que te formou no sabes de qu, julgas que no poder tirar-te de novo daquilo de que nada conheces? No percebe o galo quando chega a meia-noite? No eleva ele sua voz para te dizer que j amanhece o dia? No conhece o co o passo de seu dono? No corre o cabrito ferido para as ervas que lhe traro a cura? Contudo, quando morrem, sua Alma no o sabe; somente tua Alma sobreviver com mente e conscincia. No invejes os animais por seus sentidos mais apurados que os teus; aprende que a vantagem est, no em possuir boas coisas, mas, em saber utilizlas. Se tivesses o ouvido do veado, se fossem teus olhos to fortes e penetrantes como os da guia, se igualasses o perdigueiro em olfato, se pudesse o macaco emprestar-te seu paladar, a tartaruga seu tato, de que te serviria tudo isto sem a razo? No sucumbem todos eles e seus iguais?

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Possui algum deles o dom da fala? Pode um deles dizer-te por que faz o que faz? Os lbios do sbio so como as portas de uma cmara; nem bem so abertas e seus tesouros se espalham diante de ti. Como rvores de ouro em um campo de prata so as sbias sentenas pronunciadas no devido tempo. Podes pensar com suficiente grandeza em tua Alma? H louvores suficientes para ela? A Alma a essncia Daquele que a concedeu. Guarda a lembrana de sua dignidade para sempre; nunca esqueas o grande talento confiado tua guarda. Tudo que possa fazer o bem tambm pode fazer o mal; cuida para que dirijas seu curso para a virtude. No penses que podes perder a Alma na multido; no suponhas que podes ocult-la em teu armrio. A ao seu deleite e ela no se deixar afastar da ao. Seu movimento perptuo; seus esforos so universais; seu potencial de ao no pode ser suprimido. Se estiver na mais longnqua parte da Terra, ela o encontrar; se estiver alm da regio das estrelas, seu olhar o descobrir. A busca sua delcia. Assim como o homem que caminha pelo deserto em busca de gua, assim a Alma tem sede de conhecimento.

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Tal como a espada na mo de um louco a Alma para aquele que carece de discernimento. A finalidade de sua busca a verdade; seus meios de encontr-la so a razo e a experincia. Mas no sero estas coisas frgeis, incertas e falaciosas? Como ento alcanar a verdade? A opinio geral no prova da verdade; pois a maioria dos homens ignorante. A percepo de ti mesmo, o conhecimento Daquele que te criou, o sentimento de adorao que sentes por Ele, no est tudo isto claro a teus olhos? Responde: que mais existe que precises saber?

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CAPITULO IV: Do Perodo e Utilizao da Vida Humana

A vida para o corao do homem o que o olho da manh para a cotovia, a sombra do entardecer para a coruja, o mel para a abelha, a carcaa para o abutre. A vida, ainda que brilhante, no ofusca; embora obscura, no desagrada; ainda que doce, no enfastia; embora se corrompa, no provoca averso; no entanto, quem conhece seu verdadeiro valor? Aprende a estimar a vida corretamente; ento estars prximo do pinculo da sabedoria. No penses como os tolos, que dizem nada haver de mais valioso; nem acredites nos pretensos sbios que afirmam que deves conden-la. O amor no existe para si mesmo, mas para o bem que possa fazer a outros. O ouro no pode comprar a vida para ti, nem uma mina de diamantes pode trazer de volta o momento que dela perdeste. Emprega o momento seguinte com virtude. No deves dizer que seria melhor se no tivesses nascido; ou que, tendo nascido, teria sido melhor morrer cedo;nem ouses perguntar ao Criador "que mal haveria se eu no existisse?" O bem est a teu alcance, e mesmo que tua pergunta for justa, eis que te condena. Engoliria a isca o peixe se soubesse do anzol nela escondido? Cairia o leo na emboscada se soubesse que fora preparada para ele? Da mesma forma, fosse a Alma perecer com este barro, o homem no desejaria viver, nem um Deus 85

misericordioso o teria criado; reconhece, portanto, que vivers muitas e muitas vezes. Tal como o pssaro encerrado na gaiola antes de v-la, que no lacera a carne contra suas grades, assim tambm no deveras tentar fugir inutilmente do estado em que te encontras; aceita o que te foi atribudo e contenta-te com isto. Embora os caminhos da vida no sejam planos, no so totalmente penosos. Acomoda-te a tudo;e onde perceberes menos aparncias do mal, suspeita do maior perigo. Quando teu leito de palha, dormes com segurana. Mas quando repousares sobre rosas, cuida-te dos espinhos! Uma morte nobre melhor que uma vida de maldades; esfora-te, portanto, para viveres tanto quanto deves e no quanto queiras. Enquanto tua vida tiver mais valor para os outros do que tua morte, ser teu dever preserv-la. No lamentes como o insensato o pouco tempo que tens; lembra-te que teus cuidados diminuem medida que diminui teu tempo de vida. Se subtrais de tua vida as partes inteis, que resta? Se subtrais teu tempo de infncia, as horas em que dormiste, as horas vazias de pensamentos, os dias de enfermidade, mesmo na tua plenitude v como foram poucas as estaes que enumeraste. Aquele que te deu a bno da vida, encurtou-a para que mais valiosa fosse. De que te serviria uma vida mais longa? Desejadas mais oportunidade para

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adquirires mais vcios? Quanto ao bem