a startup enxuta - eric ries.pdf

210

Upload: buitram

Post on 31-Dec-2016

276 views

Category:

Documents


10 download

TRANSCRIPT

  • DADOS DE COPYRIGHT

    Sobre a obra:

    A presente obra disponibilizada pela equipe Le Livros e seus diversos parceiros, com oobjetivo de oferecer contedo para uso parcial em pesquisas e estudos acadmicos, bem comoo simples teste da qualidade da obra, com o fim exclusivo de compra futura.

    expressamente proibida e totalmente repudavel a venda, aluguel, ou quaisquer usocomercial do presente contedo

    Sobre ns:

    O Le Livros e seus parceiros disponibilizam contedo de dominio publico e propriedadeintelectual de forma totalmente gratuita, por acreditar que o conhecimento e a educao devemser acessveis e livres a toda e qualquer pessoa. Voc pode encontrar mais obras em nossosite: LeLivros.link ou em qualquer um dos sites parceiros apresentados neste link.

    "Quando o mundo estiver unido na busca do conhecimento, e no mais lutando pordinheiro e poder, ento nossa sociedade poder enfim evoluir a um novo nvel."

    http://lelivros.linkhttp://lelivros.linkhttp://lelivros.linkhttp://lelivros.link/parceiros/

  • Ficha TcnicaCopyright 2011 by Eric Ries.

    Todos os direitos reservados.

    Traduo para a lngua portuguesa: copyright 2012, Texto Editores Ltda.Ttulo original: The Lean StartupDireo editorial: Pascoal Soto

    Editor: Pedro AlmeidaProduo editorial: Andr Fonseca

    Marketing: Priscila BraunerSupervisor tcnico: Ricardo Sazima

    Preparao de texto: Alessandra MirandaReviso: Alexandra Fonseca

    Imagem de capa: Marcus GoslingTraduo: Carlos Szlak

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Ries, EricA startup enxuta: como os empreendedores atuais utilizam a inovao contnua para criar empresas extremamente bem-sucedidas / Eric Ries; [traduo Texto

    Editores]. So Paulo : Lua de Papel, 2012.

    Ttulo original: The Lean Startup.ISBN 9788581780139

    1. Consumidores Preferncias 2. Criatividade nos negcios 3. Eficincia organizacional 4. Empreendedorismo 5. Empresas novas Administrao I.

    Ttulos.

    12-03325 CDD-658.11ndices para catlogo sistemtico:

    1. Novos negcios : Administrao de empresas 658.11

    Texto Editores Ltda.[Uma editora do grupo Leya]

    Rua Desembargador Paulo Passalcqua, 8601248-010 - Pacaembu So Paulo SP

    www.leya.com.br/luadepapelTwitter: @luadepapel_BRA / @EditoraLeya

    http://www.leya.com.br/luadepapel

  • Para Tara

  • A

    Apresentao

    lcancei o fracasso de forma espetacular. Era 1999 e havamos desenvolvido um dosprimeiros sistemas e-Learning (ensino a distncia via web) do Brasil para o Senar

    (Servio Nacional de Aprendizagem Rural) em parceria com a Embrapa (Empresa Brasileirade Pesquisa Agropecuria). ramos apenas dois, eu e um estagirio (Virglio Cruzeiro Neves,que posteriormente se tornaria meu scio). O sistema foi usado em escala nacional para acapacitao de trabalhadores rurais em administrao rural. Tinha contedo rico, comimagens, udio, vdeo e animaes; possibilitava a discusso do assunto entre os participantespor meio de uma lista de discusses, tinha testes de conhecimento, relatrios, ferramentas deadministrao; havamos aplicado conhecimentos avanados na arquitetura e design dainterface; era, enfim, uma ferramenta avanada para a poca. Construda 100% sobre softwarelivre (a linguagem PHP, atualmente utilizada at pelo Facebook, estava engatinhando), tevesucesso em sua misso e reconhecimento em congressos nacionais e internacionais.

    Esse xito, aps alguns meses e diversos convites para interromper o mestrado e trabalharcom e-Learning, motivou-me a fundar uma startup na rea. Contatei o Virglio, agora jformado e morando na Sua, e convidei-o para ser meu scio na empreitada. Aps algumtempo, l estvamos ns montando um plano de negcios (completinho, tal comoaprendramos em um curso de planos de negcios), submetendo nossa inscrio incubadorado SOFTEX, convencendo amigos e familiares de que no estvamos loucos ao trocarcarreiras promissoras nas melhores empresas por uma aventura incerta e, mais importante,codificando o novo software.

    Passamos quase um ano desenvolvendo do zero a ferramenta que seria uma grande evoluode nosso primeiro sistema; afinal, a Instruct.com no se contentaria com nada menos que oestado da arte em e-Learning. Contratamos profissionais, passamos por inmeras dificuldades(cheguei a trocar o carro por uma scooter, para economizar gasolina), mas estvamosprogredindo: a cada ms, tnhamos mais funcionalidades desenvolvidas e um sistema maiscompleto e estvel. Quando, finalmente, chegamos a um ponto em que considervamos asoluo minimamente pronta para a comercializao, fomos para o mercado e... surpresa!Apesar de todo mundo falar em e-Learning, ningum comprava. Ou seja, fizemos duas vendaspequenas: uma para a prefeitura e outra para um instituto. Essa foi a nossa dura introduo aoassunto deste livro. Havamos investido tempo, esforo e dinheiro considerveis, e construdocom sucesso um bom produto que ningum queria. Aprendi muito com essa experincia. Masteria sido possvel aprender mais rpido e com menos esforo e investimento?

    Essa histria ilustra exemplarmente o que acontece quando nos isolamos do cliente, no

  • identificamos nem testamos nossas principais suposies, no temos contabilidade e mtricasadequadas, trabalhamos em grandes lotes e no temos feedback real e constante.

    Mais de uma dcada depois, muitos empreendimentos inovadores, se no a maioria, aindacomentem os mesmos erros. Rotineiramente, vejo empresas pequenas e grandes de startups agrandes corporaes, de ONGs a rgos do governo trabalharem incansavelmente emprodutos e servios sem ter praticamente nenhuma validao do seu valor, das suaspossibilidades de crescimento e da sua transformao em um negcio sustentvel, apoiadasbasicamente em pesquisas de mercado, grupos de foco, projees de crescimento e,principalmente, na intuio de seus lderes.

    Por que no fazer diferente?Partindo de uma histria semelhante e visando a reduo de riscos, prejuzos e tempo na

    criao e no estabelecimento de novas startups, Eric Ries desenvolveu um processoabsolutamente inovador, que vem angariando adeptos em todo o mundo.

    A startup enxuta prope um novo modo de pensar e de construir produtos e serviosinovadores que levem a um negcio sustentvel. Este livro contextualiza o leitor no mundo dasstartups e da inovao radical, mostrando por que necessrio um novo mtodo para ainovao na economia moderna e as origens da startup enxuta. Tambm define conceitosfundamentais para o entendimento da teoria, em especial a questo da aprendizagem validadae a utilizao do mtodo cientfico, construindo paralelos importantes com a manufatura enxuta uma abordagem comprovada para a produo de bens fsicos.

    Ries prioriza a velocidade em percorrer o ciclo Construir-Medir-Aprender; o teste dassuposies fundamentais de valor e crescimento utilizando produtos viveis mnimos (MVPs);a otimizao do produto por meio de testes, de contabilidade para a inovao e de mtricasadequadas; e a deciso de perseverar, se estivermos no caminho certo, ou de pivotar, caso aestratgia seja furada.

    Olhando em retrospectiva a histria da Instruct, fica claro que deveramos ter investido maisem contato com o cliente, assim como em experimentao e validao, em detrimento deplanejamento e execuo cega. Poderamos ter construdo um MVP simples para testar se omercado enxergava valor e compraria uma soluo como a que estvamos imaginando e, emcaso afirmativo, partiramos para sua otimizao, sempre medindo o progresso em direo aum negcio sustentvel.

    Tenho acompanhado ativamente o cenrio de startups e inovao no Brasil, e, por ondepasso, vejo um entusiasmo renovado, fervilhante, com o tema do empreendedorismo. Aspessoas esto vibrantes, cheias de energia e vontade de colocar em prtica seus talentos eesforos para materializar seus sonhos. Naturalmente, a startup enxuta um assuntopermanente nesses meios e nota-se claramente a empolgao de seus adeptos, sinal evidentede que atingiu em cheio o pblico-alvo. Mas noto tambm uma certa confuso e dificuldade nomomento de colocar os conceitos em prtica e de, efetivamente, guiar os esforos de umastartup pela metodologia proposta. Dessa maneira, creio que este livro ter um papel relevanteno esclarecimento da metodologia no Brasil e no sucesso das startups que adotarem estepensamento. Lembre-se: o mais importante entender os princpios, no se ater a tticas etcnicas especficas.

  • A startup enxuta, apoiada na sabedoria de muita experincia acumulada e experimentaono mundo real, vem para trazer um pouco de cincia ao que antes era pura arte e, utilizada emconjunto com outras metodologias e tcnicas (Business Model Canvas, CustomerDevelopment, metodologias geis & implantao contnua), certamente ir reduzir odesperdcio de talento e maximizar as chances de sucesso de nossos empreendedores atuais.

    Junte-se Revoluo!

    Ricardo SazimaDesenvolvimento de Produtos Digitaisna Abril Mdia e cofundador da Inova

    Ventures Participaes S/A IVP

  • V

    Introduo

    eja a descrio desta cena e me diga se j no ouviu um relato assim antes.Universitrios brilhantes, em um dormitrio coletivo, esto inventando o futuro.

    Embudos de novas tecnologias e entusiasmo juvenil, e sem levar em considerao limites,eles criam uma empresa do nada. O seu sucesso precoce lhes permite captar dinheiro eapresentar um novo e incrvel produto ao mercado. Eles contratam os amigos, renem umaequipe de estrelas, e desafiam o mundo a det-los.

    H dez anos e diversas startups1 atrs, eu tambm me encontrava nessa descrio,construindo minha primeira empresa. Em especial, lembro-me de um momento daquela poca:o instante em que percebi que minha empresa iria fracassar. Eu e meu scio estvamosdesesperados. A bolha das empresas ponto-com havia estourado e tnhamos gastado todo onosso dinheiro. Tentamos de maneira desesperada levantar mais capital, mas noconseguimos. Era como uma cena de separao em um filme de Hollywood: chovia, eestvamos discutindo violentamente no meio da rua. No conseguamos sequer concordar arespeito do caminho a seguir, e, assim, nos separamos com raiva, caminhando em direesopostas. Como metfora do fracasso da nossa empresa, essa imagem de ns dois, perdidos nachuva e sendo levados pela correnteza separados um do outro, perfeita.

    Ainda uma memria dolorosa. A empresa avanou com dificuldades nos meses seguintes,mas a situao era terminal. Na ocasio, pareceu que estvamos fazendo tudo certo: tnhamosum grande produto, uma equipe brilhante, uma tecnologia incrvel e a ideia certa na hora certa.E, realmente, estvamos conectados a algo. Estvamos desenvolvendo uma maneira deuniversitrios criarem perfis on-line com a finalidade de compartilh-los... comempregadores. Ops! Apesar da ideia promissora, estvamos condenados desde o primeiro dia,pois desconhecamos o processo que precisaramos utilizar para transformar nossos insightsde um novo produto em uma grande empresa.

    Se voc nunca vivenciou um fracasso como esse, difcil descrever o sentimento. comose o cho estivesse se abrindo sob seus ps. Voc percebe que foi tapeado. Os artigos dasrevistas so mentiras: trabalho duro e perseverana no levam ao sucesso. E, ainda pior: asdiversas promessas que voc fez a funcionrios, amigos e familiares no vo se realizar.Todos os que acharam que voc era tolo de empreender por conta prpria tinham razo.

    No devia acabar assim. Nas revistas e nos jornais, nas histrias de sucessos do cinema eem inmeros blogs escutamos o mantra dos empreendedores de sucesso: com determinao,genialidade, timing correto e sobretudo um grande produto, voc tambm pode alcanar afama e a fortuna.

  • H uma poderosa indstria de criao de mitos em ao para nos vender essa histria, maspassei a acreditar que ela falsa, e essa crena veio aps minha racionalizao do fato. Naverdade, depois de trabalhar com centenas de empreendedores, vi pessoalmente a frequnciacom que um comeo promissor leva ao fracasso. A amarga realidade que a maioria dasstartups fracassa. A maioria dos novos produtos no faz sucesso. A maior parte dos novosempreendimentos no alcana seu potencial mximo.

    No entanto, o mito da perseverana, do gnio criativo e do trabalho duro persiste. Por queessa crena to popular? Acho que h algo muito atraente a respeito dessa histria modernade comear na pobreza e enriquecer. Ela faz o sucesso parecer inevitvel se voc tem ospredicados certos. Isso significa que os detalhes mundanos, a parte burocrtica, as pequenasescolhas no tm importncia. Se desenvolvermos um produto de fato, os consumidores viro.Quando fracassamos, como acontece com muitos de ns, temos uma desculpa pronta: nocriamos a coisa certa. No fomos visionrios o suficiente, ou no estvamos no lugar certo nahora certa.

    Depois de mais de dez anos como empreendedor, passei a rejeitar essa linha de pensamento.Aprendi, tanto com meus sucessos e fracassos, como com os de muitas outras pessoas, que aparte chata, a burocracia, que tem a maior importncia. O sucesso de uma startup no consequncia de bons genes ou de estar no lugar certo na hora certa. O sucesso de uma startuppode ser construdo seguindo o processo correto, que pode ser aprendido, e, portanto,ensinado.

    O empreendedorismo um tipo de administrao. No, voc no leu errado. Fazemosassociaes muito divergentes com essas duas palavras: empreendedorismo e administrao.Ultimamente, parece que uma cool, inovadora e estimulante, e a outra desinteressante,chata e inspida. Chegou o momento de deixar para trs essas ideias preconcebidas.

    Contarei uma segunda histria de startup. Em 2004, um grupo acabara de fundar uma novaempresa. A anterior deles havia falido fragorosamente. A credibilidade deles est no nvelmais baixo de todos os tempos. Eles tm uma megaviso: mudar a maneira como as pessoas secomunicam usando uma nova tecnologia denominada avatares (lembremos, isso foi antes dofilme recordista de bilheteria de James Cameron). Eles esto seguindo um visionrio chamadoWill Harvey, que pinta um quadro cativante: pessoas se conectando on-line com os amigos,usando avatares para lhes dar uma combinao segura de conexo ntima e anonimato. Aindamelhor: em vez de a startup ter de criar todo o vesturio, mobilirio e acessrios de que essesavatares precisariam para suas vidas digitais, os clientes seriam incentivados a criar essascoisas e vend-las uns aos outros.

    O desafio de engenharia diante deles imenso: criar mundos virtuais, contedo gerado pelousurio, um mecanismo de comrcio on-line, micropagamentos, e finalmente e igualmenteimportante a tecnologia de avatares tridimensionais que poderia ser processada em qualquerPC.

    Eu tambm fao parte dessa segunda histria. Sou cofundador e diretor de tecnologia dessaempresa, a IMVU. Neste ponto de nossas carreiras, meus cofundadores e eu estamosdeterminados a cometer novos erros. Fazemos tudo errado: em vez de passarmos anosaperfeioando nossa tecnologia, desenvolvemos um produto mnimo vivel, um produto inicial

  • que terrvel, cheio de bugs (erros de programao) e problemas de instabilidade que travamo computador. Ento, ns o disponibilizamos para os clientes bem antes de estar pronto. Ecobramos dinheiro por isso. Aps conseguir os primeiros clientes, mudamos o produtoconstantemente rpido demais para os padres tradicionais , lanando novas versesdezenas de vezes todos os dias.

    Ns realmente tivemos clientes naqueles primeiros dias verdadeiros adotantes iniciais(early adopters) visionrios , e, frequentemente, conversvamos com eles e pedamos seufeedback. No entanto, no fazamos nada do que eles falavam. Considervamos suasrecomendaes apenas umas das fontes de informao a respeito do nosso produto e da nossaviso geral. De fato, estvamos mais propensos a realizar experimentos com nossos clientesdo que a atender seus caprichos.

    O pensamento empresarial tradicional afirma que essa abordagem no deveria funcionar,mas funciona, e voc no tem de acreditar em mim. Como veremos neste livro, a abordagemque desbravamos na IMVU tornou-se a base de um novo movimento de empreendedores emtodo o mundo. Essa abordagem se desenvolve sobre diversas ideias prvias de administraoe desenvolvimento de produto, incluindo a manufatura enxuta, o design thinking, odesenvolvimento de clientes (customer development) e o desenvolvimento gil. Representauma nova abordagem para criar a inovao contnua. Eu a denominei de startup enxuta (leanstartup).

    Apesar da grande quantidade de literatura a respeito de estratgia empresarial, atributos-chave dos lderes empresariais e maneiras de identificar a prxima grande sensao, osinovadores ainda lutam para trazer tona suas ideias. Essa frustrao foi o gatilho que noslevou a tentar uma abordagem nova e radical na IMVU, caracterizada por um tempo de ciclomuito rpido, por um foco no que os clientes queriam (sem lhes perguntar), e por umaabordagem cientfica de tomada de decises.

    Origens da startup enxutaSou uma daquelas pessoas que cresceu programando computadores. Assim, meu caminho parapensar a respeito de empreendedorismo e administrao foi tortuoso. Sempre trabalhei na reade desenvolvimento de produtos em minha rea de atuao; meus parceiros e chefes eramgerentes ou profissionais de marketing, e meus colegas trabalhavam em desenvolvimento eoperaes. Na minha carreira, tive repetidas oportunidades de trabalhar arduamente emprodutos que acabaram fracassando no mercado.

    A princpio, em grande medida por causa do meu background, via esses fracassos comoproblemas tcnicos que exigiam solues tcnicas: melhor arquitetura, melhor processo dedesenvolvimento, mais disciplina, foco ou viso de produto. Essas pretensas melhoriasresultaram em fracassos ainda maiores. Assim, li tudo que caiu em minhas mos e tive abno de ter como mentores alguns dos indivduos mais brilhantes do Vale do Silcio. Napoca em que me tornei cofundador do IMVU, estava sedento por novas ideias a respeito decomo desenvolver uma empresa.

    Tive a sorte de ter scios que estavam dispostos a experimentar novas abordagens. Eles

  • estavam fartos assim como eu das deficincias do pensamento tradicional. Tambmtivemos a sorte de ter Steve Blank como investidor e consultor. Em 2004, Steve tinha acabadode comear a pregar uma nova ideia: as funes de negcio e marketing de uma startup deviamser consideradas to importantes quanto as de engenharia e desenvolvimento de produto, e,portanto, mereciam uma metodologia igualmente rigorosa para orient-las. Essa metodologia,que ele denominou desenvolvimento de clientes, me ofereceu insights e orientao notrabalho dirio como empreendedor.

    Enquanto isso, eu formava a equipe de desenvolvimento de produto da IMVU utilizandoalguns dos mtodos heterodoxos que mencionei anteriormente. Comparados s teoriastradicionais de desenvolvimento de produto que havia aprendido em minha carreira, essesmtodos no faziam sentido. No entanto, pude perceber por experincia prpria que estavamfuncionando. Esforcei-me, ento, para explicar as prticas aos novos funcionrios,investidores e fundadores de outras empresas. Carecamos de uma linguagem comum paradescrev-las e de princpios concretos para compreend-las.

    Comecei a procurar ideias em iniciativas no exterior que pudessem me ajudar acompreender minha experincia. Comecei a estudar outros setores, especialmente o industrial,que origina a maioria das teorias modernas de administrao. Estudei a manufatura enxuta,processo que nasceu no Japo com o Sistema de Produo Toyota: um modo totalmente novode pensar acerca da manufatura de bens fsicos. Constatei que, ao aplicar ideias da manufaturaenxuta aos meus desafios empresariais com alguns ajustes e mudanas , eu tinha o comeode um arcabouo que fazia sentido para eles.

    Essa linha de pensamento evoluiu at a startup enxuta: a aplicao do pensamento enxuto aoprocesso de inovao.

    A IMVU tornou-se um grande sucesso. Seus clientes criaram mais de 60 milhes deavatares. uma empresa lucrativa, com receita anual de mais de 50 milhes de dlares em2011, e que emprega mais de cem pessoas em seus atuais escritrios em Mountain View, naCalifrnia. O catlogo de produtos virtuais da IMVU que pareceu to arriscado anos atrs agora possui mais de 6 milhes de itens; mais de 7 mil so adicionados por dia, quase todoscriados pelos clientes.

    Como resultado desse sucesso, comecei a ser solicitado a dar conselhos a outras startups einvestidores de capital de risco. Ao descrever minhas experincias na IMVU, muitas vezesenfrentava olhares sem expresso ou ceticismo extremo. A reao mais comum era: Issonunca vai funcionar. Minha experincia ia to contra o pensamento convencional, que amaioria das pessoas, mesmo no centro de inovao que o Vale do Silcio, no era capaz deentender.

    Ento, comecei a escrever, primeiro num blog intitulado Startup Lessons Learned, e a falar em conferncias, para empresas, startups e investidores de capital de risco para qualquerpessoa com vontade de escutar. Ao ser convocado para defender e explicar minhaspercepes, e com a colaborao de outros autores, pensadores e empreendedores, tive aoportunidade de refinar e desenvolver a teoria da startup enxuta alm dos seus princpiosrudimentares. Desde o comeo, minha esperana foi encontrar maneiras de eliminar osinmeros desperdcios que observava ao meu redor: startups que faziam produtos que ningum

  • queria, novos produtos retirados das prateleiras, incontveis sonhos irrealizados.Com o tempo, a ideia da startup enxuta floresceu num movimento mundial. Os

    empreendedores comearam a constituir grupos locais para discutir e aplicar as ideias dastartup enxuta. Atualmente, h comunidades de prtica organizadas em mais de cem cidades domundo.2 Viajei por pases e continentes. Em todos os lugares, observei sinais de um novorenascimento do empreendedorismo. O movimento da startup enxuta est tornando oempreendedorismo acessvel a toda uma nova gerao de fundadores, que esto sedentos pornovas ideias sobre como construir empresas bem-sucedidas.

    Embora meu background seja o empreendedorismo associado a software de alta tecnologia,o movimento cresceu bem alm dessas origens. Milhares de empreendedores esto utilizandoos princpios da startup enxuta em todos os setores possveis. Tive a oportunidade detrabalhar com empreendedores de empresas de todos os tamanhos, de setores distintos, e atmesmo no governo. Essa jornada me levou a lugares que nunca imaginei que conheceria, desdeos escritrios dos investidores de capital de risco mais importantes do mundo at as salas dediretoria das empresas constantes da Fortune 500, passando pelo Pentgono. A ocasio emque me senti mais nervoso numa reunio foi quando estava tentando explicar os princpios dastartup enxuta para o diretor de TI do Exrcito norte-americano, que um general trs estrelas(para registro, ele era extremamente aberto a novas ideias, mesmo de um civil como eu).

    Em pouco tempo, percebi que devia me concentrar no movimento da startup enxuta emperodo integral. Minha misso: melhorar a taxa de sucesso de novos produtos inovadores nomundo inteiro. O resultado o livro que voc est lendo.

    O mtodo da startup enxutaEste um livro para empreendedores e para as pessoas s quais eles respondem. Os cincoprincpios da startup enxuta, que permeiam todas as trs partes deste livro, so os seguintes:

    1. Empreendedores esto por toda parte. Voc no precisa trabalhar numa garagempara estar numa startup. O conceito de empreendedorismo inclui qualquer pessoaque trabalha dentro da minha definio de startup: uma instituio humana projetadapara criar novos produtos e servios sob condies de extrema incerteza. Issosignifica que os empreendedores esto por toda parte, e a abordagem da startupenxuta pode funcionar em empresas de qualquer tamanho, mesmo numa de grandeporte, em qualquer setor ou atividade.

    2. Empreender administrar. Uma startup uma instituio, no um produto, assim,requer um novo tipo de gesto, especificamente constituda para seu contexto deextrema incerteza. De fato, como discutirei depois, acredito que empreendedordeveria ser considerado um cargo em todas as empresas modernas que dependemda inovao para seu crescimento futuro.

    3. Aprendizado validado. Startups existem no apenas para fabricar coisas, ganhardinheiro ou mesmo atender clientes. Elas existem para aprender a desenvolver umnegcio sustentvel. Essa aprendizagem pode ser validada cientificamente por meio

  • de experimentos frequentes que permitem aos empreendedores testar cada elementode sua viso.

    4. Construir-medir-aprender. A atividade fundamental de uma startup transformarideias em produtos, medir como os clientes reagem, e, ento, aprender se o casode pivotar ou perseverar. Todos os processos de startup bem-sucedidos devem servoltados a acelerar esse ciclo de feedback.

    5. Contabilidade para inovao. A fim de melhorar os resultados doempreendedorismo e poder atribuir responsabilidades aos inovadores, precisamosfocar tambm em assuntos menos interessantes: como medir o progresso, definirmarcos e como priorizar o trabalho. Isso requer um novo tipo de contabilidadedesenvolvida para startups e para as pessoas responsveis por elas.

    Por que as startups fracassam tanto?O primeiro problema a fascinao associada a um bom plano, a uma estratgia slida e a

    uma pesquisa de mercado completa. Em pocas anteriores, essas coisas eram indicadoras deum provvel sucesso. A tentao de tambm aplic-las s startups irresistvel, mas isso nofunciona, pois as startups operam com muita incerteza. As startups ainda no sabem quem soseus clientes ou como devem ser seus produtos. medida que o mundo fica mais incerto, cada vez mais difcil prever o futuro. Os mtodos antigos de administrao no esto alturada tarefa. Planejamento e previso so precisos apenas quando baseados num histricooperacional longo e estvel, e num ambiente relativamente esttico. Startups no tm nenhumdos dois.

    O segundo problema que aps observarem a administrao tradicional falhar na soluodesse problema, alguns empreendedores e investidores jogaram a toalha e adotaram a escolade startups simplesmente faa (just do it). Essa escola acredita que, se a gesto oproblema, o caos a resposta. Infelizmente, como pude atestar por experincia prpria, issotambm no funciona.

    Pode parecer absurdo achar que algo to disruptivo, inovador e catico como uma startuppossa ser gerenciado, ou, para ser exato, deva ser gerenciado. A maioria das pessoasconsidera o processo e a administrao maantes e desinteressantes, enquanto as startups sodinmicas e estimulantes. No entanto, o que realmente estimulante ver uma startup ter xitoe mudar o mundo. A paixo, a energia e a viso que as pessoas trazem para esses novosempreendimentos so recursos muito preciosos para desperdiar. Podemos e devemos fazer melhor. Este livro trata de como fazer isso.

    Como este livro organizadoEste livro dividido em trs partes: Viso, Direo e Acelerao.

    A parte intitulada Viso defende a ideia de uma nova disciplina de administraoempresarial. Identifico quem um empreendedor, defino uma startup e articulo uma novamaneira de as startups medirem se esto fazendo progressos, denominada aprendizagemvalidada. Para alcanar essa aprendizagem, veremos que as startups em uma garagem ou

  • dentro de uma empresa podem utilizar a experimentao cientfica para descobrir comodesenvolver um negcio sustentvel.

    A parte denominada Direo analisa o mtodo da startup enxuta em detalhes, mostrandouma volta completa do ciclo bsico de feedback construir-medir-aprender. Comeando comsuposies do tipo atos de f, que clamam por testes rigorosos, voc aprender como construirum produto mnimo vivel para testar essas suposies, um novo sistema contbil para avaliarse voc est progredindo, e um mtodo para decidir entre mudar de rumo, mas com um pfincado no cho, ou perseverar.

    Na parte intitulada Acelerao, investigaremos tcnicas que permitem s startups enxutasacelerar atravs do ciclo de feedback construir-medir-aprender to rpido quanto possvel,mesmo durante sua expanso. Tambm analisaremos os conceitos de manufatura enxuta, queso pertinentes s startups, como o poder dos pequenos lotes. Tambm discutiremos projetoorganizacional, como os produtos se desenvolvem, e de que forma aplicar os princpios dastartup enxuta alm da proverbial garagem, inclusive dentro das maiores empresas do mundo.

    Sculo II da administraoComo sociedade, dispomos de um conjunto comprovado de tcnicas para administrar grandesempresas, e conhecemos as melhores prticas para construir produtos fsicos. No entanto,quando se trata de startups e inovao, ainda estamos atirando no escuro. Ficamos nos valendode vises, caando os grandes homens capazes de fazer a mgica acontecer, ou ficamostentando analisar nossos novos produtos at no poder mais. Esses so novos problemas,nascidos do sucesso da administrao no sculo XX.

    Este livro procura assentar numa base slida o empreendedorismo e a inovao. Estamos noalvorecer do sculo II da administrao. nosso desafio fazer algo grande com aoportunidade que temos. O movimento da startup enxuta procura assegurar que aqueles de nsque desejam desenvolver a prxima grande inveno tero as ferramentas necessrias paramudar o mundo.

    1 Empresa recm-criada, recm-estabelecida, nascente. Ou, um grupo de pessoas que tenta transformar uma ideia em um novoproduto e criar uma empresa. Posteriormente, o autor apresenta sua definio de startup. (N. T.)

    2 Para uma lista atualizada das comunidades de startup enxuta, ou para localizar uma perto de voc, ver , ou Lean Startup Wiki: . Consulte tambm o Captulo 14: Junte-se ao movimento.

    http://leanstartup.meetup.comhttp://leanstartup.pbworks.com/Meetups

  • Parte IVISO

  • D

    1COMEAR

    esenvolver uma startup um exerccio de desenvolver uma instituio, portanto, envolvenecessariamente administrao. Muitas vezes, isso surge como uma grande surpresa para

    os aspirantes a empreendedores, pois suas associaes com essas duas palavras sodiametralmente opostas. Os empreendedores so justificadamente cautelosos em relao implementao de prticas gerenciais tradicionais no incio de uma startup, receosos de queestas atrairo a burocracia ou reprimiro a criatividade.

    Durante dcadas, os empreendedores e seus problemas singulares destoaram daadministrao geral. Em consequncia, muitos adotam uma atitude simplesmente faa,evitando todas as formas de gesto, processo e disciplina. Infelizmente, essa abordagemconduz com mais frequncia ao caos do que ao sucesso. Eu sei por experincia: meusprimeiros fracassos relativos a startups foram todos desse tipo.

    No ltimo sculo, o grande sucesso da administrao geral proporcionou uma abundnciamaterial sem precedentes, mas esses princpios de administrao so mal adaptados para lidarcom o caos e a incerteza normalmente enfrentados pelas startups.

    * * *

    Acredito que o empreendedorismo requer uma disciplina gerencial prpria para aproveitara oportunidade empresarial que lhe foi dada.

    Atualmente, h mais empreendedores atuando do que em qualquer outro perodo da histria.Isso se tornou possvel por causa das mudanas drsticas da economia global. Para mencionarapenas um exemplo: frequentemente, escutamos os analistas lamentarem a perda de empregosna indstria norte-americana nas duas ltimas dcadas, mas raramente escutamos acerca dacorrespondente perda da capacidade manufatureira. Isso porque, nos Estados Unidos, aprodutividade industrial est aumentando (cerca de 15% na ltima dcada), mesmo diante dacontnua perda de empregos (ver os grficos a seguir). De fato, os aumentos considerveis deprodutividade possibilitados pela moderna administrao e tecnologia criaram maiscapacidade produtiva do que as empresas sabem como lidar.3

  • Estamos vivendo um renascimento sem precedentes do empreendedorismo mundial, masessa oportunidade corre riscos. Como carecemos de um paradigma gerencial coerente com asnovas iniciativas de inovao, estamos pondo de lado nosso excesso de capacidade com umanaturalidade extravagante. Apesar dessa falta de rigor, estamos encontrando algumas maneirasde ganhar dinheiro, mas para cada sucesso h muitos fracassos: produtos so retirados dasprateleiras poucas semanas depois do lanamento, startups badaladas pela imprensa soesquecidas alguns meses depois, e novos produtos acabam no sendo usados por ningum. Oque torna esses insucessos especialmente dolorosos no somente o dano econmico causadoa funcionrios, empresas e investidores; eles tambm so um desperdcio gigantesco dosrecursos mais preciosos da nossa civilizao: o tempo, a paixo e a habilidade das pessoas. Omovimento da startup enxuta dedicado a impedir esses insucessos.

  • AS RAZES DA STARTUP ENXUTAA startup enxuta tira seu nome da produo enxuta, a revoluo que Taiichi Ohno e ShigeoShingo promoveram na Toyota. O pensamento enxuto est alterando radicalmente a maneirapela qual as cadeias de suprimento e os sistemas de produo so conduzidos. Entre seus

  • princpios esto o aproveitamento do conhecimento e da criatividade de cada funcionrio, areduo dos tamanhos dos lotes, a produo do tipo just in time, o controle do estoque e aacelerao do tempo de ciclo. Ensinou ao mundo a diferena entre atividades com valor dasoutras, e mostrou como desenvolver qualidade nos produtos de dentro para fora.

    A startup enxuta adapta essas ideias ao contexto do empreendedorismo, propondo que osempreendedores julguem seu progresso de maneira distinta do modo pelo qual outros tipos deiniciativas empresariais julgam. O progresso na manufatura medido pela produo de bensfsicos de alta qualidade. Como veremos no Captulo 3, a startup enxuta utiliza uma unidadediferente de progresso, denominada aprendizagem validada. Com a aprendizagem cientficacomo nosso parmetro, podemos descobrir e eliminar as fontes de desperdcio que assolam oempreendedorismo.

    Uma teoria abrangente de empreendedorismo deve abordar todas as funes de umempreendimento na fase inicial: viso e conceito, desenvolvimento de produto, marketing evendas, aumento de escala, parcerias e distribuio, e estrutura e desenho organizacional. Temde proporcionar um mtodo de medir o progresso num contexto de extrema incerteza. Pode daraos empreendedores orientao clara sobre como tomar diversas decises espinhosas:investir ou no em processo e quando investir; formulao, planejamento e criao deinfraestrutura; quando fazer sozinho e quando fazer com uma parceria; quando responder aofeedback e quando persistir na viso; e como e quando investir na expanso da capacidade daempresa. E mais que tudo: deve permitir aos empreendedores a realizao de previses quepodem ser testadas.

    Por exemplo, consideremos a recomendao de que voc forme equipes multifuncionais,responsveis pelo que denominamos marcos de aprendizagem, em vez de organizar suaempresa em rgidos departamentos funcionais (marketing, vendas, tecnologia da informao,recursos humanos etc.), que incentivam as pessoas a desempenhar bem suas funes em suasreas de especializao (ver Captulo 7). Talvez voc concorde com essa recomendao, outalvez fique ctico. De qualquer maneira, se decidir implementar a recomendao, prevejo querapidamente ter feedback das suas equipes de que o novo processo est reduzindo aprodutividade. As equipes solicitaro um retorno ao antigo modo de trabalho, no qual tinham aoportunidade de permanecer eficientes trabalhando em lotes maiores e compartilhando otrabalho entre departamentos.

    seguro prever esse resultado, e no s porque observei isso diversas vezes na empresa emque trabalho. uma previso objetiva da prpria teoria da startup enxuta. Quando as pessoasesto acostumadas a avaliar sua produtividade somente considerando a prpria funo, elasacham que um dia bom aquele em que fizeram bem seu trabalho durante todo o dia. Quandotrabalhei como programador, isso significava oito horas diretas de programao, seminterrupo. Aquele era um dia bom. Em contraste, se era interrompido com perguntas,processos, ou Deus me livre! reunies, me sentia mal. O que eu realmente executavanaquele dia? Codificao e funcionalidades do produto eram tangveis para mim; podia v-las, entend-las e mostr-las. A aprendizagem, em contraste, intangvel.

    A startup enxuta pede para as pessoas comearem a medir sua produtividade de maneiradiferente. Como as startups muitas vezes desenvolvem acidentalmente algo que ningum quer,

  • no tem muita importncia se as pessoas fazem isso no prazo e dentro do oramento. Oobjetivo de uma startup descobrir a coisa certa a criar a coisa que os clientes querem epela qual pagaro o mais rpido possvel. Em outras palavras: a startup enxuta uma novamaneira de considerar o desenvolvimento de produtos novos e inovadores, que enfatizainterao rpida e percepo do consumidor, uma grande viso e grande ambio, tudo aomesmo tempo.

    * * *

    Henry Ford um dos empreendedores mais bem-sucedidos e famosos de todos os tempos.Como a ideia da administrao foi associada histria do automvel desde os primeiros dias,acredito que apropriado empregar o automvel como metfora para uma startup.

    Um carro equipado com dois ciclos de feedback importantes e muito diferentes. Oprimeiro ciclo ocorre dentro do motor de combusto interna. Antes de Henry Ford se tornarum CEO famoso, ele era engenheiro. Em sua oficina, passou dias e noites experimentando amecnica exata para obter o movimento dos cilindros do motor. Cada pequena exploso dentrodo cilindro gera fora motriz para girar as rodas, e tambm produz a ignio da prximaexploso. Se o timing desse ciclo de feedback no for gerenciado de modo preciso, o motorvai engasgar e deixar de funcionar.

    As startups possuem um motor semelhante, que denomino motor de crescimento. Osmercados e os clientes para as startups so distintos: uma empresa de brinquedos, uma firmade consultoria e uma fbrica podem no parecer que tm muito em comum, mas, comoveremos, funcionam com o mesmo motor de crescimento.

    Cada nova verso de um produto, cada novo recurso e cada novo programa de marketingso uma tentativa de melhorar esse motor de crescimento. Como as experincias de HenryFord em sua oficina, nem todas essas mudanas geram melhorias. O desenvolvimento de umnovo produto acontece aos trancos e barrancos. Muito tempo na vida de uma startup gastoregulando o motor a fim de obter melhorias no produto, no marketing ou nas operaes.

    O segundo ciclo de feedback importante num automvel est entre o motorista e o volante.Esse feedback to imediato e automtico que muitas vezes no pensamos nele, mas aconduo que diferencia o ato de dirigir da maioria das outras formas de transporte. Se vocvai de carro para o trabalho todos os dias, provavelmente conhece o trajeto to bem que suasmos parecem gui-lo at l espontaneamente. Podemos percorrer o trajeto praticamentedormindo. No entanto, se eu lhe pedir para fechar os olhos e anotar exatamente como chegarao seu escritrio no os sentidos das ruas, mas cada ao que voc precisa fazer, cadamovimento da mo no volante e dos ps nos pedais , voc considerar isso impossvel. Acoreografia da conduo incrivelmente complexa quando a pessoa para de fazer outrascoisas para pensar a respeito.

    Em contraste, uma espaonave requer exatamente esse tipo de calibragem prvia. Tem deser lanada com as instrues mais precisas sobre o que deve ser feito: cada empuxo, cadadescarga do propulsor e cada mudana de direo. O menor erro no local de lanamento podeprovocar resultados catastrficos milhares de quilmetros depois.

  • Infelizmente, diversos planos de negcios de startups parecem mais que esto planejando olanamento de uma espaonave do que a conduo de um carro. Esses planos prescrevem ospassos a seguir e os resultados esperados nos mnimos detalhes, e como no planejamento paralanar um foguete, so configurados de uma maneira que mesmo erros minsculos nashipteses podem levar a resultados catastrficos.

    Uma empresa em que trabalhei foi infeliz em prever uma significativa adoo pelos clientes na casa dos milhes de um dos seus novos produtos. Alimentado por um lanamentoespalhafatoso, a empresa executou bem seu plano. Infelizmente, os clientes no adquiriram oproduto em nmeros expressivos. Ainda pior, a empresa investira em grande infraestrutura,contrataes e suporte para lidar com o fluxo de clientes esperado. Quando os clientes no sematerializaram, a empresa tinha se comprometido tanto que no conseguiu se adaptar nodevido tempo. Ela tinha alcanado o fracasso fielmente, com xito e executando com rigorum plano que se revelou completamente imperfeito.

    O mtodo da startup enxuta, em contraste, projetado para voc aprender a dirigir umastartup. Em vez de projetar planos complexos, baseados em inmeras hipteses, voc podefazer ajustes constantes por meio do volante, que o ciclo de feedback construir-medir-aprender. Por meio desse processo de conduo, podemos aprender quando e se o momentode fazermos uma curva fechada chamada piv ou se devemos perseverar em nosso caminhoatual. Uma vez que temos um motor em funcionamento, a startup enxuta oferece mtodos paradimensionar e desenvolver o negcio com acelerao mxima.

    Em todo processo de conduo, voc sempre tem uma ideia clara de onde est indo. Se vocest indo para o trabalho, no desiste porque h um desvio no caminho ou porque entrou numarua errada. Voc continua concentrado em chegar ao seu destino.

    As startups tambm possuem um norte verdadeiro, um destino em mente: criar um negcioprspero e capaz de mudar o mundo. Chamo isso de viso de uma startup. Para alcanar essaviso, as startups empregam uma estratgia, que inclui um modelo de negcios, um plano deproduto, um ponto de vista acerca dos parceiros e dos concorrentes, e as ideias a respeito dequem sero os clientes. O produto o resultado final dessa estratgia (ver o grfico na pgina20).

  • Os produtos mudam constantemente atravs do processo de otimizao, o que denominoajustando o motor. Com menos frequncia, a estratgia pode ter de mudar. No entanto, a visodominante raramente muda. Os empreendedores esto comprometidos a conduzir a startup ataquele destino. Cada revs uma oportunidade de aprendermos como chegar aonde queremos(ver o grfico abaixo).

  • Na vida real, uma startup um portflio de atividades. Muita coisa est acontecendosimultaneamente: o motor est em funcionamento, adquirindo novos clientes e atendendo osexistentes; estamos fazendo ajustes, tentando melhorar nosso produto, marketing e operaes; eestamos na conduo, decidindo se devemos pivotar e quando. O desafio doempreendedorismo equilibrar todas essas atividades. Mesmo as menores startups enfrentamo desafio de dar apoio aos clientes existentes enquanto procuram inovar. Mesmo a empresamais estabelecida, enfrenta o imperativo de investir em inovao, a fim de no se tornarobsoleta. medida que a empresa cresce, o que muda o mix dessas atividades no seuportflio de trabalho.

    * * *

    Empreender gerenciar. No entanto, imagine uma gerente moderna que tem a misso deconstruir um novo produto no contexto de uma empresa estabelecida. Imagine que ela procureo diretor financeiro da empresa um ano depois, dizendo: No conseguimos cumprir as metasde crescimento que previmos. Na realidade, no temos quase nenhum novo cliente e nenhumanova receita. Contudo, aprendemos muito e estamos na iminncia de uma nova linha denegcios revolucionria. Tudo de que precisamos de mais um ano. Na maioria das vezes,esse seria o ltimo informe que essa empreendedora interna daria ao seu empregador. Omotivo para isso que, na administrao geral, o fracasso em apresentar resultados deve-seao insucesso de planejar adequadamente ou ao insucesso de executar corretamente. Os doisso lapsos significativos. No entanto, o desenvolvimento de um novo produto na economiamoderna requer exatamente esse tipo de fracasso no caminho para a grandeza. No movimentoda startup enxuta, comeamos a perceber que esses inovadores internos tambm soempreendedores, e que a administrao do empreendedorismo pode ajud-los a ter xito; esse o tema do prximo captulo.

    3 As estatsticas e anlises do setor manufatureiro so extradas do blog Five Thirty Eight:http://www.fivethirtyeight.com/2010/02/us-manufacturing-is-not-dead.html.

    http://www.fivethirtyeight.com/2010/02/usmanufacturingisnotdead.html

  • N

    2DEFINIR

    as minhas viagens pelo mundo falando a respeito da startup enxuta, fico muitas vezessurpreso ao encontrar pessoas na plateia que parecem deslocadas. Alm dos

    empreendedores de startup mais tpicos que encontro, aquelas pessoas so gerentes gerais, amaioria trabalhando em empresas muito grandes, e que tm a misso de criar novosempreendimentos ou inovaes de produtos. Eles so versados em polticas organizacionais:sabem como constituir divises autnomas com demonstraes de resultados distintas, econseguem proteger equipes polmicas da intromisso corporativa. A maior surpresa queeles so visionrios. Como os fundadores de startups com os quais trabalhei durante anos, elesconseguem vislumbrar o futuro dos seus setores, e esto preparados para assumir riscosousados, em busca de solues novas e inovadoras para os problemas enfrentados por suasempresas.

    Mark, por exemplo, gerente de uma empresa muito grande e participou de uma das minhaspalestras. Ele lder de uma diviso e recentemente foi convocado a trazer sua empresa parao sculo XXI, desenvolvendo um novo conjunto de produtos projetados para tirar proveito daInternet. Quando ele veio conversar comigo mais tarde, comecei a lhe dar o conselho padroacerca de como criar equipes de inovao dentro de uma grande empresa. Ele me interrompeuno meio da explanao: Sim, eu li O dilema do inovador.4 J cuidei de tudo. Mark era umfuncionrio antigo da empresa e um gerente bem-sucedido em iniciativas internas. Assim,gerenciar a poltica interna era o menor dos seus problemas. Eu deveria ter percebido; seusucesso era o testemunho da sua capacidade de navegar pelas polticas corporativas, pelopessoal e pelos processos da empresa para a realizao de tarefas.

    Em seguida, procurei lhe dar alguns conselhos acerca do futuro, a respeito de algumas novastecnologias de desenvolvimento de produto com muito potencial. Novamente, ele meinterrompeu: Certo. Sei tudo a respeito de Internet, e tenho a viso de como nossa empresaprecisa se adaptar a ela ou morrer.

    Mark tem definidos todos os pr-requisitos para o empreendedorismo estrutura de equipeapropriada, pessoal de qualidade, viso forte do futuro e apetite por assumir riscos e assim,finalmente, ocorreu-me de perguntar o motivo pelo qual ele estava pedindo meus conselhos.Ele respondeu: como se tivssemos todas as matrias-primas: gravetos, lenha, papel, pedrade isqueiro, at algumas fagulhas. Mas onde est o fogo?. As teorias de administraoestudadas por Mark tratam a inovao como uma caixa preta, enfocando as estruturas que asempresas precisam pr no lugar para formar equipes internas de startups. No entanto, Mark

  • viu-se trabalhando dentro da caixa preta e com necessidade de orientao.O que Mark estava precisando era de um processo para converter as matrias-primas da

    inovao em sucessos de breakthrough no mundo real. Assim que uma equipe est formada, oque ela deve fazer? Que processos deve utilizar? Como atribuir-lhe responsabilidades paracumprir etapas? Essas so perguntas que a metodologia da startup enxuta est determinada aresponder.

    Minha concluso? Mark to empreendedor quanto um fundador do Vale do Silcio comuma startup de alta tecnologia na garagem. Ele precisa dos princpios da startup enxuta damesma forma que as pessoas que considero empreendedores clssicos precisam.

    s vezes, os empreendedores que atuam dentro de uma organizao estabelecida sochamados de empreendedores internos (intrapreneurs), por causa das circunstnciasespecficas que caracterizam o desenvolvimento de uma startup dentro de uma grandeempresa. Como apliquei as ideias da startup enxuta em uma grande variedade de empresas eramos de atividade, passei a acreditar que os empreendedores internos tm muito mais emcomum com o restante da comunidade de empreendedores do que a maioria das pessoasacredita. Portanto, quando utilizo o termo empreendedor, estou me referindo a todo oecossistema de startup, independentemente do tamanho da empresa, do setor ou do estgio dedesenvolvimento.

    Este livro para empreendedores de todas as classes: desde jovens visionrios com poucosrecursos, mas com grandes ideias, at visionrios experientes dentro de grandes empresas,como Mark e pessoas que atribuem responsabilidades a eles.

    SE EU SOU UM EMPREENDEDOR, O QUE UMASTARTUP?A startup enxuta um conjunto de prticas para ajudar os empreendedores a aumentar suaschances de desenvolver uma startup de sucesso. Para acabar com os mal-entendidos, importante definir o que uma startup:

    Uma startup uma instituio humana projetada para criar novos produtos e servios sob condies de extremaincerteza.

    Passei a perceber que a parte mais importante dessa definio o que ela omite. No diznada a respeito do tamanho da empresa, da atividade ou do setor da economia. Qualquerpessoa que est criando um novo produto ou negcio sob condies de extrema incerteza umempreendedor, quer saiba ou no, e quer trabalhe numa entidade governamental, uma empresaapoiada por capital de risco, uma organizao sem fins lucrativos ou uma empresa cominvestidores financeiros decididamente voltada para o lucro.

    Consideremos cada uma das partes. A palavra instituio conota burocracia, processo, atletargia. Como isso pode ser parte de uma startup? No entanto, as startups bem-sucedidasesto repletas de atividades associadas ao desenvolvimento de instituies: contratao defuncionrios criativos, coordenao das atividades deles, e criao de uma cultura

  • empresarial que gera resultados.Frequentemente, perdemos de vista o fato de que uma startup no consiste num produto,

    numa inovao tecnolgica ou at mesmo numa ideia brilhante. Uma startup maior do que asoma de suas partes; uma iniciativa intensamente humana.

    O fato de que o produto ou servio da startup uma nova inovao tambm parte essencialda definio, e tambm uma parte delicada. Prefiro empregar a definio mais ampla deproduto, aquela que abrange qualquer fonte de valor para as pessoas que se tornam clientes.Qualquer coisa que os clientes vivenciam da interao com uma empresa deve serconsiderada parte do produto daquela empresa. Isso verdade em relao a uma quitanda, umsite de comrcio eletrnico, um servio de consultoria e uma entidade de servio social semfins lucrativos. Em todos os casos, a organizao se dedica a revelar uma nova fonte de valorpara os clientes e se preocupa com o impacto do seu produto sobre esses clientes.

    Tambm importante que a palavra inovao seja compreendida amplamente. As startupsutilizam muitos tipos de inovao: descobertas cientficas originais, um novo uso para umatecnologia existente, criao de um novo modelo de negcios que libera um valor que estavaoculto, ou a simples disponibilizao do produto ou servio num novo local ou para umconjunto de clientes anteriormente mal atendidos. Em todos esses casos, a inovao o cernedo sucesso da empresa.

    H mais uma parte importante dessa definio: o contexto no qual a inovao acontece. Amaiorias das empresas grandes e pequenas esto excludas desses contextos. As startupsso projetadas para enfrentar situaes de extrema incerteza. Abrir uma nova empresa, queseja um clone exato de um negcio existente, copiando modelo de negcios, precificao,cliente-alvo e produto, pode at ser um investimento econmico atraente, mas no umastartup, pois seu sucesso depende somente da execuo tanto que esse sucesso pode sermodelado com grande exatido. (Eis por que tantas pequenas empresas podem ser financiadascom simples emprstimos bancrios; o nvel de risco e incerteza so to bem entendidos queum analista de crdito pode avaliar suas perspectivas futuras.)

    A maioria das ferramentas da administrao geral no so projetadas para florescer no soloadverso da extrema incerteza, no qual as startups vicejam. O futuro imprevisvel, os clientestestemunham um conjunto crescente de alternativas, e o ritmo da mudana est sempreaumentando. No entanto, a maioria das startups tanto em garagens quanto em empresas ainda administrada por meio de prognsticos padro, marcos de produtos e planos denegcios detalhados.

    A HISTRIA DO SNAPTAXEm 2009, uma startup decidiu tentar algo realmente audacioso. Ela queria livrar oscontribuintes dos onerosos contadores mediante a automatizao do processo de coleta deinformaes tipicamente encontradas nos formulrios W-2 (a declarao anual que a maioriados funcionrios americanos recebe do empregador, que resume os salrios tributveis doano). Rapidamente, a startup esbarrou em dificuldades. Ainda que muitos consumidorestivessem acesso a uma impressora/scanner em casa ou escritrio, poucos sabiam como utilizar

  • esses aparelhos. Aps diversas conversas com possveis clientes, a equipe se decidiu porfazer os clientes tirarem fotos de formulrios com seus celulares. E, ao testar esse conceito, osclientes perguntaram algo inesperado: seria possvel preencher toda declarao de impostode renda no prprio telefone?

    Isso no era uma tarefa fcil. O preenchimento tradicional da declarao de imposto derenda exige que os contribuintes enfrentem centenas de perguntas, diversos formulrios e ummonte de papelada. Aquela startup tentou algo original: decidiu disponibilizar uma versoinicial do seu produto mesmo no sendo capaz de realizar um trabalho completo. A versoinicial funcionava somente para pessoas fsicas com renda muito simples a declarar, efuncionava somente na Califrnia.

    Em vez de a pessoa fsica preencher um formulrio complexo, ela podia utilizar a cmera docelular para tirar uma foto do seu formulrio W-2. A partir dessa simples foto, a startupdesenvolveu a tecnologia para compilar e preencher a maioria dos formulrios 1040 EX dedeclarao de imposto de renda. Em comparao com o trabalho rduo de preparaotradicional da declarao, o novo produto denominado SnapTax proporciona umaexperincia mgica. Do seu comeo modesto, o SnapTax transformou-se numa significativahistria de sucesso de startup. Em 2011, seu lanamento nacional revelou que os clientesgostavam do produto, alcanando mais de 350 mil donwloads nas primeiras trs semanas.

    Esse o tipo de inovao incrvel que podemos esperar de uma nova startup.No entanto, o nome dessa empresa pode surpreend-lo. O SnapTax foi desenvolvido pela

    Intuit, a maior fabricante norte-americana de ferramentas de finanas, tributos e contabilidadepara pessoas fsicas e pequenas empresas. Com mais de 7 mil funcionrios e receitas anuaisna casa dos bilhes de dlares, a Intuit no uma startup tpica.5

    A equipe que desenvolveu o SnapTax no se parece muito com a imagem arquetpica dosempreendedores. Seus membros no trabalham numa garagem nem comem macarroinstantneo. A empresa deles no carece de recursos financeiros. Eles recebem salriosintegrais e benefcios. Trabalham num escritrio todos os dias. Contudo, so empreendedores.

    Histrias como essa no so to comuns dentro das grandes corporaes como deveriamser. Afinal de contas, o SnapTax concorre diretamente com um dos principais produtos daIntuit: o software TurboTax. Em geral, empresas como a Intuit caem na armadilha descrita emO dilema do inovador, de Clayton Christensen: elas so muito boas na criao de melhoriasincrementais em produtos existentes e no atendimento aos clientes existentes, que Christensendenominou inovao de sustentao, mas enfrentam dificuldades para criar novos produtosdisruptivos a inovao radical , o que pode criar novas fontes sustentveis de crescimento.

    Uma parte notvel da histria do SnapTax o que os lderes da equipe responderam quandolhes perguntei a respeito da explicao para seu improvvel sucesso. Eles contrataramempreendedores famosos de fora da empresa? No, eles formaram uma equipe comfuncionrios da prpria empresa. Eles enfrentaram a intromisso constante da alta direo,que a runa das equipes de inovao de diversas empresas? No, seus patrocinadoresexecutivos criaram uma ilha de liberdade, onde puderam experimentar o quanto foinecessrio. Eles tiveram uma grande equipe, um grande oramento e muito dinheiro para omarketing? No! Eles comearam com uma equipe de cinco pessoas.

  • O que permitiu que a equipe do SnapTax inovasse no foram seus genes, o destino ou ossignos astrolgicos, mas um processo deliberadamente facilitado pela alta direo da Intuit. Ainovao algo que se d de baixo para cima, descentralizada e imprevisvel, mas no querdizer que no possa ser administrada. Pode, mas para isso requer uma nova disciplina deadministrao, uma que precisa ser dominada no s por empreendedores atuantes, buscandodesenvolver a prxima grande sensao, mas tambm pelas pessoas que os apoiam, que osnutrem e que lhes atribuem responsabilidades. Em outras palavras: cultivar oempreendedorismo responsabilidade da alta direo. Atualmente, uma empresa de pontacomo a Intuit pode apontar para histrias de sucesso como a do SnapTax, pois reconheceu anecessidade de um novo paradigma de administrao. Essa uma realizao que levou anospara se concretizar.6

    UMA STARTUP DE 7 MIL PESSOASEm 1983, o fundador da Intuit, o famoso empreendedor Scott Cook, teve a ideia radical (como cofundador Tom Proulx) de que um dia a contabilidade pessoal seria feita por computador.O sucesso deles estava longe de ser inevitvel: eles enfrentaram diversos concorrentes, umfuturo incerto e um mercado inicialmente diminuto. Uma dcada depois, a empresa abriu ocapital e, subsequentemente, defendeu-se de ataques bem divulgados de empresas maiores,incluindo a gigantesca Microsoft. Em parte com a ajuda de John Doerr, conhecido investidorde capital de risco, a Intuit tornou-se uma empresa bastante diversificada, integrante daFortune 1000, que, atualmente, fornece dezenas de produtos lderes de mercado atravs desuas principais divises.

    Esse o tipo de sucesso empresarial que temos o costume de escutar: uma equipedesordenada de pobres-diabos que acaba alcanando a fama, a aclamao e riquezaconsidervel.

    Voltemos a 2002. Cook estava frustrado. Ele acabara de tabular dez anos de dados de todosos lanamentos de novos produtos da Intuit e conclura que a empresa estava tendo um retornosofrvel sobre seus volumosos investimentos. Em resumo: vrios dos novos produtos noestavam dando certo. Pelos padres tradicionais, a Intuit uma empresa muito bemadministrada, mas conforme Cook se aprofundava nas causas bsicas desses insucessos,chegava a uma concluso difcil: o paradigma administrativo habitual que ele e sua empresaestavam praticando era inadequado em relao ao problema da inovao contnua daeconomia moderna.

    No outono de 2009, Cook havia trabalhado durante muitos anos para mudar a culturaadministrativa da Intuit. Ele tomou conhecimento dos meus trabalhos iniciais sobre a startupenxuta e me convidou para dar uma palestra na Intuit. No Vale do Silcio, esse no o tipo deconvite que voc recusa. Admito que fiquei curioso. Ainda estava no incio da minha jornadareferente startup enxuta e no tinha muita compreenso a respeito dos desafios enfrentadospor uma empresa integrante da Fortune 1000.

    Minha conversa com Cook e Brad Smith, o CEO da Intuit, foi minha iniciao a respeito dopensamento dos administradores modernos, que se esforam para empreender tanto quanto os

  • investidores de capital de risco e os fundadores numa garagem. Para enfrentar esses desafios,Cook e Smith esto voltando s razes da Intuit. Eles esto trabalhando para desenvolver oempreendedorismo e o ato de correr riscos em todos os setores da empresa.

    Por exemplo, consideremos um dos principais produtos da Intuit. Como a maior parte dasvendas do TurboTax acontece perto da poca da declarao de imposto de renda nos EstadosUnidos, o setor responsvel por ele costumava ter uma cultura extremamente conservadora.Ao longo do ano, as equipes de marketing e produto concebiam uma grande iniciativa, queseria lanada precisamente poca da declarao de impostos. Atualmente, elas testam maisde quinhentas alteraes diferentes nos dois meses e meio da poca da declarao de impostode renda. As equipes executam setenta testes diferentes por semana. Podem fazer uma mudanano site na quinta-feira, test-la no fim de semana, analisar os resultados na segunda-feira, echegar a uma concluso no comeo da tera-feira; ento idealizam novos testes na quinta-feira,e lanam o novo conjunto na noite desse mesmo dia.

    Como Cook afirma: Rapaz, atualmente, a quantidade de aprendizagem que se obtm imensa. Com isso se consegue o desenvolvimento de empreendedores, pois, se voc tem umnico teste, voc no tem empreendedores, tem polticos, porque tem de vender. Entre umacentena de boas ideias, voc tem de vender a sua ideia. Assim, voc cria uma sociedade depolticos e vendedores. Quando voc tem quinhentos testes em andamento, ento as ideias detodos podem ser testadas. E, ento, voc cria empreendedores que testam e aprendem, e quepodem testar de novo e reaprender, em contraste com uma sociedade de polticos. Assim,estamos tentando incentivar isso em toda a nossa organizao, usando exemplos que no tmnada a ver com alta tecnologia, como o exemplo do site. Toda empresa hoje em dia possui umsite. Voc no precisa ser high tech para utilizar ciclos rpidos de testes.

    Esse tipo de mudana difcil. Afinal de contas, a empresa possui um nmero significativode clientes que continuam a demandar servios excepcionais, e de investidores que esperamretornos constantes e crescentes.

    Cook prossegue: Vai contra a natureza do que as pessoas aprenderam em negcios e do queos lderes aprenderam. O problema no reside nas equipes de empreendedores. Eles adoram aoportunidade de rapidamente colocar seu beb no mercado. Adoram a oportunidade de ter ovoto do cliente, em vez da votao dos executivos. A questo real com os lderes e osgerentes de nvel mdio. H muitos lderes que foram bem-sucedidos por causa do pensamentoanaltico. Eles consideram que so analistas, e o trabalho deles fazer um grandeplanejamento, anlise, e ter um plano.

    O tempo que uma empresa tem de liderana de mercado para explorar suas inovaespioneiras est encolhendo, e isso cria um imperativo para que at mesmo as empresas maisbem estabelecidas invistam em inovao. De fato, do meu ponto de vista, o nico caminhosustentvel de uma empresa para o crescimento econmico a longo prazo desenvolver umafbrica de inovao utilizando as tcnicas da startup enxuta para criar inovaes radicaiscontinuamente. Em outras palavras, as empresas estabelecidas precisam descobrir comorealizar o que Scott Cook fez em 1983, mas numa escala industrial e com um grupoestabelecido de gerentes impregnados da cultura tradicional de administrao.

    Sempre inconformista, Cook me pediu para testar essas ideias, e, assim, dei uma palestra

  • que foi transmitida simultaneamente para todos os mais de 7 mil funcionrios da Intuit, na qualexpliquei a teoria da startup enxuta, repetindo minha definio: uma organizao projetadapara criar novos produtos e servios sob condies de extrema incerteza.

    O que aconteceu em seguida est gravado na minha memria. Enquanto eu falava, o CEOBrad Smith ficou sentado perto de mim. Quando terminei, ele se levantou e disse para todos osfuncionrios da Intuit: Pessoal, prestem ateno. Voc escutaram a definio de Eric arespeito de uma startup. Possui trs partes, e, ns aqui na Intuit, somos compatveis com todasas trs partes dessa definio.

    Cook e Smith so lderes que entendem que algo novo necessrio no pensamentoadministrativo. A Intuit a prova de que esse tipo de pensamento pode funcionar nas empresasestabelecidas. Smith me explicou suas responsabilidades em relao s novas iniciativas deinovao medindo duas coisas: a quantidade de clientes utilizando produtos que no existiamh trs anos e a porcentagem da receita resultante dos produtos que no existiam h trs anos.

    Sob o modelo antigo, levava 5,5 anos, em mdia, para um novo produto bem-sucedidocomear a gerar uma receita de 50 milhes de dlares. Smith explicou-me: No ltimo ano,geramos 50 milhes de dlares em produtos que no existiam h doze meses. No umproduto especfico. uma combinao de todo um grupo de inovaes acontecendo, mas esse o tipo de coisa que est criando alguma energia para ns, que achamos que podemos terresultados muito mais significativos ao liquidar rapidamente as coisas que no fazem sentido eduplicar as que fazem. Para uma empresa to grande quanto a Intuit, so resultados modestosdo comeo de uma jornada. Ela tem dcadas de sistemas legados e pensamentosremanescentes de outra poca para superar. No entanto, sua proposta de adotar a gestoempresarial est comeando a compensar.

    Liderana requer criar condies que permitam aos funcionrios realizar os tipos deexperimentaes requeridas pelo empreendedorismo. Por exemplo, mudanas no TurboTaxpermitiram que a equipe da Intuit desenvolvesse quinhentos experimentos a cada perodo dedeclarao de imposto de renda. Antes disso, profissionais de marketing com grandes ideiasno conseguiam fazer esses testes mesmo se quisessem, pois no tinham um sistema emfuncionamento para mudar o site com rapidez. A Intuit investiu em sistemas que aumentaram avelocidade com que os testes podem ser criados, implementados e analisados.

    Como Cook afirma: Construir esses sistemas de experimentao responsabilidade da altadireo da empresa; esses sistemas tm de ser introduzidos pela liderana. Em vez de oslderes ficarem brincando de Csar (imperador romano), mostrando os polegares para cima oupara baixo para aprovar ideas, eles devem instalar a cultura e os sistemas necessrios paraque os times se movam e inovem na velocidade da experimentao.

    4 The Innovators Dilemma um livro clssico de Clayton Christensen a respeito das dificuldades que as empresasestabelecidas enfrentam com a inovao radical. Junto com sua sequncia, The Innovators Solution, expe sugestesespecficas a respeito de como empresas estabelecidas podem criar divises autnomas para perseguir a inovaocaracterstica da startup. Esses pr-requisitos estruturais especficos so discutidos em detalhes no Captulo 12.

    5 Para mais informaes a respeito do SnapTax, ver e

  • than-350000-dowloads-for-snaptax-its-smartphone-tax-filling-app>.

    6 A maioria das informaes a respeito da Intuit e do SnapTax vem de entrevistas particulares com a administrao e osfuncionrios da empresa. Informaes acerca da criao da Intuit vm de Inside Intuit: How the Makers of Quicken BeatMicrosoft and Revolutionized an Entire Industry (Cambridge: Harvard Business Press, 2003), de Suzanne Taylor e KathySchroeder.

  • C

    3APRENDER

    omo empreendedor, nada me atormenta mais do que a questo de saber se minha empresaest fazendo progressos na criao de um negcio bem-sucedido. Como engenheiro, e

    depois como gerente, estava acostumado a avaliar o progresso certificando-me de que otrabalho progredia de acordo com um plano, era de alta qualidade e custava o que tnhamosprojetado.

    Aps muitos anos como empreendedor, comecei a me preocupar com medir o progresso dotrabalho dessa maneira. E se estivssemos desenvolvendo algo que ningum quisesse? Nessecaso, qual era a relevncia de fazer isso no prazo e de acordo com o oramento? Ao ir paracasa no fim do dia, as nicas coisas que sabia com certeza era que tinha mantido as pessoasocupadas e gasto dinheiro naquele dia. Esperava que os esforos de minha equipe nosaproximassem de nosso objetivo. Se acabssemos pegando um caminho errado, eu teria de meconsolar com o fato de que, no mnimo, tnhamos aprendido algo importante.

    Infelizmente, aprender a desculpa mais antiga na histria para um empreendimentomalsucedido. ao que os gerentes recorrem quando no alcanam os resultados prometidos.Os empreendedores, sob presso para ter sucesso, so bastante criativos quando se trata dedemonstrar o que aprenderam. Podemos contar uma boa histria quando nosso emprego, nossacarreira ou nossa reputao est em jogo.

    No entanto, a aprendizagem um consolo sem graa para os funcionrios que seguem umempreendedor rumo ao desconhecido. um consolo sem graa para os investidores quealocam dinheiro, tempo e energia preciosos em equipes empreendedoras. um consolo semgraa para as organizaes grandes e pequenas que dependem da inovao doempreendedorismo para sobreviver. No se pode levar a aprendizagem ao banco; no se podegast-la nem investi-la. No se pode ofert-la aos clientes nem entreg-la a parceiroslimitados. Assim, surpreendente que a aprendizagem tenha uma m reputao nos crculos deempreendedores e administradores?

    No entanto, se o objetivo fundamental do empreendedorismo se envolver na construo deorganizaes sob condies de extrema incerteza, sua funo mais essencial a aprendizagem.Devemos aprender a verdade acerca de que elementos da nossa estratgia esto funcionandopara concretizar nossa viso, e quais so apenas absurdos. Devemos aprender o que osclientes de fato querem, e no o que eles dizem que querem ou o que achamos que devamquerer. Devemos descobrir se estamos num caminho que levar ao desenvolvimento de umnegcio sustentvel.

  • No modelo da startup enxuta, reabilitamos a aprendizagem com um conceito que denominoaprendizagem validada. A aprendizagem validada no uma racionalizao depois do fato ouuma boa histria elaborada para ocultar o fracasso. um mtodo rigoroso para demonstrar oprogresso quando uma pessoa est pisando no solo da extrema incerteza no qual as startupscrescem. A aprendizagem validada o processo de demonstrar empiricamente que uma equipedescobriu verdades valiosas acerca das perspectivas de negcio presentes e futuras de umastartup. Ela mais concreta, mais exata e mais rpida do que prognsticos de mercado ou oclssico planejamento empresarial. o antdoto principal contra o problema fatal de alcanaro fracasso: executar com sucesso um plano que no leva a lugar nenhum.

    A APRENDIZAGEM VALIDADA NA IMVUIlustrarei esta seo com um exemplo da minha carreira. Muitas plateias me ouviram relatar ahistria da fundao da IMVU e dos diversos erros que cometemos no desenvolvimento doprimeiro produto. Neste momento, detalharei um desses erros para esclarecer a aprendizagemvalidada.

    Os envolvidos na fundao da IMVU aspiravam a ser importantes pensadores estratgicosimportantes. Cada um de ns havia participado anteriormente de empreendimentos anterioresque fracassaram, e estvamos avessos a repetir a experincia. Nos primeiros dias, nossasprincipais preocupaes estavam relacionadas s seguintes questes: O que devemosdesenvolver e para quem? Que mercado podemos ingressar e dominar? Como podemosdesenvolver um valor durvel que no seja corrodo pela concorrncia?7

    Estratgia brilhanteDecidimos ingressar no mercado de mensagens instantneas (MI). Em 2004, esse mercadotinha centenas de milhes de consumidores que participavam ativamente em todo o mundo. Noentanto, a maioria dos clientes que usava produtos de MI no pagava pelo privilgio. Em vezdisso, os grandes portais e as empresas de mdia, tais como AOL, Microsoft e Yahoo!,operavam suas redes de MI com prejuzo, como porta de entrada para outros produtos eservios, ganhando um pouco de dinheiro com a propaganda.

    O servio de MI um exemplo de mercado que envolve efeitos de rede poderosos. Como amaioria das redes de comunicao, o servio de MI idealizado para seguir a lei de Metcalfe:o valor de uma rede como um todo proporcional ao quadrado do nmero de participantes.Em outras palavras, quanto mais pessoas na rede, mais valiosa ela . Isso faz sentido: o valorpara cada participante condicionado principalmente pela quantidade de outras pessoas comque ele pode se comunicar. Imaginemos um mundo em que voc possui o nico telefone; eleno teria nenhum valor. O telefone adquire valor apenas quando as outras pessoas tambm opossuem.

    Em 2004, o mercado de MI se restringia a um nmero pequeno de empresas. As trs redesprincipais controlavam mais de 80% da utilizao geral e estavam no processo de consolidarseus ganhos em participao de mercado custa de uma srie de concorrentes menores.8

  • Segundo a voz corrente, era praticamente impossvel ingressar com uma nova rede de MI nomercado sem investir muito dinheiro em marketing.

    O motivo simples. Por causa do poder dos efeitos de rede, os produtos de MI possuemaltos custos de troca. Para trocar de uma rede para outra, os clientes teriam de convenceramigos e colegas a trocar com eles. Esse trabalho extra para os clientes cria uma barreira entrada no mercado de MI: com todos os consumidores travados num produto estabelecido,no h clientes disponveis com os quais estabelecer uma nova abordagem.

    Na IMVU, decidimos por uma estratgia de construir um produto que combinaria o grandeapelo s massas da MI tradicional com a alta receita por cliente de videogamestridimensionais (3D) e mundos virtuais. Em virtude da quase impossibilidade de levar aomercado uma nova rede de MI, decidimos criar um produto complementar ao servio de MI(add-on ou plugin), que atuaria em conjunto com as redes existentes. Dessa maneira, osclientes poderiam adotar os produtos virtuais e a tecnologia de comunicao por meio dosavatares da IMVU sem ter de trocar seus provedores de MI, aprender uma nova interface deusurio e mais importante trazer seus amigos com eles.

    De fato, consideramos que esse ltimo ponto era fundamental. Para o produto add-on sertil, os clientes teriam de utiliz-lo com seus amigos. Cada mensagem traria incorporada a elaum convite para se associar IMVU. Nosso produto seria basicamente viral, espalhando-sepor todas as redes de MI existentes como uma epidemia. Para alcanar esse crescimento viral,era importante que o produto add-on atendesse ao mximo de redes de MI existentes efuncionasse em todos os tipos de computadores.

    Seis meses para o lanamentoCom essa estratgia em mente, meus scios e eu comeamos um perodo de intenso trabalho.Como diretor de tecnologia, era minha responsabilidade, entre outras coisas, construir osoftware que suportaria a interoperabilidade com as redes de MI. Assim, trabalhamos durantemeses, investindo muitas horas no esforo de lanar o primeiro produto. Ns nos demos umprazo duro de seis meses 180 dias para lanar o produto e atrair nossos primeiros clientespagantes. Era um cronograma cansativo, mas estvamos determinados a lanar o produto noprazo.

    O produto add-on era to grande e complexo, e tinha tantas peas em movimento quetivemos de fazer diversas concesses para conclu-lo no prazo. Honestamente: a primeiraverso era terrvel. Passamos horas interminveis discutindo quais bugs (defeitos deprogramao) consertar e quais eram aceitveis, quais funcionalidades ainda tentarimplementar e quais cortar. Foi um tempo maravilhoso e amedrontador: estvamos cheios deesperana a respeito das possibilidades de sucesso e tomados pelo medo das consequnciasde lanar um produto ruim.

    Pessoalmente, receava que a baixa qualidade do produto manchasse minha reputao comoengenheiro. As pessoas achariam que eu no sabia como construir um produto de qualidade.Todos temamos macular a marca IMVU; afinal, cobrvamos das pessoas por um produto queno funcionava muito bem. Imaginvamos as manchetes desfavorveis dos jornais:

  • Empreendedores ineptos criam produto terrvel.Com a aproximao do dia do lanamento, o medo crescia. Em nossa situao, muitas

    equipes de empreendedores cedem ao medo e adiam a data de lanamento. Emboracompreenda esse impulso, fico feliz de termos perseverado, pois o adiamento impedeinmeras startups de obterem o feedback necessrio. Nossos fracassos anteriores nosdeixavam mais receosos de um resultado ainda pior que lanar um produto de baixaqualidade: criar algo que ningum quisesse. E assim, tensos e com desculpas engatilhadas,apresentamos o produto ao pblico.

    LanamentoE ento... nada aconteceu! Nossos temores se revelaram infundados, pois ningum ao menostestou nosso produto. A princpio, senti-me aliviado, porque ao menos ningum descobririacomo o produto era ruim, mas logo esse sentimento deu lugar a uma grande frustrao. Depoisde todas as horas que passamos discutindo acerca dos recursos a incluir e dos bugs aconsertar, nossa proposio de valor ficou to distante que os clientes no estavam sequerexperimentando o produto o suficiente para descobrir quo ruim eram nossas opes deprojeto. Os clientes nem mesmo faziam o donwload do nosso produto.

    Nas semanas e meses seguintes, trabalhamos para melhorar o produto. Atramos um fluxoconstante de clientes por meio do processo on-line de registro e download. Tratvamos osclientes de cada dia como um relatrio novo em folha, informando-nos acerca de nossodesempenho. Acabamos aprendendo como mudar o posicionamento do produto para que osclientes ao menos fizessem o download dele. Fazamos melhorias no produto bsicocontinuamente, enviando correes para os bugs e novas mudanas todos os dias. No entanto,apesar dos nossos melhores esforos, fomos capazes de convencer apenas uma quantidadepateticamente pequena de pessoas a comprar nosso produto.

    Em retrospecto, uma boa deciso que tomamos foi a definio de metas claras de receitapara aqueles primeiros dias. No primeiro ms, planejamos obter uma receita total de 300dlares, e conseguimos, embora por pouco. Muitos amigos e familiares foram convidados(tudo bem, suplicamos) a comprar o produto. A cada ms, as pequenas metas de receitacresciam; primeiro, para 350 dlares, e, depois, para 400 dlares. Conforme cresciam, osesforos aumentavam. Em pouco tempo, os amigos e familiares acabaram; nossa frustraoaumentou. Melhorvamos o produto todos os dias, mas o comportamento dos clientescontinuava o mesmo: ainda no o utilizavam.

    Nosso insucesso em alterar os nmeros nos incitou a acelerar a iniciativa de trazer clientesao escritrio para entrevistas pessoais e testes de usabilidade. As metas quantitativas criarama motivao para o emprego da pesquisa qualitativa, e nos orientaram nas perguntas queformulamos; esse um padro que veremos em todo este livro.

    Gostaria de poder dizer que fui o nico a perceber nosso erro e sugerir a soluo, mas, narealidade, fui o ltimo a admitir o problema. Em resumo, toda a anlise estratgica demercado estava completamente errada. Compreendemos isso de forma emprica, medianteexperimentao, e no por meio de grupos de foco ou de pesquisa de mercado. Os clientes no

  • podiam nos dizer o que queriam; a maioria, afinal, nunca tinha ouvido falar de avatares em3D. Em vez disso, revelaram a verdade por meio da ao ou inao, enquanto nosesforvamos para melhorar o produto.

    Conversando com os clientesComo resultado do desespero, decidimos conversar com alguns possveis clientes. Ns ostrouxemos ao escritrio e pedimos: Experimente esse novo produto; o IMVU. Se fosse umadolescente, um usurio pesado de MI, ou um adotante inicial de tecnologia, ele se envolviaconosco. Ao contrrio, se fosse uma pessoa comum, a resposta era: Tudo bem. O que vocgostaria que eu fizesse exatamente?. No chegaramos a lugar nenhum com o grupo depessoas comuns; elas achavam que o IMVU era muito estranho.

    Imaginemos uma garota de 17 anos sentada conosco para testar o produto. Ela escolhe seuavatar e afirma: Ah, bastante divertido. Ela est customizando seu avatar, decidindo comoele vai parecer. Ento, dizemos: Tudo bem, chegou o momento de fazer o download do add-on de mensagem instantnea. Ela pergunta: O que isso?.

    Bem, essa coisa que interopera com o cliente de mensagem instantnea. Ela fica olhandopara ns, pensando: Nunca ouvi falar disso. Meus amigos nunca ouviram tambm. Por quequerem que eu faa isso?. Exigia muitas explicaes; um add-on de mensagem instantneano era uma categoria de produto existente na mente dela.

    Mas, como ela est na sala conosco, somos capazes de convenc-la. Ela faz o download doproduto e, ento, pedimos: Tudo bem, convide uma das suas amigas para bater papo. E elaretruca: De jeito nenhum. Por que no?, perguntamos. Ela responde: Ainda no sei seessa coisa bacana. Vocs querem que eu me arrisque a convidar uma de minhas amigas? Oque ela vai pensar de mim? Se for uma droga, ela vai achar que eu sou uma babaca, certo?.Ento, afirmamos: No, no, vai ser mais divertido se convidar sua amiga; um produtosocial. Ela olha para ns com uma expresso repleta de dvidas; percebemos que aquilosignifica um beco sem sada. Naturalmente, na primeira experincia, eu disse: Tudo bem, scom essa pessoa; mande ela para casa e me traga uma outra. Ento, o segundo cliente chega ediz a mesma coisa. Depois, o terceiro cliente chega e acontece o mesmo. Voc comea aperceber padres e, no importa a persistncia, sem dvida h algo errado.

    Os clientes continuavam dizendo: Quero usar sozinho. Quero experimentar primeiro paraver se bacana antes de convidar um amigo. Nossa equipe era originria da indstria dovideogame; assim, entendamos o que aquilo significava: modo para um nico jogador(single-player).

    Assim, desenvolvemos uma verso para um s jogador. Trouxemos novos clientes aoescritrio. Eles customizaram os avatares e fizeram o download do produto, como antes. Emseguida, entraram no modo jogador nico, ento dissemos: Jogue com seu avatar e o vista;veja os movimentos incrveis que ele pode executar. Depois: Tudo bem, voc fez issosozinho. Agora, chegou o momento de convidar um dos seus amigos. Pressentimos o quevinha a seguir. Eles afirmaram: De jeito nenhum. Isso no bacana. Dissemos: Bem, nsfalamos para voc que no ia ser bacana. Qual o sentido de uma experincia de jogador

  • nico em um produto social?. Achamos que devamos ganhar uma medalha de ouro apenaspor escutar os clientes. Exceto pelo fato de que os clientes ainda no gostavam do produto.Olharam para ns e disseram: Escute meu senhor, voc no est entendendo. Que loucura essa de me pedir para convidar meus amigos antes de sabermos se legal?. Era um beco semsada.

    Como resultado de mais desespero, introduzimos um recurso denominado ChatNow, quepermitia pressionar um boto e ser aleatoriamente conectado com outra pessoa em qualquerlugar do mundo. A nica coisa que vocs teriam em comum era o fato de pressionarem o botoao mesmo tempo. De forma inesperada, em nossos testes de servio ao cliente, as pessoascomearam a dizer: Ah, isso divertido!.

    Assim, trouxemos outros clientes ao escritrio. Eles utilizaram o boto ChatNow eacabaram encontrando pessoas que consideraram interessantes. Disseram: Ei, aquele cara legal; quero adicion-lo a minha lista de contatos. Onde est minha lista de contatos?.Respondemos: Voc no precisa de uma nova lista de contatos. Voc pode usar sua lista decontatos da AOL. Lembre-se: essa foi a maneira que planejamos para aproveitar ainteroperabilidade que nos levaria aos efeitos de rede e ao crescimento viral. Imagine ocliente olhando para ns e perguntando: O que voc quer que eu faa exatamente?. Ento,respondemos: D seu pseudnimo para ele para que possa coloc-lo na sua lista de contatosda AOL. Percebamos os olhos do cliente se arregalando e dizendo: Est brincando? Umestranho na minha lista de contatos?. Contestamos: Sim; caso contrrio, voc ter de fazer odownload de um servio de MI totalmente novo, criando uma nova lista de contatos. Ento, ocliente afirmou: Voc tem ideia de com quantos servios de MI eu j tenho de lidar?.

    No. Um ou dois, talvez? a quantidade de servios que cada um de ns do escritriousava. E o adolescente revelou: T de brincadeira? Eu administro oito. No tnhamos ideiade quantos servios de mensagem instantnea existiam no mundo.

    Tnhamos a incorreta pr-concepo de que um desafio aprender um novo software e difcil transferir os amigos para uma nova lista de contatos. Nossos clientes mostraram queisso era absurdo. Queramos desenhar diagramas no quadro branco que evidenciariam comonossa estratgia era brilhante, mas os clientes no entendiam conceitos como efeitos de rede ecustos de troca. Se tentssemos explicar por que deveriam se comportar do modo queprevramos, ficariam perplexos.

    Tnhamos um modelo mental de como as pessoas utilizavam softwares, que estavaultrapassado h anos, e, assim, por fim, de modo penoso, aps dezenas de reunies comoaquelas, comeamos a entender que o conceito do add-on de MI era fundalmentalmente falho.9

    Nossos clientes no queriam um add-on de MI, mas uma rede de MI independente. Eles noconsideravam um obstculo ter de aprender a utilizar um novo programa de MI; pelocontrrio, as primeiras pessoas que testaram nosso produto utilizavam diversos programas deMI diferentes de modo simultneo. Os clientes no se intimidavam com a ideia de ter de levarseus amigos com eles para uma nova rede de MI; revelou-se que eles gostavam daqueledesafio. Ainda mais surpreendente: nossa suposio de que os clientes desejariam utilizar MIbaseada em avatares principalmente com os amigos tambm estava errada. Eles desejavamfazer novos amigos atividade que os avatares em 3D so especialmente apropriados para

  • realizar. Aos poucos, os clientes destroaram nossa estratgia inicial aparentemente brilhante.

    Jogando fora meu trabalhoTalvez voc sinta compaixo por nossa situao e perdoe minha obstinao. Afinal, era meutrabalho de meses que tinha de ser jogado fora. Eu havia trabalhado duro no softwarenecessrio para fazer nosso programa de MI interoperar com outras redes; que estava nocentro da estratgia original. Quando chegou o momento de pivotar e abandonar a estratgiaoriginal, quase todo o meu trabalho milhares de linhas de cdigo foi jogado fora. Senti-metrado. Afinal, era um entusiasta das ltimas novidades em metodologias de desenvolvimentode software (conhecidas coletivamente como desenvolvimento gil), que prometiam ajudar aevitar o desperdcio no desenvolvimento de produtos. No entanto, apesar disso, cometi omaior desperdcio de todos: desenvolvi um produto que os clientes se recusaram a usar. Erarealmente deprimente.

    Eu desejava saber: levando em conta o fato de que meu trabalho se revelou um desperdciode tempo e energia, a empresa no teria tido melhor sorte se eu tivesse passado aquelesltimos seis meses numa praia bebericando drinques enfeitados com guarda-chuvinhas? Defato, eu fora necessrio? No teria sido melhor se eu no tivesse feito absolutamente nada?

    Como mencionei no incio deste captulo, sempre h um ltimo refgio para as pessoas quedesejam justificar o prprio fracasso. Consolei-me com o fato de que, se no tivssemosdesenvolvido esse primeiro produto com erros e tudo, nunca teramos tomado conhecimentode importantes percepes acerca dos clientes. Jamais teramos descoberto que a estratgiaera imperfeita. H verdade nessa desculpa: o que aprendemos naqueles primeiros e decisivosmeses colocou a IMVU no caminho que a levaria ao seu grande sucesso final.

    Por um tempo, esse consolo do aprendizado me fez sentir melhor, mas meu alvio foiefmero. Eis a pergunta que me incomodou mais que todas: se o objetivo daqueles meses foitomar conhecimento de importantes percepes acerca dos clientes, por que demorou tanto?Quanto do nosso esforo havia contribudo para as lies bsicas que precisvamos aprender?Teramos aprendido aquelas lies antes se no tivesse ficado to concentrado nodesenvolvimento de um produto melhor, adicionando recursos e reparando bugs?

    VALOR VERSUS DESPERDCIOEm outras palavras, quais dos nossos esforos criam valor e quais desperdiam valor? Essapergunta est no cerne da revoluo da manufatura enxuta; a primeira pergunta que qualquerpartidrio da manufatura enxuta treinado para responder. Aprender a enxergar o desperdcioe, depois, elimin-lo de modo sistemtico permitiu que empresas enxutas, como a Toyota,dominassem setores inteiros da economia. No mundo do software, as metodologias dedesenvolvimento gil que eu havia praticado at aquele momento tinham suas origens nopensamento enxuto. Elas tambm foram idealizadas para eliminar o desperdcio.

    No entanto, aqueles mtodos me levaram a um caminho no qual a maioria dos esforos daminha equipe foi desperdiada. Por qu?

  • A resposta me chegou lentamente ao longo dos anos seguintes. O pensamento enxuto definevalor como algo que proporciona valor ao cliente; todo o restante desperdcio. No negciode manufatura, os clientes no se importam com a maneira pela qual o produto montado,apenas com que ele funcione de maneira correta. No entanto, numa startup, quem o cliente eo que ele pode considerar que tem valor so fatos desconhecidos, parte da prpria incertezaque parte essencial da definio de uma startup. Percebi que, como uma startup,precisvamos de uma nova definio de valor. O progresso real que tnhamos feito na IMVUera o que tnhamos aprendido ao longo daqueles primeiros meses a respeito do que cria valorpara os clientes.

    Qualquer coisa que fizramos naqueles meses que no contribura para o aprendizado erauma forma de desperdcio. Teria sido possvel aprender as mesmas coisas com menosesforo? A resposta, claro, sim.

    Antes de mais nada, consideremos todos os debates e a priorizao de esforos investidosem recursos que os clientes nunca descobririam. Se tivssemos lanado o produto maisrpido, poderamos ter evitado aquele desperdcio. Tambm consideremos todo o desperdcioprovocado pelas hipteses estratgicas incorretas. Eu desenvolvera a interoperabilidade paramais de uma dzia de redes diferentes de MI. Aquilo era mesmo necessrio para testar ashipteses? Poderamos ter tido o mesmo feedback dos clientes com menos da metade dasredes? Com apenas trs? Com apenas uma? Como os clientes de todas as redes de MI acharamnosso produto sem atrativos, o nvel de aprendizagem teria sido o mesmo, mas o esforo teriasido muito